Por Memória Globo

Fabrício Mota/Memória Globo, 2018

Início dos anos 1980. Todos queriam saber quem seria o novo ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República. Em Brasília, o chefe mandou a repórter para a porta da casa de um dos candidatos ao cargo. E esqueceu de dispensá-la do plantão. Ela passou a noite toda esperando, em vão: o novo ministro, escolhido no dia seguinte, era outro. Esse é um dos episódios vividos e lembrados com humor pela jornalista Cristiana Lôbo, especializada em cobertura fatual e analítica da política nacional, com passagens por jornais, TV, sites e blogs. Ela ficou no setor desde 1982. Chamada carinhosamente de “Loba” pelos colegas, cobriu os governos João Figueiredo, José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. A jornalista morreu em 11 de novembro de 2021, após longa luta contra um câncer.

Quando você critica um político, ele liga para dizer que não é bem aquilo. E quando elogia, de certa forma ele acha que você não está fazendo mais do que a obrigação. A sensação que tenho hoje é que lido com eles sem achar que o que dizem é uma verdade absoluta. Sempre ouço quem quer conversar comigo. Não se pode desprezar uma outra face da informação, senão você não vai captar o fato corretamente.

Cristiana Lôbo em entrevista ao Memória Globo, 2018. — Foto: Fabricio Mota/Memória Globo.

Início da carreira

Cristiana dos Santos Mendes Lôbo nasceu em Goiânia, em 18 de agosto de 1957, e se formou em jornalismo na Universidade Federal de Goiás. Escolheu o curso para tentar realizar o sonho de ter um programa de música no rádio. Começou cobrindo política em Goiás e, depois, em Brasília. Sua carreira tomou novos rumos quando passou a trabalhar para O Globo. Foi setorista no Ministério da Saúde, onde viu ser criada a carteira de vacinação, que ajudou a diminuir a mortalidade infantil no país, e depois passou para o Ministério da Educação. “Foi ali que aprendi que você tem de trabalhar de manhã até a noite. E nunca larguei disso”, conta.

Um momento intenso na sua vida profissional foi a cobertura da campanha por eleições diretas no país, em 1984. “Naquele tempo, não existia celular, nem internet, a única coisa que havia era um telefone que você apertava e a redação ouvia. Eles pediam 15 linhas, e a gente tinha de fazer o retrato daquele momento”, recorda. O ritmo de trabalho não diminuiu no governo de José Sarney: “No dia em que foi editado o Plano Cruzado, de reforma da economia, eu tinha voltado da minha licença-maternidade. Saí de casa às 7h, voltei às 23h. Cheguei a ter febre. E nesse dia o bebê não mamou.”

No governo Collor, Cristiana Lôbo lembra que as relações entre a cúpula e os jornalistas eram tensas. Um dia, no estreito corredor do prédio anexo do Palácio do Planalto, ela estava indo e o presidente, voltando. A jornalista pensou: “Meu Deus, que sorte, vou fazer uma entrevista com o Collor.” Mas ele se virou para outro lado e a entrevista não saiu.

No jornal O Globo, ela trabalhou na coluna Panorama Político e na Coluna do Swann. Foi se especializando em notas curtas – o que a ajudaria, anos depois, no trabalho na televisão. Antes disso, após 13 anos em O Globo, Cristiana transferiu-se para O Estado de S. Paulo, onde assumiu a coluna política. E assim, como observadora de fatos e tendências, continuou acompanhando de perto a vida política brasileira: “Tivemos uma ditadura que interrompeu a formação de novos políticos. Viemos de uma economia fechada em que até posto de gasolina era uma concessão pública. E isto significava ter amigos no poder”.

Na GloboNews

A chegada na televisão se deu na GloboNews, em 1997, como comentarista do Jornal das Dez. Como parte do jornalismo da Globo, dialogava com colegas do jornal O Globo e de outros setores da rede de televisão. “Eu trato a televisão como eu tratava a coluna do jornal: converso com várias pessoas durante o dia. Às vezes tem um assunto do dia, que é interessante comentar, outras vezes tem um assunto novo, que você mesma traz”, comenta. Paralelamente às análises políticas, a jornalista seguiu fazendo coberturas especiais. Na passagem do governo de Fernando Henrique Cardoso para o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, trabalhou duro: “Teve um dia em que fiquei no ar de manhã até a noite, porque a gente ia descobrindo quem é que saía e quem entrava. Era o paraíso para nós: notícia o dia inteiro. Para mim, melhor do que isso, só os filhos!”. Também acompanhou de perto a eleição e posse da presidente Dilma Roussef, em 2010 e 2011.

Jornal das Dez: estreia de Cristiana Lôbo (1997)

Jornal das Dez: estreia de Cristiana Lôbo (1997)

Em 2003, passou a integrar o programa Fatos e Versões, apresentado por Franklin Martins, onde se destacava pelo quadro Papo no Cafezinho, dedicado aos bastidores da política e seus expoentes. “O Fatos e Versões é um programa de tanto sucesso porque ele fala dos bastidores da política e isso interessa às pessoas. Quando você fala dos bastidores é exatamente contar sem precisar opinar, contar para as pessoas o que está por trás de cada notícia, de cada decisão’, ressalta. Com a saída de Franklin, em 2006, a jornalista assumiu a apresentação do programa, que ficaria no ar até março de 2020, quando a pandemia de Covid-19 fez com que a GloboNews mudasse a grade de programação para dedicar mais tempo ao hardnews. De 2008 até 2014, participou também do Estúdio I, ao lado de Maria Beltrão.

Fatos e Versões: estreia (2003)

Fatos e Versões: estreia (2003)

Sempre com entusiasmo, Cristiana Lôbo acompanhou, durante mais de 20 anos, os principais fatos políticos do século XXI para a GloboNews – e não foram poucos. Com cuidado e clareza, buscava contar e contextualizar os bastidores de eventos tão importantes da história nacional como o julgamento do Mensalão, as manifestações de 2013, o impeachment da presidente Dilma Rousseff e as consequências da operação Lava Jato. Durante a corrida presidencial de 2018, participou, com Andréia Sadi, Merval Pereira, Gerson Camarotti e Valdo Cruz do programa Central das Eleições. “Nós fizemos entrevistas sobre coerências e incoerências dos programas de governo; o que era factível ou não era factível. Teve entrevistas de duas horas com cada um dos candidatos, depois teve uma programática de mais meia hora. Acho que a GloboNews contribuiu muito com a formação da opinião do eleitor para decidir o voto. Foi um trabalho bem interessante, extenuante – na semana das entrevistas a gente ficava estourado, mas muito feliz e muito realizado”, lembra.

A jornalista também tinha intensa presença na internet. Além de um blog no G1 chamado Os Bastidores da Política, em 2012, alcançou a marca de 33 mil seguidores no site Twitter – que ela considerava um mundo enorme, um universo paralelo. Não existem fórmulas prontas que possam resumir sua trajetória, mas ela dá uma dica: “Só vivendo muito para ver tudo o que já vi.”

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Menina do Jô

De 2005 a 2014, Cristiana Lôbo passou a fazer parte das discussões políticas no Programa do Jô, num quadro chamado Meninas do Jô, que reunia as jornalistas Lillian Witte Fibe, Ana Maria Tahan e Cristina Serra.

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Cristiana Lôbo morreu, aos 64 anos, no dia 11 de novembro de 2021, em São Paulo. Ela lutava contra um mieloma – um tipo de câncer na medula óssea – e estava internada para tratar uma pneumonia. Deixou marido, Murilo, dois filhos, Bárbara e Gustavo, e os netos Antônio e Miguel.

Fontes

Depoimentos concedidos ao Memória Globo por Cristiana Lôbo em 07/04/2011 e 20/08/2018.
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