“Sou um humorista indefinido”, afirma Cláudio Manoel Mascarenhas Pimentel dos Santos ou, simplesmente, Cláudio Manoel. Ele é filho de uma professora e de um engenheiro. “Devo tudo ao humor, consumo e escrevo humor, mas não me julgo humorista. Às vezes, sou mais um produtor-autor. Levei muito tempo para escrever em ficha de hotel, por exemplo, ator. Não conseguia. Sempre achava que no dia que escrevesse isso ia estar a Fernanda Montenegro atrás falando: ‘Mas não é mesmo!’ “, diverte-se.
Mesmo tendo cursado dois anos na faculdade de Engenharia de Produção da UFRJ, um pouco de Economia na mesma universidade e parte do curso de Comunicação Social na UFF, Cláudio Manoel considera que sua formação mesmo foi no Colégio Aplicação da UFRJ, onde conheceu Bussunda, que tinha 9 anos na época, e o Marcelo Madureira, quando ambos tinham 13 anos. “Fiquei sete anos lá e foi importante porque além de ser um colégio que exigia muito, aprendi a consumir leitura, não só a me alfabetizar. Também socializei bem, convivo com gente de lá até hoje. Foi onde conheci os irmãos do Bussunda e comecei a frequentar a casa deles, além de ser da mesma turma do Marcelo”.
Em 1980, Cláudio Manoel e Bussunda foram convidados a fazer parte do jornalzinho Casseta Popular, que havia sido criado dois anos antes por Marcelo Madureira, Beto Silva, e Helio De La Peña.
“A gente vendia em bar, na praia e usava o dinheiro para fazer a edição seguinte. Naquela época, já estava começando a abertura política, mas as gráficas ainda tinham problema em aceitar o jornal para rodar. Uns achavam que era de oposição, outros pornografia. Na verdade, era meio os dois”
A turma do Casseta também começou a fazer shows e montaram um coral que se chamava Coro de Pica. Até que, em 1984, o jornal Planeta Diário surgiu nas bancas, editado pela Núcleo-3, também fazendo humor. A turma do Casseta Popular resolveu procurar, então, a mesma editora para fazer uma revista bimestral. “A gente vendia cerca de cem mil exemplares a cada edição“, conta.
Quando decidiram tornar a revista mensal, Cláudio Manoel e Bussunda foram os escolhidos para serem os responsáveis pela publicação, uma vez que todos os outros trabalhavam. “Eu era editor, Bussunda meu partner. A gente ganhava um salário mínimo e meio por mês. Fomos morar juntos também, eu, Bussunda e Beto”.
Numa terça-feira de dezembro de 1987, dia da semana em que jogavam futebol num clube em Botafogo, Beto conta para Cláudio e Bussunda que havia recebido um telefonema importante: “’O Cláudio Paiva ligou, Jô Soares saiu da Globo foi para o SBT e vai ter um projeto chamado Humor Novo. Eles estão precisando de redator, a gente tem que fazer um vestibular, tem que provar que sabemos escrever para TV’. E aí, ficamos trancado nesse apartamento que a gente morava e veio também o Helio porque o Marcelo já tinha encostado com o Reinaldo e o Hubert pra escrever para Band”.
'TV Pirata'
O tal programa de humor era a 'TV Pirata', que estreou em 1988, contando tanto com a turma do Casseta Popular quanto a do Planeta Diário. “Seguíamos a vida separado até que o Paulo Albuquerque, gerente de uma casa de shows do Rio chamada JazzMania e fã de humor, propôs para gente fazer um show conjunto para apresentar nas segundas-feiras. Resolvemos fazer uma banda musical e compor músicas de humor, com alguns textos interligando as músicas. Era para ficarmos algumas semanas em cartaz e duramos mais de um ano”.
Para Cláudio Manoel, a 'TV Pirata' foi importante também pelo contato que teve com a redação final do programa. “A gente começou fazer a redação final junto com o Cláudio Paiva. Aprendi com ele, a quem devo muito, o ofício. Eu me transformei no redator final do 'Casseta & Planeta', você tem que entrar na onda do outro, às vezes você lê e não acha tanta graça, mas você procura”.
'Doris para Maiores' e 'Casseta'
Com o fim da 'TV Pirata' em 1990, o grupo propôs um piloto chamado 'Casseta & Planeta Urgente'. “A gente recebeu o veredicto da direção, que na época era o Boni, que gostou do conteúdo, mas disse que a gente era desconhecido. Eles tinham acabado de contratar a Doris Giesse. Daí nasceu o 'Doris Para Maiores' (1991) e o nosso lema era ‘jornalismo mentira, humorismo verdade’”. No terceiro programa, a Doris pediu para sair, afirmando que não se via como humorista. Em 1992, eles estrearam o 'Casseta & Planeta, Urgente!', com a Kátia Maranhão como apresentadora.
Estreia do programa, com apresentação de Kátia Maranhão.
“O Casseta ainda era na praia da ideia do jornalismo mentira, humorismo verdade porque a gente não se sentia seguro, não tínhamos as ferramentas para atuar tanto assim. O jornalístico era uma coisa mais fácil porque a gente nem tinha compromisso com a notícia, nem em compor um personagem”.
Paródia da novela “Explode Coração” com Claudio Manoel, Beto Silva e Marcelo Madureira.
Maçaranduba e Seu Creysson
Ao longo dos 20 anos de 'Casseta & Planeta', Cláudio Manoel destaca o Maçaranduba e o Seu Creysson entre seus personagens mais marcantes. “O Maçaranduba era uma onda do hipermacho, que o cara é tão homem, que você desconfia. Então, tinha essa onda de brincar com essa masculinidade, essa testosterona excessiva, violenta e, na maioria dos casos, covarde. E o Seu Creysson foi um personagem com uma criação bastante coletiva e que teve uma trajetória interessante”.
Cena em que Maçaranduba (Claudio Manoel) e Montanha (Bussunda) lutam com Iemanjá (Maria Paula).
Segundo Cláudio Manoel, um dos momentos mais marcantes do Seu Creysson foi quando eles decidiram lançar a candidatura do personagem para presidente. Eles fizeram um comício de verdade na Praça da República, em São Paulo, com a Maria Paula de apresentadora e ainda convidaram bandas para tocar e alguns artistas. O evento reuniu 15 mil pessoas.“Tinha uma coisa muito legal de manifestação, as pessoas levaram faixas, ‘O povo não tem dente, Seu Creysson presidente’. Foi minha experiência de ator mais maluca, que é essa coisa do cara incorporar o personagem. Quando saí do comício tinha imprensa para caramba e os caras só me entrevistavam como Seu Creysson”.
Cena com o personagem Seu Creysson (Cláudio Manoel), em 'Casseta & Planeta'
EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO:
Webdoc sobre a criação do personagem Seu Creysson, do programa “Casseta & Planeta, Urgente!”, com entrevistas exclusivas ao Memória Globo.
Webdoc sobre a criação do personagem Maçaranduba, do programa “Casseta & Planeta, Urgente!”, com entrevistas exclusivas ao Memória Globo.
Coberturas esportivas
Além das paródias de novela, outro ponto forte ao longo das duas décadas em que o programa esteve no ar foi a cobertura esportiva. “Os Jogos Olímpicos, pelas diversas modalidades, dá muita piada, você pode brincar com atletismo, natação, mas obviamente, no país do futebol, o futebol é o mais forte. Um diferencial acho que foram as Copas, principalmente, a primeira (1994), que a gente tinha uma relação muito próxima dos jogadores e éramos uma atração até pra imprensa”.
O programa faz graça com eventos ocorridos durante as Olimpíadas. Narração de Francisco Milani. 1996.
“A Marluce Dias uma vez perguntou para mim por que a gente durou tanto tempo e falei: ‘Porque a gente é muito masculino’. Acho que a gente, por ter o hábito do conflito, do futebol, da briga, do bate-boca, de querer impor a vontade, lidamos melhor com os conflitos, ele sempre existiram. A relação com o Zé Lavigne também foi muito importante. Ele foi o cara que formatou, nos organizou, formou equipe, trouxe parceiros que para nós foram muito importantes também, de direção de fotografia, figurino, caracterização” .
EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO:
Webdoc sobre o programa Casseta & Planeta Urgente! na cobertura da conquista brasileira do tetracampeonato na Copa dos EUA (1994), com entrevistas exclusivas dos humoristas Beto Silva, Helio De La Peña e Claudio Manoel ao Memória Globo.
Morte de Bussunda
A morte do Bussunda, em 2006, marcou os ‘cassetas’ e pessoalmente a vida de Cláudio Manoel. “Não só perdemos um integrante do grupo, como o band leader, o sujeito que era a cara do grupo. O programa era não só melhor com o Bussunda. A vida era melhor com ele. A gente tinha muita história juntos."
Em 2010, o grupo decide parar para voltar em 2012, com um novo formato, o 'Casseta & Planeta Vai Fundo'. Foram duas temporadas, uma de 12 episódios e outra de oito, e Cláudio Manoel assinou, além da redação final, a direção-geral do programa. “O grupo me escolheu para ser esse representante. Minha função era muito mais de uma coordenação das partes do que uma chefia. Para mim foi uma experiência pessoal muito importante, foi uma ferramenta bacana”, afirma Cláudio, que no cinema, além de atuar, também ajudou a roteirizar os filmes 'A Taça do Mundo é Nossa' (2003) e 'Seus Problemas Acabaram' (2006).
Mas a experiência do cinema não ficou só por aí. Em 2008, Cláudio Manoel dirigiu um documentário, 'Simonal – Ninguém sabe o duro que dei'. O filme recebeu importantes prêmios, como Melhor Documentário Brasileiro 2008 pelo júri oficial e popular no Festival de Paulínia, além do Hors Concurs na Premiere Brasil do Festival do Rio daquele ano. O projeto foi feito em parceria com Micael Langer e Calvito Leal.
“O Simonal foi uma vontade de experimentar fazer algo diferente, até fora do humor. Queria ter essa experiência de dirigir, de pesquisar. Quando o Micael e o Calvito propuseram juntarmos os projetos, acabei aceitando porque para mim nada ganha do coletivo. E no Simonal isso foi um processo muito importante. Eu não queria assinar o roteiro, estava contando a história dele através de 20 e poucas pessoas. Simonal pra mim foi uma pós-graduação, foi um MBA, foi a ideia de aprender um monte de coisa que eu não sabia”.
'O Que Vi Da Vida'
Outra experiência marcante na carreira de Cláudio foi o quadro do 'Fantástico' 'O Que Vi da Vida' (2011). “Foi uma ideia que surgiu durante a feitura do Simonal, a gente queria continuar essa experiência com os depoimentos que a gente fez, uma coisa mais introspectiva, mais confessional, que tivesse uma relação do depoente com a câmera e não com o entrevistador. Para mim foi também essa possibilidade de exercer outros formatos, de você linkar mais com o público”.
Em depoimento exclusivo ao Memória Globo, o redator e humorista Cláudio Manoel comenta o quadro “O Que Vi da Vida”, do Fantástico (2011), do qual foi um dos criadores.
De acordo com Cláudio, as entrevistas mais marcantes para ele foram a com Zeca Pagodinho, que foi a primeira, a da Susana Vieira, a do Chico Anysio e da Cissa Guimarães. “A outra foi a da Xuxa, que foi muito forte. Ela que pediu para participar porque achava que o quadro era digno, respeitoso, não era sensacionalista e ela estava numa campanha contra o abuso sexual”.
A experiência no 'Fantástico' rendeu a Cláudio Manoel um convite da direção da Globo para fazer parte da equipe de roteirista do programa da Fátima Bernardes, que estava deixando a bancada do 'Jornal Nacional', para apresentar um programa sozinha. “Foi muito legal porque foi exatamente 20 anos depois do 'Doris Para Maiores' que voltamos a trabalhar juntos eu, Guel (Arraes) e Geneton (Moraes Neto)”, orgulha-se Claudio.
“Tudo que eu fiz ao longo desses anos faria de novo, menos a cobertura do carnaval, que foi lá no início de tudo. Eu me sinto totalmente lisonjeado, um camarada de sorte. Sou satisfeitíssimo.”
FONTE:
Depoimento de Cláudio Manoel ao Memória Globo em 20/03/2013. |