Por Memória Globo

Zé Paulo Cardeal/Arte Memória Globo

César Tralli por pouco não optou pela vida artística. Fez teatro e teve três bandas de rock onde tocava bateria. Na hora de escolher a profissão, no entanto, seguiu o interesse pela escrita e optou pelo jornalismo. Como repórter, sua carreira foi de matérias sobre buracos de rua à experiência como correspondente em Londres. Reuniu parte das histórias, inclusive, no livro 'Olhar Crônico', publicado em 2001. Como repórter especial da Globo, ganhou o Prêmio Embratel de Jornalismo na categoria Televisão pelos casos de corrupção envolvendo o ex-prefeito Paulo Maluf; Prêmio Comunique-se como melhor repórter de vídeo do país; Grande Prêmio Rede Globo de Televisão por sua investigação nos casos Máfia dos motoristas, Acidente com avião da TAM e Prisão Law e, depois, o Troféu Barbosa Lima Sobrinho por uma série de reportagens exibidas no 'Jornal Nacional' sobre a adulteração de combustíveis. Em 2011, assumiu a bancada do 'SP1'. Dez anos depois, em 30 de outubro de 2021, passou a comandar, oficialmente, o 'Jornal Hoje', no lugar de Maju Coutinho.

Por mais que a gente tenha experiência, a adrenalina acompanha 100% do tempo. Todos os dias, quando entro no estúdio, sinto aquele friozinho na barriga. Mas aí prevalecem o amor e o prazer da ancoragem. E vem a segurança para matar um leão por dia.

César Tralli, no estúdio do 'Jornal Hoje', 2021 — Foto: Marcos Rosa/Globo

Início da carreira

César Tralli descende de uma família simples, de origem italiana. O pai trabalhava em uma empresa na área de informática e a mãe era professora primária. Estudou em escolas públicas e, aos sete anos, foi matriculado na Cultura Inglesa. O curso lhe rendeu uma bolsa de estudos em Londres. O interesse pela palavra escrita começou ainda na infância. Aos 12 anos, escrevia e enviava cartas para grandes jornais. Algumas chegaram a ser publicadas na seção de leitores. Formou-se em jornalismo pela Faculdade de Comunicação Cásper Líbero e fez mestrado em ciências sociais na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Para ajudar a família, começou a trabalhar cedo, dando aulas particulares de português, inglês e história. Seu primeiro emprego foi na Gazeta Esportiva, jornal de esportes do Grupo Folha. Na época, ainda não se imaginava em televisão. Em seguida, foi para a Rádio Jovem Pan e sobrevoava a cidade de helicóptero, dando dicas sobre o trânsito. Dali foi para o SBT, contratado para trabalhar no telejornal 'Aqui Agora' e, depois, para a Record, onde apresentava o programa 'Florida on Line', em 1992.

O começo na Globo foi em 1993, no programa 'São Paulo Já'. O jovem, que chegou a pegar seis ônibus por dia para trabalhar, alugou uma quitinete a três quarteirões da emissora. “Como morava perto, arrancaram o meu couro”, lembra. Ele participou da cobertura da morte de Ayrton Senna e da comoção que tomou conta do Brasil.

Vida de correspondente

Ao desembarcar em Londres, mal teve tempo de se instalar e partiu para a sua primeira cobertura: o assassinato do primeiro-ministro de Israel, Yitzhak Rabin. Depois, vieram viagens para Faixa de Gaza, Belém, Cisjordânia, Tel-Aviv, Jerusalém, entre outras. Em 1995, no meio de uma matéria, foi chamado para voltar à redação e, dali embarcou para o Rio de Janeiro, para uma reunião com a direção de Jornalismo. Recebeu a proposta de ir para Londres, aos 24 anos, substituir o jornalista Silio Boccanera. Inicialmente, deveria permanecer na capital inglesa durante dois anos, mas acabou ficando cinco.

Esteve cinco vezes no Líbano naquele período – em uma dessas viagens, fez uma reportagem para o 'Fantástico' sobre uma menina que chorava cristais. Meses depois, descoberta a farsa, ele retornou ao país para cobrir as consequências da notícia no local. Em 1996, Tralli e o repórter cinematográfico Sergio Gilz foram enviados para cobrir os ataques entre o grupo Hezbollah e Israel, quando conseguiu uma entrevista exclusiva com os extremistas. Ele gosta de dizer: “Eu não conheço o Canadá, mas já estive no Líbano cinco vezes. Lugar fascinante. A primeira vez que pousei lá, tive a sensação terrível de que eu já pertencia àquele lugar”.

No mesmo ano, fez a cobertura dos dez anos do acidente nuclear de Chernobyl. Se tudo o impressionou na ocasião, o que marcou o repórter foi o encontro com as Mães de Chernobyl, por acaso, na estrada, próximo à cidade de Prypiat: “Eram mulheres totalmente desamparadas pelo poder público. Seus maridos e filhos morreram ou estavam doentes por causa do acidente, e ninguém fazia nada por elas. Usando camisetas com as fotos dos filhos mortos, elas fretaram um ônibus e viajavam contando as histórias e pedindo ajuda”.

Em agosto de 1997, estava em Londres quando teve de partir de repente: embarcou para Paris, onde a princesa Diana havia sofrido um grave acidente, segundo as primeiras informações. Na semana seguinte voltou para os funerais da Lady Di na capital inglesa. As pautas do jornalista também incluíra a guerra de Kosovo, os conflitos no Timor Leste, guerras em países da África e no Iraque.

Uma das reportagens de que mais se orgulha de ter feito nasceu por acaso. Enquanto lia um jornal inglês, um anúncio chamou a atenção: procuram-se mulheres em Villamiel, um povoado no interior da Espanha. Para o 'Fantástico', ele e os cinegrafistas Paulo Pimentel e Sergio Gilz revelaram um vilarejo em que a população era predominantemente masculina. Os moradores se reuniram e realizaram uma festa para atrair futuras esposas. A reportagem fez tanto sucesso, que não faltaram candidatas brasileiras à procura de um namorado espanhol. A chuva de fax, segundo Tralli, assustou os solteiros.

Jornalismo investigativo

Ao completar cinco anos em Londres, em 2000, Tralli voltou ao Brasil para fazer o que sempre teve vontade: cobrir escândalos do poder público e denunciar crimes de colarinho branco.

Em seguida, fez a cobertura da prisão do juiz Nicolau dos Santos Neto, primeiro juiz cassado por corrupção e preso por desvio de obras no Tribunal Regional do Trabalho. Logo depois, veio outra cobertura especial: viajou para Nova York dois dias depois dos atentados de 11 de Setembro. “Era um voo da American Air Lines. Eu me lembro de que, dentro do avião, um Boeing desses gigantes da American, de passageiros, só havia o nosso cinegrafista, eu e um fotógrafo da Folha de S. Paulo. O avião estava absolutamente vazio”, ressalta.

Em janeiro de 2002, cobriu o sequestro e a morte do então prefeito Celso Daniel. Acompanhou, ainda, as investigações dos “aloprados” (assim chamados pelo então presidente Lula) do PT, pegos com malas de dinheiro em um hotel e que teriam tentado comprar um dossiê sobre o PSDB, em São Paulo. Em reportagem sobre a Cracolândia, mostrou que os policiais do Departamento de Narcótico, em vez de combater o crime, eram os que forneciam a droga.

O repórter acompanhou ainda o caso de Suzanne Von Richthofen que, junto com o namorado, matou os pais dela enquanto o casal dormia, em 2002. “O caso de Suzanne mostra até que ponto vai a maldade humana”, analisa. Como no caso Isabella Nardoni, assassinada aos 5 anos no dia 29 de março de 2008. “As pessoas se perguntam o tempo todo como é que um pai tem coragem de jogar uma filha pela janela?”. Dois anos depois, acompanhou o julgamento que condenou o pai da criança a 31 anos de prisão e a madrasta a 26.

Com a reportagem sobre a prisão do contrabandista chinês Law Kim Chong, Tralli ganhou o Prêmio Comunique-se, em 2002. “Ele era intocável. Atuava em toda a cadeia da pirataria, controlando desde a produção na China ao transporte e comércio no Brasil.” O repórter afirma que essa foi a cobertura mais difícil de sua carreira.

Em 2003, acompanhou a Operação Anaconda, da Polícia Federal, que investigava um esquema de venda de sentenças judiciais. O crime envolvia policiais federais, advogados e juízes. A operação resultou na prisão do juiz federal João Carlos da Rocha e no afastamento de outro juiz, Casem Mazloum. Em São Paulo, obteve seu primeiro e grande furo de reportagem com a matéria sobre a prisão do ex-governador Paulo Maluf, em 2006. A investigação durou seis anos e as informações exclusivas chegaram por meio de funcionários de empreiteiras, alijados do esquema de corrupção, resolveram colaborar e forneceram provas de desvio de verbas em grandes obras públicas.

Em seguida, cobriu os ataques de facções criminosas à cidade. Em 2007, com a equipe da Globo, denunciou a máfia que agia adulterando gasolina em postos de São Paulo. A reportagem recebeu o Troféu Barbosa Lima Sobrinho. Um ano depois, em julho de 2008, veio a cobertura da Operação Satiagraha que levou para a prisão banqueiros e investidores acusados pela Polícia Federal de lavagem de dinheiro, corrupção e desvio de verbas públicas.

Em 17 de outubro de 2008, a estudante, Eloá Cristina Pimentel, de 15 anos, foi morta pelo ex-namorado, Lindemberg Alves Fernandes, após ser mantida refém por 100 horas. O rapaz se dizia inconformado com o fim do relacionamento. As reportagens de Tralli sobre o caso Eloá para o 'Jornal Nacional' derrubaram a tese da polícia que dizia ter havido um disparo antes da invasão policial no apartamento onde a jovem e a amiga, Nayara, foram mantidas em cárcere privado. A cobertura do 'Jornal Nacional' foi finalista do Prêmio Emmy de 2009.

Em 2011, César Tralli fez a série 'Fronteiras Brasileiras'. Ele visitou as fronteiras do Brasil com o Paraguai, o Uruguai, a Argentina e a Bolívia, na região amazônica. As reportagens mostraram o atalho que contrabandistas e sacoleiros usavam para escapar da fiscalização, transportando cigarros, agrotóxicos, remédios falsificados, armas e drogas. Revelaram também os traficantes usando lanchas voadeiras, aviões pequenos, crianças indígenas e adultos como “mulas” e o controle da prostituição infantil. Em meio a tanta corrupção, um suspiro de alívio: voluntários indígenas passaram a patrulhar as terras na divisa do Brasil com a Bolívia para evitar a entrada do tráfico. A série rendeu a César Tralli e aos jornalistas Pedro Mantoan e Fernando Ferro, o Prêmio Embratel 2011 na categoria Jornalismo Investigativo.

______________________________
Copas do mundo

O repórter investigativo fez também matérias esportivas em Copas do Mundo, Olimpíadas e nos Jogos Pan-Americanos. Em 1994, cobriu a Copa do Mundo nos EUA. Depois, fez parte da equipe enviada para cobrir a Copa da França (1998), a da Coreia e do Japão (2002), a da Alemanha (2006) e a da África do Sul (2010). Esteve também nos Jogos Olímpicos de Atenas (2004), de Pequim (2008) e de Londres (2012).

______________________________

'SP1'

Em 26 de setembro de 2011, César Tralli assumiu a apresentação do 'SP1', que ancorava esporadicamente. Apresentado na hora do almoço, o telejornal ganhou mais ritmo. O âncora deixou de usar a bancada e passou a interagir com repórteres no telão para conferir dinamismo ao telejornal. À frente do 'SP1', César Tralli cobra autoridades, faz entrevistas ao vivo e nunca deixa de ser o que sempre foi sua natureza: repórter. Telefona para fontes, apura informações exclusivas, tira dúvidas, antecipa notícias e assim participa ativamente do telejornal. Em anos de eleições, faz reportagens especiais e sabatina ao vivo no estúdio os candidatos mais bem colocados nas pesquisas. Seja para prefeito da capital paulista ou para governador do Estado.

César Tralli na bancada do 'SP1 Edição', 2011. — Foto: Zé Paulo Cardeal/Globo

Uma das coberturas mais marcantes dessa nova fase, para ele, foi a apresentação do 'SP1' – ao vivo – direto do Japão, por quase uma semana, quando o Corinthians esteve lá disputando o Mundial de Clubes, em 2012. Tralli fez várias reportagens mostrando a torcida corintiana, revelou hábitos, costumes e o jeito de viver da população oriental. Seja na rua ou no estúdio, o jornalista procura valorizar os colegas e o trabalho de equipe. Costuma dizer “nós aqui do 'SP1' ”, “nossos repórteres”, “nossa produção”. E cada dia mais também o público interage ao vivo no telejornal e sugere pautas sobre os assuntos que mexem com o dia a dia da população.

No dia 30 de outubro de 2021, César Tralli assumiu, oficialmente, a ancoragem do 'Jornal Hoje', no lugar de Maju Coutinho, que passou a apresentar o 'Fantástico' ao lado de Poliana Abritta.

Eu amo muito o que eu faço.

Fonte

Mais do memoriaglobo
Próxima temporada estreia dia 13/01

Reality show exibido desde 2002, a partir de um formato criado pela produtora holandesa Endemol. Durante três meses, participantes são confinados em uma casa e postos à prova. Cada temporada do programa é exibida diariamente durante cerca de dois meses.

Qual seu preferido? Relembre os 24 vencedores do 'Big Brother Brasil' - Foto: (João Cotta/Globo)
Projeto Resgate

Fernanda Montenegro interpreta a filha de Santos Dumont em trama de Lauro César Muniz

'Zazá' estreia no Globoplay - Foto: (Arley Alves/Globo)
Projeto Fragmentos do Globoplay

Escrita especialmente para Regina Duarte, a novela se baseava na comédia romântica Sabrina Fair, de Samuel Taylor.

Reveja alguns capítulos de 'Carinhoso', com Regina Duarte e Cláudio Marzo - Foto: (Acervo/Globo)
Projeto Originalidade

Beatriz (Gloria Pires), Inês (Adriana Esteves) e Regina (Camila Pitanga) são mulheres diferentes que têm suas vidas ligadas ao lidarem com a ambição e o poder.

'Babilônia' está na íntegra no Globoplay - Foto: (Memória Globo)
Televisão brasileira de luto

O ator e diretor Ney Latorraca nasceu em Santos, São Paulo, em 25 de julho de 1944. Estreou na Globo em 1975 na novela Escalada. Se destacou em novelas e programas  humorísticos. Morreu em dezembro de 2024, aos 80 anos.

O adeus a Ney Latorraca: ator morre aos 80 anos  - Foto: (Eduardo França/Globo)
Canções que marcaram gerações

Programa especial de fim de ano de Roberto Carlos.

Os 50 anos do Roberto Carlos Especial  - Foto: (Acervo/Globo)
Projeto Resgate

Malhação reestreou em maio de 2001 com uma trama mais dramática que o habitual e investindo mais nas campanhas de responsabilidade social.

'Malhação Múltipla Escolha 2001' estreia no Globoplay  - Foto: (Memoria Globo)