Por Memória Globo

Memória Globo

Preparação, jogo de cintura e tranquilidade são as características que fazem do jornalista um bom apresentador, na opinião de Carla Vilhena – além de carisma, claro. A jornalista carioca tem anos de prática na bancada dos principais programas jornalísticos da Globo. A começar pelo 'Fantástico', nos anos 1990, passando pelos telejornais locais de São Paulo e o 'Jornal Nacional' – substituindo os apresentadores titulares, sempre que necessário. Ela, aliás, foi uma das primeiras mulheres a ancorar o 'JN' e revela que “não dá para esquecer aquela música tocando e você entrando no ar”. Sempre bate uma pontinha de nervosismo. Em entrevista ao Memória Globo, Carla Vilhena lembra que isso é bom, só não pode deixar subir à cabeça. Nessas horas, ela ativa o que chama de “gerenciador de crise”, uma espécie de piloto automático mental que a mantém calma em situações tensas. Em outras palavras, autocontrole. Naquela noite de 1999, ela conta que até rezou para dar tudo certo, “mas nunca tive o pensamento, olhando para a câmera, que tinham milhões de pessoas me olhando, então isso facilitou muito”, revela.

O bom apresentador tem que ser muito bem informado e ter todo o telejornal na cabeça, além de ideias que possam acrescentar em determinados momentos. Ao fazer um jornal ao vivo, tudo pode acontecer.

Carla Vilhena — Foto: Acervo/Globo

Início da carreira

Filha de Mário Vilhena Filho, publicitário, e Eunice Marques Vilhena, fonoaudióloga, Carla Marques Vilhena nasceu no Rio de Janeiro, em 11 de junho de 1967. Quando terminou o colégio, em 1984, conseguiu uma vaga de estágio na Globo – ela era muito jovem, tinha 17 anos. E foi nos bastidores do 'RJTV' e do 'Jornal Hoje' que apreendeu a editar as imagens das reportagens que chegavam da rua. Nessa época, teve como professores jornalistas em quem se inspirou para seguir a profissão, como Leila Cordeiro, Leda Nagle, Cristina Franco.

Em 1987, Carla Vilhena foi para a TV Manchete, enquanto concluía a faculdade de jornalismo na Facha. Ali, teve sua primeira experiência diante das câmeras e passou a entender como se usava o teleprompter, já que a faculdade não dispunha deste tipo de equipamento. Após uma breve passagem pela Manchete, Carla decidiu tentar a sorte como apresentadora de telejornal na TV Bandeirantes, onde permaneceu por cinco anos. Segundo ela, que nesta época morava em São Paulo, a vontade de trabalhar na Globo era grande, mas sentia que precisava de mais experiência para conseguir uma vaga como apresentadora.

Início na Globo

Em 1997, a oportunidade apareceu e a jornalista aceitou um convite para ser repórter do 'São Paulo Já' (atual SPTV – 1ª Edição), também atuando como apresentadora do 'Fantástico', ao lado de Zeca Camargo, Pedro Bial e Glória Maria. Em 1998, quando a revista eletrônica dominical passou por uma reformulação, a jornalista voltou para a reportagem.

Com Lillian Witte Fibe, preparou material especial para o 'Brasil 500 anos'. A repórter viajou Brasil e Portugal para realizar matérias para os telejornais da rede. “Nessa comemoração, havia três tochas que representavam as principais populações que compõem o Brasil: tinha a tocha dos negros, que foi em Goiás, a dos índios, no Piauí, e a tocha dos portugueses, em Lisboa”. As tochas do conhecimento foram uma iniciativa do governo federal para simbolizar a união dos povos no Brasil. Em cerimônias simbólicas, elas foram entregues ao Presidente da República por representantes destes povos", recorda.

Carla Vilhena também participou de importantes coberturas, como o caso da Máfia dos Fiscais, um escândalo que revelou o esquema de corrupção entre os fiscais do prefeito de São Paulo, Celso Pitta, entre 1997 e 2001. “As pessoas querem saber o que está sendo feito do dinheiro delas, os telejornais tem que mostrar, fazer denúncia e reportagem”, analisa.

Reportagem de Carla Vilhena sobre a inauguração da nova sede da Rede Globo em São Paulo, com a presença do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Jornal Nacional, 29/01/1999.

Reportagem de Carla Vilhena sobre a inauguração da nova sede da Rede Globo em São Paulo, com a presença do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Jornal Nacional, 29/01/1999.

"Boa tarde" para todo o Brasil

Carla Vilhena sempre gostou de gramática, desde os tempos da escola. E sua paixão pela língua abriu caminho para que ela se tornasse apresentadora do 'Jornal Hoje'. Uma história muito curiosa, como ela mesma lembra. Em 2001, Evandro Carlos de Andrade, então diretor de jornalismo e esporte da Globo e aficionado pelo uso correto da língua no jornalismo, pediu que todos os repórteres realizassem uma prova de português. Quando saiu o resultado, Carla Vilhena recebeu a notícia que tinha ficado em primeiro lugar. “Quando o Evandro viu a minha nota, foi a São Paulo e conversamos sobre português. Ele descobriu um assunto que podia tratar comigo, que era a paixão pela língua”, recorda. Logo depois, ela trocou a reportagem pela bancada do 'Jornal Hoje', uma espécie de prêmio que se revelou um novo desafio.

Carlos Nascimento e Carla Vilhena na bancada do Jornal Hoje — Foto: Acervo/Globo

Carla tinha uma relação afetiva com o telejornal, afinal, foi nos bastidores do 'Hoje' em que tudo começou. O formato descontraído, voltado para a família na hora do almoço, permitia que os apresentadores improvisassem ao vivo, comentando as reportagens. Foram dois anos na bancada do 'JH'. A serenidade a ajudou tanto a chamar assuntos mais leves, como matérias de comportamento, quanto a anunciar os fatos relevantes que ocorreram no Brasil e no mundo. O trabalho cauteloso podia ocorrer tanto diante quanto por trás das câmeras.

Os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, exigiram um trabalho pesado nos bastidores. Neste dia, o 'Jornal Hoje' fez um plantão que cobriu a manhã e se estendeu durante a tarde daquela terça feira. Carlos Nascimento e Ana Paula Padrão seguraram a transmissão, enquanto Carla Vilhena ajudava a atualizar as informações na redação e traduzir notícias dos jornais internacionais.

Estreia do novo cenário e de Carla Vilhena na bancada do Jornal Hoje, 16/07/2001.

Estreia do novo cenário e de Carla Vilhena na bancada do Jornal Hoje, 16/07/2001.

“ZELADOR DA CIDADE”

Em janeiro de 2003, Carla Vilhena foi convidada para assumir a bancada do 'SPTV – 1ª Edição', ao lado de seu marido na época, o jornalista Chico Pinheiro. Para Vilhena, a principal característica deste noticiário é a agilidade – por ir ao ar na faixa do meio dia, ele é construído no decorrer dos acontecimentos, o que dá margem para momentos de improviso. Naquela época, o telejornal já tinha no jornalismo comunitário uma ferramenta importante para se aproximar da população. O modelo começou a ser implantado no 'SPTV' em 1999, denunciando os problemas dos bairros. Para Carla Vilhena, os sete anos em que passou no noticiário foram os em que mais sentiu “o carinho do povo. Porque o 'SPTV' é como se fosse um zelador da cidade, as pessoas podem contar com ele para todos os problemas. E a gente cobrava das autoridades”, comenta.

A cobrança do poder público se aplica tanto a matérias do cotidiano, que pedem providências para tapar buracos de rua, melhorias em serviços básicos em áreas da periferia, quanto a grandes acontecimentos, como a cratera no metrô de São Paulo. Neste último caso, o 'SPTV' ficou no encalço das autoridades para que os culpados pela tragédia, que deixou sete pessoas mortas na altura da estação Pinheiros, em janeiro de 2007, pagassem pelo descaso. “Muita coisa aconteceu na hora no horário do 'SPTV', mostramos com muita intensidade, ao longo de várias semanas. No entorno da cratera, todas as casas ficaram interditadas e as pessoas tiveram que lutar para receber alguma indenização”, relembra.

Varla Vilhena — Foto: Acervo/Globo

Para a jornalista, um dos momentos mais marcantes como apresentadora foi a cobertura especial dos 450 anos de São Paulo. A campanha começou em abril e terminou em julho de 2003 no aniversário da cidade. O 'SPTV' foi ancorado fora do estúdio: Chico Pinheiro apresentou o programa do Terraço Itália, um dos edifícios mais altos da cidade, enquanto Vilhena se posicionou no Páteo do Colégio, construção jesuítica que é o marco fundador da cidade.

Três anos depois, a redação de São Paulo se mobilizou para cobrir os atentados de facções criminosas em vários pontos da cidade. Em agosto de 2006, o sequestro do repórter da Globo Guilherme Portanova deixou todos em estado de alerta. “Foi um momento de terror, nunca vi uma situação que afetou tanto a cidade como esta”, lembra. Os ataques durante a madrugada e o crescimento da violência urbana motivaram mudanças com relação à segurança dos jornalistas. Carla Vilhena lembra que a equipe que fazia plantão à noite, preparando reportagens para os telejornais do dia seguinte, passou a usar carros blindados. Fora todo o treinamento de segurança que já vinha sendo desenvolvido nas praças da Globo, desde 2002, em função do assassinato do jornalista Tim Lopes por traficantes de drogas no Rio de Janeiro.

Para Carla, não existe uma fórmula para noticiar tragédia e violência, o bom senso é o que prevalece. Foi o que ocorreu com a cobertura do caso Isabella Nardoni, em 2008. “A gente vai atrás do que as pessoas querem ouvir, mas temos que evitar o sensacionalismo”, comenta.

Em 2009, o premiado projeto 'Os Rios de São Paulo' (2009) se tornou uma das iniciativas de que Carla Vilhena mais se orgulha de ter participado. Com a série de reportagens, o 'SPTV' levou para a rua – ou melhor, para o rio (no caso, o Tietê) – uma tecnologia chamada flutuador, desenvolvida pelo departamento de Engenharia da Globo em parceria com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado, que era capaz de medir a qualidade da água. O flutuador fez o percurso de 500 km, passando por 30 cidades naquele ano. O trajeto foi uma fonte rica de reportagens de Carlos Tramontina, que conseguiu mapear o despejo de poluentes no rio mais importante do estado. “A gente descobriu coisas incríveis, chamamos prefeitos de toda a região metropolitana para falar da poluição no rio, quando o flutuador passava pela cidade dele e cobrávamos os motivos de não se tratar o esgoto. Víamos onde a poluição era produzida. Foi muito inovador”, orgulha-se.

Eleições e jogo de cintura

Um dos maiores desafios na vida profissional de um apresentador de telejornal, segundo Carla Vilhena, é entrevistar candidatos ao governo e prefeitura da cidade, na bancada, antes das eleições. No tempo em que esteve no 'SPTV', ela participou da preparação intensa antes das entrevistas. Para ela, a união e o trabalho nos bastidores antes dessas conversas são fundamentais para que o resultado final seja bom. “Tem coisas que são pensadas e outras que ocorrem no calor do momento. É aí que entra a experiência e o jogo de cintura. O apresentador também precisa ter criatividade e a tranquilidade para contornar situações complicadas, porque você não é a estrela ali, a estrela é o entrevistado”, analisa.

Não apenas em época eleitoral, mas a atenção e a preparação são importantes em qualquer momento. Carla Vilhena revela que sempre que precisou entrar ao vivo, tinha o texto na ponta da língua e, além disso, uma visão geral do telejornal. “Eu posso até estar cansada, mas tenho que estar preparada. Em tantos anos, é incontável o número de vezes que acontece alguma coisa e que meu gerenciador de crise mental atua e consigo manter a calma e falar sobre aquele assunto, explicar para o telespectador o que está acontecendo”, revela.

'Bom Dia São Paulo'

Em 2010, Ali Kamel, então diretor da Central Globo de Jornalismo, convidou Carla Vilhena para apresentar o 'Bom Dia São Paulo'. A jornalista conta que já vinha se preparando havia um tempo, no caso dessa possibilidade surgir. “Foi uma experiência excelente, porque o 'Bom Dia' é o principal jornal do estado e as pessoas, principalmente as do interior, tem muito carinho. Todo mundo me considerava como uma pessoa da família, entrando em suas vidas de manhãzinha. Foi a primeira vez que apresentei o telejornal sozinha”, comenta. Ela enaltece o papel do apresentador neste programa, que é baseado em conversas e comentários sobre os assuntos da noite anterior e o factual no momento em que o trabalhador se prepara para iniciar sua jornada. Em sua opinião, o estúdio de vidro surge como uma cereja do bolo para o formato, já que permite que o telespectador acompanhe o amanhecer pela vista panorâmica.

Repórter especial

Em 2013, Carla Vilhena deixou o 'Bom Dia São Paulo' e aceitou uma nova experiência na profissão. Tornou-se repórter do 'Fantástico'. Ela avalia a experiência como enriquecedora, afinal, a “dinâmica da reportagem faz com que o repórter esteja constantemente em contato com a fonte – a cada dia temos uma aula sobre os assuntos”, analisa. Nesta nova fase, passou a ter uma vida itinerante, viajando para onde surge a notícia. Em setembro de 2014, entrevistou o cantor Julio Iglesias, na casa dele, na Espanha. A conversa foi ao ar no 'Fantástico', pouco antes da última turnê de shows do cantor no Brasil. “Ele aproveitou para mostrar um pouco a família e o estilo de vida dele. Foi muito divertido, a gente saiu no carrinho de golfe e o cinegrafista olhou, saiu correndo no carrinho atrás, fazendo imagem, porque a gente não combinou, foi um convite do Julio”, revela. Outro momento que ela considera emocionante foi a entrevista que realizou com o ex-jogador de basquete, Oscar Schmidt, em junho de 2013, logo após o esportista declarar que estava com um tumor no cérebro. “Tentamos mostrar que ele continua essa pessoa positiva, para cima, otimista. Mas também mostrou um pouco do que ele tem de fragilidade”, analisa. No 'Fantástico', em agosto de 2014, fez ainda uma reportagem sobre a superlotação de hospitais de São Paulo, denunciando que algumas instituições retinham macas e deixavam ambulâncias do SAMU paradas, sem prestar socorro. Em 2015, além do 'Fantástico', Carla Vilhena também colaborou com reportagens para os jornalísticos 'Hora Um' e 'Bem Estar'.

A jornalista Carla Vilhena deixou a Globo em janeiro de 2018.

Carla Vilhena — Foto: Acervo/Globo

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