Por Memória Globo

Bob Paulino/Memória Globo

Américo Magno de Souza Figueirôa  é  filho do farmacêutico Antonio de Souza Lima e da dona de casa Adoracion Figueirôa Souza. Formado no exterior, começou a trabalhar em TV nos Estados Unidos, mas voltou ao Brasil no início da década de 1980 e desenvolveu toda a sua carreira na Globo.Na emissora, esteve ao lado de repórteres na cobertura de acontecimentos marcantes, como os últimos dias de Tancredo Neves, o massacre do Carandiru, o enterro de Ayrton Senna e o pós-guerra no Iraque e em Angola. Em mais de três décadas de atuação, soube usufruir do desenvolvimento tecnológico na captação e transmissão de imagens para oferecer ao telespectador informação confiável, com apuro visual e estético.

Tem gente que não gosta muito do novo, mas estou sempre aberto para o novo e tentando entender para onde se vai.

Início da carreira

Américo Figueirôa saiu do Brasil aos 21 anos, em 1976, e decidiu estudar cinema e teatro nos Estados Unidos. Mas chegando lá optou por se formar em Produção de Cinema e TV, com ênfase em telejornalismo, pois o curso da Brigham University, de Utah, oferecia mais possibilidades de inserção no mercado de trabalho. “Comecei a trabalhar nos Estados Unidos no canal de televisão da universidade. Tinha uma boa estrutura, então eu fazia edição, captação, nunca apresentação, porque não tinha talento para isso e nem coragem de ficar na frente das câmeras. Também fazia cinema e acabei trabalhando no 1º Festival de Cinema de Sundance”, conta.

Depois dessa experiência, Américo Figueirôa foi contratado pela KUTV, afiliada da ABC em Salt Lake City, onde atuava como operador de câmeras de estúdio. A volta ao Brasil aconteceu em 1983, em função de uma doença de sua mãe. Sem emprego no país, contou com a iniciativa de uma de suas irmãs, que pediu a Hermano Henning, nascido também no interior paulista, uma chance para o irmão na Globo.

Indicado pelo repórter para uma entrevista, ainda em 1983, Américo Figueirôa conseguiu primeiro uma vaga cobrindo férias, em São Paulo, e depois foi efetivado como repórter- cinematográfico. “O equipamento lá fora estava mais evoluído; os nossos eram mais precários. A gente usava uma luz mais chapada, duas lâmpadas brancas e duas azuis, no ambiente externo usávamos as duas azuis, no interno, as brancas, e a iluminação nunca vinha com eixo de 45º, era sempre muito chapada, então era mais difícil e precisávamos de muita luz também, na época. Nos Estados Unidos a gente trabalhava com pontos de iluminação, câmeras mais práticas”, compara. Quando iniciou sua trajetória na Globo, a película estava sendo substituída pelo VT, algo novo e desafiador para os profissionais da época, pela mudança de textura.

Coberturas marcantes

Em 1984, seu segundo ano na Globo, o repórter-cinematográfico cobriu o incêndio da Vila Socó. Escalado inicialmente para uma matéria leve, um show de Ângela Maria e Cauby Peixoto que acabou não ocorrendo, recebeu um aviso do chefe de reportagem que deveria se deslocar para Cubatão, onde o incêndio acontecia. “Quando o dia amanhece é que você vê a tragédia toda, famílias inteiras abraçadas, corpos carbonizados. Foi um pouco assustador”, avalia.

Américo Figueirôa participou também da cobertura da doença de Tancredo Neves, em 1985. Ao lado da repórter Neide Duarte, passou mais de 20 dias na porta do Hospital das Clínicas, em São Paulo, em busca de imagens e notícias. O repórter-cinematográfico esteve ainda de plantão no Instituto Médico-Legal, durante o massacre do Carandiru, em 1992, e em 1994 acompanhou o cortejo de despedida a Ayrton Senna, que parou São Paulo. De folga em Angra dos Reis, recebeu um telefonema do seu supervisor, Luis Manse e interrompeu o descanso. De helicóptero, mostrou a multidão que tomou as ruas da cidade à procura de espaço para ver o corpo do piloto passar, em um carro dos bombeiros.

Reportagem de Neide Duarte sobre as orações para o presidente eleito Tancredo Neves na porta do Incor, Jornal Nacional, 18/04/1985.

Reportagem de Neide Duarte sobre as orações para o presidente eleito Tancredo Neves na porta do Incor, Jornal Nacional, 18/04/1985.

Em Londres

Avisado por um colega cinegrafista de que havia uma oportunidade para trabalhar no escritório da Globo em Londres, Américo Figueirôa se candidatou à vaga. Fez uma prova de conhecimentos gerais e de inglês, passou e viajou para a cidade em 1998. No curto período em Londres, encerrado em 1999, encontrou dois outros repórteres cinematográficos – Sergio Gilz e Paulo Pimentel – e cobriu acontecimentos como a busca por refugiados da Guerra do Kosovo que haviam desaparecido na Macedônia, ao lado da repórter Ana Paula Padrão.

“A Globo deu em primeira mão a notícia, foi a primeira equipe de TV a chegar no lugar e mostrar onde eles estavam, porque me lembro que na época a imprensa europeia não sabia. Teve um momento, uma sonora com um menino que não sabia onde estavam os pais, estava ali perdido, não falava inglês. Acho que foi talvez a cena que mais me comoveu: o silêncio e a tristeza no rosto dessa criança”, afirma.

Zonas de conflito

Em 2003, de volta a seu trabalho habitual no Brasil, Américo Figueirôa viajou com Marco Uchôa até Angola, com o objetivo de gravar uma série de reportagens, exibidas no Jornal da Globo, em função do aniversário de um ano do pós-guerra, naquele país. Apesar do conflito e da miséria, encontrou um povo disposto a celebrar. E foi com William Waack, no mesmo ano, ao Iraque, apresentar aos brasileiros como estava o país após a queda de Saddam Hussein. A série de reportagens chamou-se Guerra no Pós-Guerra. “Nossa comunicação com o Brasil era um telefone de satélite. A experiência numa área de conflito tem importância muito grande, porque às vezes, sem experiência ou muito jovem, você é mais afoito, se arrisca demais. E às vezes se arriscar não é boa coisa num momento desse”, ensina.

Jornal da Globo: Série "Tempos de paz em Angola" (2003)

Jornal da Globo: Série "Tempos de paz em Angola" (2003)

Cultura e meio-ambiente

Para o 'Fantástico', em 2009, Américo Figueirôa faz uma viagem marcante com o repórter Maurício Kubrusly para a série “Me leva, Índia”. “Era época da novela 'Caminho das Índias', então era uma coisa para falar da novela, mas também para mostrar a cultura, os locais, a alimentação. Fiquei surpreso com a miséria e a sujeira ao lado da beleza, essa mistura toda e o convívio até com a falta de higiene. Isso me assustou um pouco, mas as pessoas vivem muito bem”, acredita. Com Kubrusly, fazendo imagens para a mesma série, esteve ainda na Polônia e na Itália.

Na Alemanha, em 2013, o cinegrafista trabalhou com o repórter André Trigueiro, gravando uma sequência de matérias sobre sustentabilidade, a partir da decisão do país de substituir as usinas nucleares. Os dois rodaram 2600km por diversas cidades alemãs e mostraram o potencial da energia eólica e solar, lembrando em suas reportagens que a Alemanha tem menos sol e ventos que o Brasil. Sobre meio ambiente, no mesmo ano, Américo foi com a jornalista Neide Duarte ao sertão pernambucano, onde famílias viviam com uma quantidade mínima de água.

A família de dona Delmindi de Lima sobrevive, no sertão de Pernambuco, com 22 litros de água, menos da metade que a maioria usa para tomar banho. Segundo a ONU, cada pessoas precisa de 110 litros de água por dia, para consumo e higiene.

A família de dona Delmindi de Lima sobrevive, no sertão de Pernambuco, com 22 litros de água, menos da metade que a maioria usa para tomar banho. Segundo a ONU, cada pessoas precisa de 110 litros de água por dia, para consumo e higiene.

Reportagens polêmicas

Mais uma vez para o 'Fantástico', em 2006, participou de uma reportagem que gerou polêmica: uma entrevista com Suzane Richthofen (condenada por encomendar a morte dos pais). Esperando para gravar com a repórter Fabiana Godoy, que negociou por muito tempo a entrevista, a equipe conseguiu obter o áudio do momento em que o advogado orientava Suzane para que ela chorasse e encerrasse a entrevista em seguida. E deu destaque à encenação.

Com Tiago Eltz, em 2016, cobriu o acidente com o avião da Chapecoense. Na Bolívia, aguardando o término de uma reunião com autoridades brasileiras à qual a imprensa não tinha acesso, gravou por um buraco na janela um quadro com todos os detalhes do encontro, com exclusividade. Nas reportagens feitas por Tiago Eltz, ficou provado que o avião não tinha combustível suficiente para enfrentar qualquer imprevisto.

Impacto das novas tecnologias

O uso de câmeras GoPro, drones e do celular como instrumentos de captação de imagem é visto, por Américo Figueirôa, como um dado positivo e impactante. “A tecnologia está aí e a gente vai ter que se adaptar. O celular ajuda? Ah, a qualidade é inferior, mas ele ajuda quando você tem uma informação que não pode perder. Não vai substituir uma câmera profissional, mas tem sua importância. Em relação aos drones, acho que há certo exagero, às vezes usam demais, mas valorizam muito a matéria, eu não consigo pensar em matérias do 'Globo Rural', hoje, sem o drone”, diz.

Américo Figueirôa, 2017 — Foto: Bob Paulino/Memória Globo

Escada como marca

Uma característica do trabalho de Américo Figueirôa é a escada de alumínio que ele carrega ao sair para fazer as matérias. O hábito se iniciou durante a cobertura do caso Mengele (médico nazista escondido no Brasil), em 1985, quando o cinegrafista viu os correspondentes internacionais brigarem por espaço, fisicamente, em frente à sede da Polícia Federal, em São Paulo. Desde então, a escadinha é uma aliada para a obtenção das melhores imagens.

Sou da opinião que um pouco mais alto eu tenho uma visão geral, consigo fazer tudo, se eu estou no meio eu não faço nada.

FONTE:

Depoimento ao Memória Globo em 23/11/2017.
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