Por Memória Globo

Frame de vídeo / Globo

O epicentro do terremoto foi no mar, a 35 quilômetros de profundidade e a 120 quilômetros de Concepción, a cidade mais atingida. A região central do país ficou parcialmente isolada, sem água, energia e comunicação. O aeroporto de Santiago ficou fechado e as estradas foram bloqueadas. Com dois milhões de chilenos atingidos pela tragédia, a presidente Michelle Bachelet declarou estado de catástrofe.

Ondas gigantes varreram cidades costeiras, minutos depois do abalo sísmico. O risco de tsunami colocou em alerta diversos pontos da costa do Pacífico, do Havaí à Nova Zelândia. Os tremores também foram sentidos na Argentina e no Brasil.

Localizado próximo a uma zona de convergência entre duas placas tectônicas, o Chile é um dos países mais suscetíveis a terremotos. O pior deles aconteceu em maio de 1960. Um tremor de 9,5 graus, o maior registrado no mundo, matou 5.700 pessoas e provocou ondas que chegaram até o Japão e o Havaí.

As imagens da destruição no Chile lembraram o terremoto que aconteceu no Haiti, em janeiro de 2010, e deixou 200 mil mortos.

Reportagem de Marcos Uchoa e Antônio Gil sobre a situação nas cidades de Talco e Concepción após o terremoto que causou destruição no Chile. Jornal Nacional, 03/03/2010.

Reportagem de Marcos Uchoa e Antônio Gil sobre a situação nas cidades de Talco e Concepción após o terremoto que causou destruição no Chile. Jornal Nacional, 03/03/2010.

EQUIPE E ESTRUTURA

A Globo cobriu o terremoto no Chile e suas consequencias, com correspondentes no local da tragédia e reportagens exclusivas em seus principais telejornais. A repercussão no Brasil, onde tremores também foram sentidos, e em outros países, como EUA e Japão, também foi destaque no noticiário.

Direção contrária

Carlos de Lannoy e Emiliano Fabris, correspondentes em Buenos Aires, estavam a caminho das Ilhas Malvinas para uma reportagem. Em vez de passarem a noite em Santiago, onde fizeram escala poucas horas antes do terremoto, optaram por seguir para Punta Arenas, de onde partiria, no dia seguinte, o voo para o destino final.

“Então, sem saber, a gente fez a opção de fugir do terremoto. Escapamos, mas perdemos a chance de estar no local, no epicentro quase, do terremoto.” Carlos de Lannoy sobre a cobertura do terremoto no Chile

“Aquele lugar no aeroporto de Santiago, onde passamos duas ou três horas antes de pegar o voo, às 23h30, ficou destruído. Chegamos a Punta Arenas às 3h30 da manhã, no horário do terremoto. A cidade fica numa região isolada no Chile. Então, sem saber, a gente fez a opção de fugir do terremoto. Escapamos, mas perdemos a chance de estar no local, no epicentro quase, do terremoto”, conta Lannoy em seu depoimento ao Memória Globo.

Carlos de Lannoy e Emiliano Fabris cobriram de Punta Arenas as consequencias do terremoto. Entrevistaram chilenos e acompanharam a angústia de pessoas que tinham família em Santiago e em outros lugares atingidos pelo abalo. Os dois só conseguiram voltar para a capital no dia 5 de março.

Rota alternativa

O correspondente Marcos Uchoa e o repórter cinematográfico Antonio Gil estavam prestes a embarcar para Santiago para acompanhar o amistoso de futebol entre o Chile e a Coréia do Norte, quando aconteceu o terremoto. Com os aeroportos do país fechados, os dois só conseguiram chegar a Santiago viajando de carro pela Argentina.

Marcos Uchoa, em seu depoimento ao Memória Globo, conta como foi: “Eu dei a ideia de voarmos até Mendoza, na Argentina, e atravessarmos de carro a Cordilheira dos Andes. O que fizemos, muita gente também queria fazer, pessoas que tinham parentes no Chile e outras equipes de televisão. Mas eu fiz com Antonio Gil o que havia feito com Sergio Gilz na cobertura do tsunami na Ásia: enquanto ele pegava as coisas, eu tentava alugar um carro. E foi a sorte. Havia quatro locadoras no aeroportinho de Mendoza, e eu aluguei o último carro que havia na quarta locadora.”

Uma das dificuldades que a equipe encontrou para trabalhar foi a falta de energia e comunicação. Só era possível gerar material para o Brasil de Santiago, o que os obrigava a retornar sempre à cidade. “O Chile é muito comprido, e existe uma estrada que corta o país. Essa estrada estava toda destruída. Eu dirigia horas e horas, havia engarrafamentos e desvios grandes. E como no Sul não havia nem eletricidade, nem água, e nem telefone, Antonio Gil e eu não podíamos trabalhar de lá: precisávamos ir e voltar todos os dias, o que era insuportável. Chegávamos muito tarde e cansadíssimos, e ainda precisávamos gerar o material para o Brasil. Foi muito difícil”, lembra Uchoa.

Catástrofe

Entrevista, feita pela internet, com um brasileiro que sobreviveu ao terremoto que causou destruição no ChileTerremoto, Jornal Hoje, 27/02/2010.

Entrevista, feita pela internet, com um brasileiro que sobreviveu ao terremoto que causou destruição no ChileTerremoto, Jornal Hoje, 27/02/2010.

As primeiras informações sobre o terremoto foram ao ar no Jornal Hoje daquele sábado, 27 de fevereiro. O número de mortos já passava de 120, mas centenas de pessoas continuavam desaparecidas. A cidade mais atingida foi Concepción, a segunda maior do país, com 600 mil habitantes. As imagens mostravam o desespero da população, os escombros dos prédios e casas, as estradas destruídas e o caos que imperava na região. O terremoto no mar fez com que as autoridades disparassem alertas de tsunami para os países banhados pelo Pacífico. Ondas gigantes já tinham atingido cidades costeiras e um arquipélago a oeste do país.

Ainda era possível sentir as réplicas do terremoto. Um brasileiro que vivia no Chile estava conversando pelo computador com uma produtora do Jornal Hoje, Clarissa Cavalcanti, quando começou a sentir os tremores novamente. Mesmo assustado, ele caminhou com a câmera e mostrou as rachaduras nas paredes do apartamento.

Direto de Santiago

Quando o Fantástico de 28 de fevereiro foi ao ar, Marcos Uchoa e Antonio Gil estavam em Santiago. A equipe descreveu o cenário de desolação que encontrou pelo caminho. As imagens mostraram a destruição das estradas e a periferia da cidade, onde casas desmoronaram e a população enfrentava falta de água e luz. Havia a solidariedade dos vizinhos, mas também o medo dos assaltos. Alguns moradores faziam vigília à noite para protegerem o que ainda tinham.

“Quando chegamos à periferia de Santiago, já havia muita destruição na autoestrada. Tivemos de pegar caminhos alternativos. Os bairros pobres estavam destruídos” Marcos Uchoa sobre a cobertura do terremoto no Chile

“Quando chegamos à periferia de Santiago, já havia muita destruição na autoestrada. Tivemos de pegar caminhos alternativos. Os bairros pobres estavam destruídos. Um pouco depois, fizemos uma matéria em Santiago não sobre o terremoto, mas sobre a natureza humana. Como eu digo: havia um prédio intacto e, ao lado, outro prédio todo trincado. Por quê? A construtora não botou um concreto certo, não fez nas normas certas”, analisa Uchoa.

Testemunho comovente

“Os enviados especiais da Rede Globo ao Chile, Marcos Uchoa e Antônio Gil, vão abrir esta edição do Jornal Nacional com um testemunho exclusivo e tocante.” Assim Fátima Bernardes chamou a reportagem da dupla de correspondentes exibida no telejornal no dia 3 de março.

Marcos Uchoa e Antonio Gil estiveram em Talco, capital da região de Maule, a mais atingida pelo terremoto, e Concepción. A reportagem mostrou o desespero da população que estava sem água, luz e gás e também os saques que estavam acontecendo. 

Em Concepción, a equipe registrou o caos em que se encontrava o lugar. A violência que tomou conta da cidade assustava os moradores, que reclamavam da falta de assistência do governo. Além de luz e água, faltavam remédios para a população. Os bombeiros ainda buscavam sobreviventes entre os escombros de um prédio de 15 andares. O incêndio em uma loja de departamentos era o retrato da desordem, como destacou o repórter. Após roubarem o estabelecimento, as pessoas atearam fogo às mercadorias. 

Réplicas

Reportagem de Marcos Uchoa sobre uma família que sobreviveu ao terremoto no Chile e os novos tremores que assustavam a população. Fantástico, 07/03/2010.

Reportagem de Marcos Uchoa sobre uma família que sobreviveu ao terremoto no Chile e os novos tremores que assustavam a população. Fantástico, 07/03/2010.

Os tremores secundários continuaram acontecendo nos dias seguintes ao terremoto. A equipe da Globo testemunhou um desses abalos enquanto estava em Concepción. “Nós encontramos uma brasileira, casada com um chileno. E, enquanto nós a entrevistávamos, o portão tremia. Ali houve um tremor de 6.5 na escala Richter, bem forte”, lembra Marcos Uchoa. Ana Paula Rabelo contou como ela e o marido reagiram quando perceberam o terremoto da madrugada do dia 27. Desde então, mais de 200 tremores já tinham acontecido.

A reportagem – levada ao ar no Fantástico, em 7 de março – também mostrou como a solidariedade de vizinhos estava sendo importante naquele momento e destacou a história de uma família que conseguiu escapar do tsunami.

Tsunami

Marcos Uchoa e Antonio Gil visitaram cidades costeiras que foram destruídas pelo tsunami que sucedeu o terremoto. Em Talcahuano, como mostrou o Jornal Nacional em 9 de março, os barcos foram levados para longe do cais. Um morador afirmou que a onda que atingiu o local tinha cerca de dez metros.

Em Curanipe, um camping que ficava em frente ao mar foi devastado pelas ondas. Como tudo aconteceu no meio da noite, apenas poucos minutos após o terremoto, as pessoas não conseguiram fugir e estavam desaparecidas. 

No dia seguinte, a reportagem de Marcos Uchoa no Bom Dia Brasil destacou a vida dos chilenos depois da tragédia.

Fugitivos

Em Chillan, o muro da penitenciária desabou, permitindo a fuga de centenas de presos e causando pânico entre a população, como mostrou a reportagem de Marcos Uchoa e Antonio Gil levada ao ar pelo Jornal Hoje em 10 de março.

“Os presos fugiram, correndo pela cidade, à noite. Eu entrevistei uma senhora que era professora na escola da penitenciária e morava com a diretora. As duas eram acostumadas a lidar com os presos. Dois entraram na casa delas, com facas na mão. Uma acordou a outra: ‘Temos visitas’. E elas começaram a lidar com os bandidos de igual para igual. Os caras comeram com a faca na mão, depois pediram a chave do carro delas. E ela falou: ‘Olha, esse carro é muito velho, não está funcionando. Vai parar ali no meio da rua, e a polícia vai pegar você. Se quiser tentar mesmo assim…’. O cara acreditou, porque era verdade, e começou a conversar com elas. Lá pelas tantas, estava cheio de polícia na rua, que ficava ao lado da penitenciária. Ela falou: ‘Meu filho, é melhor vocês se entregarem. Eu vou entregá-los para a polícia e pedir para não fazerem nada com vocês dois.’ E de fato ela chamou a polícia: ‘Olha, não façam nada, não. Eles se comportaram muito bem.’ Foi inacreditável! As mulheres, sem dúvida, na minha experiência, são as pessoas mais impressionantes”, conta Uchoa.

Reportagem de Marcos Uchoa e Antonio Gil sobre o desabamento do muro de uma penitenciária em Chillan, Chile, permitindo a fuga de centenas de presos e causando pânico entre a população, Jornal Hoje, 10/03/2010.

Reportagem de Marcos Uchoa e Antonio Gil sobre o desabamento do muro de uma penitenciária em Chillan, Chile, permitindo a fuga de centenas de presos e causando pânico entre a população, Jornal Hoje, 10/03/2010.

FONTES

Depoimentos concedidos ao Memória Globo por: Carlos de Lannoy (08/07/2013) e Marcos Uchoa(27/09/2010, 05/10/2010 e 26/10/2010); Bom Dia Brasil, 10/03/2010; Fantástico, 28/02/2010, 07/03/2010; Jornal Hoje, 27/02/2010, 10/03/2010; Jornal Nacional, 27/02/2010, 03/03/2010, 09/03/2010.
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