Por Memória Globo

Frame de vídeo / Globo

No dia 14 de fevereiro de 1981, uma rebelião no presídio de Jacareí, em São Paulo, deixou seis mortos. O levante começou por volta das 10h, quando 67 presos saíram para o banho de sol no pátio do presídio. Primeiro, os detentos dominaram um cabo da polícia. Logo depois, fizeram reféns entre os funcionários do presídio. O advogado Franz Castro, que trabalhava na Associação de Apoio aos Condenados, foi levado como refém na tentativa de fuga de três dos criminosos. Os policiais exigiram a libertação do advogado e o tiroteio começou. No final, Franz Castro, os três presos e um policial foram mortos.

EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO

Webdoc sobre a cobertura da rebelião no Presídio de Jacareí em 1981, com entrevistas exclusivas do Memória Globo.

Webdoc sobre a cobertura da rebelião no Presídio de Jacareí em 1981, com entrevistas exclusivas do Memória Globo.

EQUIPE E ESTRUTURA

LINHA DE FRENTE

A equipe da Globo destacada para cobrir a rebelião foi formada pelo cinegrafista Reynaldo Cabrera, o repórter Carlos Nascimento e o operador de VT Carlos Alberto Bombonatte. Ao chegar ao local, ainda sem maiores informações e atrás das melhores imagens do incidente, a equipe foi surpreendida pelo início do tiroteio, permanecendo aproximadamente 20 minutos na linha de frente do confronto.

Nascimento narrou os acontecimentos dali mesmo. A fita registrando o áudio e o vídeo do flagrante foi enviada para a redação, pronta para ser exibida no Jornal Nacional. As imagens eram impressionantes: pessoas correndo e se escondendo atrás dos carros nas calçadas, em plena luz do dia, e um preso sendo executado por policiais.

Reportagem de Carlos Nascimento e Reynaldo Cabrera sobre a rebelião do presídio de Jacareí, Jornal Nacional, 14/02/1981.

Reportagem de Carlos Nascimento e Reynaldo Cabrera sobre a rebelião do presídio de Jacareí, Jornal Nacional, 14/02/1981.

MOMENTOS DE GRANDE TENSÃO

Reynaldo Cabrera nunca esqueceu o episódio: “A gente desceu [do helicóptero] no pátio de uma fábrica, a menos de 100 metros da cadeia. De manhã, já tinha havido uma fuga. Os detentos tinham como refém um cabo da polícia militar e um advogado, e estavam negociando. Na hora de sair, veio uma Belina e o pessoal da polícia começou a gritar que eles não podiam levar o policial. E eu ouvi uma voz atrás de mim dizendo: ‘Momentos de grande tensão aqui em Jacareí. Os policiais militares estão se armando e se preparando para atirar. Tiros de todas as partes’, era o Nascimento. Parecia filme de bang-bang à italiana. Só deu tempo de ajoelhar, pôr o cotovelo no chão como se fosse um tripé e continuar gravando. Um policial levou um tiro na testa, de raspão. Na minha frente, caiu um capitão com um rombo na cabeça. Ele morreu na hora. Um dos prisioneiros correu e, quando ele chegou no muro, ergueu os braços para se entregar e já tinham três em cima dele mandando bala. Isso tudo a dois, três metros da gente.” 

Parecia filme de bang-bang à italiana. Só deu tempo de ajoelhar, pôr o cotovelo no chão como se fosse um tripé e continuar gravando.”
— Reynaldo Cabrera sobre tiroteio

DESTAQUES

Fita errada

Apesar da importância e da grande repercussão que as imagens certamente teriam, por pouco não chegaram a tempo de serem exibidas na edição do Jornal Nacional. Segundo Carlos Nascimento, houve um problema com o helicóptero que levaria o material para a emissora: “Entregamos então a fita original para um taxista e pedimos que ele a levasse para São Paulo. Como já era tarde, não tínhamos esperança alguma que desse tempo.”

Logo em seguida, o problema com o helicóptero foi solucionado, e Nascimento resolveu mandar para a emissora uma segunda fita gravada por Cabrera, que, todavia, não continha os melhores registros da rebelião. Para sua surpresa, estava enganado: o próprio repórter fizera confusão e trocara as fitas, entregando ao taxista a fita errada. Assim, o material exclusivo seguiu de helicóptero para a redação da Globo em São Paulo, a tempo de ser exibido no Jornal Nacional. 

Tudo terminado

“Seis pessoas morreram hoje à tarde durante uma rebelião no presídio de Jacareí, a 60 quilômetros de São Paulo”, anunciou o apresentador Darcio Arruda no Jornal Nacional. A matéria que se seguia mostrava a vista aérea do presídio durante a rebelião e os momentos tensos durante os quais dois policiais são baleados em frente às câmeras de Cabrera, com áudio de Carlos Nascimento. Para finalizar, o repórter informou: “Cinco horas da tarde. Tudo terminado. A polícia militar invadiu o presídio e controlou a situação.”

Incêndio

Era tudo acontecendo ao mesmo tempo. Colocamos no ar boletins sobre o incêndio e notícias da rebelião em Jacareí.
— Dante Matiussi sobre o dia 14 de fevereiro de 1981

No mesmo dia da rebelião em Jacareí, o Jornal Nacional registrou no Centro de São Paulo outro acontecimento trágico: o incêndio no edifício Grande Avenida, que matou 17 pessoas e deixou mais de 100 feridas. O fogo começou na parte de baixo do prédio, de 20 andares, quando faltavam poucos minutos para o meio-dia. As causas foram várias: rede elétrica antiga, sobrecarga de energia e instalações precárias de segurança.

Dante Matiussi, então chefe de redação em São Paulo, relembra aquele dia dramático: “Era tudo acontecendo ao mesmo tempo. Colocamos no ar boletins sobre o incêndio e notícias da rebelião em Jacareí. Tivemos que cobrir para o Jornal Hoje e, paralelamente, preparar o material para o Jornal Nacional, que teve quase 80% do seu conteúdo produzido em São Paulo.” 

Prêmio

A cobertura rendeu à Globo e sua equipe o prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, concedido pelo Sindicato de Jornalistas de São Paulo.

FONTES

Depoimentos concedidos ao Memória Globo por: Carlos Nascimento (10/0/2002), Dante Matiussi (30/01/2004) e Reynaldo Cabrera (17/03/2004); MEMÓRIA GLOBO. Jornal Nacional, a notícia faz história. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2005. Jornal Nacional (14/02/1981).
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