Natural da pequena cidade de Diamantina, norte de Minas Gerais, Juscelino Kubitschek (1902-1976) se formou em Medicina e ingressou na carreira política depois de completar 30 anos. Antes de se tornar presidente da República (1956-1961), foi prefeito de Belo Horizonte e governador de Minas Gerais, pelo PSD. Após eleição nacional em 1955, assumiu a presidência, tendo como principais promessas a transferência da capital para o coração do Brasil e a realização do Plano de Metas, projeto de modernização pela aceleração do processo de industrialização, conhecido pelo lema “50 anos em 5”.
Vídeo produzido pelo Memória Globo sobre a morte de Juscelino Kubitschek, com entrevista exclusiva do jornalista Álvaro Pereira (1976).
Após deixar a presidência da República, foi eleito senador e tomou posse já em 1961. Com a eclosão do golpe militar de 1964, JK teve os direitos políticos cassados. Em 1976, Juscelino morreu em um acidente de carro, na via Dutra, quando viajava de São Paulo para o Rio de Janeiro.
Em 1996 e, novamente, em 2013, investigações chegaram a sugerir que o ex-presidente fora vítima de um atentado político, hipótese negada pela Comissão Nacional da Verdade, que também avaliou o caso em abril de 2014.
ACIDENTE DE CARRO
Em 22 de agosto de 1976, Juscelino Kubitschek viajava de São Paulo para o Rio de Janeiro no banco de trás de seu Opala, quando sofreu um acidente fatal. O carro, que o ex-presidente chamava de Platão, era conduzido por Geraldo Ribeiro, motorista particular de JK por 30 anos, que também não resistiu aos ferimentos decorrentes da tragédia e morreu. Segundo a perícia, o automóvel seguia pela rodovia Presidente Dutra, na altura do quilômetro 165, próximo à cidade de Resende, quando foi atingido por um ônibus. Desgovernado, o veículo cruzou o canteiro de segurança em alta velocidade e se chocou contra uma carreta na contramão, antes de ser arrastado por 30 metros. O carro ficou destruído, conforme mostrou reportagem de Glória Maria para o Jornal Nacional, no dia seguinte à tragédia.
JK tinha 73 anos e tivera os direitos políticos cassados pela ditadura, em junho de 1964, apesar de ter intenção de concorrer à futura eleição presidencial, em caso de restituição do regime democrático.
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Censura
Assim que recebeu a notícia da morte de Juscelino Kubistchek, na noite do dia 22 de agosto de 1976, a Globo colocou no ar um noticiário extra de três minutos, informando ao público os recentes acontecimentos. A matéria não agradou a Censura Federal, que enviou um recado à redação do Jornal Nacional pedindo que a morte fosse abordada com menos emoção. Além disso, estava proibida a menção ao fato de que JK tivera os direitos políticos cassados pelo governo militar e também qualquer alusão aos anos de seu mandato presidencial (1956-1961).
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Mesmo com as advertências, a TV Globo acompanhou o velório no dia seguinte, com imagens do cortejo, que seguiu para o aeroporto Santos Dumont, de onde o corpo partiria para Brasília. Emocionada, a multidão homenageou JK cantando a música Peixe Vivo, os hinos Nacional, da Independência e à Bandeira. Mas as imagens não chegaram à emissora a tempo de entrar no JN, por conta do tumulto. Naquela época, a Globo ainda não tinha adotado a tecnologia Eletronic News Gathering (ENG), que permitia o envio de imagem e som direto do local do acontecimento para a emissora: o primeiro uso desse sistema no JN ocorreu apenas em 1977.
No Distrito Federal, mais comoção. Cerca de 20 mil pessoas fizeram questão de dar o último adeus a JK, antes do enterro. Em depoimento ao Memória Globo, o repórter Álvaro Pereira conta que estava na capital do país naquele dia e se lembra de que o enterro mobilizou a cidade inteira: “Aquilo deve ter assustado o regime militar, e eles não puderam fazer nada. É curioso, porque um regime tão poderoso, apoiado por tropas armadas do Exército, Marinha e Aeronáutica, ficou, de repente, sem ação diante da morte de JK porque veio aquele momento meio espontâneo, a massa na rua, querendo prestar uma última homenagem a Juscelino, queria sair da Catedral com o caixão nas costas. Foi um evento magnífico e comandado pela população, pela massa. O regime militar acompanhou meio assustado, meio amedrontado, apenas tentando manter a ordem daquelas manifestações. Mas não teve o poder de cercear qualquer tipo de manifestação popular de solidariedade ou de homenagem ao grande líder político. Foram momentos marcantes em Brasília e que ajudaram, gradualmente, a construir a democracia no país”.
HOMENAGENS
Uma semana depois, a Globo acompanhou a celebração da missa de sétimo dia do ex-presidente na Igreja da Candelária, no Rio de Janeiro. Na cerimônia religiosa estiveram a viúva Sarah Kubitschek, políticos, amigos e admiradores de JK, conforme mostrou o JN, no dia 30 de agosto. Um dia antes, o Fantástico também homenageou JK, com reportagem especial nas ruas de Diamantina, cidade natal de Juscelino – que era carinhosamente chamado de “pé de valsa” por seus conterrâneos. Nas vielas íngremes da cidade mineira, moradores realizaram um serenata de despedida, entoando em coro a canção Peixe Vivo.
Passado um ano, foi inaugurado em Brasília o túmulo definitivo do ex-presidente, no cemitério do Campo da Boa Esperança, como noticiou o JN em 22 de agosto de 1977. Após a missa celebrada por três padres, dona Sarah Kubitschek agradeceu aos 2,5 mil presentes, dizendo com emoção que JK “voltou a Brasília carregado nos braços do povo”.
Dez anos depois
As homenagens seguiram. Em 1986, a repórter Beatriz Thielmann acompanhou a celebração dos dez anos da morte, realizada no Memorial JK, no Eixo Monumental, em Brasília. Por conta da chuva, a cerimônia que estava prevista para ocorrer em um palco ao ar livre, onde haveria uma apresentação de música, foi transferida para dentro do museu
COMISSÃO DA VERDADE
Em dezembro de 2013, a Comissão Municipal da Verdade de São Paulo anunciou que Juscelino Kubitschek havia sido vítima de um atentado político, conforme noticiou o jornalista Alberto Gaspar, em reportagem ao JN. Segundo a comissão, indícios apontavam que o motorista Geraldo Ribeiro, que conduzia o Opala usado por JK, fora baleado na testa durante o trajeto, perdendo o controle do veículo, que colidiu em seguida com um caminhão, na contramão. O relato de um caminhoneiro, ouvido pela primeira vez, e também o de um perito que afirmou ter visto uma perfuração no crânio do motorista durante a exumação de seu corpo, em 1996, estavam entre as provas encontradas pela comissão.
O ex-presidente teria morrido em consequência de um acidente de carro. O acidente aconteceu no dia 22 de agosto de 1976, na Via Dutra. Jornal Nacional, 22/04/2014.
O relatório de 90 páginas foi encaminhado à Comissão Nacional da Verdade (CNV), que iniciou outra investigação para avaliar a hipótese. Em 22 de abril de 2014, em matéria da repórter Cristina Serra, o JN anunciou o resultado da investigação da CNV: tanto o ex-presidente quanto seu motorista foram vítimas de um acidente de carro, e não de um homicídio.
A equipe de reportagem acompanhou a sessão em Brasília, entrevistou o presidente da Comissão, e ouviu a declaração do representante do grupo de peritos que analisou o caso: a fenda no crânio foi provocada por uma lesão durante a exumação, e o objeto metálico encontrado junto ao corpo de Geraldo Ribeiro era, na verdade, um grampo utilizado para fixar o forro do caixão. A investigação avaliou documentos e fotografias inéditas, testemunhas e laudos científicos. A conclusão foi que, após ter o carro atingido por um ônibus, Geraldo Ribeiro tentou recuperar o controle do carro ao realizar uma manobra, reação que, segundo os especialistas, seria impossível, caso ele tivesse sido baleado na cabeça.
Motorista exumado
O corpo do motorista Geraldo Ribeiro foi exumado em Minas Gerais, no dia 14 de agosto de 1996. A ação decorreu da reabertura do inquérito sobre a morte de Juscelino Kubitschek, solicitada pelo advogado Paulo Castelo Branco, do Museu JK, conforme noticiou o Jornal da Globo, em julho daquele ano. A hipótese do advogado era que Juscelino poderia ter sido vítima de um atentado político. Após a exumação, o corpo foi avaliado por um perito, que afirmou ter encontrado uma fenda na parte frontal do crânio e um objeto metálico não identificado. Nada foi provado: a hipótese de assassinato foi rechaçada pela Justiça, e o caso, arquivado.
FONTES
Jornal Nacional, a notícia faz história. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2004. Bom Dia Brasil 23/04/2014; Jornal Nacional 30/8/1976, 22/8/1977, 27/8/1981, 22/8/1986, 10/12/2013, 22/4/2014. Jornal da Globo 09/7/1996. Fantástico 29/08/1976. |