O rito do impeachment no Senado foi dividido em três fases: apuração em comissão especial; avaliação em plenário da decisão da comissão, que resultaria no afastamento da presidente por até 180 dias; e julgamento do processo, momento em que o Senado se tornaria uma espécie de tribunal. A última fase seria presidida pelo então presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski. Uma reportagem de Zileide Silva no ‘Jornal Nacional’ daquela noite explicou todos os detalhes do processo a ser instaurado.
Reportagem de Zileide Silva sobre o recebimento do pedido de impeachment de Dilma Rousseff no Senado e a explicação dos próximos trâmites do processo. Jornal Nacional, 18/04/2016.
Explicar ao telespectador como os turnos de votação aconteceriam nas duas casas legislativas demandou estudo e habilidade de traduzir o momento político, como conta a repórter Camila Bomfim: “A gente tinha que estudar bastante o regimento para saber como as coisas funcionavam naqueles dois turnos de votação. Até porque, no Senado, no primeiro turno já tinha o resultado prático, que era o afastamento temporário da presidente para ser confirmado em agosto. A gente se dedicou muito às matérias que mostravam exatamente isso: que as duas casas legislativas tinham dois turnos de votação, mas em cada uma delas os resultados práticos se davam de forma diferente. A gente se debruçava bastante com ajuda das fontes mais técnicas possíveis dentro da Câmara e do Senado para poder desenhar em arte e em reportagens aquilo que o telespectador não estava acostumado a ver: o passo a passo de um processo que podia mudar a história do país”.
Para iniciar as investigações, a comissão especial do Senado precisava eleger 21 senadores titulares e 21 suplentes. Essa decisão foi tomada no dia 25 de abril, conforme mostrou Júlio Mosquéra ao ‘Jornal Nacional’. O repórter acompanhou todos os trâmites referentes a essa frente de trabalho, mostrando no telejornal do dia 6 de maio a decisão final: por 15 votos a 5, os senadores aprovaram o relatório de Antonio Anastasia (então no PSDB), favorável ao prosseguimento do processo de impeachment. Uma nova votação fora marcada para o dia 12 de maio. Para ser aprovado, o pedido deveria conseguir o mínimo de 54 votos dos 81 senadores. As negociações políticas começaram.
Reportagem de Júlio Mosquéra sobre a aprovação do relatório da Comissão do Senado que pedia o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Jornal Nacional, 06/05/2016.
Votação no Senado
A segunda fase do rito do impeachment no Senado chegou ao fim na noite de 11 para 12 de maio de 2016, com votação em plenário. Por 55 votos a favor e 22 contra, a Casa instaurou o processo de impeachment e afastou Dilma Rousseff da presidência por até 180 dias – prazo limite para o julgamento final ocorrer. O vice, Michel Temer, assumiu interinamente o governo.
O dia da votação
Os ânimos estavam à flor da pele. Bases do governo e da oposição tentavam, a todo custo, reverter votos a seu favor. A sessão em plenário do Senado durou mais de 20 horas. Começou na tarde do dia 11 de maio e só terminou na manhã do dia 12, com breve intervalo na madrugada. As equipes da Globo e da GloboNews em Brasília se espalharam por diferentes pontos dos edifícios do Congresso Nacional. Os produtores-especialistas no Congresso elaboraram roteiros minuciosos sobre o que dizia o regimento, com o passo a passo da tramitação, apontaram também a tendência de cada voto. Setoristas do judiciário analisaram os processos e prepararam um dossiê com as implicações legais. Como os crimes de responsabilidade cometidos por Dilma eram de ordem orçamentária, também os setoristas de economia precisaram se debruçar no caso para entender as pedaladas fiscais.
Ao mesmo tempo em que políticos viravam a noite em debates acalorados, jornalistas se desdobravam para acompanhar a sessão. Ninguém queria ir embora, enquanto o resultado não saísse. Ricardo Villela conta: “Todo mundo virou a noite. Eu me lembro de mandar as pessoas irem para casa para dormir, mas ninguém queria sair. O João Netto, produtor-especialista em Senado, dizia: ‘Essa é minha Copa do Mundo, não largo’. E ninguém largava mesmo. Fui para casa, dormi uma hora e voltei”.
As equipes de Tecnologia e de Operações precisaram multiplicar os pontos de vivo, com o crescimento do espaço do jornalismo na programação da TV aberta e da GloboNews.
Na Globo, a madrugada foi dividida em plantões de Monalisa Perrone e William Waack, com entradas ao vivo de Heraldo Pereira, que não deixou a galeria do Senado em nenhum momento. Às 5h54, o apresentador ganhou a companhia de Cristiana Lôbo, que segurou a transmissão ao vivo para a GloboNews. O resultado da votação tão aguardada foi revelado poucas horas depois, em plantão que interrompeu os telejornais locais da manhã na Globo. O impeachment de Dilma Rousseff fora aprovado. Na sequência, o ‘Bom Dia Brasil’ exibia um resumo completo da madrugada. A presidente então seria afastada oficialmente de suas atividades por até 180 dias. Assumiria Michel Temer.
Reportagens de Gioconda Brasil, Giuliana Morrone e Heloísa Torres sobre a votação no Senado que aprovou o afastamento de Dilma Rousseff. Bom Dia Brasil, 12/05/2016
A edição do ‘Jornal Nacional’ de 12 de maio teve cerca de 70 minutos de duração e mostrou, em reportagem de Zileide Silva, a despedida de Dilma Rousseff, que fez discurso diante de representantes de movimentos sociais. Para aquela edição, Heraldo Pereira, Marcos Losekann, Roberto Kovalick, Cláudia Bomtempo, Tonico Ferreira, José Roberto Burnier e Júlio Mosquéra prepararam matérias abordando diferentes faces do impeachment: a política, a jurídica, a econômica e a social.
Reportagem de Heraldo Pereira sobre a votação no Senado que determinou o afastamento Dilma Rousseff e o prosseguimento do processo de impeachment da presidente. Jornal Nacional, 12/05/2016
Reportagem de Zileide Silva sobre a despedida de Dilma Rousseff, que fez discurso diante de representantes de movimentos sociais. Jornal Nacional, 12/05/2016.
Confusão na despedida de Dilma
Terminado o discurso, a presidente afastada deixou o Planalto pela porta lateral. Diante do Palácio, uma multidão de manifestantes protestava em meio a jornalistas que estavam trabalhando. A repórter Zileide Silva e a produtora Roniara Castilhos foram vítimas de agressões verbais e físicas.
Renata Vasconcellos e William Bonner falam sobre a agressão de manifestantes favoráveis a presidente Dilma Rousseff contra quatro jornalistas da Globo. Jornal Nacional, 12/05/2016.
“A despedida de Dilma naquele dia em Brasília foi marcada por manifestações de apoio e agressões aos jornalistas. Quando o secretário-geral da Câmara entregou a ela a notificação oficial, eu estava no Planalto. Acompanhei a assinatura do documento e, depois, com outros jornalistas, me encaminhei para o chiqueirinho – como é chamado o espaço reservado à imprensa nessas ocasiões – para acompanhar o discurso de Dilma em um púlpito do lado de fora. O problema foi que os manifestantes invadiram o nosso espaço. De repente, colegas gritaram: ‘Sai daqui! Eles estão vindo, vão te agredir!’ Eu não queria ir embora. Estava trabalhando e não sentia que ia ser algo tão pesado, até que vários manifestantes partiram na minha direção, xingando. No meio da confusão, um policial me chamou: ‘Corre, Zileide!’ Eu e a produtora Roniara Castilhos corremos na direção dele, que conseguiu me proteger, mas não a Roniara, que levou um chute nas costas. Foi horrível. O Planalto pediu desculpas. Nós só estávamos fazendo jornalismo, nada mais”. - Zileide Silva.
“O impeachment tinha um julgamento político e um jurídico. Nós fazíamos transmissões ao vivo diariamente de Câmara, Senado e STF. Enquanto isso, tínhamos toda a cobertura do procedimento jurídico: os advogados da Dilma fazendo o trabalho para tentar entrar com recursos, ganhar tempo, derrubar decisões que eram tomadas pela Comissão ou pela Câmara no Supremo. Então tinha um trabalho muito forte de cobertura na Justiça” - Marlon Herath, então coordenador do ‘JN’ em Brasília.
“A votação final do impeachment do Senado, a gente sabia que ia durar o fim de semana inteiro. A gente se preparou, montou escalas, de maneira que conseguisse ficar no ar direto. A gente se preocupa em dar sempre o contexto, em ter um comentarista que explique. Mas transmite o tempo inteiro pra dar tempo do assinante, do telespectador, escutar todos que estão falando, quando eles brigam, quando eles gritam. Não há uma transmissão seletiva, a gente mostra tudo. O nosso compromisso é com a verdade, com a honestidade”. - Carlos Jardim, chefe de redação da GloboNews.