O republicano Donald Trump venceu a disputa eleitoral de novembro de 2016 contra a democrata Hillary Clinton, tornando-se o 45º presidente dos Estados Unidos. A candidata teve maior número de votos totais, mas não venceu no Colégio Eleitoral – nas eleições americanas, cada estado ganha um peso, de acordo com o tamanho de sua população, logo, conquistar mais votos individuais nem sempre garante a vitória. A eleição de Trump surpreendeu a imprensa norte-americana. As pesquisas de opinião realizadas ao longo do ano davam como certa a vitória de Hillary e não previram que três estados considerados democratas votariam em favor do republicano: Michigan, Wisconsin e Pensilvânia. Ainda em 2016, o processo eleitoral foi investigado por ter tido possível intervenção russa. Neste processo político, marcado por escândalos e denúncias de fraude, veio à tona o fenômeno das fake news – notícias falsas, em inglês.
A vitória de Trump surpreende a imprensa mundial. Jornal Nacional, 09/11/2016.
EQUIPE E ESTRUTURA
Na época coordenado por Cristiana Sousa Cruz, o escritório da Globo em Nova York destacou 34 profissionais para cobrir as eleições para Globo e GloboNews. A sucursal foi responsável por realizar a contagem dos votos em tempo real, junto ao hub comandado pela agência de notícias Associated Press, e podia anunciar, em primeira mão ao Brasil, o vencedor da eleição. No dia oficial da votação, Jornal Nacional e Jornal da Globo foram ancorados ao vivo de Washington. Paralelamente, a GloboNews ficou no ar, ao vivo, durante toda a madrugada, acompanhando a apuração.
CORRIDA ELEITORAL
A primeira fase da corrida eleitoral norte-americana se dá nas prévias, durante o primeiro semestre do ano. De 1º de fevereiro a 14 de junho de 2016, os partidos Democrata e Republicano realizaram primárias e caucus – prévias eleitorais que só existem dessa maneira nos Estados Unidos – nos estados para definir quem seriam os candidatos oficiais para a disputa de 8 de novembro. Em julho, os partidos anunciaram seus candidatos oficiais.
Até o anúncio, pré-candidatos disputaram a indicação dos delegados, em uma corrida eleitoral quase tão agressiva quanto a etapa seguinte. Hillary Clinton travou debates com o senador Bernie Sanders pela preferência dos democratas. Já Donald Trump, desbancou os republicanos Ted Cruz e John Kasich – ambos desistiram das prévias em maio, abrindo caminho para o empresário fazer sua campanha sozinho, como mostrou Sandra Coutinho para o JornalNacional, no dia 4 daquele mês.
Reportagem de Sandra Coutinho sobre a saída de Ted Cruz e John Kasich da corrida presidencial americana e a definição de Donald Trump como o candidato republicano. Jornal Nacional, 04/05/2016
Semanas depois, em 9 de junho, conforme exibiu o Jornal Nacional em reportagem de Fabio Turci, o então presidente dos Estados Unidos Barack Obama anunciou apoio à Hillary. Bernie Sanders só desistiu da disputa em 12 julho, conforme explicou Luís Fernando Silva Pinto em reportagem para o Jornal Nacional. A desistência tardia, aliada à troca constante de farpas entre os pré-candidatos, adiou a união de eleitores democratas em torno da figura de Hillary. A edição do Jornal Nacional do dia 29 de julho exibiu uma reportagem de Luís Fernando Silva Pinto, produzida por Fernanda Saviolo, com os destaques da festa democrata que consagrara Hillary como a principal candidata.
Donald Trump, que já estava em campanha havia dois meses, passou a disputar os 13 milhões de eleitores que haviam declarado apoio a Sanders. Segundo Trump, o democrata “traiu sua base” ao se aliar à Hillary. Era apenas o início da troca de acusações entre os candidatos à Presidência.
A partir de julho, a corrida eleitoral ganhava forma, e, com ela, a cobertura jornalística aumentava. Telejornais da Globo passaram a noticiar, quase diariamente, as principais novidades sobre o tema. Enquanto isso, a GloboNews abria cada vez mais espaço para o assunto, com reportagens especiais e comentários em telejornais conversados, como o Em Pauta.
O repórter Jorge Pontual e o repórter-cinematográfico Rob Langhammer, do escritório de Nova York, acompanharam a campanha de Trump em alguns estados americanos para fazer um perfil do candidato para o programa Sem Fronteiras, da GloboNews. Acostumado a cobrir eleições presidenciais no país havia vinte anos, Pontual lembra que sentiu algo de diferente nas convenções republicanas em 2016. Ao Memória Globo, ele conta: “Fomos a Phoenix, no Arizona, cobrir um comício de campanha de Donald Trump. Chegamos bem cedo pra entrevistar pessoas na fila esperando pra entrar. Assessores, amigos, pessoas próximas, não eram somente eleitores. Todos muito gentis. Horas depois, já dentro do Centro de Convenções, Trump começa a falar e instiga a multidão contra nós, dezenas de jornalistas, que estávamos dentro de um curralzinho ao fundo. As mesmas pessoas, antes tão boazinhas, viraram feras: gritavam, xingavam, ameaçavam. Temi pela nossa integridade física. Um cidadão mais calmo veio pedir ao Rob, que estava ainda mais branco que de hábito, que não tomasse aquele ataque pessoalmente. Trump foi embora feliz, tendo voltado a multidão contra a imprensa, que ele chama de ‘inimiga do povo’”.
Pontual também acompanhou a campanha de Hillary durante algumas semanas naquele ano e conta que a reportagem “tentava humanizar a personagem, mostrar quem era a pessoa por trás da figura pública”. O perfil da candidata foi ao ar no Sem Fronteiras, na GloboNews, em 22 de setembro de 2016.
O DIA DA VOTAÇÃO
No dia 8 de novembro de 2016, os americanos foram às urnas para escolher o 45º presidente da República, em uma das eleições mais polarizadas da história do país. Globo e GloboNews contaram com uma grande estrutura para os dias que cercaram o acontecimento.
Além do factual em todos os telejornais, William Bonner ancorou o Jornal Nacional de Washington nos dias 7 e 8 para levar o clima das ruas às telas do Brasil. O âncora também preparou matérias especiais.
William Bonner ancora o Jornal Nacional de Washington e comenta os últimos dias da campanha presidencial nos Estados Unidos e a disputa entre Hillary Clinton e Donald Trump. Jornal Nacional, 07/11/2016
A edição do Jornal da Globo daquela noite foi quase inteiramente dedicada ao assunto. William Waack, na época apresentador do telejornal, também ancorou o JG de Washington. Durante a edição, a repórter Sandra Coutinho, do estúdio em Nova York, passava os últimos números apurados pelo hub de imprensa por estado. Felipe Santana, que acompanhava a apuração em uma festa na Flórida, entrou ao vivo com a notícia de que o estado que em 2012 votara pelos democratas, desta vez, decidira eleger Donald Trump. Em entrevista ao Memória Globo na época, William Waack lembrou: “A Flórida, tradicionalmente, vota num candidato de um lado e em outra eleição ela vota do outro. Por que isso acontece? Onde isso se dá? A Flórida é dividida exatamente no meio e ali no meio tem os distritos eleitorais, que mudam para um lado ou para o outro. O que nós fizemos? Fomos para lá”.
O repórter Fábio Turci acompanha a “Festa da Vitória”, organizada pelo Partido Republicano em Nova York. Jornal da Globo, 08/11/2016.
Naquela noite, a equipe do correspondente Luís Fernando Silva Pinto ficou responsável por acompanhar a apuração no centro de convenções do Partido Democrata, em Nova York. Já Fábio Turci cobriu a chamada “Festa da Vitória”, organizada pelo Partido Republicano na Trump Tower, também em Manhattan.
A cobertura ao vivo da GloboNews começou na noite de terça-feira, 8, e entrou pela madrugada, parando apenas quando Donald Trump fez seu discurso como presidente eleito, no dia seguinte. O canal de notícias acompanhou a apuração em tempo real, pela segunda vez, usando um sistema desenvolvido pela tecnologia da Globo, que contava com um mapa interativo, mostrando como cada estado americano votara. Repórteres estavam espalhados pelo país, cobrindo as cidades de Washington, Nova York, Miami, Phoenix, Chicago e Los Angeles. Os correspondentes na Ásia e na Europa também entraram ao vivo, com a repercussão do processo político no mundo.
DESTAQUES DO DIA:
Na edição especial do Jornal das Dez, apresentador mostra mapa interativo feito para a apuração de votos na eleição americana. Jornal das Dez, 08/11/2016
Felipe Santana acompanha a apuração na Flórida para o Jornal da Globo, 8/11/2016
DONALD TRUMP É ELEITO
A eleição de Donald Trump foi anunciada às 5h32 (horário de Brasília) do dia 9 de novembro de 2016 pela agência Associated Press, responsável pela apuração paralela do processo eleitoral americano.
O estado do Wisconsin foi decisivo para que Trump ultrapassasse o limite de 270 delegados do colégio eleitoral para ser considerado vencedor. Minutos depois do anúncio, a democrata Hillary Clinton ligou para o rival, admitindo a derrota. A notícia entrou ao vivo no Hora Um e, horas mais tarde, o assunto foi mostrado no Bom Dia Brasil, que abriu a edição para a participação de Jorge Pontual, do escritório de Nova York, ao vivo.
Em Nova York, Jorge Pontual fala sobre a eleição de Donald Trump e chama reportagem de Sandra Coutinho. Bom Dia Brasil, 09/11/2016.
O correspondente substituiu Sandra Coutinho como uma espécie de âncora no estúdio da Globo no exterior, repassando ao Brasil as principais informações da madrugada. A ênfase do noticiário daquela manhã era a reação de surpresa da imprensa norte-americana com o resultado. As pesquisas de opinião não previram que Trump venceria nos estados de Michigan, Wisconsin e Pensilvânia. Uma matéria de Sandra Coutinho mostrou a discrepância entre os dados estimados pelos principais institutos de pesquisa do país e a realidade.
O sistema que elege um presidente dos Estados Unidos é diferente do usado no Brasil. Não basta ter a maioria dos votos diretos dos eleitores. É necessário conquistar a maioria dos votos dos delegados que compõem o Colégio Eleitoral. Quanto mais habitantes, mais delegados um estado tem no Colégio Eleitoral. O sistema existe para que estados mais populosos tenham mais peso de decisão.
Daniel Wiedermann, então chefe de reportagem do escritório, lembra que a apuração das eleições no Estados Unidos é feita pela imprensa, semanas antes da contagem oficial dos votos em papel. A margem de erro é mínima. No Brasil, o trabalho é realizado pelo Tribunal Superior Eleitoral. “Foi a primeira vez que nós, TV Globo, tivemos a possibilidade de tomar essa decisão, porque normalmente a gente esperava a CNN, a NBC, a ABC. Dessa vez, a gente tinha os dados da Associated Press e podia anunciar quem venceu. É um poder editorial bacana, mas perigoso, tivemos que ser conservadores nessa hora. Dar a notícia depois, mas corretamente”.
Na quinta-feira, dia 10, a GloboNews exibiu uma edição especial do programa SemFronteiras. Em uma mesa redonda comandada pelo correspondente Silio Boccanera, os enviados especiais Jorge Pontual, Guga Chacra e Sandra Coutinho debateram o contexto econômico e político que cercaram as eleições.
No domingo daquela semana, o Fantástico mostrou os principais momentos da corrida eleitoral e da escolha de Donald Trump como presidente, e exibiu trechos de um documentário da Java Filmes com o registro de 200 dias da campanha política do republicano, além do perfil do empresário – da infância à Casa Branca. As cenas foram editadas por Renata Chiara e Felipe Weiner, com reportagem de Alan Severiano para o programa dominical.
No Sem Fronteiras, Silio Boccanera comanda um debate com os correspondentes Jorge Pontual, Guga Chacra e Sandra Coutinho sobre as eleições americanas. Sem Fronteiras, 10/11/2016.
Fantástico revela como é Donald Trump longe das câmeras. 13/11/2016.
ESCÂNDALOS E FAKE NEWS
A campanha eleitoral à presidência dos Estados Unidos foi marcada por escândalos, bate-bocas, boatos e notícias falsas.
Luiz Fernando Silva Pinto fala ao vivo, da Filadélfia, sobre a convenção do Partido Democrata e o escândalo envolvendo o vazamento de e-mails da campanha de Hillary Clinton. Jornal da Globo, 25/07/2016.
Reportagem de Sandra Coutinho sobre as denúncias de assédio sexual contra Donald Trump durante a campanha eleitoral americana. Jornal Nacional, 14/10/2016.
Escândalos
Em julho de 2016, o Wikileaks publicou uma série de e-mails comprometedores para a campanha de Hillary Clinton. O ciberataque, posteriormente investigado pelo FBI, mostrou estratégias da democrata para vencer nas prévias o senador Bernie Sanders, do mesmo partido.
Em outubro, denúncias de assédio sexual contra Trump foram publicadas pelos jornais The News York Times e Washington Post. Nelas, mulheres acusavam o empresário de “tocá-las indevidamente”, nos anos 1990. Trump negou as acusações. Na mesma época, vazou na internet um vídeo de 2005 em que Trump usava termos vulgares para se referir a mulheres, como mostrou o Jornal Nacional do dia 7.
Fake News
Pela primeira vez, um processo eleitoral para o cargo mais importante da política internacional teve o destino selado nas redes sociais. Ao longo da campanha, escândalos, boatos e notícias falsas envolvendo o nome dos candidatos à presidência dominaram a internet. O termo fake news, usado para designar informações falsas que assumem caráter de notícia principalmente na internet, foi popularizado em 2016. Não apenas por designar fenômeno que estava ocorrendo no contexto das eleições americanas, mas também por ter sido incorporado como estratégia política no discurso de políticos como Donald Trump, sendo uma forma de atacar a imprensa tradicional. As “Fake News” tornaram-se uma arma política.
Nas eleições de 2016, sites criados no formato de portais de notícia passaram a publicar histórias falsas envolvendo políticos. Os links, compartilhados em massa em redes sociais e repercutidos por vezes na mídia norte-americana, fomentaram o fenômeno amplamente rechaçado naquele ano por instituições de mídia e da justiça. Em setembro de 2017, o GloboNews Documentário exibiu Fake News: Baseado em Fatos Reais, filme produzido por André Fran, Rodrigo Cebrian e Felipe Ufo, que percorreram vários países do mundo para identificar a origem dos sites mais acessados de notícias falsas, investigando a fundo o fenômeno. No documentário, os correspondentes da Globo Jorge Pontual e Sandra Coutinho descreveram suas experiências nas eleições de 2016. A equipe também conversou com agências de checagens de informação, um dos serviços que se mostrou eficiente no combate às mentiras veiculadas em forma de notícia.
Trecho do documentário Fake News: baseado em fatos reais, produzido por André Fran, Rodrigo Cebrian e Felipe Ufo, que percorreu vários países do mundo para identificar a origem dos sites mais acessados de notícias falsas. Globonews Documentário, 30/09/2017
Reportagem de Sandra Coutinho sobre o depoimento do ex-diretor do FBI, James Comey, no Senado americano sobre as suspeitas de influência da Rússia nas eleições americanas de 2016 e a reação do presidente Donald Trump, que se pronunciou negando as acusações. Jornal Nacional, 09/06/2017.
OUTROS DESTAQUES
Reportagem de Luiz Fernando Silva Pinto sobre a mudança de tom da campanha de Donald Trump, que suavizou discurso contra imigrantes para não perder os votos dos hispânicos em situação legal. Jornal Nacional, 22/08/2016.
No Em Pauta, Guga Chacra comenta as campanhas de Hillary Clinton e Donald Trump na reta final da corrida presidencial americana. Em Pauta, 03/11/2016
FONTES
KAKUTANI. M. A Morte da Verdade – Notas sobre a Mentira na Era Trump. São Paulo: Intrínseca, 2017. | Edições de Jornal Nacional, Fantástico, Bom Dia Brasil, Jornal da Globo de 01/02/2016 a 01/01/2018. | NYT. Truth and Lies in the Age of Trump. 10/2016. | G1. Jornal Nacional. Eleitores americanos escolhem candidatos para corrida à presidência. 01/03/2016. | G1. Jornal Nacional. Colégio eleitoral dos Estados Unidos oficializa a vitória de Donald Trump. 19/12/2016. | G1. Donald Trump vence Hillary Clinton e é eleito presidente dos EUA. 9/11/2016 | G1. ESPECIAL – Trump Presidente. 9/11/2016 | G1. Outras duas mulheres acusam Donald Trump de assédio sexual. 14/10/2016 | G1. Eleições nos EUA: veja o calendário das prévias no país. 01/02/2016. | G1. Eleições nos EUA: entenda como funciona a escolha do presidente pelo colégio eleitoral. 28/08/2020 | BBC. Para CIA e FBI, ‘Rússia teria agido em eleições nos EUA para promover vitória de Trump’. 10/12/2016. |