Por Memória Globo

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Em fevereiro de 2001, trechos de uma conversa de Antonio Carlos Magalhães com os procuradores da República Luiz Francisco de Souza, Guilherme Schelb e Eliana Torelly foram divulgados pela revista IstoÉ. Entre revelações e denúncias, o senador fez acusações contra o ex-secretário geral da Presidência Eduardo Jorge e Jader Barbalho, recém eleito presidente do Senado Federal, além de criticar o governo de Fernando Henrique Cardoso. ACM também revelou ter a lista de todos que votaram contra e a favor de Luiz Estevão na sessão secreta que resultou na cassação do mandato do ex-senador, em junho de 2000, e ainda afirmou que a senadora Heloísa Helena, do PT, teria votado a favor de Estevão.

A suspeita de violação do sigilo do painel eletrônico do Senado Federal deflagrou uma crise que culminou com as renúncias de Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, na época líder do governo no Senado, em maio de 2001. Ambos foram acusados pelo Conselho de Ética de quebra do decoro parlamentar. Os dois negaram envolvimento no caso, mas Regina Borges, então diretora da empresa de Processamento de Dados do Senado, confessou que a lista dos votos foi entregue por ela mesma a Arruda, a pedido do próprio senador que, em seguida a mostrou a ACM. Para evitar a cassação de seus mandatos e a consequente perda de seus direitos políticos, Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda renunciaram ao cargo de senador.

Reportagem de Roberto Kovalick sobre as primeiras denúncias contra Antonio Carlos Magalhães pela violação do sigilo do painel eletrônico do Senado Federal, Jornal Nacional, 22/02/2001.

Reportagem de Roberto Kovalick sobre as primeiras denúncias contra Antonio Carlos Magalhães pela violação do sigilo do painel eletrônico do Senado Federal, Jornal Nacional, 22/02/2001.

EQUIPE E ESTRUTURA

A crise no Senado Federal, que marcou o declínio  de Antonio Carlos Magalhães no cenário político brasileiro, mereceu ampla cobertura do jornalismo da Globo, com reportagens realizadas pela equipe de Brasília – Heraldo Pereira, Alexandre Garcia, Roberto Kovalick, Delis Ortiz, Giuliana Morrone – e exibidas sobretudo no Jornal Nacional e no Jornal da Globo.

Destaque também para os comentários de Arnaldo Jabor, nos quais, com seu humor crítico, o jornalista analisava mais um escândalo político.

CONFETE, SERPENTINA E DENÚNCIAS

Na quinta-feira, 22 de fevereiro de 2001, quando o país já entrava no ritmo do Carnaval, Fátima Bernardes noticiava no Jornal Nacional as acusações e denúncias de Antonio Carlos Magalhães publicadas pela revista IstoÉ. A reportagem de Roberto Kovalick repercutiu e apontou as possíveis consequências da divulgação de parte da conversa que o senador teve com os procuradores da república.

ACM, que viajara na véspera para os Estados Unidos, se pronunciou através de uma nota lida por William Bonner, na qual negava que houvesse tratado sobre qualquer assunto relativo ao governo em sua reunião com os procuradores. Segundo o senador, foi o próprio procurador Luiz Francisco de Souza que sugeriu meios para incriminar Jader Barbalho.

Em resposta às denúncias, o presidente do Senado pediu uma auditoria interna para analisar o painel de votação e disse estar estarrecido com a possibilidade de que o sigilo tenha sido violado.

Indignada por ter sido acusada de votar contra a cassação de Luiz Estevão em junho de 2000, a senadora Heloísa Helena chamou Antonio Carlos Magalhães de “canalha” e ameaçou pedir indenização por danos morais. Os dois ainda trocariam acusações e ofensas no plenário do Senado Federal no dia 7 de março

Reportagem de Heraldo Pereira sobre o rompimento do presidente Fernando Henrique Cardoso com Antônio Carlos Magalhães durante a crise no Senado, Jornal Nacional, 23/02/2001.

Reportagem de Heraldo Pereira sobre o rompimento do presidente Fernando Henrique Cardoso com Antônio Carlos Magalhães durante a crise no Senado, Jornal Nacional, 23/02/2001.

No dia 23 de fevereiro, com seu primeiro bloco dedicado inteiramente ao assunto, o Jornal Nacional deu destaque à reação de Fernando Henrique Cardoso. Após os ataques de ACM, o presidente demitiu dois ministros ligados ao político baiano – Waldeck Ornelas (Previdência) e Rodolpho Tourinho (Minas e Energia). FHC decidiu romper com o senador no mesmo dia em que as conversas com críticas a seu governo foram divulgadas. Segundo a reportagem de Heraldo Pereira, Fernando Henrique Cardoso anunciou o fim de uma relação política, profissional e até mesmo pessoal. O presidente descartou qualquer possibilidade de contato com ACM, que passou a ser tratado como inimigo político do governo.

A repórter Giuliana Morrone conversou com Antonio Carlos Magalhães que, pelo telefone, atacou FHC, classificando como um ato de vingança a demissão dos ministros e o acusando de manter ladrões no governo. ACM também negou que tivera acesso aos votos da sessão secreta que cassou Luiz Estevão e chamou Heloísa Helena de “destemperada”.

Antonio Carlos Magalhães só renunciaria três meses depois, mas Arnaldo Jabor, em seu comentário naquela edição do JN, já previa o fim de uma era na política brasileira: “Antonio Carlos Magalhães não cometeu apenas um erro político. Foi um delírio psíquico. A pessoa de ACM não aceitou o declínio do ACM político e foi ficando arcaico. E com esse incrível tiro no pé, ele inaugurou um período novo na história do Brasil”.

VIOLAÇÃO CONFIRMADA

A reportagem de Heraldo Pereira exibida no Jornal Nacional em 17 de abril confirmava que o painel de votação do Senado Federal fora violado. Após análise, técnicos da Unicamp concluíram que o sistema de segurança do painel era frágil, o que permitiu a fraude. Também nesse dia, Regina Célia Borges, ex-diretora da empresa de Processamento de Dados do Senado (Prodasen), afirmou à comissão do Senado que investigava o caso que José Roberto Arruda, em nome de Antonio Carlos Magalhães, pediu que ela obtivesse a lista dos votos da cassação de Luiz Estevão.

Arruda e ACM desmentiram Regina Borges. Mas, dois dias depois, ela tornou a dar seu depoimento, desta vez para o Conselho de Ética, no qual confirmou tudo que dissera antes e concordou em participar de uma acareação com os senadores. A reportagem exibida pelo JN naquela noite mostrou trechos do depoimento que foi transmitido ao vivo pela Globo News para todo o país.

No dia 20 de abril, Roberto Kovalick mostrou no Jornal Nacional a repercussão das declarações de Regina Borges. Antonio Carlos Magalhães se recusou a comentar o assunto com o repórter, mas afirmou que estavam fazendo um pré-julgamento e a verdade prevaleceria. Com sua ironia peculiar, Arnaldo Jabor resumiu os últimos acontecimentos de Brasília. “O Brasil está tomando banho. Democracia é assim – mostra a sujeira, mas lava mais branco”, disse o jornalista em seu comentário naquela noite.

Reportagem de Heraldo Pereira sobre a confirmação da violação do painel de votação do Senado Federal, Jornal Nacional, 17/04/2001.

Reportagem de Heraldo Pereira sobre a confirmação da violação do painel de votação do Senado Federal, Jornal Nacional, 17/04/2001.

CONTRADIÇÕES

“Dezessete de abril: o ex-presidente do senado nega envolvimento na violação do painel. Vinte e seis de abril: o senador Antonio Carlos Magalhães confessa. O Jornal Nacional mostra o depoimento mais esperado do escândalo do Senado.” Assim começou o JN de 26 de abril, quando ACM confessou que teve acesso à lista dos votos da sessão que cassou o mandato de Luiz Estevão. Em seu depoimento, no entanto, ele negou que tivesse pedido a violação do painel.

A reportagem de Heraldo Pereira apontou claramente as contradições do senador baiano ao mostrar um trecho do discurso de ACM no plenário do senado nove dias antes, em que o senador negava ter recebido qualquer lista.

Roberto Kovalick acompanhou, direto do Conselho de Ética do Senado Federal, o depoimento do senador baiano, que naquele momento ainda não havia terminado, e fez entradas ao vivo durante o telejornal, com as últimas informações.

No dia seguinte, o JN continuou a mostrar as contradições de Antonio Carlos Magalhães. Em seu depoimento ao Conselho de Ética, José Roberto Arruda desmentiu ACM, dizendo que sim, agiu em seu nome e com o seu consentimento ao pedir a Regina Borges a lista dos votos.

A ACAREAÇÃO

Os três principais personagens do escândalo participaram de uma acareação no dia 3 de maio. Foi a primeira vez na história política do Brasil que dois senadores da república e uma funcionária pública federal foram questionados sobre se o que diziam era verdade ou não. Durante mais de sete horas, integrantes do Conselho de Ética do Senado Federal confrontaram as versões de Antonio Carlos Magalhães, José Roberto Arruda e a ex-diretora da Prodasen Regina Borges. Quando o Jornal Nacional foi ao ar naquela noite, a sessão no Conselho de Ética ainda não havia terminado. Roberto Kovalick, que acompanhava a acareação dos senadores com a servidora pública entrou ao vivo durante o telejornal.

A cobertura completa foi exibida pelo Jornal da Globo ainda no dia 3 de maio. Já na abertura do telejornal, a apresentadora Ana Paula Padrão confirmou o que já era esperado: ACM, Arruda e Regina Borges mantiveram seus discursos. Eram três diferentes versões. Ou seja, alguém estava mentindo. Segundo a reportagem de Delis Ortiz, apesar de frustrados com o resultado da acareação, os parlamentares não tinham dúvida de que deveria haver uma punição.

Reportagem de Délis Ortiz sobre a acareação entre Antonio Carlos Magalhães, José Roberto Arruda e Regina Borges, Jornal da Globo, 03/05/2001.

Reportagem de Délis Ortiz sobre a acareação entre Antonio Carlos Magalhães, José Roberto Arruda e Regina Borges, Jornal da Globo, 03/05/2001.

Após a acareação, o Jornal da Globo fez uma pesquisa com os integrantes do Conselho de Ética do senado para saber qual era a posição de cada um quanto ao futuro de ACM e José Roberto Arruda. As respostas foram exibidas ao longo daquela edição do telejornal.

Em seu comentário naquela noite, Arnaldo Jabor queria entender os motivos que levaram à violação do painel de votação do senado: “A pergunta que eu gostaria de fazer é: por quê? Um senador, ou deputado rouba na Sudam, tudo bem, entende-se… Mas painel? Por quê? Foi rivalidade política de Arruda contra Luiz Estevão? Ou foi ACM querendo controlar a mente dos senadores? Foi puxa-saquismo de Arruda? Ou foi pura delinquência? Terá sido o desejo de ACM de se autodestruir? Será que foi o prazer perverso de sabotar a democracia? Por que fizeram isso? Como disse o jornalista Carlito Maia: Freud explica? Não. Fraude explica”.

A RENÚNCIA

No dia 23 de maio foi aprovado o relatório da Comissão de Ética pedindo a abertura de processo de cassação de José Roberto Arruda e Antônio Carlos Magalhães. Para evitar perder seus direitos políticos, Arruda renunciou ao mandato no dia seguinte.

Uma semana depois, no dia 30 de maio, ACM renunciou ao cargo de senador. Em seu último discurso no plenário, fez ataques contra o governo de Fernando Henrique Cardoso. Sua cadeira no senado foi ocupada pelo suplente Antônio Carlos Magalhães Junior, seu filho. No Jornal Nacional dessa noite, Alexandre Garcia fez um resumo sobre a trajetória política do senador baiano até sua derrocada.

O Jornal da Globo também deu destaque à renúncia de um dos mais influentes políticos brasileiros que agora, pela primeira vez em muitos anos, não ocupava nenhum cargo.

Com a renúncia de Antônio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, o relatório que pedia a cassação do mandato dos dois senadores foi arquivado.

Reportagem de Alexandre Garcia com o resumo da trajetória política de Antonio Carlos Magalhães até sua renúncia ao cargo de senador após a crise no Senado, Jornal Nacional, 30/05/2001.

Reportagem de Alexandre Garcia com o resumo da trajetória política de Antonio Carlos Magalhães até sua renúncia ao cargo de senador após a crise no Senado, Jornal Nacional, 30/05/2001.

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