Por Memória Globo

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Em plena floresta amazônica, entre Carajás e o Araguaia, foi descoberta uma montanha de ouro, em 1980. Serra Pelada, como ficou conhecida, era um elevado coberto por floresta cravado na Fazenda Três Barras, no sudoeste do Pará. A primeira pepita foi encontrada pelo fazendeiro Genésio Ferreira da Silva, que, após mandar a preciosidade para averiguação, permitiu que um grupo de 30 homens tentasse a sorte em uma grota da propriedade. O ouro de aluvião, caracterizado por aparecer em camadas superficiais da terra, era abundante: logo, a notícia se espalhou pelo país. Movidos pelo sonho do Eldorado, cerca de 90 mil homens, principalmente do nordeste, foram atraídos para Serra Pelada, entre 1980 e 1992, quando garimpo foi fechado.  Já nos primeiros meses, a vegetação foi retirada e a serra, dividida em barrancos para exploração individual. Aquele pedaço de floresta se tornou o maior garimpo a céu aberto do mundo, rendendo aos cofres públicos 42 toneladas de ouro. 

Com o tempo, o ouro de aluvião ficou escasso. A perfuração de um lençol freático e as fortes chuvas sazonais típicas da região transformaram em um grande lago o buraco de mais de 100 metros de profundidade de onde se extraía o mineral. O garimpo manual se tornou impossível, afinal, o principal local de extração de ouro estava submerso e o metal encontrado na superfície era escasso. Os milhares de garimpeiros de Serra Pelada ficaram sem emprego: aumentou a pobreza e a violência na região. A divergência de opinião sobre as medidas cabíveis para retomar o garimpo gerou tensão entre os próprios garimpeiros, que continuaram sonhando com o tesouro perdido.

Reportagem de Pedro Rogério sobre as precárias condições de vida e trabalho no garimpo de Serra Pelada. Jornal Nacional, 07/05/1980.

Reportagem de Pedro Rogério sobre as precárias condições de vida e trabalho no garimpo de Serra Pelada. Jornal Nacional, 07/05/1980.

EQUIPE E ESTRUTURA

Na década de 1980, a esperança de se tornar rico de uma hora para outra atraiu milhares a  Serra Pelada. Ano após ano, o telejornalismo da Globo acompanhou de perto os principais acontecimentos na terra cheia de histórias, promessas e tragédias.

O Jornal Nacional foi o primeiro noticiário a retratar in loco para todo o Brasil como funcionava o garimpo, em reportagem especial realizada por Pedro Rogério, que foi ao ar em maio de 1980. E seguiu noticiando as principais conquistas e mazelas de Serra Pelada, como a visita do presidente João Figueiredo, em 1981; a descoberta da maior pepita de ouro do Brasil e segunda maior do mundo, em 1983; o desabamento de terra que terminou com 16 mortos, em 1986; as greves e protestos coibidas com violência pela polícia, em 1988. Além de ter exibido uma reportagem retrospectiva – de José Hamilton Ribeiro – que mostrou como andava Serra Pelada anos mais tarde, em 2005.

José Hamilton anos antes visitara a área do garimpo. Em uma reportagem para o Globo Repórter, em 1982, se tornou o primeiro jornalista a se colocar diante das câmeras no programa, que inaugurava um novo formato.

Em setembro de 1980, Hermano Henning mostrou no Fantástico os bastidores de Serra Pelada e revelou como funcionava o sistema de pagamento, comércio e saúde, após o governo ter decidido intervir na região. O Fantástico, posteriormente, realizou reportagens investigativas, que denunciavam a precariedade das condições de trabalho dos garimpeiros e a violência que se instaurou na região após o fechamento da lavra manual.

A partir de 1985, em parceria com a TV Liberal, a Globo passou a ter um repórter local que produzia as principais notícias a serem veiculadas nos telejornais da rede. Emanuel Vilaça acompanhou o período de declínio do garimpo e os embates entre garimpeiros, membros da diretoria da cooperativa de trabalhadores, e a polícia.

O tema da violência foi bastante explorado pelo Jornal da Globo, em 2003, que realizou uma série com duas reportagens investigativas acerca de denúncias de corrupção na cooperativa dos garimpeiros, ameaças de morte a líderes sindicais, e o descaso do governo no sul do Pará. Os enviados especiais Jonas Campos e Célio Costa mostraram o que se tornou o garimpo que um dia fascinou o Brasil.

A CORRIDA DO OURO

Bamburrar quer dizer enriquecer, na terra onde um pobre podia se fazer rico da noite para o dia. Esse era o objetivo da legião de garimpeiros que chegou a Serra Pelada nos primeiros meses de 1980, em busca de ouro. De picareta na mão e muita disposição, esses homens trabalhavam em um esquema de sociedade: havia o sujeito que escavava e o que carregava o ouro ou a terra remexida nas costas, chamado de saúva. No final, 10% da arrecadação era paga ao dono das terras, Genésio Ferreira da Silva. A venda do ouro de maneira irregular motivou uma investigação da Polícia Federal, em maio de 1980, conforme noticiou em primeira mão o Jornal Nacional do dia 7. A par do caso, o JN enviou ao local uma equipe integrada pelo repórter Pedro Rogério e o cinegrafista Toninho Marins.

“Nossa viagem começa em Marabá. São 25 minutos de voo. Quem olha para baixo, só vê a imensidão da Amazônia. Ali no meio, o garimpo de Serra Pelada. Parece um formigueiro. É tanta gente que as cabanas entram pela mata”, narra Pedro Rogério na reportagem. Em depoimento ao Memória Globo, o jornalista se lembra de que iniciou a viagem em janeiro.

“Fomos a primeira televisão a mostrar aquela coisa extraordinária que era Serra Pelada".
— Pedro Rogério | repórter

A equipe ouviu dos garimpeiros relatos de glória – dos que enriqueceram com o ouro – e frustração – daqueles que trabalharam em vão, mas ainda tinham esperança de ganhar o seu milhão. Serra Pelada representava o sonho do Eldorado brasileiro.

Reportagem de Pedro Rogério sobre as precárias condições de vida e trabalho no garimpo de Serra Pelada. Jornal Nacional, 07/05/1980.

Reportagem de Pedro Rogério sobre as precárias condições de vida e trabalho no garimpo de Serra Pelada. Jornal Nacional, 07/05/1980.

ESTATIZAÇÃO DO OURO

Durante o primeiro semestre de 1980, não parava de chegar gente em Serra Pelada. O garimpo manual já contava com cerca de 20 mil pessoas se espremendo entre os barrancos ao mesmo tempo. O governo não conseguiu fazer valer os direitos da companhia Vale do Rio Doce de extração de qualquer mineral em solo brasileiro, já que a quantidade de garimpeiros armados era grande – o sonho dourado não poderia ser manchado de sangue.

No dia 8 de julho, Cid Moreira anunciou no Jornal Nacional que “a Caixa Econômica Federal instala um posto especial para o garimpo de Serra Pelada, no Pará. O posto vai comprar todo o ouro produzido na região”. A partir de então, agências bancárias começaram a se multiplicar na cidade mais próxima, Marabá, a cem quilômetros dali. Segundo a reportagem exibida no telejornal, também foi criado um sistema de fiscalização para evitar o contrabando. Poucas pessoas, no entanto, tentaram vender a pedra preciosa em outras bandas: além do governo pagar uma taxa um pouco acima do preço de mercado, Serra Pelada era um local isolado, no meio da mata e, para sair, só de avião ou por meio de trilhas clandestinas.

O apresentador do JN também informou que, para dar vazão ao ouro extraído, o Banco Central, em Brasília, construiu uma caixa-forte especial: as toneladas do metal fundidos ganharam uma nova casa.

Vida de saúva

A presença do Estado em Serra Pelada garantiu algumas melhorias no cotidiano dos garimpeiros, conforme mostrou Hermano Henning, em matéria especial com duração de 20 minutos exibida no Fantástico, no dia 7 de setembro de 1980. “Muita gente correu para Serra Pelada para lucrar com o ouro dos garimpeiros. Aqui, tem comércio. O posto da COBAL embarateceu os preços dos produtos”, dizia a reportagem. Antes da instalação do mercado, a região tinha o custo de vida alto, já que o abastecimento era difícil de ser realizado. Na mesma época, o Exército, por meio do Inamps, instalou um posto médico para atendimento dos trabalhadores – a doença mais comum era a malária.

Toda essa riqueza gerada em Serra Pelada foi controlada a mão de ferro pelo governo militar. Para evitar roubos, a Caixa Econômica passou a efetuar o pagamento em cheques, em vez de maços de dinheiro vivo: quem quisesse bamburrar tinha que ser correntista do banco, como apontou a reportagem do Fantástico.

Os garimpeiros também passaram a se organizar melhor para otimizar o trabalho e se adequar ao pequeno espaço para tanta gente. “Estamos chegando ao garimpo de Serra Pelada no Pará. O novo Eldorado Brasileiro, o lugar onde vivem 25 mil homens e nenhuma mulher. São homens muito simples que, de repente, na corrida do ouro, fizeram fortuna”, observou Henning na ocasião.

Visita do presidente

Em 12 de novembro de 1980, Serra Pelada recebeu a visita do presidente João Batista Figueiredo, conforme noticiou o Jornal Nacional daquele dia. Figueiredo foi esperado por uma multidão de garimpeiros, que o saudou calorosamente, cantou o hino nacional diante do hasteamento da bandeira do Brasil e ouviu atentamente o discurso da autoridade.

Já naquela época, os trabalhadores temiam perder a concessão da exploração manual do ouro para uma empresa de mineração. “Ao invés de proibirmos o garimpo, devemos ordenar o garimpo e dar possibilidade ao trabalhador autônomo de tomar parte. Isso não impede que o governo e as companhias privadas possam continuar”, anunciou o presidente, em discurso transmitido pelo noticiário.

GLOBO REPÓRTER

Depois de grandes reportagens realizadas em Serra Pelada pelo Jornal Nacional e Fantástico, em 1982 chegava a hora do Globo Repórter visitar a região. A reportagem de José Hamilton Ribeiro, exibida no dia 10 de junho, acompanhou o cotidiano de três homens que deixaram suas famílias – em Minas Gerais, no Maranhão e no Pará – para tentar a sorte no garimpo; contando com entrevistas com parentes dos garimpeiros, em sua cidade natal. A matéria foi gravada em fita e trazia outra inovação: a aparição do repórter diante das câmeras.

José Hamilton comenta sobre a cobertura: "A força de trabalho reunida na região só tinha comparação com a força de trabalho que construiu as pirâmides do Egito. Em nenhum outro momento da história estiveram reunidos tantos homens com o mesmo objetivo como aconteceu em Serra Pelada. O fenômeno humano era representado pelo fato de que a pessoa deixava a família, às vezes em dificuldade, e partia para uma vida de sacrifícios, com o objetivo de regressar com muito ouro e resolver os problemas financeiros por várias gerações. Havia a ilusão de que o ouro movimentava o mundo".

Anos mais tarde, o jornalista retornaria à Serra Pelada, encontrando um cenário bem diferente do retratado por ele em 1982. Desta vez, preparou uma matéria para o Jornal Nacional, que no dia 25 de abril de 2005, iniciava uma série de reportagens especiais em comemoração aos 40 anos da TV Globo. “Água barrenta e talvez contaminada esconde um lugar que, como poucos, alimentou cobiça e fantasia”, narrou ele à beira do lago profundo que se tornou a antiga serra dourada.

A reportagem mostrou que, 25 anos depois de encontrada a primeira pepita, ainda havia gente se espremendo em lugares apertados, com esperança de encontrar alguma riqueza. Naquele ano, como foi mostrado no JN, Sebastião Curió, coronel da reserva, era prefeito de uma cidade que levava seu nome: Curionópolis. E administrava como podia a tensão constante e violenta entre os garimpeiros.

Reportagem de José Hamilton Ribeiro sobre a situação dos trabalhadores no garimpo de Serra Pelada, Globo Repórter, 10/06/1982.

Reportagem de José Hamilton Ribeiro sobre a situação dos trabalhadores no garimpo de Serra Pelada, Globo Repórter, 10/06/1982.

O MAJOR CURIÓ

Pouca gente nos rincões do Pará ouviu falar no tenente-coronel Sebastião Rodrigues Moura. Mas Marco Antônio Luchini e major Curió eram nomes que corriam na boca do povo, desde meados dos anos 1970. Tratavam-se da mesma pessoa: agente do Sistema Nacional de Informação (SNI), Curió usou nomes falsos durante oito anos. Ficou conhecido no Norte do país por ter sido o comandante da ação que exterminou a Guerrilha do Araguaia, em 1974. Quando o governo quis “organizar” a exploração do ouro em Serra Pelada, Curió foi destacado como interventor, em maio de 1980. Era a única autoridade civil e militar na região. Ali, ficou famoso.

Prometendo ser a ponte entre garimpeiros e Estado, Curió proibiu a entrada de mulheres, cachaça e armas na zona de trabalho. Seu revólver, como costumava dizer, era o que “cantava mais alto”. A popularidade do major o levou ao Congresso. Foi eleito deputado federal pelo Pará, em 15 de novembro de 1982, com 49.529 votos. Sua candidatura foi anunciada em maio daquele ano, conforme registrou o Jornal Hoje do dia 17: “O homem que comanda o garimpo em Serra Pelada lança sua candidatura”. Em Brasília, Curió tentou prolongar ao máximo a concessão de direitos ao trabalho manual dos garimpeiros.

Até 1984, o garimpo manual seguiu instável, passando por longos meses de fechamento. Em junho, o governo estendeu por mais cinco anos a chance de trabalho humano nos barrancos de Serra Pelada. Um churrasco com direito a fogos de artifício e à liberação da visita de mulheres foi realizado no povoado, como noticiou o Jornal Nacional do dia 23. Em entrevista ao telejornal, Curió declarava que a questão estava resolvida, ou seja, que a lavra manual seria mantida.

MUITO OURO

"Serra Pelada bate o recorde de produção. O garimpo do Sul do Pará onde foi encontrada na semana passada a maior pepita de ouro dos últimos cem anos no Brasil [7 kg], vai extrair mais de 7.000 kg de ouro este ano”, anunciou Berto Filho na bancada do Jornal Nacional do dia 24 de julho de 1982. Era inaugurado o período de maior bonança, que se estenderia, entre recordes de produção e de tamanho de pepitas encontradas, até 1986. Naquela ocasião, o jornalista Pedro Rogério voltou à Serra Pelada para mostrar a movimentação intensa no garimpo mais cobiçado do país. “Vinte e três mil garimpeiros estão trabalhando agora na grota rica. São 1.700 cavas de 2 x 3 metros. Serra Pelada, na opinião geral, está vivendo seu momento de esplendor. Vejam só estes números: em 1981, a produção foi de 2.500 quilos. De abril deste ano até hoje, já foram fundidos 2.100 kg”.

Um ano depois, em junho de 1983, Serra Pelada bateu outro recorde. Foi encontrada a segunda maior pepita de ouro do mundo – uma pedra de 36 kg -, como anunciou Cid Moreira no JN do dia 21. Até 1992 foi extraído de Serra Pelada cerca de 42 toneladas de ouro.

CHUVAS E TRAGÉDIA

Em seus 12 anos de funcionamento, o garimpo manual em Serra Pelada foi interrompido diversas vezes pelas chuvas torrenciais, características da floresta amazônica. A primeira tromba d’água caiu em janeiro de 1981. A bordo de um helicóptero, o repórter Francisco José foi até o local para mostrar o lamaçal e a decepção dos garimpeiros, em matéria exibida no Jornal Nacional do dia 12. O prejuízo era inestimável, mas logo os milhares de homens se acostumariam a pendurar suas picaretas e aguardar a chegada de dias mais firmes.

Em outubro de 1981, por exemplo, um acidente paralisou as atividades novamente, segundo reportagem exibida no JN do dia 9. Sem deixar mortos, a queda de uma barreira – junto ao início de época de chuvas – interditou o garimpo até abril de 1982.

Em 1983, um problema mais grave denunciava a falta de segurança no “formigueiro humano”, como era chamado. Uma coluna de terra despencou sobre um grupo de trabalhadores. Segundo informou o JN do dia 18 de julho, 16 pessoas morreram no desastre.

Em outubro de 1986, uma reportagem de Emanuel Vilaça para o Jornal Nacional mostrou outro deslizamento de terra. “O acidente foi no barranco de Pedra Preta. Quando o acidente ocorreu, às 8h30 da manhã, cerca de 300 garimpeiros trabalhavam aqui. Segundo os cálculos da associação de garimpeiros, os 10 homens que foram retirados daqui sem vida, ontem, foram soterrados por 40 toneladas de terra. Para os 60 mil homens que viviam em Serra Pelada, a extração do ouro tornava-se cada vez mais arriscada.

TENSÃO E PROTESTOS

A partir de 1985, os protestos em Serra Pelada aumentaram, acompanhando a profundidade do buraco da cava principal. Os garimpeiros passaram a exigir intervenção do governo para a drenagem da água, que se acumulava entre os barrancos; e um rebaixamento do terreno. Para entrar e sair da zona de trabalho, os garimpeiros tinham que subir ou descer quase 200 degraus de escadas estreitas e improvisadas. Os principais telejornais da Globo acompanharam a tensão. Em 9 de novembro daquele ano, o Jornal Nacional mostrou que garimpeiros pacificamente protestavam junto à rodovia às margens do rio Tocantins, em prol do repasse de mais verbas públicas para melhorias na lavra manual.

No dia seguinte, o Fantástico exibiu uma entrevista com o governador do Pará, Jader Barbalho, que era contrário à decisão da presidência da República em transferir a responsabilidade sobre a área de Serra Pelada para as mãos do estado. “Eu considero um tremendo abacaxi. Eu não quero de forma alguma deixar de aceitar liminarmente esta proposta feita pelo presidente da República, mas unindo o governo do estado e Governo Federal poderíamos executar as obras de engenharia; e estudar em conjunto a solução a médio e longo prazo do problema”, declarou. De acordo com ele, os garimpeiros estariam sofrendo manipulação política por parte de líderes filiados a partidos.

Na manhã do dia 11, a crise continuou. Os garimpeiros bloquearam as vias de acesso à Serra Pelada, como foi noticiado no Bom Dia Brasil, que ainda exibiu uma entrevista exclusiva com o ministro de Minas e Energia, Edson Lobão, sobre a crise na região.

A tensão aumentou nos meses seguintes. Os protestos foram coibidos com violência pela polícia. Em outubro de 1986, um trabalhador foi assassinado por um oficial, dentro da cava principal. O fato gerou uma onda de revolta: a população queimou o quartel da polícia, a sede da associação de garimpeiros e destruíram a casa de membros da diretoria da instituição. Uma matéria exibida no Jornal Nacional do dia 13 de outubro mostrou que a Polícia Federal assumiria a partir de então o controle da associação.

Em 1988, quando os garimpeiros bloquearam uma ponte sobre o rio Tocantins, a polícia retirou 2 mil manifestantes da área “no peito e na bala”, como mostrou reportagem de Emanuel Vilaça exibida no JN, no dia 5 de janeiro. Duas pessoas morreram.

FIM DO GARIMPO

A crise entre os trabalhadores de Serra Pelada coincidiu com a escassez do ouro. Em reportagem no Jornal Nacional em 1 de maio de 1987, Emanuel Vilaça narra a situação tensa que obscurecia o Eldorado brasileiro. Entre os 100 mil habitantes apenas 15 mil tinham emprego. “O garimpo não está produzindo como antigamente. Até 1984, a produção era de 100 toneladas de ouro por ano. Hoje, não passa de 2 toneladas. O buraco já está com 100m de profundidade e pouca gente consegue encontrar alguma coisa. Há dois anos que não é feito nenhum rebaixamento aqui no garimpo de Serra Pelada”, anunciou o repórter. Sem rebaixamento, o garimpo só duraria mais dois anos, de acordo com geólogos entrevistados. A profundidade tornaria impossível a lavra manual.

Em 1991, o Globo Repórter esteve novamente em Serra Pelada. A reportagem de Francisco José informou que o garimpo já se encontrava fechado, situação que seria definitiva no ano seguinte. “Há dez anos, milhares de brasileiros vieram à Serra Pelada movidos pelo ouro. Aqui, havia uma montanha, hoje é um grande buraco completamente alagado, com 80 m de profundidade. E lá embaixo estão os barrancos, segundo os garimpeiros, com 400 toneladas de ouro.” A reportagem mostrou como andava a vida de alguns dos 15 mil homens que seguiam sem trabalho. Entre eles estava Maranhão, um homem que se recusava a voltar à terra natal com as mãos abanando.

Em 1992, o domínio sobre a área foi transferido para a Vale do Rio Doce, na época estatal do governo federal. A empresa destruiu casas com tratores e fechou buracos de exploração irregular de ouro. A violência nas cercanias, como em Eldorado dos Carajás, Marabá e Curionópolis, também cresceu.

Milhares de garimpeiros partiam para a região em busca do sonho dourado. Onde havia uma montanha, há um grande buraco totalmente alagado com 80 metros de profundidade. Segundo cálculo de garimpeiros, havia mais de 400 toneladas de ouro.

Milhares de garimpeiros partiam para a região em busca do sonho dourado. Onde havia uma montanha, há um grande buraco totalmente alagado com 80 metros de profundidade. Segundo cálculo de garimpeiros, havia mais de 400 toneladas de ouro.

JORNAL DA GLOBO

Quinze anos se passaram desde que o sonho do Eldorado se dissipou. Em 2003, uma série com duas reportagens feita pelo Jornal da Globo mostrou um cenário desolador em Serra Pelada. Em meio a disputas internas, os garimpeiros viviam regidos por medo e aquecidos por lembranças, na esperança de que o ouro voltasse a ser encontrado nas profundezas do grande lago. Em companhia do repórter cinematográfico Célio Costa, o repórter Jonas Campos foi ao Pará mostrar a guerra entre grupos rivais de garimpeiros em Serra Pelada. As matérias que foram ao ar nos dias 25 e 26 de fevereiro inauguraram as séries no Jornal da Globo.

“O que trouxe esses homens de volta a essas terras foi a notícia de uma indenização de R$108 milhões por sobra de ouro. Garimpeiros já ganharam em 1ª instância. O Senado ainda deu aos garimpeiros o direito à terra. E abriu caminho para que eles pleiteiem a lavra. Só que eles não se entendem. Não sabem quem tem direito à terra, o que cabe a cada um. A cooperativa dos garimpeiros existe desde 1984. Em tese, seria a instância decisória do grupo. Mas, acusada de fraudar documentos, a entidade foi lacrada pela Justiça depois que um incêndio criminoso destruiu boa parte dos arquivos”, denunciou a primeira reportagem, que também mostrou que ainda havia cerca de 200 toneladas de ouro a serem exploradas.

Na segunda reportagem, os jornalistas mostraram que o sonho de se tornar rico estava virando pesadelo. Três garimpeiros haviam morrido naquele ano e outros tantos estavam jurados de morte. “Foi o sonho do ouro que atraiu toda essa gente para cá. Mas foi a realidade que os transformou em prisioneiros. Todos têm o mapa da mina, aliás, todos estão em cima dela. Mas por enquanto só há uma coisa a fazer: esperar e temer”. A reportagem mostrou que pessoas ligadas à liderança dos garimpeiros, que lutavam contra o que vinha ocorrendo dentro da cooperativa, estavam marcados para morrer.

A primeira reportagem da série “Eldorado Perdido”, realizada pelo repórter Jonas Campos, mostra a realidade na região de Serra Pelada após a febre do ouro na década de 1980, Jornal da Globo, 25/02/2003.

A primeira reportagem da série “Eldorado Perdido”, realizada pelo repórter Jonas Campos, mostra a realidade na região de Serra Pelada após a febre do ouro na década de 1980, Jornal da Globo, 25/02/2003.

NOVA CORRIDA DO OURO

Em setembro de 2002, o Senado reconheceu o direito dos garimpeiros sobre Serra Pelada. A possibilidade de reativação da exploração mobilizou algumas centenas de pessoas que migraram para a região, em busca do ouro. Em reportagem para o Fantástico, exibida no dia 8 de dezembro, Jonas Campos mostrou que o clima era tenso desde que o presidente da associação de garimpeiros fora assassinado. Em torno do grande lago que se tornou a cava principal, alguns garimpeiros faziam lavagem de ouro em terras mexidas, sem a autorização do governo.

Em 2008, o Fantástico voltou à Serra Pelada. A reportagem de Vinícius Dônola e Toninho Marins exibida em 25 de maio mostrou que a área se tornara um barril de pólvora. “O velho sonho de fazer riqueza da noite para o dia reacendeu a violência no sudoeste do Pará. Grupos de garimpeiros rivais se enfrentaram nas ruas de Serra Pelada. O confronto da semana passada envolveu a tropa de choque da PM”. O repórter também lembrou que dez dias antes do tumulto, o presidente da cooperativa fora executado com 13 tiros à queima roupa, como havia informado o Jornal Nacional do dia 19, em reportagem de Roberto Paiva.

Reportagem de Jonas Campos sobre a nova corrida do ouro em Serra Pelada, no Sul do Pará. Fantástico, 08/12/2002.

Reportagem de Jonas Campos sobre a nova corrida do ouro em Serra Pelada, no Sul do Pará. Fantástico, 08/12/2002.

Havia um ano que uma empresa estrangeira mapeava o solo de Serra Pelada, tirando amostras para viabilizar um plano de garimpo mecanizado, coisa que só seria colocada em prática em 2012. A partir de então, os 38.000 associados não precisariam fazer mais nada, apenas dividir 25% do lucro que a empresa obtivesse com a extração.

Não foi o que aconteceu. Em 2013, o Jornal Nacional mostrou que, mesmo com o início das atividades de uma mineradora em Serra Pelada, os garimpeiros não haviam colocado as mãos em um centavo dos R$ 50 milhões de que tinham direito. A reportagem de Fabiano Villela exibida no dia 31 de outubro denunciou que a verba havia sido desviada por membros da própria cooperativa, que estava sob investigação da Justiça.

Segundo as investigações, mais de R$ 50 milhões que deveriam ter sido distribuídos para os garimpeiros ficaram nas mãos de ex-dirigentes da cooperativa. Jornal Nacional, 31/10/2013.

Segundo as investigações, mais de R$ 50 milhões que deveriam ter sido distribuídos para os garimpeiros ficaram nas mãos de ex-dirigentes da cooperativa. Jornal Nacional, 31/10/2013.

FONTES

Depoimentos concedidos ao Memória Globo por: Francisco José (28/01/2004), Hermano Henning(06/04/2004), José Hamilton Ribeiro (14/11/2006), Pedro Rogério (18/02/2004). Bom Dia Brasil11/11/1985; Fantástico 7/9/1980, 10/11/1985, 8/12/2002, 25/5/2008; Globo Repórter 10/6/1982, 17/05/1991; Jornal da Globo 25/02/2003, 26/02/2003. Jornal Nacional 7/5/1980, 8/7/1980, 12/11/1980, 12/1/1981, 9/10/1981, 24/7/1982, 18/7/1983, 23/6/1984, 21/6/1983, 9/11/1985, 13/10/1986, 15/01/1988, 01/5/1987, 25/4/2005, 19/5/2008, 31/10/2013.
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