Dona Benta, Sinhana, Donana Medrado e Kiki Vassourada. Zilka Salaberry criou personagens inesquecíveis e viveu mulheres fortes. A atriz, que estreou nos palcos em 1936. Era de uma família de artistas. Sua mãe, Luísa Nazareth, foi atriz de teatro, passando em seguida a fazer carreira no rádio. Seu pai, João Carvalho, era comediante, e os avós maternos, a espanhola Angela Dias e Cândido Nazareth, também eram atores. Cândido Nazareth foi, inclusive, um dos responsáveis pela criação do retiro Casa dos Artistas.
Início da carreira
Assim como suas duas irmãs, a atriz Zilka Sallaberry cresceu estudando no Colégio Santos Anjos, enquanto a família se apresentava em peças teatrais pelo Brasil. Aos 14 anos, já estava casada com o ator Mário Sallaberry, passando a atuar em peças do histórico Teatro Escola, de Renato Viana. Na companhia, conviveu com atores como Procópio Ferreira, Dulcina de Moraes e Cacilda Becker. Mais tarde, juntou-se ao Teatro dos Sete, de Fernanda Montenegro, Sérgio Brito, Ítalo Rossi, Gianni Ratto e outros.
Zilka Sallaberry teve uma passagem pelo teatro de revista na década de 1950, protagonizando em cena um nu, não totalmente explícito (ela ficava de calcinha e sutiã e, em seguida, virava-se de costas para tirar o sutiã), mas bastante ousado para a época. Sua irmã Lourdes, por sua vez, casou-se com o ator Rodolfo Mayer e também adotou o ofício de atriz. A mais nova, Alair, dedicou-se ao balé e acabou envolvendo-se também com a televisão, exercendo funções de produção.
Estreia na televisão
O primeiro contato de Zilka Sallaberry com a televisão foi através dos teleteatros da TV Tupi, sobretudo os infantis. Depois de pequenas participações, em 1956, o diretor Fabio Sabag lhe ofereceu o papel da bruxa no Teatrinho Troll. A cena apresentava o confronto entre a bruxa e uma onça, e Zilka Sallaberry decidiu improvisar, correndo e ameaçando subir pelas colunas do cenário. O diretor adorou o resultado, e a atriz ganhou um papel fixo na televisão.
Já sua participação no Grande Teatro da TV Tupi, que apresentava textos consagrados, deu-se em ritmo de emergência. Fernanda Montenegro adoeceu subitamente, com uma crise renal, e Sérgio Britto pediu que Zilka a substituísse. Sem saber que se tratava do papel principal, a atriz aceitou a tarefa e preparou-se em tempo recorde: teve apenas duas horas para decorar texto e marcação para a apresentação ao vivo. Com o êxito na substituição, sua reputação em televisão cresceu e, a partir daí, recebeu diversos convites. Em entrevista ao Memória Globo a atriz disse: “Após a apresentação, eu fui embora para casa. Eu tive uma dor de cabeça durante oito dias. (..) O Sérgio Britto me agradeceu e disse: ‘Eu só tenho uma forma de lhe agradecer: é um dia lhe dar um grande papel para senhora fazer, mas ensaiando conosco a semana inteira’. Eles estavam em São Paulo nessa época. Quando voltaram para o Rio, ele cumpriu a promessa. E montou 'O Primo Basílio' e eu fazia a Juliana, a empregada”.
'Irmãos Coragem 1ª versão': cena em que Maciel (Ênio Santos) vem contar à Sinhana (Zilka Sallaberry) que seu filho João (Tarcísio Meira) está bem. Com Márcia (Glória Menezes).
Início na Globo
Em 1967, Zilka Sallaberry saiu da Tupi e passou a integrar o elenco das telenovelas da Globo. Seu primeiro papel foi o de uma mendiga em 'A Rainha Louca' (1967), de Glória Magadan. “Eu realmente entrei com o pé direito na Globo (…). Eu, que ia fazer um papelzinho que ia entrar e ia sair, fui até a última cena”, contou ao Memória Globo. Tornou-se mais conhecida, porém, a partir de sua atuação em duas novelas da autora Janete Clair: 'Sangue e Areia' (1967) e, sobretudo, 'Irmãos Coragem' (1970). Nesta novela, um marco da teledramaturgia brasileira, a atriz viveu Sinhana, mãe dos três irmãos Coragem, interpretados por Tarcísio Meira (João), Cláudio Cavalcanti (Jerônimo) e Cláudio Marzo (Duda).
Nos anos seguintes, Zilka Sallaberry viveria outros papéis marcantes, como em 'O Bem-Amado' (1973), de Dias Gomes. Primeira novela a cores da TV brasileira, que imortalizou o ator Paulo Gracindo no papel de Odorico Paraguaçu, 'O Bem-Amado' apresentou Zilka como a delegada Donana Medrado, inimiga de Odorico, com quem disputa – e perde – as eleições para a prefeitura de Sucupira.
Merece destaque também a Kiki Vassourada, personagem vivida pela atriz na novela 'Corrida do Ouro' (1974), de Lauro César Muniz. Por não abrir mão de sua liberdade, a personagem chega a abandonar a própria filha recém-nascida, para voltar 30 anos depois, pilotando uma motocicleta.
'Sítio do Picapau Amarelo'
Em 1977, Zilka Sallaberry assumiu o papel mais longo de sua carreira: a Dona Benta, do programa infantil 'Sítio do Picapau Amarelo', que representou até 1986. Apesar de ter relutado de início, por achar que seu temperamento agitado não combinava com o perfil da personagem, aceitou o papel, coincidentemente, no momento em que nascia sua primeira neta. Aos 44 anos de carreira, a imagem de Zilka Sallaberry passaria a ser tão profundamente identificada com a personagem de Monteiro Lobato que, anos após o final do programa, a atriz continuava sendo reconhecida nas ruas como Dona Benta. “Eu não acreditava que eu pudesse fazer Dona Benta. (..) Eu pedi para o Geraldo Casé [diretor] para parar a gravação na hora para eu ver como estava ficando. Ele disse: “Claro, imagina. Como não?” Não esqueço nunca. A primeira cena minha, em que eu apareço no 'Sítio', eu estou sentada no alpendre fazendo crochê, e a Anastácia vem com os ovos da galinha para eu ver se estão bons. No que ela veio, aí eu respirei aliviada. Respirei aliviada. Eu disse: ‘Meu Deus, como pode?’ “, contou.
Retorno às novelas
Seu primeiro papel em novelas, após o fim do 'Sítio do Picapau Amarelo', foi o de uma cigana em 'O Outro' (1987). Para compor melhor o personagem, Zilka Sallaberry passou a conviver com ciganas em Copacabana, o que alimentou o mito de que ela própria teria raízes ciganas. Em 1990, viveu a Dona Marocas, mãe do policial federal Aristênio Catanduva (Tarcísio Meira), protagonista da novela 'Araponga' (1990), de Dias Gomes, Lauro César Muniz e Ferreira Gullar.
'Sítio do PicaPau Amarelo - 1ª versão' (1977): cena em que Dona Benta (Zilka Sallaberry) ensina como fazer o doce de talhada para as crianças. Com Narizinho (Rosana Garcia), Pedrinho (Júlio Cézar) e Emília (Dirce Migliaccio).
Em 1992, Zilka Sallaberry rompeu de vez com a imagem de Dona Benta ao interpretar a dona de bordel Veneranda, da minissérie 'Tereza Batista', adaptada por Vicente Sesso. Depois dessa minissérie, a atriz fez uma participação em 'Engraçadinha… Seus Amores e Seus Pecados' (1995), escrita por Leopoldo Serran e, em 1998, retornou às novelas como a Bá, no remake de 'Pecado Capital', escrito por Gloria Perez – papel feito por Elza Gomes na primeira versão.
Nos anos 1990, Zilka Sallaberry participou de quatro episódios do programa 'Você Decide: Remédio Duvidoso' (1995), sob a direção de Tizuka Yamasaki; 'Estrada do Amanhã' (1997), dirigido por Fabio Sabag; 'Trabalho Escravo' (1998), dirigido por Mário Márcio Bandarra; e 'Um Outro em Meu Lugar' (1999), sob a direção de Roberto Farias.
Em 2002, Zilka Sallaberry fez uma participação especial nos primeiros capítulos da novela 'Esperança', de Benedito Ruy Barbosa, que acabou sendo seu último trabalho na televisão.
Em 2006, a atriz foi homenageada pelo Centro de Pesquisa e Estudo do Teatro Infantil (Cepetin) com a criação do Prêmio Zilka Sallaberry de Teatro Infantil, com o objetivo de valorizar a produção de qualidade do teatro para criança, premiando profissionais e espetáculos que se destacam no Rio de Janeiro.
EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO
Webdoc sobre a novela 'A Rainha Louca', com entrevistas exclusivas do Memória Globo.
Webdoc sobre o programa 'Sítio do Picapau Amarelo – 1ª versão' com entrevistas exclusivas do Memória Globo.
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A atriz morreu no dia 10 de março de 2005, aos 87 anos, no Hospital Samaritano, no Rio de Janeiro, de insuficiência respiratória.
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