Susana Naspolini

Natural de Criciúma, Santa Catarina, Susana Naspolini começou a carreira em emissoras do estado. No Rio de Janeiro, foi repórter da GloboNews e dos telejornais locais da TV Globo, onde passou a apresentar o quadro de jornalismo comunitário 'RJ Móvel', do 'RJ1'. Morreu em São Paulo, em 25 de outubro de 2022.

Por Memória Globo


Susana Naspolini escolhia, diariamente, ser feliz. Conhecida no Rio de Janeiro por denunciar de forma espontânea, bem-humorada e assertiva o descaso do poder público em áreas carentes, a jornalista dizia que a vida é feita de perdas e percalços. Cabe a cada um escolher como encarar suas lutas – e ela sabia como enfrentar as dela, o fazia com muito otimismo e bom humor. No Grupo Globo desde 2002, quando se tornou repórter temporária da GloboNews, Naspolini passou pelo Canal Futura, pela produção da Editoria Rio, da TV Globo, e pela equipe de reportagem dos telejornais 'Bom Dia Rio' e 'RJTV'. Em 2008, em sistema de rodízio com outros repórteres, começou a apresentar o quadro 'RJ Móvel', parte do 'RJ1', o que mudaria completamente sua carreira. Com um calendário de cobrança em mãos, Susana se colocava no lugar do outro para entender suas queixas. Era costume testar o asfalto das ruas pedalando bicicletas infantis e andando de skate, bem como expor problemas de saneamento básico navegando de barco em valas de esgoto. Seu jeito divertido mobilizava pessoas onde quer que estivesse.

Meu trabalho como repórter é onde eu sou feliz. Sou uma repórter otimista, sempre acho que vai dar jeito, que as coisas vão melhorar. Acredito nas boas intenções das pessoas. Sou incansável. Acredito que o bem sempre prevalece.

Susana Dal Farra Naspolini Torres nasceu no dia 20 de dezembro de 1972, em Criciúma, Santa Catarina. Filha da professora Maria Dal Farra Naspolini e de Fúlvio Naspolini, sócio de uma transportadora de cargas, Susana sempre sonhou em ser repórter. Nas matérias fictícias que encenava quando criança, denunciava buracos na rua de sua casa, com uma escova de cabelos em punho, no lugar de um microfone. Quando cresceu, a brincadeira ficou séria, prestou vestibular para Comunicação Social na Universidade Federal de Santa Catarina e passou. Um ano depois, em 1991, conseguiu uma vaga disputada no curso de teatro do Tablado, no Rio de Janeiro. Convenceu os pais de que não poderia desperdiçar essa oportunidade, outra paixão. Trancou temporariamente a graduação e se mudou para a capital fluminense. Poucas semanas depois de se assentar em um quarto alugado no bairro do Leme, na Zona Sul da cidade, a vida a surpreendeu pela primeira vez.

Susana tinha apenas 18 anos quando descobriu que estava com um câncer nas células do sistema linfático. Tudo mudou. Fez o tratamento da doença em São Paulo. Era a primeira de cinco batalhas contra o câncer que teria pela frente. Dezenove anos depois, aos 37, foi diagnosticada com um tumor maligno na mama e, logo em seguida, com um câncer na tireoide. Em 2016, enfrentou mais uma vez outro câncer de mama, que em 2020 evoluiu para uma metástase nos ossos.

De volta a Florianópolis, em 1992, retomou o curso de Jornalismo. Aos 19 anos, começou a trabalhar como repórter do SBT. Do teatro, levou a espontaneidade diante do público, sua principal marca anos mais tarde.

— Foto: Renato Velasco/Memória Globo

Em 1994, foi convidada pela RBS para apresentar o 'Bom Dia Santa Catarina' em Criciúma, onde a afiliada da Globo abria uma nova sede. Naspolini voltou a morar com os pais. Três anos depois, foi transferida para Joinville, onde se tornou editora-chefe e apresentadora do jornal local.

Era uma festa esse trabalho de praça, que também é uma loucura. Eu pautava os repórteres, editava texto e vídeo, me maquiava, apresentava o jornal. A gente acaba aprendendo a fazer um pouco de tudo, se virar nos apertos.

Foram dois anos até se tornar repórter da TV Vanguarda, afiliada da Globo em São José dos Campos, onde passou apenas dez meses. Em 2002, Susana Naspolini pediu demissão e se mudou para o Rio de Janeiro. Ela conhecera, em 2001, o narrador esportivo Maurício Torres, por quem se apaixonara e decidira se casar.

Entrada na Globo

Maurício Torres trabalhava no Esporte da Globo, no Rio. Em 2002, indicou Susana para cobrir uma licença, como repórter, na GloboNews. Ela permaneceu na função até 2004. Dessa época, lembrava de não ter rotina fixa – era realocada para o horário disponível no dia. Para o canal de notícias 24h por dia, é necessário fôlego e agilidade, a produção é intensa. Para Naspolini, a cobertura que mais a marcou nesse período foi a de um surto de dengue na cidade do Rio de Janeiro.

Foi uma cobertura exaustiva em todos os sentidos, era um problema que estava matando gente, tinha que ficar em cima, fazendo matéria. No Dia D do combate à dengue, fui gravar na Central do Brasil. Era tanto calor que a sola do sapato derreteu nos trilhos. Fiquei descalça. A gente aprende muito.

Em 2004, depois de dois anos nessa experiência, Susana passou seis meses no Canal Futura, realizando um trabalho bem diferente do que ela estava acostumada. Eram matérias gravadas, com mais tempo de realização, sobre temas sociais. Dali, seguiu para uma assessoria de imprensa, até receber um convite do então chefe de produção da Editoria Rio da Globo, Juarez Passos.

Editoria Rio

Na Editoria Rio, caiu direto na produção do quadro 'O Eleitor Quer Saber', exibido no 'RJ1'. Era 2004, ano eleitoral, e a ideia era mostrar os problemas da cidade que mais afligiam o público e elaborar perguntas para os candidatos à prefeitura. Passada a eleição, Naspolini voltou a ser repórter.

O jornalismo local é minha paixão. É sobre a cidade em que a gente mora, é onde a gente cumpre nossa missão de jornalista, que é fazer o mundo melhor, ajudar as pessoas, contribuir de alguma forma. Só que daí tem de tudo, matérias alegres, tristes, violência, saúde.

Para dar conta dos problemas da cidade, Susana Naspolini encarava todo tipo de desafio na reportagem. Rodava a zona metropolitana do Rio de Janeiro para alimentar quadros e colunas, como 'Disque-Reportagem' (2005), 'Direito do Cidadão' (2005), 'RJ nas Escolas' (2007), e séries, como 'Túneis' (sobre o estado de túneis do Rio de Janeiro, 2006), 'Ônibus do RJ' (2006) e 'Ensino Público de Qualidade' (2007). Desde essa época, seu jeito brincalhão a aproximava da população.

'RJ Móvel'

A primeira vez que Susana apresentou o 'RJ Móvel' foi em 2008. Naquele ano, o quadro comunitário do 'RJ1' já nutria suas principais características: percorria bairros e municípios da região metropolitana para denunciar problemas que afligiam a vida da população, cobrava as autoridades responsáveis e marcava no calendário data de retorno para ver se o problema fora resolvido. O que mudou com a entrada de Susana foi a forma de fazê-lo: “Antes, a estrutura das matérias era diferente, era tradicional, com off – o texto que o repórter grava em áudio e depois cobre com imagem –, passagem, entrevista com morador, depois o 'ao vivo' com autoridade dizendo que ia solucionar o problema. Isso me incomodava. Porque se ligaram para a gente ir lá, tinha que mostrar isso. A gente chegando e a ‘dona Maria’ indo lá nos mostrar o problema. Porque ela ligou, ela tem que aparecer mais. Se oferece um café, vamos lá tomar café com ela, a vida daquelas pessoas está na casa delas”, contou.

O improviso foi acrescido de bom-humor. Se reclamavam que não dava para andar em uma rua esburacada, inundada, ou numa ponte que está prestes a cair, Susana Naspolini queria fazer testes ao vivo que reiterassem a denúncia. Andar de bicicleta, entrar em barcos, contornar crateras, pular poças de esgoto. Nada disso era programado, tudo surgia na hora – ela queria estar onde as pessoas estavam e, para isso, não podia se preocupar com a aparência e a postura.

'RJ Móvel' em Realengo, 30/12/2016

'RJ Móvel' em Campo Grande, 24/09/2019

'RJ Móvel' em Campo Grande, 07/01/2020

É o meu jeito de trabalhar, podem, ou não, gostar. Sou muito feliz fazendo, me sinto em casa. No outro dia, minha filha falou: ‘Mãe, sua blusa estava toda suada’. Respondi: 'Filha, estava gravando em Bangu, meio-dia, não vai ter suor?'. Tem suor, tem o cafezinho; se eu tiver andando e tropeçar, vai entrar o tropeço; se eu sentar na calçada pra falar com alguém, vai mostrar; ah, esse ângulo tem mais sol do que o outro? Não tem problema, é ali que a gente está.

A partir de meados de 2013, Susana se tornou um dos principais nomes do 'RJ Móvel' e seguiu fazendo com seriedade o trabalho pelo qual era tão apaixonada. Segundo ela, a persistência é a arma da profissão – ela se dizia incansável, acreditava que sempre há solução para os problemas, restava cobrar, insistir, buscar. Não à toa, era característica tanto dela quanto do quadro retornar inúmeras vezes a uma mesma localidade para se certificar de que um problema tinha, de fato, sido resolvido – foi, por exemplo, 18 vezes à comunidade da Muzema para denunciar um alagamento de esgoto. Em 31 de outubro de 2019, a repórter chegou a pendurar ao vivo uma melancia no pescoço para que, “quem sabe assim, a prefeitura enxergue” a lama que prejudicava a vida dos moradores.

Susana Naspolini se afastou do 'RJ Móvel' em 2009, 2016 e 2020 para fazer tratamento de câncer, em São Paulo. Em maio de 2014, perdeu o marido Maurício Torres. O narrador e apresentador esportivo morreu de falência múltipla de órgãos decorrente de quadro infeccioso.

— Foto: Frame de vídeo/Globo

Outros trabalhos

Apesar de ser conhecida pelas reportagens de prestação de serviço e cobrança das autoridades, Susana Naspolini cobriu diversos tipos de eventos, problemas e incidentes no Rio de Janeiro. Conforme ela mesma lembrou, o telejornalismo local tem de tudo: “matérias alegres, tristes, violência saúde”.

Entre as coberturas de maior destaque em sua trajetória profissional, estão as chuvas no Rio de Janeiro, em abril de 2010 – quando foi enviada para investigar a situação no Morro dos Prazeres, em Santa Teresa, região central da cidade; e abril de 2019 – ocasião em que mostrou de perto a situação dos deslizamentos na Avenida Niemeyer, que liga a Zona Sul à Barra da Tijuca, na Zona Oeste. Participou ativamente da cobertura da ocupação policial na Vila Cruzeiro, em 2011, que rendeu ao Jornalismo da Globo o Prêmio Emmy Internacional. E, de forma bem diferente, da cobertura do Rock in Rio, em 2013, quando ficou pendurada por um cinto em um guindaste, podendo ver o evento e a cidade do alto, “que nem um passarinho”.

Isso sem falar nas coberturas anuais de carnaval – onde atuava nas arquibancadas, cobrindo a reação popular aos desfiles das escolas de samba na Marquês de Sapucaí. No réveillon, Susana costumava ser escalada para acompanhar o trabalho realizado por profissionais nas areias da Praia de Copacabana, na manhã e tarde do dia 31 de dezembro.

'Globo Comunidade'

Em maio de 2017, Susana Naspolini assumiu outro desafio, para tocar em paralelo com o 'RJ Móvel': apresentar o 'Globo Comunidade' no Rio de Janeiro. O programa é um boletim informativo com material produzido pelas editorias locais e vai ao ar na manhã de domingo. Na visão de Naspolini, o 'Globo Comunidade' era uma oportunidade de se aprofundar em temas que estavam em pauta e que tiveram pouca visibilidade no noticiário da semana.

A estreia de Susana Naspolini no 'Globo Comunidade', 20/05/2017

Em junho de 2019, Susana Naspolini lançou o livro 'Eu Escolho Ser Feliz', uma autobiografia que enfatiza sua luta contra o câncer e o otimismo que dizia ser seu motor de superação para seguir em frente. A força que a repórter tinha para lidar com os próprios percalços da vida transparecia em seu dia a dia, na hora de ajudar os outros a enfrentarem seus problemas. Era, como ela dizia, uma escolha. “Vivemos em um mundo dinâmico”, escreveu, “mudanças acontecem com ou sem a nossa participação. Cabe a nós, só a nós, escolhermos como vamos nos comportar”.

Susana Naspolini morreu em São Paulo, em 25 de outubro de 2022, após perder a batalha para o câncer.

EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO

Em entrevista exclusiva ao Memória Globo, a jornalista Susana Naspolini fala sobre o início da sua carreira. 

Em entrevista exclusiva ao Memória Globo, a jornalista Susana Naspolini fala sobre o início da sua trajetória na Globo. 

Em entrevista exclusiva ao Memória Globo, a jornalista Susana Naspolini fala sobre a importância do jornalismo local. 

Em entrevista exclusiva ao Memória Globo, a jornalista Susana Naspolini fala sobre a missão do 'RJ Móvel', quadro do 'RJ'.

Em entrevista exclusiva ao Memória Globo, a jornalista Susana Naspolini fala sobre a evolução do formato do 'RJ Móvel, quadro do 'RJ'

Em entrevista exclusiva ao Memória Globo, a jornalista Susana Naspolini fala sobre seu ofício de jornalista. 

Fontes