Marieta Severo

A atriz carioca Marieta Severo estreou na Globo em 1966 e atuou em mais de 20 novelas e minisséries da emissora.

Por Memória Globo


“Eu era a contadora de histórias oficial da escola. Quando faltava uma professora em outra turma, falavam: ‘Chama a Marietinha para contar história!’ O que eu fazia naquela época tem a ver com o que faço hoje: contar histórias”, lembra. De lá para cá, a atriz já atuou em mais de 30 peças de teatro, 40 filmes e 20 novelas e programas na televisão. Incluindo a série A Grande Família (2001), onde ela deu vida à doce Dona Nenê, durante 14 temporadas. Filha de um advogado e de uma professora de inglês, Marieta Severo até sonhava ser bailarina – ela estudou balé clássico durante muitos anos –, mas mantinha os pés no chão. Sem ter ninguém para lhe servir de exemplo na família, não pensava seriamente em seguir a carreira artística. Estudou para ser professora primária. Mas ao conhecer O Tablado, uma tradicional escola de teatro do Rio de Janeiro, sua real vocação aflorou.

Eu gosto de uma grande história, com um personagem muito bem construído, com material muito bom. E esse material pode estar em qualquer formato. Minha perseguição é sempre a qualidade do que eu faço, seja em televisão, cinema ou teatro.
Marieta Severo em O outro lado do paraíso. Raquel Cunha/Globo — Foto: Globo

Início da carreira

Marieta Severo da Costa nasceu em 3 de novembro de 1946, no Rio de Janeiro. Aos 19 anos, estreou no cinema, com uma participação em Society em Baby Doll (1965), de Luiz Carlos Maciel e Waldemar Lima. No mesmo ano, pisou pela primeira vez no palco num pequeno papel em As Feiticeiras de Salém, de Arthur Miller, com direção de João Bethencourt. A protagonista da peça, Eva Wilma, a indicou para um papel na novela O Sheik de Agadir (1966), de Glória Magadan, na recém-inaugurada TV Globo.

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Webdoc sobre O Sheik de Agadir (1966)

O sucesso foi imediato. Sua personagem era a princesa árabe Éden, que no fim da história se revelava ser também o misterioso assassino Rato. “Nas histórias da Glória Magadan, valia tudo, tinha árabe, nazista. Apareciam mãos usando luvas pretas que enforcavam homens enormes. Acho que escolheram a princesinha porque ninguém podia imaginar que aquela personagem tão frágil pudesse enforcar aqueles homens. Foi uma repercussão enorme. E me jogaram uma pedra quando eu andava por Copacabana”, lembra.

Nessa época, a atriz trabalhou em mais duas novelas da autora, O Homem Proibido (1967), na Globo, e E Nós, Aonde Vamos (1970), exibida pela Tupi. Em seguida, afastou-se da televisão por 13 anos, quando se dedicou exclusivamente ao teatro e ao cinema. O retorno aconteceu em 1983, na minissérie Bandidos da Falange, de Aguinaldo Silva. “Eu fazia a mulher do personagem do Nuno Leal Maia, um bandido que morria. Era uma mulher que usava de tudo para ficar bem na vida”. Depois, fez três novelas em seguida: Champagne (1983), de Cassiano Gabus Mendes, Vereda Tropical (1984), de Carlos Lombardi, e Ti-Ti-Ti (1985), de Cassiano Gabus Mendes. Na última, interpretou Suzana, ex-mulher do costureiro Ariclenes (Luis Gustavo), com quem vivia uma relação de amor e ódio. Em Que Rei Sou Eu? (1989), do mesmo autor, interpretou a voluntariosa Madeleine Bouchet, que deixava de cabelos em pé os conservadores cidadãos do Reino de Avilan. “Essa personagem era o máximo. Ela era realmente uma heroína, pré-feminista, idealista”, diz.

Na novela seguinte, Deus nos Acuda (1992), de Silvio de Abreu, foi a vilã Elvira, uma secretária inescrupulosa. “Eu vou dizer o óbvio: é ótimo fazer vilãs! As vilãs movem a história, carregam as ações, modificam os outros personagens”. Repetiu a dose em Pátria Minha (1994), de Gilberto Braga, como Loretta Pellegrini. “Na primeira cena, ao tomar café, o mordomo lhe pergunta quantas gotas de adoçante deseja. E ela responde: ‘Duas e meia’. Quando li isso, pensei: ‘Oba! Um personagem que diz duas e meia sintetiza tudo que pode vir por aí’. Foi um dos melhores personagens que já fiz”, lembra.

Em 2000, na novela Laços de Família, de Manoel Carlos, Marieta encarnou outra personagem marcante: Alma Flora Pirajá de Albuquerque, uma mulher rica, autoritária e vaidosa que controlava a vida dos sobrinhos Edu (Reinaldo Gianechini) e Estela (Júlia Almeida). Por seu desempenho, recebeu o prêmio de Melhor Atriz concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA). “Manoel Carlos é um observador do ser humano. Alda não era uma vilã, mas uma mulher com personalidade muito forte, muito determinada e sem limites para conseguir o que queria, o que achava que era correto. E tinha uma paixão desenfreada pelo sobrinho”, diz.

As gravações de Laços de Família ainda não tinham terminado quando o diretor Guel Arraes a convidou para integrar o elenco do seriado A Grande Família. De 2001 até o final do seriado, em 11 de setembro de 2014, Marieta interpretou a dedicada dona de casa Nenê, mulher de Lineu (Marco Nanini), mãe de Tuco (Lúcio Mauro Filho) e Bebel (Guta Stresser) e sogra de Agostinho (Pedro Cardoso).

Para a atriz, o maior desafio em dar vida à Nenê foi a responsabilidade em interpretar uma mulher comum, cuja vida não tinha grandes emoções e que representava muito bem a dona de casa brasileira. “Foi um convite irrecusável. Terminei de gravar a novela e, no dia seguinte, às 8h, já estava gravando Dona Nenê. Foi assim, bluft, de um personagem para o outro”, conta. Exibido semanalmente, A Grande Família foi um remake do histórico seriado de autoria de Oduvaldo Vianna Filho e Armando Costa, exibido pela Globo na década de 1970.

Na primeira versão, coube à Eloísa Mafalda dar vida à Nenê. “O que nos deixa orgulhosos é que A Grande Família é a melhor maneira que o brasileiro tem de se ver. A gente mostra uma família que sobrevive com o básico, mas sempre de um jeito positivo, com afeto, amor, compreensão e solidariedade”, diz. Em 2003, o elenco da série sofreu um baque, com a morte do ator Rogério Cardoso, que interpretava o pai de Nenê, Seu Flor. “Foi uma experiência muito louca a gente ter que voltar para aquela casa e não ter mais o pai. A gente se sentava, e a presença do Rogério estava com a gente! Ele vai continuar sempre em A Grande Família”. A série virou filme em 2007, com direção de Maurício Farias.

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Webdoc sobre a novela Laços de Família com entrevistas exclusivas do Memória Globo.

Entrevista exclusiva da atriz Marieta Severo ao Memória Globo, em 31/03/2006, sobre o impacto do falecimento de Rogério Cardoso para o seriado “A Grande Família – 2ª versão”.

Em 2015, a atriz aceitou viver seu primeiro grande desafio na televisão após as 14 temporadas de A Grande Família. Em Verdades Secretas, novela de Walcyr Carrasco, dirigida por Mauro Mendonça Filho, Marieta deu vida à vilã Fanny, dona de uma agência de modelos que administrava o escuso “book rosa”. O negócio era uma das principais fontes de renda da empresa e envolvia a contratação de modelos iniciantes como prostitutas de luxo – as jovens eram forçadas a aderir ao sistema para ingressar no mundo da moda. Fanny era perversa e sarcástica. Apaixonada pelo bonitão Anthony (Reynaldo Gianecchini), a quem ela sustentava. No fim da trama, ao ser abandonada pelo amado, se envolve com Leo (Raphael Sander).

Verdades Secretas, que também abordou outros lados do submundo da moda (como o consumo de drogas), foi sucesso de audiência na faixa das 23h. O público, no final, torceu para que Fanny tivesse um final feliz, ainda que fosse uma das principais vilãs da trama.

Em 2017, a atriz interpretou a vilã Sophia Montserrat, uma poderosa empresária, em O Outro Lado do Paraíso. A personagem criada por Walcyr Carrasco não economizou nas maldades e se tornou uma assassina, usando uma tesoura para dar fim às suas vítimas. Em 2021, deu vida à cozinheira Noca, avó de Lara (Andreia Horta), em Um Lugar ao Sol. Para viver a personagem na trama de Lícia Manzo, Marieta precisou assumir os cabelos brancos.

Verdades Secretas: Último capítulo (Bloco 3)

Cinema e teatro

Mesmo dedicada à televisão, Marieta Severo nunca se afastou do teatro ou do cinema. Para ela, o que importa na vida de um ator é a qualidade do trabalho e não o veículo em que ele expressa sua arte. Uma boa oportunidade pode aparecer em qualquer espaço. “Eu gosto de uma grande história, com um personagem muito bem construído, com material muito bom. E esse material pode estar em qualquer formato. Minha perseguição é sempre a qualidade do que eu faço, seja em televisão, cinema ou teatro.”

Ela atuou em filmes importantes e sucessos de bilheteria como Todas as Mulheres do Mundo (1967), de Domingos Oliveira; Chuvas de Verão (1978) e Bye Bye Brasil (1979), ambos de Cacá Diegues; O Homem da Capa Preta (1986), de Sérgio Rezende; Com Licença, Eu Vou à Luta (1986), de Lui Farias; Carlota Joaquina, Princesa do Brazil (1994), de Carla Camurati; e Cazuza: O Tempo não Para (2004), de Walter Carvalho e Sandra Werneck. Em 2002, recebeu no Festival de Gramado o prêmio Oscarito, pelos 37 anos de carreira dedicados ao cinema brasileiro.

Marieta Severo fez história nos palcos com atuações em espetáculos como Roda Vida (1968), de Chico Buarque, dirigida por José Celso Martinez Corrêa; Ópera do Malandro, outra de Chico Buarque, dirigida por Luís Antônio Martinez Corrêa; No Natal a Gente vem te Buscar (1980), A Aurora da Minha Vida (1982), Um Beijo, um Abraço, um Aperto de Mão (1985) e Cenas de Outono (1988), todas de Naum Alves de Souza (“Eu já tinha alguns anos de carreira, mas, com o Naum, descobri uma expressão minha, um jeito meu”, conta) e A Estrela do Lar (1989), de Mauro Rasi, que a consagrou como a Melhor Atriz do ano, valendo-lhe os prêmios Molière, Shell e Mambembe.

Em 2005, ao lado da amiga Andréa Beltrão, inaugurou o Teatro Poeira, em Botafogo, Rio de Janeiro. Dois anos depois, no palco do Poeira, as duas estrearam o espetáculo As Centenárias, com texto escrito por Newton Moreno especialmente para elas.

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