Henderson Royes

O repórter cinematográfico Henderson Royes nasceu em 1953, no Rio Grande do Sul. Atuou primeiro no Rio de Janeiro e depois em Nova York, onde se radicou. Desde que o programa 'Manhattan Connection' foi criado, há 25 anos, integrou sua equipe de produção.

Por Memória Globo


Henderson José Royes dos Santos veio para o Rio de Janeiro aos 5 anos, em função do trabalho de seu pai. Militar, José Etelvino dos Santos mudou-se para a então capital do país para estudar no Instituto Militar de Engenharia, onde depois foi professor. Na cidade, José Etelvino se estabeleceu com a esposa Ana Royes dos Santos e a família. Desde jovem, Henderson Royes tinha o desejo de morar no exterior. Antes de começar o curso de Comunicação Social na PUC do Rio, em 1972, tentou ser funcionário da Varig, empresa que lhe daria a chance de viajar sem o custo das passagens aéreas. A experiência profissional durou apenas cinco dias, pois o expediente não era compatível com o horário de estudo e ele optou por seguir o curso superior, pensando em fazer carreira em publicidade.

Eu sempre achei que a câmera é a melhor companheira em situações de conflito e perigo. Ela funciona como uma espécie de escudo protetor que te separa emocional e psicologicamente do evento, quando a gente está entre a adrenalina e a tarefa de captar esse momento.

O trabalho na Globo, como repórter-cinematográfico, permitiu que Henderson realizasse seu projeto, com a transferência para Nova York. Nos mais de dez anos em que atuou no jornalismo da emissora, participou de reportagens de impacto, como uma entrevista com Yasser Arafat e as guerras civis de El Salvador e Nicarágua, onde demonstrou coragem e viveu situações de perigo. Trabalhou também com cultura, comportamento e moda, áreas de interesse em que seguiu atuando após sair da Globo, sempre com especial apreço pela qualidade da imagem produzida. Quando estava na PUC, um colega de curso sugeriu um caminho diferente daquele imaginado por Henderson, capaz de mudar seus planos e ser determinante para seu destino. “Antônio Claudio Brasil, que foi cinegrafista da Globo, muito amigo, eu sou padrinho de casamento dele, inclusive, me disse: ‘Olha, já que você quer viajar para o exterior, quem sabe você trabalha comigo na Globo? Porque existem bureaus no exterior e, depois de entrar, você pode se candidatar e até ir para um deles’”, conta.

Sugestão aceita, Henderson foi à emissora e conseguiu uma vaga como assistente de cinegrafista. A carga horária era compatível com o curso, a partir de então pago pela Globo, que havia começado a investir na formação acadêmica de sua equipe. De 1974 a 1977, período em que atuou no Rio de Janeiro, ele destaca as matérias de cultura e comportamento feitas para o 'Jornal Hoje' e o 'Fantástico' como os trabalhos mais importantes. Nessa época, na condição de assistente, viajou pelo Brasil com a repórter Marília Gabriela e o repórter-cinematográfico Henrique Olivier. Fez desfiles de moda com Márcia Mendes e gravou reportagens e entrevistas ao lado de Rubem Braga, Marisa Raja Gabaglia e Nelson Motta.

Quando soube que a Globo tinha a intenção de abrir um escritório em Paris, Henderson matriculou-se em um curso de francês, com a aprovação da direção de jornalismo, formada por Armando Nogueira e Alice-Maria. Mas faltando apenas duas semanas para a transferência, os planos foram alterados e o repórter-cinematográfico acabou indo para Nova York, onde havia uma estrutura montada e sua adaptação seria mais fácil.

Vida em Nova York

Logo após sua chegada nos Estados Unidos, Henderson trabalhou em parceria com os repórteres Hélio Costa e Lucas Mendes. “A primeira matéria de que me lembro foi uma viagem aos vinhedos da Califórnia com o Lucas, para mostrar na época o que estava acontecendo com a vinicultura americana. Passamos 15 dias visitando vinhedos e gravando”, rememora. Se o início pode ser considerado ameno, a cobertura do conturbado momento político vivido na América Central, nos anos seguintes, fez com que o repórter-cinematográfico entrasse na linha de fogo.

Situações de risco

Também com Lucas Mendes, Henderson esteve em El Salvador, em 1979, acompanhando a guerra civil no país.

“Uma vez houve um tiroteio, eu fui atrás, cheguei na área da catedral, encontrei dois corpos na rua, fui me aproximando para filmar e não percebi que atrás de mim havia umas dez pessoas que acharam que estavam seguras comigo, um cinegrafista com uma câmera. Mas logo depois começaram a atirar de novo e a gente teve de se esconder, até que pessoas da Cruz Verde conseguiram nos salvar.”

Com o repórter Luís Fernando Silva Pinto, Henderson viajou para a Nicarágua em 1979, durante o conflito entre sandinistas e o ditador Anastasio Somoza, que acabou deposto. Os dois ficaram no país durante 25 dias, no fim do regime, e passaram por situações difíceis na cobertura. A mais grave foi um ataque da Força Aérea Nicaraguense contra o carro que levava a equipe da Globo e fotógrafos das agências France-Presse e UPI. Todos foram obrigados a sair do veículo correndo e se abrigar onde era possível, enquanto o automóvel e a área em volta dele eram atingidos por tiros vindos do avião.

Reportagem de Luís Fernando Silva Pinto sobre a situação em Manágua, capital da Nicarágua, após a renúncia de Anastasio Somoza. 'Jornal da Globo', 17/07/1979

O escritório de Nova York funcionava como base para viagens, também, a outros continentes. Ainda no ano de 1979, Henderson, Lucas Mendes e o produtor Otávio Escobar ficaram 15 dias no Líbano, à espera de uma entrevista com o líder palestino Yasser Arafat. Durante esse período, foram levados a fábricas onde eram feitas muletas para a população atingida por mísseis israelenses.

O repórter Lucas Mendes entrevista o líder palestino Yasser Arafat. Veja trecho. 'Jornal Nacional', 25/06/1979.

Na volta, os dois fizeram uma escala em Londres e passaram por um susto, hoje visto com bom humor. “A gente tinha uns dez ou 11 rolos de filme, todo material que a gente tinha gravado estava numa caixa. Chegamos em Londres cansados. Mais tarde, no hotel, me lembrei que tinha deixado a caixa no aeroporto. Voltamos correndo, era demissão certa se a gente chegasse sem nada, mas a caixa ainda estava na esteira rodando com outras malas, ninguém tinha tocado nela”, recorda aliviado.

Mudanças tecnológicas

Desde os tempos do filme, Henderson Royes lidou com grandes mudanças tecnológicas na área de geração e transmissão de imagens. Ele se recorda que, no começo de sua trajetória profissional, eram usadas câmeras Bell & Howell, que tinham três lentes movidas à corda, como numa caixinha de música, para coberturas locais, no Rio de Janeiro. Outros equipamentos da época eram as câmeras Cannon Scoopic, à bateria, e a CP 16, de 16mm.

Como os filmes e sua revelação custavam caro naqueles anos, os repórteres-cinematográficos recebiam 100 pés, equivalentes a três minutos e meio, e precisavam filmar pensando na edição de imagens, para economizar. A Ikegami HL-77, câmera de vídeo, só foi usada por ele em Nova York.

“Eu sinto falta do tempo em que o cinegrafista se dedicava às imagens, tinha alguém que se dedicava ao som e às vezes até alguém que cuidava da luz. Hoje a gente tem que fazer tudo isso. Eu acho que, apesar da facilidade do equipamento, a gente perdeu um pouco do detalhe e do controle de qualidade nesse processo”, avalia.

Em seu período como funcionário da Globo no exterior, ficaram marcadas também as coberturas das convenções eleitorais norte-americanas, que mostravam o vigor da democracia no país, em contraponto ao que havia no Brasil, na época uma ditadura, e a cobertura da passagem do papa João Paulo II pela América Central, que mobilizou multidões de católicos em Honduras, Nicarágua, Guatemala e El Salvador.

Saída da Globo

Por questões administrativas, a Globo decidiu, em 1987, reduzir o número de equipes baseadas em Nova York e Washington, e ofereceu a Henderson Royes uma vaga no Brasil. Como ele não tinha interesse em voltar, decidiu sair da emissora e ficar nos Estados Unidos, com a família que estava estabelecida no país. Tornou-se, então, freelancer, trabalhando para a European Broadcast Union (EBU), que enviava aos Estados Unidos equipes de jornalistas de países como Holanda, Bélgica e França. Durante um ano, em 1988, participou como contratado, em horário integral, de uma iniciativa do jornal USA Today em televisão, que acabou não dando certo.

Na área de esportes, fez desde o final da década de 1980 trabalhos para a Globo, ESPN, Fox e Speed Vision, um canal de automobilismo que não existe mais, cobrindo Fórmula 1, Nascar e Fórmula Indy. Em 1992, foi contratado pela Visnews, uma agência de notícias que teve o controle adquirido pela Reuters. Pela agência, passou a prestar serviço para a empresa montada por Lucas Mendes, The Brazilian Network, e acabou contratado pelo repórter, durante dois anos, até se tornar freelancer de novo.

'Manhattan Connection'

A relação com Lucas Mendes fez com que Henderson Royes passasse a participar do 'Manhattan Connection', programa em que atuou por muitos anos.

“No começo, em 1993, eu era responsável por todo o material que era exibido, particularmente assuntos culturais e de entretenimento. Eu fazia muita coisa com a Lúcia Guimarães, a gente cobria museus, galerias de arte, entrevistava arquitetos, artistas, restaurantes. Era muito gostoso também trabalhar com Paulo Francis. Ele era muito inteligente, sempre tinha histórias para contar. Depois de todo esse tempo, o mais importante é que o programa continua sendo uma conversa de botequim entre amigos que sabem muito e têm o que dizer.”

Fonte

Depoimento concedido ao Memória Globo em 01/02/2018.