Helio Alvarez

O repórter cinematográfico Helio Alvarez nasceu no Rio Grande do Sul, em 1958. Na Globo desde 1985, participou de coberturas históricas. Foi gerente de Captação e Edição de Imagens. Deixou a empresa em 2023.

Por Memória Globo


Pelo olhar atento de Helio Alvarez, o telespectador brasileiro acompanhou fatos marcantes na conjuntura nacional e internacional ao longo dos últimos 30 anos. A queda do Muro de Berlim, os atentados de 11 de setembro, a primeira eleição do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, a guerra na Caxemira e o incêndio da boate Kiss, no Rio Grande do Sul, foram alguns deles. Alvarez rodou o mundo. Da Nicarágua ao Afeganistão, esteve presente em entrevistas memoráveis como a feita, em 1993, pelo jornalista Geneton Moraes Neto (falecido em agosto de 2016), com James Earl Ray, assassino do líder negro Martin Luther King.

“Para o registro jornalístico acho que não há melhor profissional que o repórter-cinematográfico da Globo. Ele está sempre no lugar certo e na hora certa. É um diferencial reconhecido não só no Brasil, mas fora também.”

Início na publicidade

Helio Santos Alvarez é filho do comerciante Helio Cezar Martins Alvarez e da dona de casa Carmem Maria Santos de Alvarez, estudou Comunicação Social na PUC-RS, com ênfase em Publicidade e Propaganda. Fez cursos de roteiros, direção de atores, fotografia, direção de fotografia e gestão de Business for Film and Television na FGV, o que já apontava seu interesse pelo audiovisual.

Helio Alvarez começou sua vida profissional ainda na faculdade em uma rádio de Porto Alegre que estava mudando a programação. Ele assumiu a missão de sugerir um novo perfil, voltado para o público jovem, implantando uma grade roqueira. De lá, passou a trabalhar na RBS – afiliada da Globo no Rio Grande do Sul –, no departamento de produção de comerciais. Aos 19 anos, foi assistente de produção, produtor, switcher produtor (era como se chamava o Diretor de TV na RBS) e diretor de comercias na Central Gaúcha de Produções de Comercias TV. “Fiz comerciais com os Trapalhões, Jô Soares e Chico Anysio. Nessa época, eles iam ao Rio Grande do Sul e gravavam num único dia cerca de 20 comerciais. O Chico Anysio só ia trocando de personagem: enquanto ele ia se maquiar e fazer a caracterização do personagem, a gente mudava o cenário e gravava com ele de novo”, conta.

Helio começou a trabalhar na Globo no escritório de Nova York — Foto: Renato Velasco / Globo

Na RBS, Helio tinha acesso aos mais modernos equipamentos audiovisuais da época, lançados no final dos anos 1970. Seu contato com o jornalismo ainda era escasso, pois o departamento de produções de comerciais funcionava em períodos alternativos, como a madrugada, para aproveitar os horários livres de estúdio para gravação. Em 1977, ele saiu da emissora aproveitando o “boom” do mercado de publicidade. Passou por empresas como Escala Propaganda e Olho Mágico Produções Artísticas, onde trabalhou por muitos anos, praticamente sem tirar férias.

Nova York

Alvarez passou por um período durante o qual cresceram as inquietações que o levaram a caminhos mais autorais. Em paralelo com o trabalho no mercado publicitário começou a fazer filmes em Super-8 e curtas em 35mm. Em 1985, decidiu morar em Nova York. Para ele, a cidade reunia todo acesso ao conhecimento que o faria se expandir pessoal e profissionalmente. Com o dinheiro acumulado como publicitário, comprou sua passagem para um período sabático em que desenvolveu projetos pessoais.

No mesmo ano, trabalhou como freelancer para as TVs Globo e Manchete, simultaneamente. Na Globo, começou como operador de som, vaga disponível na época, na qual pôde usar seu conhecimento técnico no jornalismo. Viajou pelos Estados Unidos, produzindo reportagens para o 'Jornal Hoje', 'Bom Dia Brasil' e 'Jornal Nacional', além do 'Fantástico'.

Fui picado pelo jornalismo, larguei tudo para virar jornalista. Havia as reuniões de pauta, onde era decidido qual matéria era mais relevante para o Brasil. Matérias de relevância internacional ou relacionada ao Brasil eram as escolhidas, e a prioridade no início era o 'Jornal Nacional'.

Ele explica que as pautas variavam dependendo do jornal para onde eram enviadas: "O 'Jornal Nacional' é mais hard news, tem que ser mais sucinto. No 'Jornal da Globo' cabe mais a análise, economia. 'Jornal Hoje' é mais matéria de comportamento. Quando eu trabalhei com o Paulo Francis a gente fazia mais matéria de cultura com os comentários dele. O Renato Machado era o editor-chefe do 'Bom Dia Brasil', e ele gostava de matérias sobre ópera, exposições, então as pautas variavam muito."

Pouco tempo depois, Helinho, como é chamado pelos colegas de trabalho, saiu da Globo e passou um ano – de 1986 a 1987 – cobrindo Fórmula Indy pela TV Bandeirantes. Nesse período trabalhou também para as agências de notícia Reuters, WTN, BBC e EBU (European Broadcasting Union). Em 1988, integrou uma segunda equipe de jornalismo, como cinegrafista da Manchete nos EUA. Pela emissora, cobriu a queda do Muro de Berlim, em 1989: “Gente com picareta, com martelo, com enxada, todo mundo ia lá para perto do muro, para bater e fazer um buraco. E a gente ficava ali o dia inteiro, fazendo matérias e acompanhando o que estava acontecendo. Era uma sensação única, a gente sabia que estava fazendo história”.

Retorno para a Globo

Em 1992, com o fechamento do escritório da Manchete em Nova York, Helio voltou a atuar como freelancer e retomou o contato com a Globo. Passou a fazer trabalhos frequentes até voltar definitivamente ao escritório norte-americano. Foi um período de inovação tecnológica, com facilidade de acesso à transmissão via satélite e melhores equipamentos, quando houve a substituição do U-Matic pela Beta, o que gerou melhor qualidade de imagem e edição. A linguagem de videoclipe chegava ao jornalismo, mais ágil e dinâmica, com mais cortes, a câmera mais solta, na mão.

As novidades se sucederam. “O 'Fantástico' sempre foi um bom laboratório para experimentar novas linguagens. Fizemos muitas reportagens diferentes. Um exemplo é a matéria sobre o jogador de basquete Michael Jordan. Tínhamos uma entrevista muito curta com ele. Para crescer a reportagem, aproveitamos material dele jogando, dos filmes e comerciais que ele fazia, criamos uma bela montagem e brincamos com o texto sobre ela. Ficou muito bom”, avalia.

Testemunha ocular da História

Na Globo, Helio participou de reportagens importantes, como a entrevista com James Earl Ray, assassino do líder negro Martins Luther King, acompanhando o repórter Geneton Moraes Neto, em 1993. No ano seguinte, esteve na cobertura do terremoto que devastou Los Angeles. “Nunca tinha presenciado um terremoto que tinha acabado de acontecer, e a gente chegou lá já trabalhando. Achamos um hotel japonês chamado Ana, que tinha sido projetado para resistir a terremotos. Ninguém queria ficar no alto, mas não teve jeito. E, para piorar, alguém no hotel virou e falou assim: ‘Faz o seguinte, pega as moedinhas e coloca na cabeceira, se tremer aquela coisa vai cair, aí você sai correndo.’ Então eu empilhava as moedinhas na cabeceira… teve um dia que eu estava dormindo, e aí não foram só as moedinhas que estavam caindo, todo o banheiro estava caindo! Os azulejos voaram todos, foi uma coisa tipo Poltergeist, tomei um susto.”

Helio acompanhou Geneton Moraes Neto na entrevista com o assassino de Martin Luther King, em 1993

É desse período também a entrevista exclusiva do subcomandante Marcos, líder do Exército Zapatista de Libertação Nacional, no México. Quatro anos depois, Helio Alvarez esteve em Bagdá para reportagens sobre o acordo de paz entre o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, e o governo do Iraque. Seria uma viagem como outra qualquer caso a equipe não tivesse ultrapassado a barreira som.”

Quando a notícia da possibilidade da entrevista chegou, o secretário já tinha ido pra Bagdá. Avisaram que nós tínhamos perdido a oportunidade. Nossa única chance era chegar no Chipre em 38 horas para embarcar em um avião da ONU que levaria mantimentos e alguns jornalistas para Bagdá. E só tinha um jeito de chegar lá. De Concorde até Londres e de lá para Nicósia no Chipre. Viajei e foi bom, até escrevi um crônica sobre isso que está no site do 'Jornal da Globo'.” Em 1999, o jornalista participou da cobertura de um acidente nuclear no Japão, o Tokaimura. Reportagens especiais também foram muitas: em 2000, Alvarez acompanhou Ana Paula Padrão e Guta Nascimento ao Afeganistão para uma série exibida no 'Jornal Nacional' e, no mesmo ano, esteve no Iraque com Edney Silvestre, em uma cobertura especial sobre os dez anos da Guerra do Golfo.

Atentado terrorista de 11 de Setembro

Para o repórter-cinematográfico, um dos fatos mais marcantes que cobriu foram os acontecimentos do 11 de Setembro. Na ocasião, ele estava com o repórter Jorge Pontual no aeroporto de LaGuardia, em Nova York, pronto para embarcar para Washington, quando soube do choque do primeiro avião com uma das torres do World Trade Center. Ele lembra que foi muito difícil cobrir a tragédia: “Era tudo muito emocionante, o tempo todo, e a gente andava com os sentimentos à flor da pele.” Alvarez e Pontual souberam pelo rádio que a torre tinha desmoronado. Eles estavam dentro de um táxi.

“O motorista parou o carro no meio da rua, tirou uma bíblia de dentro do porta-luvas e começou a rezar… se ajoelhou na rua e começou a rezar. Pontual e eu nos olhamos, sem saber o que fazer, não sabíamos se interrompíamos a oração dele, não sabíamos o que fazer. A visão era surreal. Era um silêncio, e o céu super azul, e lá no sul da ilha aquela nuvem de fumaça. Uma consternação, todo mundo em estado quase catatônico, rumores da terceira guerra mundial, ataque nuclear. Quando a gente chegou na Times Square, depois de uma longa caminhada, a situação era caótica, nenhum ônibus, nenhum trem saía de Manhattan. Era tanto trabalho que achávamos que não conseguiríamos seguir adiante. Mas aí você vai criando um mecanismo de proteção. Você se emociona, mas você continua trabalhando, vai fazendo o seu trabalho.”

Volta ao Brasil

Helio Alvarez voltou ao Brasil logo após os atentados, em 2002. Na chegada, teve como desafio cobrir a primeira eleição do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. “No dia em que ele ganhou a eleição, fizemos a primeira entrevista com o Lula. Eu e [Fernando] Gueiros fomos para o hotel, porque existia a possibilidade de o Lula dar uma entrevista para o 'Fantástico'. Estávamos nós, toda a cúpula do PT numa sala e a imprensa toda do lado de fora esperando o presidente chegar. Botamos uma cadeira, uma bandeira do Brasil na parede como fundo e essa foi a sua primeira entrevista como presidente eleito”, recorda.

As viagens não pararam: no mesmo ano em que retornou ao país, Helio participou da série no 'Jornal da Globo' de cinco reportagens com a repórter Ana Paula Padrão chamada Continente dos Excluídos, sobre a África; e em 2006 esteve com William Waack na série o Desafio do Irã. Rodou muito o Brasil também: foi integrante da equipe da Caravana JN, com a qual viajou o país por 65 dias em um ônibus, tendo Pedro Bial como repórter. “Teve uma matéria que a gente foi fazer no interior do Rio Grande do Sul, em uma escola, e o Bial se colocou como aluno, fez perguntas para a professora e jogava bolinha de papel na criançada. Foi um sucesso.”

Helio foi integrante da equipe da Caravana JN, com a qual viajou o país por 65 dias em um ônibus, tendo Pedro Bial como repórter, em 2006

Novos desafios

Helio Alvarez assumiu uma nova função a partir de 2011: a de Gerente de Captação e Edição de Imagens. Seu desafio passou a ser dar unidade ao trabalho de editores de imagem e repórteres cinematográficos, capacitando-os e oferecendo feedbacks sobre seus trabalhos. “A gente começou a fazer workshops, conversar sobre a narrativa. Antes, os editores de imagem só se envolviam no processo quando o material chegava à ilha de edição. Agora, eles se envolvem com o material antes, sendo capazes de organizar o fluxo de trabalho do ponto de vista jornalístico junto ao editor de texto, junto ao editor-chefe daquele telejornal. Também aproveitamos a mudança tecnológica – saímos da edição linear para edição não linear – e fizemos um trabalho de qualificação de todos os profissionais”, finaliza.

Ao longo dos anos, como Supervisor de Cinegrafia e depois como Gerente de Captação e Edição de Imagens, participou das coberturas das visitas do Papa Bento XVI e do ex-presidente americano Barack Obama ao Brasil; do acidente com o avião da TAM no aeroporto de Congonhas; dos casos Isabella Nardoni e Eloá; do incêndio na boate Kiss; das manifestações de 2013; da Copa do Mundo no Brasil e das eleições de 2014 e das Olimpíadas do Rio em 2016.

Helio Alvarez deixou a emissora em abril de 2023.

Fonte

Depoimentos concedidos ao Memória Globo em 13/10/2014 e 07/05/2019.