A paulistana Débora Susan Duke não tinha completado 6 anos quando estreou na televisão, no seriado Ciranda Cirandinha, na extinta TV Tupi. Poderia ser mais um caso de atriz precoce, não fosse ela uma Duarte, família que há três gerações se dedica à arte de representar, seja na telinha, na tela grande ou nos palcos. Seu padrasto chama-se Lima Duarte. Sua mãe, Marisa Sanches, era atriz. E suas duas filhas, Paloma e Daniela, como era de se esperar, também são do ramo. Débora Susan Duke, a Débora Duarte, nasceu em 2 de janeiro de 1950, e já atuou em mais de 30 novelas, cinco minisséries e diversos especiais.
Início da carreira
Ainda que fossem tempos difíceis, sob o ponto de vista econômico, Débora guarda ótimas lembranças da época em que trabalhou na TV Tupi: “Era uma grande escola. Como tinha gente talentosa lá. Dá uma certa nostalgia falar, porque era uma época muito rica em companheirismo. Também era mais artesanato, não era tanto indústria. Era ao vivo, aconteciam coisas engraçadas”.
'Beto Rockfeller' (1968), escrita por Bráulio Pedroso, com direção de seu padrasto, Lima Duarte, foi um dos trabalhos mais importantes e marcantes de Débora Duarte na TV Tupi. Na trama, a atriz viveu Lu, namorada de Beto, interpretado por Luis Gustavo, e o papel lhe rendeu o Troféu Imprensa e o Troféu Roquette Pinto de melhor atriz. Além disso, também um convite para atuar em seu primeiro longa-metragem, 'Celeste', na França. “Eu já estava gravando 'As Bruxas', um seriado de Ivani Ribeiro, quando me convidaram para fazer um filme na França. Eu nunca tinha feito cinema, muito menos falando em francês!”
Débora Duarte estreou na Globo em 1972. Antes disso, além da Tupi, atuara também na Record, onde gravou 'Editora Mayo, Bom Dia' (1971), de Walther Negrão. Foi contratada pela Globo para protagonizar a novela 'Bicho do Mato', de Chico de Assis e Renato Corrêa e Castro. “Foi minha primeira novela na Globo. Aliás, nada mais apropriado, pois eu era um bicho do mato. Assim, cheguei aqui, começaram a me por aqueles vestidinhos curtos, e eu morria de vergonha. Não estava acostumada”, lembra.
A atriz já tinha uma protagonista em seu currículo e, agora, desejava viver uma vilã. Foi o que aconteceu em 'Carinhoso' (1973), de Lauro César Muniz, em que interpretou a personagem Marisa.
Outra lembrança que a atriz tem do início dos anos 1970 foi a primeira versão da novela 'Roque Santeiro', de Dias Gomes, para a qual fora escalada no papel de Lulu, esposa do personagem Zé das Medalhas. O elenco chegou a gravar entre dez e 12 capítulos, mas a Censura Federal proibiu a exibição da novela. “Fiquei muito chateada, porque eu teria um papel maravilhoso. A Censura proibiu e Janete Clair escreveu 'Pecado Capital'. E eu ganhei um presente, que foi a Vilminha. Até hoje falam dela comigo”, comenta. Em 'Pecado Capital,' Débora também teve o prazer de atuar ao lado de Lima Duarte, que viveu seu pai na história. “Lima é caudaloso. O olhar dele é uma coisa tão plena. Você não precisa fazer nada, só deixar entrar. Eu adoro contracenar com ele. Engraçado que a gente nunca teve conversas a respeito de trabalho em casa. A gente nunca comentou a cena um do outro. Ou pediu para estudar junto”, revela.
Em 1979, ao lado de artistas como Fernanda Montenegro, Nathalia Timberg e Luis Gustavo, a atriz foi para a TV Bandeirantes, onde atuou na novela 'Cara a Cara', de Vicente Sesso. Curiosamente, seu então marido, o cantor Antônio Marcos, também participou como ator. Na mesma emissora, comandou um musical, que tinha dramaturgia e cenas externas, chamado 'Rosa e Azul', com direção de Roberto Talma. “Ele estraçalhou. Conseguiu fazer, de uma verba pequena, um programa riquíssimo. Ele deu um show”, recorda-se. No ano seguinte, de volta à Globo, a atriz participou de 'Coração Alado', de Janete Clair e, em seguida, em 1981, de 'Jogo da Vida', de Silvio de Abreu, novela que lembra com carinho, mas reclama: “Eu era uma professora de inglês. Eu fiquei muito irada, porque era uma comédia maravilhosa, como só o Silvio e Jorge Fernando sabem fazer. E o único personagem trágico era o meu”.
Minisséries
A minissérie 'Anarquistas, Graças a Deus' (1982), escrita por Walter George Durst a partir do livro de Zélia Gattai, é um dos trabalhos pelos quais demonstra o maior xodó. “Essa minissérie me trouxe tanta coisa boa na vida. Fui à casa de Jorge Amado e Zélia Gattai, e Jorge me autografou todos os livros: ‘Para minha sogra’. Em 'Anarquistas', eu fazia o papel da mãe de Zélia, e eu amava aquela personagem. Acho que foi um dos melhores trabalhos que fiz até hoje”, classifica. A atriz aproveita para dizer, orgulhosa, que é de Zélia Gattai o prefácio de seu livro de poemas 'No Colo do Apolo', lançado em agosto de 2011, que tem 'orelha' escrita por Mário Lago.
Anarquistas, Graças a Deus: Ernesto e Angelina
Outra minissérie, 'Padre Cícero', de Aguinaldo Silva e Doc Comparato, exibida em 1984, também está viva na memória de Débora. Por um motivo peculiar: “Stênio Garcia fazia o 'Padre Cícero'. A hora que ele punha a hóstia na boca da minha personagem, a Maria do Araújo, ela começava a sangrar. Então, todo mundo falava: ‘Milagre, milagre!’. Eu lembro que a gente estava gravando essa cena e, na hora que ele pôs a hóstia na minha boca, começou a chover, e foi um tal de me agarrar e me chamar de ‘Minha santinha’! Eu passei um apuro ali”, relata.
Minissérie 'Padre Cícero': cena em que a hóstia se transforma em sangue quando Maria de Araújo (Débora Duarte) recebe a comunhão de Padre Cícero (Stênio Garcia).
Débora Duarte atuou pela primeira vez ao lado da filha Paloma Duarte no seriado 'Grande Pai', dirigido por Walter Avancini, em 1991, no SBT. Em telenovelas, a primeira vez em que atuaram juntas foi na Globo, em 'Terra Nostra' (1999), de Benedito Ruy Barbosa. A novela, inclusive, não lhe deu apenas tal experiência. Na ocasião, ganhou o troféu APCA de melhor atriz. “Gostei muito de fazer. Era um trabalho contido, difícil. Bom elenco, um belo trabalho, uma novela excelente do Benedito”, acrescenta. 'Paraíso Tropical', de Gilberto Braga e Ricardo Linhares, de 1997, também lhe traz recordações e autocrítica: “Eu estava muito gorda. Isso me atrapalhou um pouco. Eu parecia uma montanha. Foi a primeira vez que trabalhei com Gloria Pires e me apaixonei. Adoro a pessoa e adoro a atriz. Olha, fosse só por isso, já tinha valido. Foi um ganho de vida para mim”, relata.
Débora Duarte e Paloma Duarte viveram mãe e filha em 'Terra Nostra'
Em 2012 interpretou D. Eulália em 'Lado a Lado', novela de Claudia Lage e João Ximenes Braga premiada com um Emmy Internacional. A personagem, que morava com o filho e infernizava a vida da nora, caiu no gosto do público. Alguns anos depois, Débora Duarte voltou a trabalhar em uma novela escrita por Gilberto Braga e Ricardo Linhares, ‘Babilônia’, de 2015. Na trama, que também teve João Ximenes Braga como autor, a atriz viveu Celina, a tia da vilã interpretada por Adriana Esteves. E em 2021, após seis anos longe das novelas, Débora fez uma participação em ‘Um Lugar ao Sol’, de Lícia Manzo. Na trama, voltou a emocionar o público com a personagem Eva, que tinha Alzheimer e vivia em uma casa de repouso.
Débora Duarte também fez rádio, teatro e mais dois longas-metragens, além do livro de poemas. A primeira peça em que atuou, aos 16 anos, 'O Sistema Fabrizzi', lhe rendeu o prêmio de atriz revelação. Com mais de 50 anos de carreira, é uma atriz dramática, capaz de construir seus personagens com tamanha carga emotiva que emociona e impressiona, pela verdade que passa para o público.
FONTES
Depoimento concedido ao Memória Globo por Débora Duarte em 14/02/2011. |