Na noite de 22 de dezembro de 1988, o ecologista Chico Mendes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, no Acre, foi morto a tiros de espingarda, no quintal de sua casa, por Darcy Alves da Silva, a mando de seu pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva.
Chico Mendes havia sido condecorado pela ONU no ano anterior, por sua luta em defesa do meio ambiente. O ecologista, que ajudara a organizar o trabalho e a resistência dos seringueiros, foi o fundador da primeira reserva extrativista do Brasil, 40 mil hectares de exploração conservacionista, em São Luiz do Remanso, situado a 80 quilômetros de Rio Branco, capital do Acre. Sua morte repercutiu no mundo inteiro, onde era conhecido como o “herói da floresta”, tendo sido o único brasileiro a participar, em 1988, de uma reunião de 500 ecologistas de todo o mundo na ONU, em Washington.
Reportagens sobre o julgamento dos assassinos do ambientalista Chico Mendes, com a cronologia da vida de Chico Mendes, o histórico do crime, e a preparação do fórum de Xapuri, no Acre. Jornal Nacional, 11/12/1990 .
Em dezembro de 1990, depois de um julgamento que durou quatro dias, os assassinos foram condenados a 19 anos de prisão. A multidão que aguardava aplaudiu quando o juiz terminou de ler a sentença. Em 1992, Darly Alves chegou a ter seu julgamento anulado pela Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Acre, mas, um ano depois, o Superior Tribunal de Justiça reformou a decisão do tribunal do Acre e manteve sua condenação pelo assassinato de Chico Mendes. Em março de 1993, Darly e Darcy fugiram da penitenciária estadual do Acre, sendo recapturados em 1996. Três anos mais tarde, Darly Alves ganhou o direito de passar os dias fora da cadeia. Após cumprirem suas penas, os dois voltaram a viver em Xapuri.
DESTAQUES
O crime
Expectativa
O julgamento
Solução criativa
Fugitivos
Captura
Cara a cara
Vinte anos depois
Playlist de reportagens
EQUIPE E ESTRUTURA
A Globo noticiou o assassinato de Chico Mendes em seus principais telejornais, com o apoio de sua afiliada local, a TV Acre. Para cobrir o julgamento dos acusados pela morte do ambientalista, no entanto, enviou uma equipe própria para a cidade de Xapuri, no Acre.
Alberico de Sousa Cruz, na época diretor de Jornalismo, decidiu investir nessa cobertura: “Eu estava em Nova York, visitando a CBS, quando o apresentador, o Dan Rather, se não me engano, me disse que ia dar uma notícia sobre o Chico Mendes. Eu vi a importância do fato. No Brasil tinha um mundo de coisas acontecendo, mas o jornal americano ia dar o Chico Mendes. Eu já tinha passado a orientação para cobrir muito bem esse assunto, que estava tendo uma repercussão externa grande. E realmente resolvi investir nisso, essa cobertura era importante.”
Sandra Passarinho foi a Xapuri mostrar como a pequena cidade estava se preparando para receber a imprensa e os interessados em acompanhar o caso. Ernesto Paglia e Marcos Losekann cobriram os quatro dias de julgamento. Na ocasião, não havia como gerar o material para o Rio de Janeiro direto de Xapuri. “A gente tinha que fazer matéria ao longo do dia, botar a fita num aviãozinho monomotor, ir até Rio Branco, editar a toque de caixa e gerar de Rio Branco para o Rio”, lembra Paglia.
O CRIME
A morte de Chico Mendes na noite de 22 de dezembro repercutiu no noticiário dos dias seguintes. O Jornal Nacional destacou a vida do seringueiro e os prêmios recebidos por ele. As reportagens mostraram a repercussão do crime na pequena Xapuri e o cerco da polícia em busca dos assassinos, além de uma entrevista com a viúva Ilzamar Mendes.
No dia 26, Darcy Alves da Silva se entregou na Secretaria de Segurança Pública do Acre. Pouco depois, em 8 de janeiro de 1989, o Fantástico noticiou a prisão de seu pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva.
Reportagem sobre a prisão do fazendeiro Darly Alves da Silva, acusado de assassinar o ambientalista Chico Mendes, Fantástico, 08/01/1989.
EXPECTATIVA
Reportagem de Sandra Passarinho sobre a expectativa em torno do julgamento dos assassinos do ambientalista Chico Mendes. Jornal Nacional, 29/11/1990.
Em dezembro de 1990, aconteceu o julgamento dos assassinos de Chico Mendes. A Globo, que montou um grande esquema para aquela cobertura, mostrou desde os preparativos na cidade para receber jornalistas de toda a parte, até a decisão final do juiz.
Na véspera do julgamento, o Jornal Nacional apresentou uma cronologia da vida de Chico Mendes e um histórico do crime. Uma reportagem destacou a principal testemunha do caso, o garoto Genésio Ferreira, que vivera na fazenda de Darly Alves durante sete anos. Dias antes da morte de Chico Mendes, ele ouvira os fazendeiros planejarem o assassinato.
Marcos Losekann mostrou o último encontro dos acusados com seus advogados. Foram exibidas cenas exclusivas feitas dentro da penitenciária. Em outra matéria, Ernesto Paglia mostrou a preparação do fórum de Xapuri, falou sobre os jurados e as testemunhas e também sobre a segurança dessas pessoas.
O JULGAMENTO
A Globo acompanhou o julgamento, exibindo reportagens de seus enviados especiais, Ernesto Paglia e Marcos Losekann. Além disso, por telefone, as informações eram atualizadas diariamente.
“Com um saco de dormir, eu me instalei em Xapuri. Depois que o Paglia e a equipe voltavam para Rio Branco, o fato continuava acontecendo. Então eu fazia o desfecho do dia do julgamento. Eram informações que não cabiam no material que havia sido levado em mãos pela equipe principal”, conta Marcos Losekann
Logo no primeiro dia, 12 de dezembro, Darcy Alves confessou, diante do juiz, ser o assassino, numa tentativa de inocentar seu pai. Mesmo assim, ambos foram condenados a 19 anos de prisão.
Reportagens de Ernesto Paglia e Marcos Losekann sobre o início do julgamento dos assassinos do ambientalista Chico Mendes. Jornal Nacional, 12/12/1990.
SOLUÇÃO CRIATIVA
Para transmitir informações, ao vivo, do último dia do julgamento, 15 de dezembro, Marcos Losekann precisou de criatividade: “O Jornal Nacional do sábado queria entrar ao vivo, por telefone, na hora do veredicto. Não existia celular, não existia sequer telefone em Xapuri, mas estava lá um postinho da Teleacre botando telefones à disposição da imprensa. Eu perguntei ao juiz, Adair Longuini, se ele permitia que eu usasse o telefone do fórum. ‘Negativo’, sentenciou. ‘A Globo pode pedir a instalação de uma linha aqui para eu narrar ao vivo no Jornal Nacional na hora em que acontecer o veredicto?’, perguntei. De novo, o juiz, no alto da sua autoridade: ‘Negativo’. Ele falava só negativo ou positivo, mas não dizia um ‘positivo’ para mim. Daí eu disse: ‘Quer dizer que eu não posso instalar?’. ‘Não, você não pode instalar um telefone dentro do fórum.’ Perguntei: ‘Doutor, eu quero isso muito claro. O senhor pode repetir? Eu não posso instalar um telefone dentro do fórum?’. ‘É.’ ‘Ok.’ Fui lá fora, falei com o pessoal da Teleacre: ‘Esse poste é de telefone?’. Responderam: ‘É. Ali tem um fio’. ‘Dá para instalar um telefone na beira do poste?’ ‘Dá. Cada louco com a sua vontade. A gente instala.’ Quando eles acabaram de instalar, e iam plugar o telefone, eu perguntei: ‘Dá para botar um cabo de 50 metros?’ ‘Dá.’ E com aquele cabo eu entrei lá dentro do fórum, ao lado do juiz, sem desobedecer a Justiça, porque eu não instalei o telefone dentro do fórum.”
Quando o Jornal Nacional foi ao ar, no entanto, os advogados de defesa ainda estavam apresentando seus argumentos. A sentença seria lida pelo juiz às 2h30 da madrugada de domingo (horário de Brasília). Pai e filho foram condenados por homicídio qualificado, cometido por motivo torpe e com emboscada. O Fantástico apresentou a cobertura completa do julgamento.
Ernesto Paglia fala, ao vivo, pelo telefone, sobre o último dia do julgamento dos assassinos do ambientalista Chico Mendes. Jornal Nacional, 15/12/1990.
Reportagem de Ernesto Paglia sobre o último dia do julgamento dos assassinos de Chico Mendes, e de Marcos Losekann sobre as homenagens ao ambientalista no dia em que ele completaria 46 anos. Jornal Nacional, 15/12/1990.
Reportagem de Ernesto Paglia sobre a conclusão do julgamento dos assassinos do ambientalista Chico Mendes, condenados por homicídio qualificado, cometido por motivo torpe e com emboscada. Fantástico, 16/12/1990.
FUGITIVOS
Em fevereiro de 1993, quando Darly e Darcy Alves fugiram do presídio de Rio Branco, o repórter Caco Barcellos refez o provável caminho da fuga dos dois, mostrando como era fácil sair do país. Em outra reportagem de Caco Barcellos era mostrado o clima em Xapuri depois da fuga dos assassinos. Com medo, a viúva Ilzamar Mendes passou a andar com escolta da Polícia Federal.
Assassinato de Chico Mendes (1993)
CAPTURA
Cerca de três anos após a fuga, em junho de 1996, o Fantásticonoticiou a captura de Darly Alves, que, ao lado do filho, vivia como sem-terra em Medicilândia, no Pará. Como Darcy não estava no acampamento na hora em que a polícia chegou, conseguiu escapar, sendo preso apenas em novembro daquele ano, em Guaíra, no Paraná.
Assassinato de Chico Mendes (1996)
CARA A CARA
Doze anos depois do crime, o Fantástico promoveu o encontro entre a viúva Ilzamar Mendes e Darcy Alves. No quadro A Hora da Verdade, Ilzamar desabafou toda a sua dor, enquanto o assassino permaneceu, na maior parte do tempo, calado.
Assassinato de Chico Mendes (2000)
VINTE ANOS DEPOIS
Ernesto Paglia, que participou da cobertura do julgamento dos assassinos de Chico Mendes, em 1990, voltou a Xapuri (AC) vinte anos depois da morte do seringueiro. Após cumprirem pena, Darly Alves e seu filho, Darcy Alves, retornaram à cidade. O repórter conversou com o fazendeiro mandante do crime, que se dizia injustiçado. Para Darly, Chico Mendes era o único responsável por sua própria morte.
Paglia também conversou com Sebastião Mendes, primo-irmão de Chico Mendes, e Elenira Mendes, filha do ambientalista, que na época do assassinato tinha apenas quatro anos. A reportagem foi ao ar no Fantástico, em 14 de dezembro de 2008.
Em reportagem para o Fantástico, Ernesto Paglia volta a Xapuri (AC), vinte anos após o assassinato de Chico Mendes, e entrevista Darly Alves, mandante do crime. 14/12/2008.
FONTES
Depoimentos concedidos ao Memória Globo por: Alberico de Sousa Cruz (15/05/2003), Ernesto Paglia (15/05/2002) e Marcos Losekann (28/05/2009); MEMÓRIA GLOBO. Jornal Nacional: a notícia faz história. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004; Fantástico, 08/01/1989, 16/12/1990, 30/06/1996, 26/11/2000, 14/12/2008; Jornal Nacional, 23 e 24/12/1988, 11 e 12/12/1990, 18 e 20/02/1993. |