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Rebeca

Rebeca Andrade encanta o mundo com série beirando a perfeição e conquista a inédita medalha dourada no solo

O Brasil prendeu a respiração quando os primeiros acordes de “End of Time”, de Beyoncé, começaram a tocar na Bercy Arena, palco da ginástica artística em Paris, na final do solo, no dia 5 de agosto. E só respirou novamente um minuto e meio depois, quando Rebeca Andrade terminou sua série de solo, numa apresentação belíssima com acrobacias incríveis, coreografia cheia de graça e chegadas praticamente cravadas. Esse sentimento de que o mundo parou ainda permaneceu por alguns minutos, até sair a nota: 14.166 e a quase certeza do ouro, que se confirmou pouco depois, quando a última ginasta se apresentou. Foi o sexto pódio olímpico da estrela mais brilhante do Olimpo brasileiro, que se isolou como maior medalhista do país.

Rebeca participou ativamente da escolha da música que embalou seu solo, que inclui ainda trechos de "Movimento da Sanfoninha", de Anitta, e do “Baile de Favela” com o qual encantou o mundo em Tóquio 2020. Foi decisiva também na construção da coreografia com o coreógrafo Rhony Ferreira. E treinou exaustivamente cada acrobacia e salto ginástico em busca da perfeição. E foi perfeita.

Rebeca Rodrigues de AndradeRebeca Rodrigues de Andrade
Nome
Rebeca Rodrigues de Andrade
Cidade
Guarulhos, SP
Idade
25 anos
Medalhas Olímpicas
Tóquio 2020
Ouro Ouro no salto
Prata Prata no individual geral
Paris 2024
Ouro Ouro no solo
Prata Prata no salto
Prata Prata no individual geral
Prata Bronze por equipes

Tsukahara grupado

O solo de Rebeca começou com pose de diva, mão direita na cintura, braço esquerdo e rosto apontados para o alto. Fez passos de dança, interpretando a música de Beyoncé enquanto se preparava para a primeira passada: partindo com os pés juntos, ela fez uma pirueta para frente ligada, por um flic flac, com o Tsukahara grupado, que consiste em um duplo mortal com as pernas encolhidas junto ao peito emendado com uma pirueta – movimento inventado pelo ginasta japonês Mitsuo Tsukahara em 1970.

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Vídeo mostra um exercício de Rebeca.

Nessa diagonal, ela cumpriu a exigência de realizar ao menos um mortal para frente durante a apresentação. Além disso, não é permitido que a ginasta saia com uma das pernas na frente nem com as duas pernas juntas em todas as diagonais. Como prefere sair com as pernas separadas, resolveu logo a obrigatoriedade da saída com as pernas juntas no início, para poder fluir mais livre no resto do tempo.

"É a diagonal mais técnica, porque tem uma ligação de elementos. Ela não pode fazer a pirueta com muita força porque senão ela passa demais para fazer o rodante flic e se fizer com pouca força, perde a dinâmica e o rodante flic fica muito lento. Olhando, parece mais fácil, mas é muito técnico, então prefiro que ela faça essa passada primeiro, logo no início".

Francisco Porath, treinador da seleção feminina de ginástica artística

Tsukahara esticado

No segundo trecho do solo, Rebeca voltou a interpretar a música em um momento estratégico de respiro entre as duas passadas mais exigentes da série e seguiu para um Tsukahara esticado, também conhecido como Chusovitina, por ter sido feito pela primeira vez pela uzbeque Oksana Chusovitina. É um duplo mortal com as pernas estendidas com uma pirueta, a acrobacia mais potente e de valor mais alto da apresentação: 0,8.

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Vídeo mostra um exercício de Rebeca.

Para chegar ao Chusovitina, ela partiu de uma rondada flic, na qual pegou o impulso necessário para a realização do movimento.

Cadete com pirueta

Antes da terceira diagonal, Rebeca iniciou com um salto ginástico chamado cadete com pirueta. Esse trecho apresenta uma mudança em relação ao que foi mostrado no Mundial do ano passado. Naquela ocasião, Rebeca fez uma cortada com pirueta, não um cadete, que era apresentado em outro momento, em uma sequência com uma cortada simples.

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Vídeo mostra um exercício de Rebeca.

São saltos semelhantes, mas o cadete tem um grau de dificuldade um pouco maior e a atleta se sentiu mais confortável o realizando sozinho, não emendado com outro movimento.

Triplo giro

Após o cadete com pirueta, Rebeca interpretou a música com coreografia e emendou no Mustafina, um giro triplo com a perna nomeado em homenagem à russa Aliya Mustafina, criadora do movimento. Na final, no entanto, o movimento não foi considerado completo. Rebeca chegou a pedir um recurso ao fim da prova, mas os árbitros julgaram dificuldade como duplo giro, não triplo.

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Após o movimento, a ginasta voltou para a coreografia junto ao solo cumprindo exigência do código de pontuação e passou pela transição para o funk de Anitta. Nessa parte da coreografia, nossa campeã olímpica e mundial estava de frente para os árbitros, aproveitando o momento fazer contato visual.

Duplo mortal esticado

Na terceira passada, Rebeca realizou um duplo mortal esticado lindo e cravado. Antes, ao chegar na posição de partida para a acrobacia, a ginasta fez uma homenagem à apresentação com que encantou o mundo em Tóquio ao repetir o famoso passo de dança em que balança corpo e braços, dando soquinhos no ar.

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Vídeo mostra um exercício de Rebeca.

Rebeca partiu então para a acrobacia, fazendo uma rondada flic e emendando no duplo mortal com as pernas estendidas. A essa altura, o público presente na Bercy Arena já era todo dela.

Cortada + Cortada com pirueta

Antes da última acrobacia, Rebeca fez uma sequência de saltos ginásticos, uma outra exigência do solo. Primeiro, uma cortada simples, e em seguida, uma cortada com pirueta.

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Vídeo mostra um exercício de Rebeca.

Em Antuérpia, Rebeca apresentou a cortada simples com um cadete com pirueta. A substituição pela cortada com pirueta aconteceu para garantir que a ginasta, já com o corpo mais cansado após três acrobacias e alguns saltos ginásticos, realize o movimento até o fim e não corresse o perigo de perder décimos preciosos na pontuação. Na cortada, a sequência com a pirueta é mais simples e orgânica. E o cadete é realizado anteriormente, isolado, como mostramos acima. Deu muito certo.

Duplo mortal carpado

O encerramento de Rebeca foi com mais uma variedade de duplo mortal. Depois dos Tsukaharas grupado e estendido e do duplo mortal esticado, ela partiu para o carpado. Nele, pernas e pés ficam esticados, mas o corpo é dobrado na altura dos quadris. Rebeca então finalizou a série saindo da diagonal e, em mais uma homenagem à apresentação que lhe deu tantas alegrias no ciclo olímpico passado, encerrou ao som de um trechinho do Baile de Favela. Mão esquerda na cintura, braço direito e rosto apontados para o alto, sorriso de quem sabia que merecia todos os aplausos. E, logo depois, o choro de alívio compartilhado com todos os brasileiros que se emocionaram com a apresentação.

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Vídeo mostra um exercício de Rebeca.

Na pontuação final, com a coreografia cumprindo todos os requisitos de composição da série, recebeu 14.166 e subiu ao lugar mais alto do pódio, onde foi reverenciada pelas americanas Simone Biles, medalhista de prata e considerada uma das maiores de todos os tempos, Jordan Chiles, que ficou com o bronze, e pelo mundo todo.

O confronto

Simone Biles subiu no tablado como favorita ao ouro. Realizou suas acrobacias impossíveis, incluindo o Biles I e o Biles II, com uma série de dificuldade 6.900. Mas pisou com os dois pés fora do tablado duas vezes e perdeu 0,6 na pontuação, além de ter tirado apenas 7.833 na execução, por falhas de postura, somando 14.133. Rebeca entregou tudo, com uma postura elegante e chegadas cravadas das acrobacias. A nota de dificuldade era um ponto inferior à de Simone, 5.900. Mas a brasileira não perdeu pontos em penalidades e, na execução quase perfeita, tirou 8.266, somando 14.166. Uma diferença de 0.033 que garantiu a Rebeca sua sexta medalha olímpica, a segunda de ouro. Simone chegou a seu 11º pódio. Mas, dessa vez, um degrau abaixo de Rebeca, que reinou no solo de Paris.

Créditos

Texto:

Flávia Ribeiro

Marcos Guerra

Design:

Alexandre Lage

Mario Alberto

Mario Leite

Desenvolvimento:

Fabio Penna