"A ficha ainda não caiu". Foi essa a primeira frase dita por Neguinho da Beija-Flor durante entrevista exclusiva ao gshow, nesta quarta-feira (20). Chorando ao atender o telefone e com a emoção à flor da pele por conta da despedida da agremiação de Nilópolis, após 54 anos puxando os sambas-enredo da escola, ele falou da despedida do Carnaval.
"É difícil demais. A gente morre duas vezes, uma neste momento e outra quando chega a nossa hora. Foram 54 anos de Carnaval com muitas alegrias e emoções. Mas chega uma hora que a gente tem que dar a vez para outra pessoa. Não posso querer isso só para mim... Mas é muito difícil, não vou te enganar", fala, com a voz embargada.
Carinhos e mais carinhos
E após anunciar a sua despedida da Beija-Flor e do Carnaval da Sapucaí, uma avalanche de carinho e afeto tomou conta da vida do cantor. Desde que falou da aposentadoria da Marques de Sapucaí, Neguinho conta que não para de receber ligações e mensagens.
Brincalhão e muito divertido, durante a entrevista, mesmo emocionado com toda situação, ele solta aquela gargalhada inconfundível e se diz surpreso com tamanho carinho que vem recebendo.
"Eu não sabia que eu era tão amado (risos). E que as pessoas gostavam tanto de samba e do meu trabalho. Estou recebendo ligações de pessoas de todos os cantos do mundo. Dos Estados Unidos, Itália e até da minha filha, a Surpresa, que já a conheci com 20 anos e mora na França. A gente chorou muito falando ao telefone. Eu não pensei que seria algo tão forte deixar o Carnaval e que teria tamanha repercussão. É muita emoção. Estou chorando até agora", entrega.
O adeus à Passarela do Samba vai acontecer em 2025. E, mais uma vez, ele estará à frente da Beija-Flor, ecoando pela Marquês de Sapucaí o seu vozeirão inconfundível e cantando um samba-enredo que homenageará o seu grande amigo: Laíla - que considerava um irmão da vida. Luiz Fernando Ribeiro do Carmo, conhecido como Laíla, foi diretor de Carnaval da Beija-Flor por quase 30 anos. Ele morreu de Covid em 2021.
"Vou me despedir com chave de ouro, num enredo lindo que irá homenagear o Laíla. Não tinha como deixar de cantar o último samba na Sapucaí contando a história desse irmão. É um amigo de longa data, que sinto muita falta", conta Neguinho da Beija-Flor.
Orlando vai sambar
Agora, já com a decisão tomada e deixando claro que por mais que seja difícil, não irá voltar atrás, Neguinho entrega que o primeiro ano do Carnaval, longe da Beija-Flor, não será na Avenida do Samba, mas sim na Flórida, nos Estados Unidos.
Em 2026, o sambista vai agitar a folia norte-americana na cidade de Orlando e promete empolgar a todos e colocar 'os gringos' para sambar.
"Já está tudo certo. Eu fechei com o Carnaval nos Estados Unidos. Em 2026 não vou estar no Brasil no período do Carnaval. Não fiz isso antes por conta do compromisso que tinha com a Beija-Flor. Mas agora está tudo acertado para viajar a Orlando no primeiro Carnaval longe da Sapucaí", entregou.
Aos 75 anos e 54 à frente da Beija-Flor embalando grandes sambas da agremiação, a terceira maior vencedora do Carnaval carioca, com 14 títulos, ele conta a saudade que irá sentir da escola.
"Foi uma decisão difícil demais de ser tomada. Mas foi preciso... Leio as coisas que estão saindo na imprensa e parece que são de outras pessoas, e não de mim (risos). Mas foi uma decisão pensada e necessária", finaliza.
Comunicado
Em nota oficial (conferir na íntegra, abaixo) enviada ao gshow, a escola exaltou o legado do sambista.
"O desfile de 2025 será marcado por uma emoção ainda mais especial. Além de homenagearmos o inesquecível mestre Laíla, será também o momento de nos despedirmos profissionalmente de nossa maior e inigualável voz no microfone oficial: Luiz Antônio Feliciano Marcondes, o nosso Neguinho.
Em 11 de junho de 1975, o então conhecido 'Neguinho da Vala' chegou a Nilópolis, a convite do nosso presidente de honra, Anísio Abraão David, que também foi responsável por sugerir o nome artístico que se eternizou: 'Neguinho da Beija-Flor'. Desde então, sua voz ecoou em cada verso que cantamos, em cada vitória que celebramos e em cada nota 10 que nos fez vibrar. Agora, após cinco décadas de dedicação a Beija-Flor, ele decidiu encerrar sua jornada profissional no mesmo ano em que prestamos homenagem ao legado de seu grande amigo Laíla.
Essa despedida, no entanto, é apenas do posto de intérprete oficial. Neguinho é, e sempre será, a essência da Beija-Flor. Não há Beija-Flor sem ele. Sua história está gravada em nossas cores, nossos sambas e nossos corações.
O próximo Carnaval da Beija-Flor, portanto, terá um sabor ainda mais especial: será a celebração de uma vida inteira dedicada ao samba. Seremos, mais uma vez, testemunhas de sua grandeza, celebrando juntos uma trajetória que soma mais de 50 anos, 14 títulos, 6 Estandartes de Ouro e um grito de guerra que ecoará para sempre no Carnaval brasileiro", finaliza.