O palco tem sido o principal espaço de acalento para Alexandre Borges. Aos 58 anos, o ator leva uma vida ativa, mas discreta, dividida entre duas cidades. Conquistou uma comunidade fiel na internet com suas postagens irreverentes no Instagram, mas diz nunca ter usado o WhatsApp. Ainda equilibra a notoriedade de ser um dos rostos mais conhecidos da televisão brasileira com a solidão, provocada pelas perdas de três figuras orquestrais em sua trajetória: sua mãe Rosa Linda, falecida em 2021; seu pai Tanah Corrêa, em 2023; e, poucas semanas depois, o grande amigo e mestre Zé Celso, renomado dramaturgo e fundador do Teatro Oficina.
"É o destino de todos nós e você começa a refletir sobre tudo. São fatos que acontecem uma vez na vida, e você nunca está preparado. Tudo muda. De repente você está órfão", afirma Alexandre Borges em entrevista a GQ. A reflexão sobre finitude também dialoga com o atual projeto do ator – também a última montagem de Zé Celso. “A vida é uma coisa impressionante. O destino quis que eu voltasse a trabalhar com ele. Ficamos dois anos ensaiando até ele falecer”.
Em cena com a peça Esperando Godot, Borges e o ator Marcelo Drummond vivem dois palhaços desesperançosos. Vladimir e Estragão se encontram no fim do mundo enquanto esperam pela salvação de uma entidade divina, porém desconhecida, escancarando a capacidade do ser humano ao questionar a própria existência. O texto é do escritor irlandês Samuel Beckett.
O espetáculo de curta temporada – em cartaz no Rio de Janeiro até dia 8, e em São Paulo de 13 a 23 de dezembro – marca a renovação de votos do ator com o grupo teatral. Em 1993, ele participou da adaptação do clássico de Shakespeare, Hamlet, na reabertura do Teatro Oficina, em São Paulo, com o projeto arquitetônico de Lina Bo Bardi e Edson Elito. O novo convite, então, surgiu em 2022 e foi um presente deixado pelo diretor de teatro para Borges após três décadas do primeiro encontro.
"As coisas aconteceram meio que juntas ao Oficina. Foi lá onde conheci a Julia [Lemmertz], minha ex-esposa, e criei uma bagagem incrível que dei continuidade na TV”, conta o ator. "A obra fala sobre a nossa condição um pouco solitária nesse mundo. Alguns sentidos que buscamos e nem sempre conseguimos encontrar. A vida se mistura com a arte, como diria Zé, a arte cura".
Mais próximo dos 60, Alexandre Borges diz que, para ele, envelhecer é um "processo solitário". "É engraçado porque é um momento que você percebe que é preciso se renovar, mesmo com preguiça e cansaço. O Zé teve uma morte muito trágica e muito besta. Vi um cara chegar aos 86 com a maior garra, paixão, superando as limitações da idade. Isso para mim é o mais importante: se preservar mesmo com os vazios. É uma solidão ferrada, é uma coisa muito esquisita", avalia.
Apesar da sensação, o ator demonstra conforto na maturidade e afirma que faz exames médicos regularmente para manter os cuidados com a saúde física e mental, que entende como ferramenta para realizar sua profissão, que é também um dos seus prazeres.
"Sabe que fiz um check-up recentemente e conversando com o meu médico, ele me perguntou se eu estava preparado para o etarismo. Nunca tinha pensado nisso", comenta. "Fico procurando festas 50+ [risos]. Naturalmente você dá uma acalmada, mas também tem que comemorar, se divertir, dançar, só que não com o pique de antes."
De atividade física, Alexandre Borges afirma que gosta de caminhar em parques (Trianon e Ibirapuera, na capital paulista, são os seus favoritos). E não abre-mão de musculação. "Sou de fases, já fiz karatê. Mas academia para mim é o básico."
O último trabalho do ator na televisão ainda é recente. Ele esteve na novela das seis Elas por Elas exibida até abril deste ano na TV Globo. Quanto ao destino nas telinhas, Borges diz que está disponível para novos convites e o que "pintar".
"Ainda me vejo na TV e no cinema, mas só isso não adianta. Você precisa ser chamado para fazer. No teatro não. Se você se vê fazendo um Shakespeare, você arregaça a manga e faz", comenta. "Faria com o maior prazer [outra novela]. Mas se não acontecer, foi maravilhoso. Torço pelas novas gerações."
Alguns dos seus personagens marcantes como Cadinho, de Avenida Brasil (2012), e Jacques Leclair, Ti-Ti-Ti (2011), permanencem frescos na memória do público. O ator diz que na rua é acarinhado pelos telespectadores, que sempre resgatam os papéis icônicos.
Vivendo uma fase mais "low profile", Alexandre Borges vê a pausa de projetos midiáticos como algo saudável e natural. Segundo ele, uma forma de ser renovar e reabastecer o "estoque de energia". "Há curiosidade e interesse do público na sua intimidade, então quando você está na TV, você abre a porta da sua casa, faz revista, mostra o seu filho pequeno, dá entrevistas sobre casamento… Lidei com isso sabendo que fazia parte, mas, é lógico, quando chega um momento de acúmulo de anos, buscar outros tipos de atuação com menos exigências é interessante. Às vezes é bom dar uma pausa. Mesmo porque, financeiramente, não preciso de mais. Depois de 30 anos você chega nesse lugar."
Para o próximo ano, a agenda do ator está em aberto. Um dos planos é voltar a morar no Rio de Janeiro para ficar perto do filho Miguelo, de 24 anos, fruto do seu casamento de 22 anos com a atriz Julia Lemmertz, com quem mantém uma relação de cumplicidade desde o divórcio, em 2015.
Sempre na ponte Rio-São Paulo, Alexandre Borges passou grande parte dos últimos anos em Santos, no litoral paulista, sua cidade natal, para cuidar da mãe. Foi neste período, que coincidiu com a pandemia, que ele também resolveu "entrar para as redes sociais".
Criou um perfil no Instagram e sua própria linguagem para se comunicar com os internautas e fãs: atráves de vídeos de paisagens e cenas do cotidiano, editados por ele, com capas de "selfies" dele sorrindo. O jeito logo caiu na graça dos usuários e, desde então, é bastante ativo na plataforma.
"As pessoas do Instagram me fizeram companhia. Me incentivaram, mandaram forças por causa da minha mãe, trocamos experiências sobre o Alzheimer. Se tornaram amigos mesmo, sabe? Por isso que às vezes me dá angústia de não responder todos, porque eu me importo", compartilha.
"É engraçado que algumas pessoas ficaram me zoando que eu só tinha selfies. Mas a verdade é que é só a capa do vídeo. Ficou essa marca registrada, não é uma coisa egocêntrica, não [risos]".
A afinidade com a tecnologia não vai muito longe. O ator não tem WhatsApp, por exemplo. Prefere se comunicar por mensagens de texto e por meio do próprio perfil da rede social. Nos últimos minutos desta entrevista, ele explica que se trata de uma escolha que chama atenção das pessoas.
"É um aplicativo que nunca entrei. Foi passando o tempo e fui tendo mais certeza de que não iria usar. Acho que é uma ferramenta super fundamental para certas profissões, para a minha profissão não é tanto. Você entra num ensaio, você desliga o telefone e vai pegar ele 7 horas depois. Então vamos assim [risos]", finaliza, com bom humor.