Sustentabilidade
Por — Bento Gonçalves (RS)

A colheita das uvas da safra 2024/25 deve começar entre o fim de dezembro e início de janeiro no Rio Grande do Sul e seguirá até o mês de março. Desde a safra passada, boas práticas agrícolas vêm sendo intensificadas na Serra Gaúcha, com o intuito de evitar novos casos de trabalho análogo à escravidão na atividade.

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O produtor de uva Vinícius Dall’Oglio, de Bento Gonçalves, investiu R$ 8 mil em melhorias no alojamento para os trabalhadores contratados nesse período. “Assim trabalhamos com mais tranquilidade e qualidade de vida para todos”, afirma Dall’Oglio. Mas há casos de produtores rurais que aplicaram entre R$ 40 mil a R$ 50 mil nas adequações.

Da terceira geração de viticultores da família, Dall’Oglio nunca teve problemas referentes ao pessoal que ajuda na colheita e lamenta os casos registrados em fevereiro de 2023, no final da safra 2022/23. Na época, 207 trabalhadores foram resgatados de alojamentos na Serra Gaúcha, em situação análoga à escravidão. Os safristas estavam prestando serviço para uma empresa terceirizada e atuavam em propriedades associadas às vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi. “Hoje as propriedades estão mais preparadas e organizadas”, acredita o viticultor.

O produtor de uva Vinícius Dall’Oglio, de Bento Gonçalves, investiu R$ 8 mil em melhorias no alojamento para os trabalhadores contratados na safra da uva — Foto: Eduardo Benini
O produtor de uva Vinícius Dall’Oglio, de Bento Gonçalves, investiu R$ 8 mil em melhorias no alojamento para os trabalhadores contratados na safra da uva — Foto: Eduardo Benini

Dall’Oglio diz receber o mesmo grupo de trabalhadores todos os anos e entre as adequações nos cômodos destinados a eles estão a colocação de armários e pintura nova.

Na propriedade de sete hectares, são produzidas nove variedades de uvas com diferentes épocas de maturação, por isso o grupo permanece no local durante alguns meses. Associado à Cooperativa Vinícola Aurora, ele conta que vem recebendo orientações e capacitação sobre boas práticas desde o ano passado.

De acordo com Rodrigo Arpini Valerio, diretor de Marketing e Vendas da Aurora, 70% dos 1.100 produtores associados contratam mão de obra para o período da colheita, o que representa em torno de 2.500 trabalhadores. Todos os produtores cooperados receberam visitas de equipes da cooperativa para orientar sobre a necessidade de construção ou melhoria dos alojamentos.

Ele conta que, na safra passada, a maioria dos trabalhadores foram contratados no modo CLT para o período sazonal de colheita, entre fim de dezembro de 2023 e meados de março deste ano. A cooperativa permite ainda a terceirização, mas os funcionários deverão ficar no alojamento na propriedade.

Valerio explica que foram repassadas também orientações sobre o uso de equipamentos de proteção individual (EPIs) e outras obrigações previstas na legislação. Na safra atual, 61 produtores cooperados foram vistoriados por meio de uma auditoria externa e mais de 60 foram fiscalizados pelo Ministério Público do Trabalho. Segundo a Aurora, todos estavam em conformidade com a legislação trabalhista.

Produtor Vinícius Dall’Oglio diz receber o mesmo grupo de trabalhadores todos os anos  — Foto: Eduardo Benini
Produtor Vinícius Dall’Oglio diz receber o mesmo grupo de trabalhadores todos os anos — Foto: Eduardo Benini

Recuperação

Valerio admite que a vinícola teve as vendas afetadas logo após o episódio de resgate dos trabalhadores em situação análoga à escravidão, em 2023, e teve que investir na recuperação da reputação. “A Aurora ficou com essa mancha e foi uma curva de aprendizado muito forte. Mas estamos fazendo diferente e queremos ir além”, afirma.

O diretor destaca o aprimoramento e desenvolvimento de uma série de iniciativas nos processos da cooperativa: “estamos alinhados às melhores práticas de mercado, de compliance e de sustentabilidade”. Nesse contexto, ele destaca as boas práticas agrícolas, o cumprimento das normas trabalhistas, o sistema de rastreabilidade, assim como 20 novos compromissos ESG assumidos pela cooperativa.

O trabalho tem dado resultado. Em 2023, o faturamento da Aurora foi de R$ 786,2 milhões - 4% a mais do que em 2022. Pelo quinto ano consecutivo, o melhor desempenho da história da cooperativa. Para 2024, a expectativa é de expansão de 10%.

A Aurora projeta atingir o primeiro R$ 1 bilhão de faturamento anual em 2026”, afirma Renê Tonello, presidente do Conselho de Administração da cooperativa. Ele revela, em entrevista à Globo Rural, que a Aurora investiu mais de R$ 30 milhões, em 2024, a fim de manter o planejamento para alcançar a meta projetada.

Entre os investimentos está a aplicação de R$ 14 milhões na ampliação do centro de distribuição. O armazém vertical de oito andares possui uma área de 14 mil m². A ampliação triplicou a capacidade de estocagem, passando de 583 mil para 2 milhões de caixas de produtos vinícolas e de 8,1 mil para 18 mil palets. Em 2023, a Aurora contabilizou 74,5 milhões de litros envasados entre mais de 220 produtos.

Maior cooperativa vinícola do país, o grupo é líder nacional nas categorias de vinhos finos, suco de uva integral e coolers. Foram exportados 1,4 milhão de litros de vinhos, espumantes e sucos de uva para 17 países.

Vinícola Aurora projeta uma produção em torno de 70 milhões a 75 milhões de quilos de uva nesta safra — Foto: Zéto Telöken
Vinícola Aurora projeta uma produção em torno de 70 milhões a 75 milhões de quilos de uva nesta safra — Foto: Zéto Telöken

Tonello comenta ainda que a cooperativa iniciou o projeto de uma nova planta empresarial no Vale dos Vinhedos, onde já há uma unidade industrial da marca dedicada à produção de sucos, que hoje representa 50% do faturamento. Segundo o presidente, a meta é que a nova planta concentre a produção de uma das unidades localizadas em Bento Gonçalves.

Atualmente, a capacidade de recebimento de uvas nas plantas industriais é de 2,5 milhões a 3 milhões de quilos de uvas por dia. Para a safra atual, a projeção da cooperativa é que sejam produzidas em torno de 70 milhões a 75 milhões de quilos de uva.

Mecanização

A fim de reduzir a necessidade de mão de obra contratada, a Aurora também está incentivando o uso de tecnologia, como a mecanização no carregamento da produção, por meio da utilização de caixas bins. Segundo a cooperativa, atualmente, 87% do volume de uvas já é colhido pelos produtores cooperados com o auxílio de bins.

Caixas bins, com capacidade de até 500 quilos e transportadas por empilhadeiras, reduzem a necessidade de mão de obra — Foto: Zéto Telöken
Caixas bins, com capacidade de até 500 quilos e transportadas por empilhadeiras, reduzem a necessidade de mão de obra — Foto: Zéto Telöken

Para estimular a troca das tradicionais caixas de 20 quilos pelos bins, a Aurora viabiliza financiamento direto para a compra dos equipamentos, com juros semelhantes ao Pronaf, entre 5% e 6% ao ano, e com prazos de pagamento que chegam a 36 meses.

O gerente agrícola da cooperativa, Maurício Bonafé, diz que a meta é que, até 2027, todo o carregamento e descarregamento de uva da Aurora seja realizado por meio de bins com capacidade de até 500 quilos, transportados por empilhadeiras. “Além de diminuir a necessidade de mão de obra contratada, o uso do equipamento reduz o esforço excessivo durante a safra”, aponta Bonafé.

O produtor Vinícius Dall’Oglio, que adotou o sistema na propriedade, comenta que já conseguiu reduzir o número de funcionários para o carregamento da produção da última safra. “Duas a três pessoas me ajudavam no processo. Agora, não dependo de ninguém, porque o sistema faz tudo”, comemora. Ele comenta que precisou investir na aquisição de um trator adequado e na torre para o carregamento das caixas bins. Dessa maneira, os trabalhadores safristas atuam somente na colheita.

Nesta safra, a estimativa do produtor é colher em torno de 250 mil quilos de uvas, bem acima dos 125 mil quilos da safra passada, quando o clima prejudicou a produção. Ele também comemora o fato dos parreirais da propriedade não terem sido atingidos pelas chuvas intensas deste ano no Estado.

Produtor Domingos Moro investiu em máquina de colheita de uva  — Foto: Eduardo Benini
Produtor Domingos Moro investiu em máquina de colheita de uva — Foto: Eduardo Benini

Há ainda produtores que estão investindo na aquisição da máquina para colheita da uva. O viticultor Domingos Moro adquiriu um desses equipamentos e já colhe 40% da produção de maneira mecanizada. “Traz eficiência na colheita e uma grande economia”, avalia.

Bonafé explica que, enquanto um trabalhador colhe 1.000 quilos da fruta por dia, a máquina colhe 2.000 quilos por hora e há modelos que chegam a colher 5.000 quilos/hora, dependendo do modelo da máquina e da questão estrutural do vinhedo.

*A jornalista viajou a convite da Cooperativa Vinícola Aurora

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