Agricultura
Por — São Paulo

O ano de 2024 será lembrado como um período de desafios climáticos para a agricultura brasileira. As queimadas e secas severas causadas pelo fenômeno El Niño deixaram os solos agrícolas empobrecidos de minerais e nutrientes, comprometendo a recuperação das áreas por, ao menos, duas safras nos talhões mais atingidos pelas condições adversas.

É o que avaliam engenheiros agrônomos, que alertam também para o custo mais alto para o produtor, que teve a produtividade atingida diretamente este ano por consequência de uma seca que perdurou por mais de 100 dias no Centro-Sul do país.

A recuperação dessas terras tem se mostrado lenta e custosa, impactando diretamente a produtividade e o sustento de milhares de produtores rurais. A cana-de-açúcar foi uma das culturas com mais prejuízos, em São Paulo e em Minas Gerais. A perda de matéria orgânica nos solos e a dificuldade de manejo hídrico atrapalhou o crescimento das plantas e a qualidade da matéria-prima.

Além disso, a compactação causada pela passagem de maquinários agrícolas e pisoteio do gado em solos fragilizados agrava ainda mais o cenário.

"A seca e o déficit hídrico impactam muito a população microbiana do solo, mas dois grupos resistem mais, sendo tolerantes a essa realidade, como fungos e bactérias. Por isso, a pesquisa em biológicos e os próprios bioinsumos são alternativas que têm mostrado mais eficácia", explica o agrônomo Álefe Borges, gestor de portfólio da Bionat, empresa de biológicos parte do Essere Group, que atua no Brasil e Paraguai.

Álefe Borges é gestor de portfólio da Bionat, empresa de biológicos parte do Essere Group — Foto: Divulgação
Álefe Borges é gestor de portfólio da Bionat, empresa de biológicos parte do Essere Group — Foto: Divulgação

Borges comenta que há diferença entre o cenário de seca e o de queimada. Nas condições de estresse hídrico, existem camadas de solo mais profundas que absorveram água e conservam microrganismos resistentes. Nessas situações, o manejo regenerativo e a adoção de biológicos ajuda a reequilibrar a fertilidade do solo e, consequentemente, o desenvolvimento das lavouras.

"A queimada, por sua vez, é um agravante, pois as temperaturas nas superfícies dos solos são muito altas, levando embora toda a matéria orgânica e o alimento do solo. A gente acaba esterilizando uma faixa do local", explica.

Depois da chuva, vem a bonança?

A superfície do solo é o lugar onde há mais matéria orgânica, nutrientes e minerais, por isso a preocupação. Segundo Borges, 80% do sistema radicular da planta está nos primeiros centímetros do solo, portanto, quando ocorreram as queimadas, muitas plantas - mesmo as colhidas - enfraqueceram e 'não vingaram' na lavoura.

"Quando se prejudica a quantidade de matéria orgânica presente e de microrganismos benéficos e que estimulam o crescimento, também se prejudica o desenvolvimento da planta e a estrutura física do solo, porque há ressecamento, pode ter perda por erosão, entre outros prejuízos", cita o agrônomo.

Com o fogo, os nutrientes ficam livres no solo, o que não é positivo, reforça Borges. "Depois que vem a chuva, a maior parte deles vai embora por lixiviação. Antes, se tinha um solo que iria distribuir esses nutrientes de forma gradativa e, agora, a microbiota está em xeque. Nas primeiras chuvas, porém, esse solo vai perder a maior parte desses nutrientes", detalha.

O produtor fica, então, com a dúvida de como recompor a fertilidade das áreas produtivas. Reequilibrar o solo vai depender de investimento em bioinsumos, em práticas regenerativas e paciência para trabalhar as lavouras nas safras seguintes a fim de "ir recuperando os locais", orienta Borges.

"Nada está perdido. Nós não temos que trabalhar erradicação, temos que trabalhar um reequilíbrio do solo para voltar também a reduzir a população de possíveis pragas ou doenças", completa. Em janeiro, agricultores esperam chuvas e será um mês de trabalho nas lavouras, em que organismos prejudiciais podem se proliferar, caso o produtor não esteja atento ao calendário de chuvas, por exemplo.

No solo que ficou por tanto tempo sem água em 2024, o índice de chuvas intenso também pode impactar a produtividade. A recuperação dessas áreas deverá envolver investimentos em práticas de manejo sustentável e tecnologias de irrigação mais eficientes.

Soluções

A seca prolongada intensifica o processo de degradação ao dificultar a reposição de umidade no solo. A escassez de água afeta a decomposição da matéria orgânica e reduz a disponibilidade de nutrientes, comprometendo também a renovação das pastagens e o cultivo de grãos.

Outros especialistas do setor -, Bruno Neves, gestor da Kimberlit, e Danilo Storti, gestor da Loyder, - ambas empresas do grupo Essere - reforçam que a recuperação dos solos em áreas atingidas depende de ações coordenadas e investimentos em técnicas sustentáveis. Entre as principais recomendações estão:

  • Adubação orgânica: A aplicação de esterco, composto e biofertilizantes ajuda a restaurar a fertilidade do solo;
  • Sistema plantio direto: A prática reduz a erosão, preserva a umidade e favorece a formação de matéria orgânica;
  • Cobertura vegetal: O uso de plantas de cobertura protege o solo contra a radiação solar e a compactação, além de melhorar a infiltração de água;
  • Reflorestamento: Em áreas de encostas e margens de rios, o plantio de árvores nativas contribui para a retenção de solo e água;
  • Tecnologias de irrigação: A adoção de sistemas como gotejamento e pivô central, aliados a um manejo eficiente, garante melhor utilização da água.

Os especialistas lembram que a recuperação dos solos é um processo de médio a longo prazo, que exige dedicação e conhecimento. Além disso, o cenário climático futuro é incerto, o que demanda maior preparação e adaptação dos agentes da cadeia produtiva.

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