“Um jogo só acaba quando termina”, alerta o engenheiro-agrônomo Geri Meneghello, Doutor em Ciência e Tecnologia de Sementes. A analogia é usada por ele para chamar a atenção para a necessidade de cuidados com as sementes utilizadas na agricultura: “o jogo da semente só termina quando ela é semeada e vai emergir para dar origem a uma nova planta”. Leia também Sementes 'piratas' geram prejuízo de R$ 2,5 bilhões por ano no BrasilCalor e estiagem afetam produção de sementes de soja para a safra 2024/25Produtor brasileiro gasta 18% mais com tratamento de sementes em 2023/24 Meneghello enfatiza a necessidade de condições ideais no armazenamento das sementes das culturas tradicionais de grãos - soja, milho, trigo, arroz -, na propriedade rural, inclusive nas semanas que antecedem a fase de semeadura e de emergência. “Se eu não cuidar da qualidade da semente nessas últimas semanas, posso comprometer o sucesso da colheita”, ressalta. Continuar lendo O agrônomo reforça que existe uma relação direta entre a qualidade da semente e o potencial produtivo das culturas. Ele explica que logo após o ponto da maturidade fisiológica - antes da colheita -, quando atingem o vigor e nível máximo de qualidade, as sementes iniciam o processo de deterioração. “Esse processo é inexorável e irreversível, e a semente vai gradativamente reduzindo a sua qualidade”, observa. Por isso, a recomendação é mantê-la em condições favoráveis para retardar ao máximo a deterioração. Condições ideais As condições ideais para armazenamento das sementes são um ambiente com clima frio e seco. “Na prática, frio significa temperaturas abaixo de 20º C e, seco, umidade relativa do ar na faixa de 55% e 60%. Assim, tenho condições favoráveis para preservar a qualidade”, orienta Meneghello. O especialista acrescenta que quanto menor a temperatura, melhor será para a conservação da semente. Mas lembra que isso demandará um custo energético. O tema foi abordado durante o Congresso Brasileiro de Sementes - CBSementes, promovido pela Associação Brasileira de Tecnologia de Sementes (Abrates) entre os dias 10 e 13 de setembro, em Foz do Iguaçu (PR). “Hoje temos tecnologia disponível para gerar energia eólica, fotovoltaica, energias limpas que podem ser utilizadas no armazenamento de sementes e isso contribui diretamente para a sustentabilidade”, resume. Antes de chegar ao campo, o produto passa, normalmente, por controle de qualidade nas empresas sementeiras. Na propriedade rural, é preciso então definir um local para armazenamento, priorizando espaços secos e bem arejados, o mais próximo possível da temperatura recomendada. Geri Meneghello participou do Congresso Brasileiro de Sementes - CBSementes — Foto: Valdecir Gomes da Silva “É importante avaliar onde eu vou armazenar a semente depois que recebo ela na minha propriedade, por algumas semanas, até semear. É em uma varanda, é em uma lona embaixo de uma árvore ou é em uma sala minimamente climatizada, em que eu consigo manter condições mais favoráveis? Obviamente que a última alternativa é muito melhor do que a primeira”, analisa o agrônomo. Sobretudo em relação às sementes de soja, que tem amplo cultivo em regiões tropicais do Brasil, como o Centro-Oeste, o alerta para se manter as condições ideais de temperatura e umidade é reforçado. “Do ponto de vista de preservação da qualidade, os compostos da soja a tornam de mais difícil conservação do que outras culturas”, compara. Recomendações Além do armazenamento correto, outras recomendações devem ser seguidas para se obter e manter sementes de qualidade na propriedade. A primeira dica apontada por Meneghello é contar com um fornecedor confiável: “é fundamental saber qual é a origem da semente, o que o produtor está entregando em termos de garantia de qualidade. Para isso, tenho que ter relações comerciais sólidas com o meu fornecedor”. Outra recomendação é contar com um profissional especializado para orientar o produtor rural na interpretação das informações apresentadas pelas empresas ou fornecedores, a fim de ser mais assertivo na tomada de decisão na hora de escolher a semente. Por fim, adotar os cuidados indicados para o recebimento e armazenamento das sementes. Mudanças climáticas Os eventos extremos do clima também podem impactar a produção agrícola, o que envolve desde a semente, “que se faz no campo”, pontua o especialista. O excesso de água - como as chuvas intensas que atingiram o Rio Grande do Sul neste ano - acelera o processo de deterioração das sementes que estão na lavoura. A seca também influencia, pela falta de água, o processo de formação e desenvolvimento das sementes, que pode não ocorrer plenamente. Em ambos os casos, Meneghello afirma que a qualidade pode ser afetada. Fernando Henning, presidente da Abrates e do CBSementes — Foto: Valdecir Gomes da Silva O presidente da Abrates e do CBSementes, pesquisador Fernando Henning, destaca que o setor está atento à questão das mudanças climáticas, com pesquisas que vêm sendo realizadas há décadas. Ele também acredita que a preocupação com a qualidade da semente e a sustentabilidade vai muito além de colher e colocar o material em um armazém refrigerado. “É também conseguir explorar o máximo possível a propriedade de maneira que os resultados demonstrem a qualidade do sistema de produção”, salienta. Além das grandes culturas, as discussões durante o congresso contemplaram outras espécies, incluindo as sementes de forrageiras, florestais, olerícolas, silvestres e espécies medicinais. Meneghello explica que cada uma dessas categorias possui suas próprias características, exigindo cuidados específicos em função de sua morfologia, composição química e necessidades de armazenamento, inclusive, por diferentes períodos. *A jornalista viajou a convite da Associação Brasileira de Tecnologia de Sementes - Abrates Mais recente Próxima Mercado de cacau chegará a US$ 23,54 bilhões em 2030, diz pesquisa