TIMES

Por Juliana Vaz — Santos, SP


Não é remake do filme Jamaica abaixo de Zero, mas a história do brasileiro Kauê Fhelipe, de 25 anos, cabe muito bem em um longa metragem para as telonas.

Paratleta da Seleção Brasileira de Ski Cross Country, Kauê sonha disputar e ser campeão dos Jogos Paralímpicos de Inverno, que serão disputados em março de 2026, nas cidades de Milão e Cortina, na Itália.

Kauê Fhelipe sonha disputar os Jogos paralímpicos de Inverno 2026 — Foto: Gregor Sieder/Arquivo Pessoal Kauê Fhelipe

Sabedor da competitividade, o santista aproveita todas as oportunidades para treinar a modalidade que pratica, mesmo sem o elemento principal: a neve. Em cima do mountainboard é possível realizar alguns exercícios na areia; veja no vídeo abaixo.

- O equipamento é bem maleável, parecido com movimentos que o ski faz na neve, nas curvas. Mas as condições climáticas são bem diferentes. As variáveis também. Lá [na Argentina] fazemos um treino com uma certa espessura de neve. Duas horas depois, ela [a neve] está completamente diferente e precisa fazer de novo - explica em entrevista exclusiva ao ge.

Ainda de acordo com Kauê, na areia, a forma como inclina o tronco e o movimento que precisa fazer segurando o bastão com os braços também o ajudam a melhorar a performance em competições fora do Brasil.

Paratleta da Baixada Santista treina esporte de neve na praia

Paratleta da Baixada Santista treina esporte de neve na praia

Há um ano, o paratleta de Santos mudou para São Carlos, no interior de SP, onde treina com a Seleção Brasileira de Ski Cross Country no NEBAR – Núcleo de Esporte de Base para o Alto Rendimento de Esportes na Neve. A equipe pratica rollerski - modalidade adaptada ao asfalto, que utiliza um esqui com rodinhas.

Trajetória no esporte paralímpico

No final do ano de 2020, Kauê contraiu COVID-19. Os primeiros sintomas foram semelhantes aos de uma gripe, mas alguns dias depois começou a sentir fortes dores nas costas. Ele conta que os médicos não conseguiram identificar a causa, até que um dia acordou sem sentir os movimentos do umbigo para baixo.

- Só em 2021, após vários exames, passei por um neurocirurgião que identificou uma inflamação na minha medula recorrente à Covid, e o nome dessa doença se chama "mielite transversa”.

Na época, com apenas 21 anos, Kauê trabalhava com produção cinematográfica e somente depois de ficar paraplégico encontrou no esporte uma nova profissão. Inicialmente optou por canoagem, depois se aventurou no tênis adaptado, mas foi durante uma reabilitação que soube de um evento paralímpico e foi apresentado ao rollerski.

Kauê Fhelipe treina com a seleção brasileira em São Carlos, no interior de SP — Foto: Arquivo pessoal/Kauê Fhelipe

- Pensei, nossa que diferente treinar um esporte de inverno no Brasil. Surgiu muita curiosidade. Pesquisei mais, comecei a praticar e estou até hoje.

A Maristela Almeida, mãe do Kauê, admite que no início ficou com medo de ver o filho praticando um esporte radical.

- Eu tinha um filho que parou de andar e ainda foi pra neve. Se parar pra pensar assusta, mas depois eu vi que ele tem o dom.

Contato com a neve

A primeira experiência na neve foi ano passado, quando Kauê participou do Marcha Blanca, na Argentina, um dos mais tradicionais eventos de esportes de inverno da América do Sul.

- Foi uma experiência incrível, momento que pensei estar no lugar certo. E ter conquistado o terceiro lugar foi mágico. De primeira assim, conseguir a medalha foi incrível - relembra.

Kauê Fhelipe participou da Copa Continental Europeia, na Noruega, e ficou entre os dez melhores do mundo — Foto: Arquivo pessoal/Kauê Fhelipe

Em seguida, o paratleta da Seleção Brasileira foi convocado para participar de uma Copa Continental Europeia, na Noruega, e ficou entre os dez melhores do mundo.

Hoje o santista é o quatro colocado no ranking brasileiro de ski cross country e tem vaga praticamente garantida para os Jogos Paralímpicos de Inverno 2026.

- Quero ser conhecido como atleta de para ski cross contry e rollerski e não como alguém que adquiriu a deficiência física, esta na cadeira de rodas e superou. Quero ser conhecido por ser bom no que faço. Eu sou um atleta como qualquer outro sem deficiência. Tenho alimentação restrita, tenho que treinar todos os dias e abdicar de estar perto da minha família. Sou quem eu sou pelo esporte. E é o esporte que me define, não a deficiência.

Veja também

Mais do ge