TIMES

Por João Dall'ara* — São Paulo


Kayke fala sobre período no São Bernardo

Kayke fala sobre período no São Bernardo

O São Bernardo luta pelo acesso à Série B do Brasileirão no ritmo dos gols de Kayke. O experiente centroavante de 36 anos, com passagens por Flamengo, Santos e outros tantos clubes no Brasil e no exterior, renasceu no time da Série C e é o artilheiro da competição, com dez gols, ao lado de Paulo Sérgio, do Náutico.

Formado nas categorias de base do Fla, Kayke chegou ao São Bernardo no início de 2024, para a disputa do Campeonato Paulista, mas se firmou de vez na competição nacional, já sem o técnico Márcio Zanardi e sob comando de Ricardo Catalá. Os gols começaram a sair e despertaram um novo sentimento no centroavante.

– Hoje ainda encontro esse motivo para agir todos os dias, levantar, sair de casa feliz e fazer o meu melhor. Aqui eu encontrei essa alegria, encontrei um clube que tem me dado uma responsabilidade dentro e fora de campo como líder. Novamente me encontrei no lugar que os jogadores acreditam em mim, a comissão técnica acredita muito em mim – comemorou Kayke, em entrevista ao ge.

Remo sai na frente, mas deixa São Bernardo empatar

Remo sai na frente, mas deixa São Bernardo empatar

– Eu cheguei em janeiro e encontrei um time já com uma identidade. Isso ao meu ver é o mais difícil, um clube que prioriza a permanência de jogadores que já têm uma história aqui. Tem um pilar aqui.

Com Ricardo Catalá, Kayke se firmou no São Bernardo e passou a ser peça fundamental do time. No Paulistão, o artilheiro alternou momentos entre titular e reserva, mas cresceu com o início da Série C, a ponto de marcar quase um terço dos gols do Bernô na competição – fez 10 dos 32.

– Quando o coletivo funciona bem, o individual aparece. Meus companheiros têm me ajudado, a bola tem chegado até a mim, e eu tenho feito a minha parte. Espero que a gente faça muito mais gols nessa fase final para classificar pra Série B, que é o nosso grande objetivo da temporada – afirmou Kayke.

Um grande momento para a carreira de quem já rodou o mundo, desbancou o astro Paolo Guerrero no Flamengo e viu joias como Rodrygo e Yuri Alberto surgirem durante sua passagem pelo Santos.

Kayke comemora os três gols que marcou contra o Volta Redonda — Foto: Reprodução: Instagram/São Bernardo FC

Mais gols do que Guerrero no Fla

Hoje craque do São Bernardo, Kayke já foi promessa do Flamengo, clube no qual fez toda a sua base e iniciou sua carreira como profissional. Natural de Brasília, ele se mudou com a família para o Rio de Janeiro ainda criança e começou no Rubro-Negro aos oito anos de idade.

– O Flamengo é o meu clube formador. Formou meu caráter e a pessoa que hoje sou também para o esporte. Eu devo tudo ao Flamengo e aos ensinamentos que eu tive ali dentro – diz o atacante.

Kayke fez sua estreia como profissional aos 19 anos e chegou a disputar quatro jogos pelo Rubro-Negro em 2007, mas não teve sequência e passou a rodar pelo mundo do futebol. Hoje, mais experiente, ele compreende os motivos da sua partida:

– Eu ainda não estava preparado para assumir aquela responsabilidade, então depois que passa a gente entende. Eu era muito novo, inexperiente, e o Flamengo é uma pressão muito grande.

Mesmo com a dura concorrência no ataque, que tinha nomes como Souza Caveirão, Obina e Diego Tardelli, Kayke acredita que a maturidade (ou a falta dela) foi o fator determinante.

– Talvez eu tivesse condições técnicas, mas ainda me faltava muita coisa para estar no profissional. Na época a gente acaba não entendendo tão bem, mas depois passando eu consegui enxergar de uma maneira diferente – admitiu.

Depois de rodar por clubes de menor expressão no Brasil e no mundo, Kayke retornou ao Flamengo em 2015, no melhor ano da sua carreira. O atacante fez um primeiro semestre espetacular no ABC de Natal, com 19 gols em 35 jogos.

Kayke, atacante do ABC - craque do Campeonato Potiguar — Foto: Klênyo Galvão/GloboEsporte.com

– Foi um ano muito especial em todos os sentidos e marcante na minha história, não só como atleta, mas como homem, como marido e como pai de família. Foi a hora que aconteceu, né? Ali eu conheci Jesus junto com a minha esposa, a gente se batizou. Pedi ela em casamento e ela engravidou do nosso primeiro filho, que hoje está com 8 anos.

Kayke chegou ao ABC no início de 2015 e fez história no Campeonato Potiguar. Apesar de ter sido derrotado na final para o América-RN, o atacante foi o artilheiro, melhor jogador e fez parte da seleção do campeonato.

– Na premiação eu nem consegui sair com todos os troféus – relembrou Kayke.

De férias, Kayke "arranha" cavaco, fala do Flamengo e bate papo com Xande de Pilares

De férias, Kayke "arranha" cavaco, fala do Flamengo e bate papo com Xande de Pilares

Ele manteve o alto nível no início da Série B e despertou o interesse do Flamengo. A proposta chegou, e o centroavante realizou o sonho de retornar ao clube que o formou. Foi um período curto no Rubro-Negro, cerca de cinco meses, mas que seria decisivo para a história do artilheiro.

– Quando voltei em 2015 era outro jogador, totalmente preparado, tanto que no meu retorno o Guerrero era o centroavante principal e eu brigava por posição de uma maneira saudável. Eu fiz o dobro de gols que ele fez na temporada, terminei o ano com 27 gols, se eu não me engano, e ele fez 13.

(Nota da redação: em 2015, Kayke fez 24 gols em 50 jogos - entre ABC e Flamengo. Guerrero, por sua vez, fez 14 gols em 36 jogos - entre Corinthians e Fla. No Brasileiro, que os dois jogaram pelo Rubro-Negro, Kayke também leva a melhor: seis gols contra três do peruano)

Kayke comemora gol do Flamengo; era rotina em 2015 — Foto: Alexandre Lago/GloboEsporte.com

O atacante foi útil e viveu boa sequência pelo Flamengo em seu retorno. Mas, ao final da temporada, o Rubro-Negro recebeu uma proposta do Japão e vendeu o jogador.

Kayke explica que o poder de investimento do time carioca em 2015 não era aquele ao qual a torcida se acostumou nos últimos anos.

– A minha posição é complicada (risos), se você vai mal você é mandado embora, se você vai bem você é vendido. Fui bem demais e o Flamengo me vendeu. O Yokohama veio com uma proposta legal e acabei saindo.

"Em casa", Kayke faz dois gols e Flamengo vence Avaí na Arena Dunas

"Em casa", Kayke faz dois gols e Flamengo vence Avaí na Arena Dunas

Rodando pelo mundo

A ida ao Japão não foi a primeira experiência de Kayke fora do Brasil. No início da carreira, após passar por Brasiliense e Macaé por empréstimo do Flamengo, o atacante jogou no Vila Nova e depois foi para o norte da Europa.

Kayke jogou por BK Hacken, da Suécia, Tromso, da Noruega, e Aalborg BK, da Dinamarca. O time dinamarquês foi o que mais marcou o atacante durante sua passagem pela Escandinávia. Foram cerca de dois anos no país.

Kayke Moreno (D) em ação pelo AAB Aalborg, da Dinamarca, em 2011 — Foto: Lars Ronbog/FrontzoneSport via Getty Images

– É um time que se eu não tivesse passado tanto tempo eu não teria aprendido tanto. Me fez crescer demais de todos os sentidos, então eu carrego o Aalborg, da Dinamarca, com muito carinho.

O atacante deixou o Brasil muito jovem, acostumado com o futebol na praia e com o calor do Rio de Janeiro. Além das diferenças no idioma, climáticas e culturais, ele também teve que se adaptar ao estilo de futebol do país.

– Não me preocupava muito, não sabia muito como fazer sem bola. Eu cresci muito nesse sentido, joguei em outras posições, aprendi a jogar de ponta dos dois lados. Aquilo me moldou realmente como um um jogador de futebol. Quando eu voltei ao Brasil depois, já me sentia muito bem preparado.

Kayke relembra passagens por clubes da Escandinávia

Kayke relembra passagens por clubes da Escandinávia

Fora de campo, além de aprender a falar fluentemente inglês, Kayke pôde experienciar um fenômeno na Noruega.

– Eu tive o prazer de ver a Aurora Boreal. Eu morava em uma cidade muito no norte, e é algo que as pessoas fazem expedições em um tempo determinado do ano para encontrar a Aurora Boreal. Eu morava em um lugar que eu ia praticamente toda noite e era muito louco isso, viver em um lugar em que você tem experiências como essa – relembrou.

No exterior, o atacante também jogou por um curto período pelo Nacional de Portugal, em 2014. Depois teve a passagem pelo Japão, em 2016, e sua última experiência fora do Brasil foi entre 2019 e 2022, quando jogou no Oriente Médio, por times do Catar e dos Emirados Árabes.

– Agora no final de carreira, já mais velho, mais experiente e sem medo de coisas novas, a gente joga em qualquer desafio. Costumam falar que brasileiro se adapta em qualquer situação, a gente vai para cima mesmo.

Ele "previu" Rodrygo no Santos

No futebol brasileiro, o atacante também jogou por Paraná, Atlético-GO, Santos, Bahia, Fluminense, Goiás, Sport e Chapecoense, antes de chegar ao São Bernardo em 2024.

Um dos melhores momentos do Kayke depois do ano mágico de 2015 foi no Santos, em 2017. O centroavante teve a missão de substituir o artilheiro e capitão do time da Vila, Ricardo Oliveira, que sofreu com lesões e teve uma pneumonia ao longo da temporada.

Kayke e Ricardo Oliveira não ficam no Santos em 2018 — Foto: Ivan Storti/Santos FC

Kayke fez 42 jogos pelo time do litoral paulista e chegou a decidir um jogo de Libertadores. Ele fez dois gols na vitória do Santos por 3 a 2 sobre o Athletico-PR, nas oitavas de final.

– Foi uma passagem muito boa pelo Santos, um clube pelo qual eu tenho um carinho muito grande. [...] Aquele ano foi um ano muito marcante na minha carreira, porque talvez tenha sido um dos melhores times em que eu já pude figurar.

O Santos contava com nomes de peso, como Bruno Henrique, Renato, Ricardo Oliveira e Lucas Lima, e também tinha jovens promessas que hoje são destaques em seus clubes. No ataque, ainda muito jovens, Rodrygo e Yuri Alberto começavam a dar seus primeiros chutes no profissional.

– São meninos pelos quais eu tenho um carinho muito grande. [...] O Santos é diferente nesse sentido, e eu fico feliz de ter feito parte da história deles. Meninos que estavam começando e que hoje a gente vê desfrutando do futebol num nível muito alto – contou o atacante.

Não é surpresa para o centroavante que Rodrygo tenha despontado no Real Madrid:

– Desde moleque, quando treinava com a gente, todo mundo já via que era diferente. Muito magrinho. muito rápido, não tinha medo da pancada, era era algo que a gente já imaginava que ia acontecer.

O objetivo pelo São Bernardo

O capítulo mais recente da história de Kayke no futebol brasileiro é o São Bernardo, onde o camisa 99 reencontrou a fase artilheira e virou peça-chave na engrenagem do treinador Ricardo Catalá. O principal objetivo é alçar o clube à segunda divisão do futebol brasileiro pela primeira vez em sua história.

– Espero construir uma história aqui em São Bernardo, já tem sido especial para mim. Nunca tinha jogado em um time de uma divisão mais baixa no cenário do futebol brasileiro, mas é um time que hoje me dá uma expectativa de fazer ele grande e fazer parte da história. Isso é muito legal.

Metas no São Bernardo

Metas no São Bernardo

O Tigre do ABC começou bem a temporada e fechou a primeira fase do Paulistão na terceira posição do Grupo D, com 21 pontos. São Paulo, com 22, e Novorizontino, com os mesmos 21, avançaram para as quartas de final. Apesar de não se classificar, o São Bernardo teve pontuação para passar nos outros três grupos.

Na Copa do Brasil, o Bernô pegou o Corinthians logo na segunda fase e não resistiu. E na Série C, o time se classificou para a segunda fase com a quarta melhor campanha e vive a expectativa de subir de divisão. A equipe está em último no Grupo B após duas rodadas, mas está vivo na disputa por uma das duas vagas de acesso com Volta Redonda, Remo e Botafogo-PB.

Kayke comemora vitória do São Bernardo na Série C — Foto: Reprodução: Instagram/São Bernardo FC

Aos 36 anos, Kayke quer marcar seu nome na história do Bernô com o acesso inédito à Série B do Brasileirão. A combinação entre jogador e clube faz com que a motivação no dia a dia se mantenha viva.

– É aquele momento final de preparação, vamos dizer assim. Como se fosse uma corrida de maratona e a gente dar aquele sprint final para terminar bem aquilo que a gente vem fazendo até agora.

*Colaborou sob supervisão de Diego Ribeiro

Veja também

Mais do ge