Vocabulário da Diversidade: atletas paralímpicos explicam termos que devemos evitar
Qual a primeira palavra que vem à cabeça quando você pensa em Paralimpíadas? Se a resposta é superação, você definitivamente precisa ouvir o que os atletas têm a dizer. Eles querem superar algumas coisas, sim: a distância, o tempo, os adversários...mas não a deficiência. Dizer que alguém é um exemplo de superação apenas por causa da deficiência é reduzir sua trajetória. É ser capacitista. As pessoas com deficiência (PCD) não são coitadinhas.
Calma! Não estamos menosprezando o esforço de ninguém. Chegar às Paralimpíadas é um feito gigante. Reduzir o atleta paralímpico a alguém que superou algo é minimizar o que ele realmente é: uma pessoa extremamente talentosa e competente no esporte. Edênia Garcia, dona de três medalhas nos Jogos, explica como é importante refletir sobre superação x performance.
Os Jogos Paralímpicos começam nesta terça-feira. O SporTV transmite ao vivo cerca de 100 horas de eventos, e o ge acompanha toda a competição em tempo real!
- De todas as matérias que fizeram sobre mim, quase 90% são sobre superação. Sempre com esse viés inconsciente: "Só de ela ser atleta já superou a deficiência, é uma guerreira". Não é só isso. Vamos além? O que vem antes: a deficiência ou a pessoa? É a pessoa. Vamos pensar numa pessoa performando, colocando em prática o que treina e se aperfeiçoa diariamente - diz Edênia, que participou, ao lado de Clodoaldo Silva, de um bate-papo com a redação do esporte da Globo.
AFINAL, O QUE É CAPACITISMO?
Resumidamente, capacitismo é achar que as pessoas com deficiência são menos capazes do que as pessoas sem deficiência. Ele é estrutural, como o racismo, o machismo e a LGBTQIA+fobia. Quase todos fomos ou ainda somos capacitistas. Por isso alguns se surpreendem quando vêem uma PCD exercendo um direito que deveria ser de todos: estudando, trabalhando, se relacionando.
Ícone do esporte paralímpico, Clodoaldo Silva vai ser um dos comentaristas da Globo nas Paralimpíadas de Tóquio 2020. Ele conta que a evolução nas abordagens vem desde os Jogos de Atenas 2004, primeira edição transmitida ao vivo. E relembra quando, no Mundial de 2010, se confundiu nas provas. Em vez de nadar borboleta, nadou costas.
- Em 2004, lembro que algumas matérias não eram sobre o "Clodoaldo Silva coitadinho", e sim o "Clodoaldo Silva atleta". Em 2010, quando errei a prova no Mundial, no dia seguinte a chamada era "Vexame de Clodoaldo". Os jornais não tiveram peninha, piedade. E eu gostei, pois foi uma tremenda cagada do Clodoaldo (risos). Não tem que passar a mão na cabeça.
NÃO USE DEFICIÊNCIA COMO XINGAMENTO
Na hora de torcer pelos atletas, vale prestar atenção, já que o capacitismo também se manifesta nas palavras. Não use deficiência como adjetivo ou xingamento aleatório (mesmo não direcionado). Ex: chamar alguém ou se autodefinir como "retardado, mongol, autista". Assista ao vídeo no início da reportagem para conhecer mais expressões que devemos evitar.
- Capacitismo é um termo novo. Sempre usei discriminação, preconceito. Vamos ter paciência uns com os outros, a gente está aprendendo. Eu mesma sou uma capacitista em desconstrução – conta Edênia, direto de Tóquio.
De acordo com dados do IBGE de 2019, 25% dos brasileiros têm algum tipo de deficiência. No mundo são 15%, ou seja: cerca de 1 bilhão de pessoas. Pessoas maravilhosamente comuns, como diz o slogan da campanha #NósOs15 (veja o vídeo abaixo).
*Bruna Campos é produtora e cobre esportes paralímpicos desde 2015; Gabi Lomba é editora da home e das redes sociais do ge.globo e mãe de Bernardo, um menino de 8 anos que tem síndrome de Down
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