"Ou vai bem na escola, ou não vai andar de kart". A frase que ditou o ritmo na casa dos Antonelli por anos sugere o quão jovem é o substituto de Lewis Hamilton na Mercedes em 2025. A promoção de Andrea Kimi Antonelli, de apenas 18 anos, deu o que falar por sua pouca experiência no esporte. Mas foi justamente o potencial demonstrado pelo adolescente que motivou a decisão da equipe.
Natural da região da Bolonha, o adolescente é considerado como o "novo Max Verstappen" porque, assim como o tricampeão da RBR fez em 2015, chegará à elite do automobilismo europeu depois de queimar algumas etapas - Max não chegou a correr na Fórmula 2, e Kimi pulou a Fórmula 3.
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E antes de conquistar sua primeira vitória em 2016, o holandês foi alvo de críticas pelo excesso de colisões e de "otimismo" em algumas manobras, apesar da velocidade demonstrada desde o início. Ainda é cedo para saber se Antonelli seguirá os passos do tricampeão, mas sua trajetória nas categorias de base chama atenção.
Antonelli será o primeiro piloto novato a correr pela Mercedes nos últimos 70 anos, desde o estreante Karl Kling na temporada 1954. Todos os últimos titulares da marca, incluindo George Russell (seu colega em 2025), Nico Rosberg, Valtteri Bottas, Michael Schumacher e o próprio Hamilton já haviam passado por outras equipes antes.
Fã de Senna e aluno exemplar, mas sem carteira de motorista
- Infelizmente, eu não cheguei a vê-lo ao vivo. Mas fiquei fascinado por (Ayrton) Senna quando, ainda criança, assisti a uma reportagem sobre ele na televisão. Desde então, ele tem sido uma fonte de inspiração e eu assisto a muitos vídeos e imagens onboard - revelou o italiano, que deve correr na F1 em 2024 com o mesmo número utilizado por Senna em algumas temporadas: o 12.
Como completou 18 anos há poucos dias, em 25 de agosto, Antonelli ainda não pôde obter sua carteira de motorista, mesmo que já dirija carros de corrida a mais de 250 km/h. Fora das pistas, namora uma piloto de kart checa, Eliska Babickova.
- Tanto a mãe dele quanto eu - e ela pegou mais no pé do que eu -, insistimos muito pra que ele continuasse seus estudos. Como sou do ramo, sei como é difícil conciliar o esporte nesse nível com a escola. Vamos tentar conciliar tudo até o fim do ano, apesar de seus compromissos com a Fórmula 2. Eu costumava dizer a ele: ‘Ou você vai bem na escola ou não vai andar de kart" - contou o pai de Kimi, Marco Antonelli.
O adolescente ainda está na escola: ele faz o quinto e último ano do equivalente ao ensino médio no Instituto Técnico Salvemini di Casalecchio di Reno, com ênfase em Relações Internacionais e Marketing. Lá, integra um programa especial para estudantes que competem em esportes de alto rendimento e, assim, pode estudar apesar das frequentes ausências para disputar corridas.
- Ele tem uma média excelente, todos os últimos anos foram com notas acima de 8. Ele é muito humilde, esse é o seu ponto forte - revelou o diretor da escola, Carlo Braga.
- Meus professores sabem da minha situação e são compreensíveis comigo, mas eu ainda tento fazer o meu melhor. Levo meus livros para o hotel nos fins de semana de corrida e tento estudar quando posso, mesmo durante as viagens - disse o piloto.
Primeiros passos no esporte
Antonelli é filho de piloto, Marco Antonelli, que disputou provas da GT3 e da Fórmula 4 e também é dono de uma equipe, a AKM Motorsport. Marco ainda foi piloto de testes da Alfa Romeo na DTM, campeonato alemão de turismo.
Ele, porém, quase esteve em outro esporte: o futebol. O pai do jovem piloto garante que ele também tinha talento com a bola nos pés, mas o amor pelo automobilismo venceu:
- Eu sempre joguei futebol e tentamos levá-lo nessa direção; e ele também era bom. Mas, para meu filho, o apelo dos motores era muito forte. Ele chegou a ter cerca de 150 carros de brinquedo, os colocava no chão e organizava corridas, até fazia o papel de comentarista. Mas nós o "infectamos", já que ele ia para a pista com a gente desde que estava no berço.
Kimi deu as primeiras voltas no kart com sete anos e, em 2015, aos oito, passou a competir. Sua primeira prova foi em Adria: ele ganhou ao largar da pole position com 7s sobre o segundo colocado. Na modalidade, o italiano também venceu a Grande Final de Easykart International; venceu duas vezes a Euro Series da WSK, a Super Master Series, e foi bicampeão continental de kart em 2020 e 2021.
O piloto ainda acumulou um terceiro lugar na WSK Super Master Series e o vice-campeonato da WSK Final Cup, em 2017. Sua campanha no Mundial, porém, foi afetada por um acidente no qual ele fraturou o pé e uma perna.
Negociação com a Ferrari e chegada à Mercedes
Antonelli esteve na mira da Mercedes desde a infância: no GP da Itália de Fórmula 1 em 2017, o chefe Toto Wolff soube do piloto por meio de Giancarlo Minardi, fundador da equipe de mesmo nome na F1, e o filho dele, Giovanni Minardi.
Na semana do GP de Mônaco de 2018, Kimi assinou com a Academia da equipe alemã, que seguiu observando-o desde então. Mas o time chefiado por Wolff não foi o único de olho no piloto. A Ferrari , na época comandada por Maurizio Arrivabene, tentou fechar com ele, mas o negócio não avançou por imbróglios contratuais e a pouca idade de Antonelli - na época, com 12 anos.
O adolescente era representado pela tradicional equipe Tony Kart, na Itália, ligada à Ferrari. Depois de fechar com a Mercedes até 2028, ele passou a competir com a equipe Energy Corse. Kimi também já correu com a Kart Republic, time que foi representado no passado pelos campeões Lewis Hamilton e Nico Rosberg, e com a equipe do próprio Rosberg no kart.
Estreia em monopostos
Antonelli estreou em monopostos em 2021, guiando o carro da Prema na Fórmula 4 italiana: disputou as três últimas rodadas do ano, conquistando três pódios e fechando o campeonato em décimo lugar com 54 pontos. No ano seguinte, seu primeiro completo, ele foi campeão com 13 vitórias.
Ainda em 2022, o italiano disputou a F4 dos Emirados Árabes, vencendo duas das quatro corridas que disputou, e a F4 alemã, cujo título também faturou. Em 2023, Kimi migrou para a Formula Regional Europeia (FRECA), sendo campeão em sua temporada inaugural. Simultaneamente, ele conquistou o campeonato da Fórmula Regional do Oriente Médio.
Os resultados motivaram a Mercedes a antecipar sua formação visando a F1 e, em 2024, Antonelli foi direto para a Fórmula 2. Apesar de um começo mais difícil no último degrau antes da elite do automobilismo da Europa, ele seguiu pontuando com regularidade nas primeiras etapas.
Em Barcelona e na Áustria, porém, ele não teve bom desempenho, seguindo em um ritmo mais inconsistente a partir da etapa. No entanto, foi neste período que o italiano conquistou as duas primeiras vitórias na categoria, na Inglaterra e Hungria.
Kimi hoje é sexto colocado no campeonato, com 99 pontos; ele representa a Prema ao lado de Oliver Bearman, futuro piloto da Haas e 14º na temporada da F2.
Pavimentando o futuro na Mercedes
O chefe da equipe, Toto Wolff, revelou já ter pensado em Antonelli no momento em que Lewis Hamilton lhe comunicou sobre a decisão de ir para a Ferrari, no fim de janeiro. Começou, aí, o processo de preparação do adolescente que, na época, ainda tinha 17 anos.
Kimi fez alguns testes privados com carros antigos da Mercedes, cujos resultados impressionaram o time. Em abril, ele guiou o W12, carro de 2021, no Circuito de Spielberg na Áustria. Um mês depois, pilotou o W13 (modelo de 2022) no Autódromo Enzo e Dino Ferrari em Imola. Em junho, outra sessão com o mesmo carro, mas no Circuito da Barcelona-Catalunha na Espanha.
A equipe alemã teria oferecido um contrato menor a Hamilton, de saída para a Ferrari, justamente visando a promoção futura de Antonelli. E neste período, a Federação Internacional do Automobilismo (FIA) revelou ter recebido um pedido de superlicença para Antonelli, que até então, não poderia emitir o documento que permite guiar na F1; para isso, ele deveria ser maior de 18 anos.
Até 2015, a F1 não limitava a idade dos pilotos recém-chegados na categoria. Mas depois da ascensão astronômica do tricampeão Verstappen, cuja temporada de estreia foi marcada por incidentes e críticas ao temperamento do adolescente holandês, impôs uma idade mínima para o grid.
A questão levantou rumores sobre a possibilidade de Antonelli substituir Logan Sargeant na Williams ainda em 2024, mas a vaga do americano ficou com o piloto da Academia da equipe britânica, o argentino Franco Colapinto. Kimi voltou, então, a protagonizar a disputa pela vaga da Mercedes - e o caminho para ele ficou aberto com o acerto de Carlos Sainz e a mesma Williams para 2025.
Estreia em treinos livres marcada por batida
Logo após o GP da Holanda, a Mercedes anunciou que Antonelli faria sua estreia com o atual carro da F1 guiando o W15 da equipe no primeiro treino do GP da Itália. Diante de seus compatriotas, porém, o adolescente só teve 15 minutos em cena: ele bateu na curva Parabolica logo após anotar a melhor volta da sessão, que foi desbancada posteriormente por Hamilton.
Kimi sofreu um impacto de 45G e participou da etapa da F2 ainda com dores. A Mercedes justificou a colisão com o fato do italiano estar muito rápido - o que, de certa forma, era verdade: em sua segunda tentativa, ele anotou os melhores tempos nos dois primeiros setores do Circuito de Monza. Foi aí que acabou rodando em alta velocidade na curva Parabolica - a última do traçado.
A média de sua velocidade mínima superou até o líder do treino, Max Verstappen, em 7 km/h: Na Ascari, por exemplo, o italiano passou a 190 km/h enquanto o tricampeão percorreu o trecho com 176 km/h em sua volta mais rápida.
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