Primeira categoria 100% feminina da história do automobilismo mundial, a W Series teve sua última corrida realizada no dia 2 de outubro de 2022 após três temporadas disputadas. A trajetória do campeonato foi interrompida após uma grave crise financeira, causada principalmente pelos efeitos da pandemia da Covid-19 e por patrocinadores que acabaram não concretizando um apoio financeiro que seria essencial para a sobrevivência da categoria, que entrou em administração judicial em 15 de junho de 2023. A pá de cal veio no fim deste ano, quando os itens que sobraram da W Series e até mesmo o uso da marca foram colocados à venda em um leilão online que será realizado em janeiro de 2024.
A W Series foi criada pela advogada Catherine Bond-Muir, de 55 anos. Ela trabalhou com propriedade intelectual e se especializou em direito esportivo. Em 2000, passou a trabalhar com fusões e aquisições esportivas, como a venda do Chelsea para o russo Roman Abramovich e a aquisição do Aston Villa por Randy Lerner. Ela passou três anos desenvolvendo a ideia da W Series e criando uma equipe de gerenciamento. Lançada em outubro de 2018, ela tinha como objetivo principal oferecer oportunidades iguais e eliminar as barreiras financeiras que historicamente impediam as mulheres de entrar nas categorias maiores do automobilismo. As três temporadas da W Series tiveram a mesma campeã: a inglesa Jamie Chadwick, hoje com 25 anos. Ela seguiu sua carreira nos Estados Unidos: foi contratada pela Andretti e corre atualmente na Indy NXT, categoria de acesso à Fórmula Indy.
A primeira tentativa de um leilão foi feita no fim de 2023, mas a venda dos ativos da W Series não foi concretizada. Por isso, uma segunda tentativa será feita agora em 2024: o período se estenderá entre os dias 17 e 31 de janeiro. Os itens à venda incluem 19 carros Tatuus F3 T-318, modelo homologado de acordo pela Federação Internacional de Automobilismo (FIA) para a Fórmula 3; dois carros danificados (não-apto para entrar na pista); um show car (sem câmbio e motor); dois motores Alfa Romeo intactos; quatro reboques articulados que funcionavam como garagens dos mecânicos e instalações de pit lane; um trailer de corrida equipado com escritório; quatro simuladores; ferramentas para mecânicos; equipamentos e peças sobressalentes; e a propriedade intelectual permitindo o uso da marca W Series.
Para quem estiver na Inglaterra, os itens estarão disponíveis para visitação entre os dias 23 e 26 de janeiro, mediante marcação de data prévia. O processo está sendo comandado pelo escritório Wyles, Hardy & Co Limited, responsável pela administração judicial do que restou da W Series. Ou seja: o(s) comprador(es) poderão até estabelecer uma nova série de corridas, ou até mesmo reeditar a primeira categoria 100% feminina da história do automobilismo. Atualmente, a F1 Academy - com apoio total da Liberty Media, dona da Fórmula 1 - ocupa essa lacuna, ainda que com carros (os Tatuus F4-T421) bem menos potentes, do mesmo nível da Fórmula 4, um degrau abaixo da antiga W Series.
Uma iniciativa corajosa
Transmitimos durante duas temporadas as corridas da W Series na tela dos canais sportv. E a iniciativa, extremamente corajosa, diga-se de passagem - da advogada inglesa Catherine Bond-Muir foi algo realmente de se aplaudir. Chamou atenção para uma situação até então negligenciada dentro do automobilismo: a representatividade feminina. As três temporadas da W Series incentivaram várias meninas mundo afora a começarem no esporte. E criou referências: a tricampeã Jamie Chadwick passou a ser um nome conhecido e reverenciado por elas. Uma pena só que não teve o apoio financeiro necessário para continuar.
Aliás, em termos de categoria-escola, a W Series era o mundo ideal. Uma equipe cuidava de todos os carros.Elas dividiam as informações de telemetria, para que aprendessem umas com as outras. E mais importante: não existiam pagantes - todas elas ganhavam uma ajuda de custo para correr lá. Na primeira temporada da F1 Academy, por exemplo, as participantes tiveram de pagar €150 mil (R$ 800 mil), valor que será reduzido para €100 mil no segundo ano (R$ 540 mil). Só esse fator, de ter de pagar algo, por menor que seja a quantia, já inviabilizaria a participação de muitas jovens. Por isso a ideia de Catherine Bond-Muir era corajosa e inovadora. E até por isso, talvez, não tenha dado certo.
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