Um brasileiro acaba de entrar para um grupo seleto do tênis mundial — e não, ele não é um atleta de elite. O mineiro Marcelo Ferreira, de 38 anos recebeu a certificação de Master Pro Tour Stringer, o nível máximo de reconhecimento da Associação Europeia de Encordoadores de Raquetes (Ersa, na sigla em inglês), a mais respeitada instituição do ramo no mundo.
Mas o que faz um encordoador? Esse profissional é responsável por ajustar a tensão das cordas na raquete do tenista, já que a variação desse aspecto pode alterar a dinâmica dos golpes. Há mais de duas décadas nessa profissão, Marcelo se tornou o 24º profissional do mundo a conseguir a certificação nos últimos 20 anos. Desses 24, apenas 19 seguem em atividade no planeta.
Ao longo da carreira, Marcelo teve a chance de trabalhar com grandes nomes do tênis, como Daniil Medvedev, Carlos Alcaraz, Iga Swiatek e Simona Halep. No ATP 1000 de Miami deste ano, ele foi o responsável pelo encordoamento das raquetes de Jannik Sinner e Danielle Collins, que foram campeões de simples no masculino e no feminino.
— É muito gratificante encordoar para eles, estar conversando com eles, estar no dia a dia com eles durante o torneio, sempre discutindo essas situações, do que ele achou do encordoamento, o que ele achou do serviço, se ficou legal, se precisa mudar alguma coisa. Então é uma troca de experiências muito boa, você trabalhar diretamente com os jogadores, com os profissionais — disse Marcelo ao ge.
Para ser reconhecido como Master Pro Tour Stringer, Marcelo precisou passar por sete estágios de certificação ao longo da vida. Para o sexto deles, chamado Pro Tour Stringer 2, é exigido experiência de cinco a dez anos em grandes torneios, além de obter bom desempenho em uma prova prática e teórica.
Após esse estágio, para atingir o nível máximo, ele passou por uma avaliação dos outros profissionais considerados Master e recebeu a aprovação unânime do seleto grupo.
— É um sonho realizado. Eu sempre lutei, nunca desisti dos meus objetivos. Mas eu vejo que ainda tem muito a percorrer, porque é uma área que você nunca deixa de aprender. É uma área que sempre está evoluindo muito, e a gente sempre trabalha muito a respeito da colaboração no tênis, não só como encordoador, mas a gente também trabalha junto com vários professores, vários técnicos, vários coaches, a gente sempre está trabalhando com vários profissionais da área de tênis. A gente nunca para de aprender e evoluir, mesmo chegando no topo.
Encordoador Marcelo Ferreira explica certificação máxima do tênis mundial
De pegador de bolinhas a empresário
Natural de Uberaba, no Triângulo Mineiro, Marcelo se mudou para Ribeirão Preto-SP aos 2 anos de idade. Foi no município paulista que ele teve o primeiro contato com o tênis e começou a trabalhar como pegador de bolinhas em quadras da cidade aos 11 anos
— Como qualquer outro boleiro, comecei a quebrar muita corda. Quebrava uma corda por semana, e não ganhava muito dinheiro para poder pagar para os outros encordoarem para mim. Então eu comecei a aprender sozinho, na tentativa e acerto. Chamei um amigo que é professor de tênis. Eu mostrava a raquete para ele e ele mostrava o que eu errei, eu tirava e fazia de novo — contou.
Com o passar do tempo, Marcelo percebeu uma oportunidade de crescimento na área e investiu na carreira. Ele fez cursos de aperfeiçoamento técnico e ganhou espaço no circuito profissional, atuando no ATP e WTA 1000 de Washington e no Uruguay Open, entre outros eventos de peso.
— O encordoador não só coloca a raquete na corda, mas ele precisa também entender muitas vezes a necessidade do atleta, seja amador, seja profissional. Então existe uma complexidade muito grande, variações de raquetes, variações de cordas, inúmeras combinações, extensão, então cada jogador tem a sua necessidade.
"A função do encordoador, resumindo todo esse trabalho, é entender essa necessidade e aplicar o serviço de forma correta para que o atleta tenha o melhor desempenho possível na hora do jogo", acrescentou.
Em cada torneio, cada tenista é apontado para um encordoador, que o acompanha durante toda a competição. Como há mais atletas que profissionais, a rotina em campeonatos maiores costuma ser caótica, segundo Marcelo.
— O mais difícil é você conseguir manter uma consistência durante todo o seu dia de trabalho, visto que a gente chega a trabalhar até 20 horas por dia, encordoar até mais de 40 raquetes por dia. Então você precisa manter a mesma consistência, a mesma seriedade, a mesma concentração o dia todo. Uma mínima diferença que você tiver de variação no seu trabalho, com certeza o jogador profissional vai sentir a diferença.
Além de encordoador, o brasileiro dá cursos para novos profissionais. Ele também é empresário e administra lojas de artigos de tênis em Ribeirão Preto. A meta, segundo ele, é abrir unidades na Flórida, onde vive há dois anos.
— Meu planejamento é continuar fazendo o que eu faço, que é o que eu gosto de fazer na vida, sempre trabalhei com o tênis. Então é continuar atendendo os profissionais, continuar trabalhando nos torneios e ampliar os negócios. Agora que eu estou inaugurando a primeira loja aqui nos Estados Unidos, aqui na Flórida. Eu tenho a intenção de abrir mais lojas aqui e poder conseguir ensinar também o público americano, aos encordoadores americanos, as técnicas corretas e atualizadas.
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