Por Adriano Leonardi

Médico do esporte e ortopedista especialista em traumatologi... ver mais

É possível regenerar a cartilagem de nossas articulações?

Lesões representam desafio médico significativo; especialista explica mitos e verdades sobre a saúde articular no esporte

São Paulo


A cartilagem articular é um tecido fundamental para o funcionamento saudável das articulações, especialmente em esportes de alto impacto, como corrida, futebol e basquete. Sua principal função é absorver choques e permitir o movimento fluido das articulações. No entanto, sua capacidade limitada de regeneração torna as lesões cartilaginosas um desafio médico significativo.

Fisioterapeuta analisa lesão em joelho EU Atleta — Foto: iStock


Mitos sobre a Regeneração da Cartilagem

Um dos principais mitos em torno da saúde articular é que a cartilagem pode se regenerar de forma natural ou espontânea. A verdade é que a cartilagem hialina, que recobre as superfícies articulares, tem uma capacidade de regeneração extremamente limitada. Isso se deve à ausência de vasos sanguíneos, nervos e linfáticos, o que dificulta a chegada de células reparadoras ao local da lesão.

Outro mito comum é que suplementos como colágeno e glicosamina podem "reconstruir" a cartilagem. Embora esses suplementos possam melhorar os sintomas de dor em alguns casos, não há evidências robustas de que promovam a regeneração significativa da cartilagem articular em humanos.

Verdades sobre a Degeneração e Reparação da Cartilagem

A degeneração da cartilagem, como ocorre na osteoartrite, é irreversível na maioria dos casos. No entanto, existem estratégias que podem retardar sua progressão ou até mesmo promover a formação de um tecido semelhante à cartilagem.

Entre essas estratégias, destacam-se as abordagens cirúrgicas, terapias regenerativas e biomateriais avançados, que têm mostrado resultados promissores. Um dos avanços mais recentes é o uso de membranas de colágeno para facilitar a reparação cartilaginosa.

O menisco, que trabalha no amortecimento do joelho é um exemplo de cartilagem — Foto: Istock Getty Images

Técnicas Avançadas de Regeneração Cartilaginosa

  • Nano-fraturas

A técnica de microfraturas é amplamente utilizada em casos de pequenas lesões cartilaginosas. O procedimento consiste em perfurar o osso subcondral (camada abaixo da cartilagem), estimulando a liberação de células-tronco e fatores de crescimento da medula óssea para o local da lesão.

Embora essa técnica promova a formação de fibrocartilagem, que é menos resistente que a cartilagem hialina original, estudos mostram que ela pode reduzir a dor e melhorar a função articular temporariamente.

  • Implante Autólogo de Condrócitos (MACI)

O ACI é um método que utiliza células da própria cartilagem do paciente para reparar a lesão. Os condrócitos são extraídos, cultivados em laboratório e posteriormente implantados na área danificada.

Resultados de longo prazo indicam que a técnica pode produzir um tecido semelhante à cartilagem hialina em até 70% dos casos. No entanto, o custo elevado e o tempo necessário para o cultivo das células são limitações importantes.

Esta técnica é considerada experimental no Brasil.

  • Membranas de Colágeno

A utilização de membranas de colágeno é uma das inovações mais promissoras na regeneração cartilaginosa. Essas membranas atuam como um arcabouço biológico (scaffold) que facilita a adesão e proliferação de células-tronco mesenquimais no local da lesão.

Estudos recentes mostraram que o uso de membranas de colágeno em combinação com microfraturas pode aumentar a qualidade do tecido regenerado, aproximando-o das características biomecânicas da cartilagem hialin. Além disso, a membrana de colágeno pode ser enriquecida com fatores de crescimento, como o TGF-β (fator de crescimento transformador beta), para acelerar o processo de reparação.

Lesão cartilagem joelho Eu Atleta — Foto: Oleksandr Todorov/iStock Getty Images

Terapias Biológicas e Células-Tronco

  • Células-Tronco Mesenquimais

Ainda experimental no Brasil, a utilização das células-tronco mesenquimais (CTMs) têm sido amplamente estudadas para o tratamento de lesões cartilaginosas. Essas células, que podem ser obtidas da medula óssea ou do tecido adiposo, têm a capacidade de se diferenciar em condrócitos e secretar fatores que promovem a regeneração.

Um estudo com 50 pacientes submetidos à injeção de CTMs no joelho relatou redução significativa na dor e melhora funcional em 85% dos casos após um ano, com evidências de regeneração parcial da cartilagem na ressonância magnética.

  • Plasma Rico em Plaquetas (PRP)

O PRP é outra técnica biológica popular, que utiliza as plaquetas do próprio paciente para liberar fatores de crescimento no local da lesão. Embora o PRP não regenere diretamente a cartilagem, ele pode reduzir a inflamação e melhorar o ambiente articular, favorecendo a reparação.

Estudos mostram que o PRP combinado com microfraturas potencializa os resultados, promovendo um tecido reparador de melhor qualidade.

Esta técnica é considerada experimental no Brasil.

Esporte e Prevenção de Lesões Cartilaginosas

Rodri sofreu lesão no joelho direito durante o jogo do Manchester City contra o Arsenal — Foto: Getty Images

Embora os avanços terapêuticos sejam promissores, a prevenção continua sendo a estratégia mais eficaz para minimizar os impactos das lesões cartilaginosas em esportistas.

Treinamento Funcional

O fortalecimento muscular e o alinhamento biomecânico são essenciais para reduzir o estresse articular durante atividades físicas de alta demanda. Programas de treinamento funcional, como o Pilates, têm mostrado benefícios na proteção das articulações.

Controle de Sobrecarga

Evitar sobrecarga articular excessiva é crucial. Esportistas devem adotar uma programação de treinos que inclua períodos adequados de descanso para permitir a recuperação dos tecidos.

Uso de Suplementos

Embora suplementos de colágeno e glicosamina não promovam regeneração direta, eles podem melhorar a qualidade do líquido sinovial e aliviar sintomas de dor, auxiliando na manutenção da saúde articular.

Perspectivas Futuras

As pesquisas sobre regeneração cartilaginosa estão em constante evolução. Estudos com impressão 3D de scaffolds de colágeno, combinados com células-tronco e fatores de crescimento, mostram potencial para personalizar tratamentos e melhorar os resultados.

Além disso, a terapia gênica surge como uma nova fronteira, com estudos focados em modificar geneticamente células para estimular a regeneração cartilaginosa diretamente na articulação.

Corrida corredores joelho eu atleta — Foto: Istock Getty Images

Embora a regeneração completa da cartilagem articular ainda não seja uma realidade em muitos casos, os avanços terapêuticos, como o uso de membranas de colágeno e terapias biológicas, oferecem novas possibilidades para o manejo das lesões cartilaginosas.

Esses tratamentos, aliados a estratégias de prevenção, podem melhorar significativamente a qualidade de vida dos esportistas e retardar a progressão de doenças articulares degenerativas. A combinação de abordagens personalizadas, tecnologias inovadoras e cuidados preventivos continua sendo o melhor caminho para proteger e, eventualmente,

Referências

https://adrianoleonardi.com.br/artigos/lesao-condral-joelho

Steadman, J.R., et al. (2003). Microfracture technique for full-thickness chondral defects. Clinical Orthopaedics and Related Research.

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Madry, H., et al. (2018). Cell and gene therapy for cartilage repair. Nature Reviews Rheumatology.

* As informações e opiniões emitidas neste texto são de inteira responsabilidade do autor, não correspondendo, necessariamente, ao ponto de vista do ge / EU Atleta.