Por Alexandre Alliatti

Jornalista e escritor – vencedor do Prêmio São Paulo de Lite... ver mais

Grêmio precisa mais de um projeto do que de um técnico

Saída de Renato abre caminho para clube criar modelo de futebol menos dependente de um treinador


Renato Portaluppi fala sobre saída do Grêmio

Confirmou-se aquilo que era evidente: Renato Portaluppi não ficará no Grêmio. Está encerrada sua quarta (e pior) passagem pelo clube como treinador. Mas é improvável que tenha sido a última: ele fatalmente voltará.

Toda troca de técnico carrega consigo uma ruptura. Quando as personagens envolvidas são Renato e o Grêmio, a mudança é ainda mais sensível. Portaluppi é um caso raro: o maior de todos os jogadores também se tornou ídolo do clube como treinador. Isso abre espaço para a ascendência de Renato sobre a torcida e, em especial, a diretoria – processo acelerado pela personalidade do técnico, um sujeito altamente confiante nas próprias qualidades.

As saídas anteriores de Renato deixaram estragos, como se o clube repentinamente se visse sem norte. Seus substitutos imediatos duraram pouco: Julinho Camargo em 2011, Enderson Moreira em 2014 e Tiago Nunes em 2021. No último caso, o ano terminou com o Grêmio rebaixado.

É uma relação de evidente dependência, e justamente por isso o Grêmio precisa de muito mais do que um treinador: precisa de um projeto. O torcedor gremista que ler esse texto saberá dizer em que modelo de jogo repousa a convicção da diretoria? Saberá dizer o plano de contratações para a próxima temporada? Saberá dizer o planejamento do clube para a utilização de jogadores saídos da base?

Grandes clubes brasileiros costumam ter dirigentes políticos – saídos das entranhas do Conselho Deliberativo, de costuras entre grupos, de amizades de longa data. Processos de profissionalização por vezes encontram resistências internas. E o futebol gaúcho, o Grêmio incluso, é particularmente aferrado a esse modelo.

Renato em derrota do Grêmio para o Corinthians — Foto: Maxi Franzoi/AGIF

A diretoria tricolor tem um diretor executivo, chamado Luís Vagner Vivian, que pouco aparece (não há problema nisso): muitos torcedores sequer o conhecem. Se ele tem a confiança do presidente, precisa ter poder para encabeçar o projeto de um novo Grêmio, em que o treinador seja escolhido dentro de um modelo de futebol, não o contrário.

O ano é propício para isso. Com um mês sem jogos pela frente e sem a Libertadores para estrangular o começo da temporada, o Grêmio tem tempo para se organizar e buscar um rumo mais seguro. Se não fizer isso, correrá enorme risco de ficar para trás – especialmente em tempos de alto investimento nos concorrentes. E aí sempre precisará recorrer a Renato, como um salvador da pátria, para apagar incêndios que poderiam ter sido evitados.