Em 2004, melhores momentos de Flamengo 0 x 2 Santo André, pela final da Copa do Brasil
30 de junho de 2004: o dia em que 11 homens de azul estragaram a festa do Flamengo, calaram mais de 70 mil torcedores no Maracanã e conquistaram um título histórico de Copa do Brasil.
Há 20 anos, o Santo André chocou o Brasil. Hoje na Série D do Brasileiro e recém-rebaixado à segunda divisão paulista, o time da Grande São Paulo foi gigante em 2004, eliminou o Palmeiras, bateu a "sensação" do torneio e chegou à glória máxima diante do time com maior torcida do Brasil. Sandro Gaúcho e Élvis fizeram os gols de um título improvável, num palco que já tinha a festa armada... para o Flamengo.
Os "intrusos" de Santo André entenderam o cenário antes mesmo de a bola rolar, quando viram a estrutura armada para um possível show da cantora Ivete Sangalo.
– Estão vendo? Vai ter show aí. Só que vocês não estão convidados não, filhos. A festa é para os caras que vieram aí – disse Sérgio Soares, ex-volante e que foi o técnico naquela noite, substituindo o suspenso Péricles Chamusca.
Os dias que antecederam a partida foram marcados por ótimas histórias de motivação por parte do Santo André, que vivenciou um clima de "já ganhou" do Flamengo, após o empate por 2 a 2 no jogo de ida da final, em São Paulo. O ambiente de festa se transformou rapidamente em um dos maiores vexames da história do clube carioca.
Título rendeu "só" R$ 1,5 mi
Se hoje um campeão de Copa do Brasil pode faturar mais de R$ 90 milhões em prêmios da CBF, naqueles tempos a situação era bem diferente: o histórico Santo André levou apenas R$ 1,5 milhão em prêmios da Confederação Brasileira de Futebol.
Corrigido pela inflação nesses 20 anos, o valor hoje ainda seria bem distante: cerca de R$ 5,5 milhões.
A promessa do então presidente, Jairo Livolis, era de que todo o prêmio pago pela CBF seria destinado aos jogadores. Ainda que o clube não acreditasse muito que chegaria longe na competição.
– O pessoal era mão fechada para caramba! O Jairo era um chorão. Para conseguir um bicho lá era uma novela, mas eu acho que foi importante essa questão de premiação, foi tudo bem claro, o Chamusca não deixava essas coisas tirarem o foco e o objetivo – brincou o atacante Sandro Gaúcho.
Entretanto, o que ficou combinado foi cumprido por parte da diretoria.
– Deu 1,5 milhão e olhe lá. Era mixaria. E qual foi a conta que nós fizemos, fomos a Jarinu para discutir o prêmio pelo título. De antemão eu já lembrei o Jairo, que se ganhássemos teríamos a Libertadores no ano seguinte, no qual as premiações eram pagas em dólar. Então, ele topou pagar uma boa premiação aos atletas e me lembro que o dinheiro da premiação caiu em um dia – confessou Celso de Almeida.
– Em relação às premiações, tudo que eles combinaram com a gente foi cumprido certinho. A cada fase que passávamos a premiação ia aumentando de acordo com as cotas que na época a CBF repassava. Então era um gás a mais, porque era praticamente um salário a mais que a gente obtinha, o extra que a gente ganhava – assegurou Élvis, um dos heróis do título.
Jogou na Bombonera?
A capacidade dos jogadores do Ramalhão em encarar um Maracanã lotado foi colocada em xeque. O meia Élvis, uma das referências técnicas do time, se aproveitou do fato de ter jogado no Quilmes, da Argentina, para dar uma carga emocional na equipe.
Contou para os demais atletas que já havia jogado contra o Boca Juniors, com a Bombonera lotada, e insinuou que não havia sentido a pressão, que poderiam encarar o Maracanã sem preocupações.
– Eu joguei no Quilmes né, passei uma temporada lá, o Vitória me emprestou, pois na época um mesmo grupo de argentinos tinha comprado os dois clubes. Falei isso para dar uma empolgada, para não ficar por baixo da situação – contou Élvis.
Só havia um detalhe: Élvis nunca jogou contra o Boca Juniors, muito menos na Bombonera. Tudo foi criado por ele para motivar ainda mais os jogadores do Santo André, que já viviam um clima de batalha entre Davi e Golias.
– [A ideia] Foi espontânea, no momento me surgiu, eu realmente tinha jogado na Argentina e tinha perdido duas finais pelo Quilmes [...] futebol argentino é muito forte, então todo o aprendizado que tive na carreira eu soube dar valor. Sempre fui um jogador muito competitivo, era um jogador técnico, mas que competia bastante, marcava bastante, era um jogador que sempre jogava para o clube, que é o mais importante – completou o meio campista.
O mais importante é que seus companheiros acreditaram na história.
– O pessoal acreditou na hora, sabiam que eu tinha jogado o Campeonato Argentino, mas não sabiam quais eram os clubes que tinha jogado contra, mas com o pessoal que eu tinha mais amizade, que morávamos junto, eles sabiam dessa história toda – concluiu o camisa 10.
Por fim, Sandro Gaúcho, autor do gol que fechou o placar, compartilhou uma história que também os fez entender que o apoio era bem maior do que imaginavam: basicamente de todos os não flamenguistas do país.
– No vestiário tinha um massagista do Maracanã, que ficava com a maca ali e ele era vascaíno, e ele veio me cobrar “Olha, vocês deram mole lá, agora dá um jeito ai, se não a gente vai ter que conversar depois, viu, eu sou vascaíno, dá no meio desses cara” e desejou boa sorte – contou Sandro.
A estratégia de mexer com o emocional dos jogadores deu certo, aliada a um plano de jogo montado por Péricles Chamusca e Sérgio Soares: abdicar do jogo no primeiro tempo, levar o empate para o vestiário no intervalo e tentar a sorte na segunda etapa, sabendo que aquele Flamengo costumava cansar muito no final das partidas.
Com pouco mais de 20 minutos da etapa final, o Santo André já estava com 2 a 0 de vantagem no placar, e o Flamengo não conseguiu reverter.
Os times de Flamengo 0 x 2 Santo André
- Flamengo: Júlio César, Reginaldo Araújo, André Bahia, Fabiano Eller e Roger (Athirson); Da Silva, Douglas Silva (Negreiros), Robson (Jônatas), Ibson e Felipe; Jean. Técnico: Abel Braga.
- Santo André: Júlio César, Dedimar, Gabriel e Alex; Nelsinho (Da Guia), Dirceu, Ramalho (Ronaldo), Élvis (Dodô) e Romerito; Sandro Gaúcho e Osmar.
GOLS: Sandro Gaúcho, aos 7, e Élvis, aos 22 do segundo tempo.
PÚBLICO E RENDA: 71.988 pagantes/R$ 1.038.244,00.
Herói do tetra pagou o churrasco
A entrega do troféu e as comemorações no Maracanã foram em velocidade recorde, diante do desejo da administração do estádio em encerrar logo os trabalhos. Dali, a delegação foi a uma churrascaria na Barra da Tijuca e viveu um momento inusitado.
Ao chegarem no restaurante, os jogadores foram recebidos com vaias de alguns flamenguistas, que só foram interrompidas por um tetracampeão mundial com a Seleção em 1994.
O ex-lateral Branco estava na churrascaria e tratou de pedir respeito, destacando que aqueles eram os campeões da Copa do Brasil e mereciam, na verdade, serem ovacionados por todos que ali estavam. As vaias deram lugar a uma longa salva de palmas e assovios de comemoração para todos os jogadores do Santo André.
Branco, que também foi dirigente de alguns clubes e da CBF após encerrar sua carreira como jogador, conhecia os mandatários do Santo André e ainda se ofereceu para pagar a conta dos campeões naquele dia.
– Na hora que nós chegamos na churrascaria lá na Barra, o Branco estava lá, e ele que pagou a conta de todo o time do Santo André naquela noite – confessou Celso Luiz de Almeida, atual presidente do Santo André e vice-presidente de futebol à época.
Porém, se engana quem pensa que a trajetória da equipe até o título foi tranquila.
O começo de tudo
A construção da conquista começa no ano de 2003. A equipe do ABC venceu a Copa São Paulo de Futebol Júnior, que revelou muitos jogadores que integrariam o elenco campeão no ano seguinte, além de ter ficado com o vice-campeonato do Brasileirão da Série C, conquistando o acesso para a Série B em 2004.
Por fim, o Ramalhão levantou a taça da Copa Paulista, o que assegurou sua vaga na Copa do Brasil.
O planejamento para o ano de 2004 não tinha na Copa do Brasil seu principal projeto. O foco era fazer boas campanhas no Campeonato Paulista e também no Campeonato Brasileiro. Prova disso era que boa parte do elenco do Santo André tinha contrato apenas até o término do torneio estadual.
Na primeira fase da Copa do Brasil, o Santo André não tomou conhecimento do Novo Horizonte e fora de casa aplicou uma goleada de 5 a 0, que eliminou a necessidade do jogo de volta. Na segunda fase do torneio, o Ramalhão já começou a dar indícios de que poderia surpreender. Venceu o Atlético Mineiro por 3 a 0 no Estádio Bruno José Daniel, conseguiu segurar uma derrota de apenas 2 a 0 no jogo de volta no Mineirão e eliminou o Galo, o primeiro campeão nacional que cairia diante da equipe branca e azul.
Mas àquela altura, em meados de abril de 2004, momento em que o Campeonato Paulista já havia terminado, o clube teve de lidar com término dos contratos de vários jogadores do elenco.
Alex - Santo André - 20 anos Copa do Brasil
Antes das oitavas de final, contra o Guarani, houve uma debandada de atletas, que receberam propostas de outros clubes e não acreditaram no projeto do Santo André para aquele ano. Outros decidiram acreditar e optaram por estender seus vínculos empregatícios. Com auxílio dos jogadores da base, o Santo André se estruturou para encarar o time de Campinas, como explica Celso Luiz de Almeida, atual presidente do Santo André e vice-presidente de futebol à época.
– Os contratos dos jogadores venceram e alguns jogadores foram embora, inclusive, muitos deles foram para o Marília. Foi muita gente embora e o time foi recomposto. Nós tínhamos uma base muito boa, nesse título da Copa do Brasil tinham 13 jogadores oriundos da base e foram incorporados, eles tinham sido campeões da Copinha em 2003 – contou Celso.
Mesmo com o time remendado diante das saídas e alguns jogadores ainda chegando entre o primeiro e o segundo jogo, o Santo André conseguiu a classificação para as quartas de final da competição, com dois empates, 1 a 1 no Brinco de Ouro da Princesa, em Campinas, e 0 a 0 no Bruno José Daniel, em Santo André. O gol marcado fora de casa garantiu a classificação para a equipe do ABC Paulista.
Da Guia - Santo André - 20 anos Copa do Brasil
A chegada do artilheiro
Um dos reforços nesse contexto foi Sandro Gaúcho, autor de muitos gols importantes na campanha do título, inclusive o que abriu a vitória na final do Maracanã. A chegada do centroavante só deu certo porque o Guarani, concorrente no mercado, fechou com o veterano Viola, ex-Corinthians, Palmeiras e Santos.
A direção do Santo André já gostaria de contar com Sandro Gaúcho antes, mas encontrava muita resistência do então técnico Luiz Carlos Ferreira, já que o atacante tinha 36 anos à época e o comandante o considerava velho demais para seu time, conforme explicou Sérgio do Prado, gerente de futebol do clube em 2004.
– O Sandro a gente estava tentando trazer havia algum tempo, pois ele já tinha jogado bem pelo Santo André, quando nós subimos no Paulistão. Só que a comissão técnica da época não queria ele de jeito algum, porque ele já tinha 36 anos. Eu só trouxe o Sandro porque o Ferreira foi embora, mas ele havia dito expressamente que não queria, vetou, era um jogador no entender dele que não iria ajudar, nós insistimos para contratá-lo, mas mesmo assim ele não quis, nessa saída nós o trouxemos, o Sandro Gaúcho só foi para o Santo André porque mudou a comissão técnica – afirmou Sérgio.
A chegada de Sandro se deu pouco antes da saída de Ferreira, justamente no confronto contra o Guarani. Isso pode até causar estranheza, mas fato é que o treinador já havia tomado sua decisão de sair, dizendo que o Santo André havia chegado ao seu teto na competição e que jamais conseguiriam superar o Palmeiras.
A direção andreense até tentou convencê-lo do contrário para permanecer, mas com uma proposta do Sport o técnico fez as malas e partiu, mesmo tendo acertado outra coisa com os dirigentes.
– O Ferreira teve um acordo com o Sport Recife e chegou no jogo que empatamos aqui com o Guarani e classificamos, mas ele chegou para mim e falou “eu vou embora”. Eu fiz algumas ponderações com ele, ele me disse que ficaria [...] tive uma conversa com ele, tinha o zum zum zum do Sport, ai ele foi embora para Recife, ele acertou a continuidade comigo, mas acabou indo embora – conta Celso Luiz de Almeida
Como vencer o Palmeiras?
Novamente, os três homens fortes do futebol andreense, Jairo Livolis, presidente do clube, Celso Luiz de Almeida, vice-presidente de futebol e Sérgio do Prado, gerente de futebol, precisaram tomar uma decisão rápida.
A solução, ou melhor, as soluções encontradas, foram adotadas em duas etapas. Primeiro, Sérgio Soares, que iniciou a trajetória na Copa do Brasil como jogador, foi convidado para integrar a comissão técnica, já que seu contrato, como vários outros, também havia se encerrado no final do Paulistão. Além disso, ele serviria de suporte para o treinador que chegaria, já que conhecia muito bem o elenco e faria a ponte entre os jogadores e o novo comandante.
O técnico escolhido pela diretoria para assumir o cargo foi Péricles Chamusca. Aquele mesmo, que havia sido vice-campeão da Copa do Brasil poucos anos antes, em 2002, com o Brasiliense. Porém, não foi esse o motivo que ligou o Santo André ao jovem treinador.
Foi a amizade entre a diretoria do Santo André e Paulo Carneiro, presidente do Vitória por muitos anos, que culminou na chegada de Chamusca ao Ramalhão.
– Nós tínhamos um amigo muito próximo, que era o presidente do Vitória, Paulo Carneiro. Nós tínhamos uma relação próxima, mais o Jairo do que eu até. Quando começamos a pensar num novo treinador, o Jairo ligou para o Paulo Carneiro na minha frente e o Paulo falou “leva o Péricles Chamusca, pelo que eu estou vendo do seu time, eu acho que ele pode ser um cara importante”.
– Falou que era um treinador estudioso, que ele tinha feito um estágio no Barcelona, era um jovem treinador, calmo, com novos conhecimentos, então é a partir daí que vem a história do Chamusca, ele surgiu a partir de uma indicação do Paulo Carneiro, que nós achamos importante e o trouxemos – abriu o jogo Celso de Almeida.
– O Paulo nos convenceu do seguinte, que o Chamusca era uma aposta, ele foi treinador da base do Vitória, e o Paulo falou a seguinte frase: “Pode levar o Chamusca, se não der certo eu pago todos os gastos que vocês tiverem, inclusive a passagem de avião, pode levar que dá certo.” Então a gente acreditou nele e deu certo, ele acertou em cheio – completou Sérgio do Prado.
Outro fato curioso e que poderia até ter atrapalhado a chegada de Chamusca era seu assistente técnico a época. João Marcelo, que havia jogado no Santo André anos antes e movia na Justiça um processo trabalhista contra o clube, foi vetado de trabalhar novamente no Ramalhão por esse motivo.
Ramalho - Santo André - 20 anos Copa do Brasil
Com isso, Sérgio Soares ascendeu ao cargo de assistente técnico principal, e foi com essa dupla de jovens treinadores no comando que o Santo André trilhou seu caminho de sucesso.
– O seu auxiliar era o João Marcelo. O João já tinha jogado no Santo André há um período. E o João tinha uma ação contra o Santo André. E o presidente, o Jairo, falou assim: "Não, Chamusca, o seu auxiliar não dá para trazer, porque tem uma ação, temos o Sérgio aí, o Sérgio Soares vai ficar aí e ele pode te ajudar, porque ele conhece todo mundo, estava jogando até ontem, ele te ajuda aí". E acabou que eu fiquei como auxiliar do Chamusca, realmente auxiliando ele, passando tudo que eu tinha de informação daquele elenco e foi uma parceria muito bacana – confirma o próprio Sérgio Soares.
Superada a falta de jogadores e de um treinador, o Santo André sofria com mais um baque. A perda de 12 pontos no Campeonato Brasileiro da Série B, por ter escalado jogadores que não estavam devidamente registrados na CBF.
Diante de todo esse cenário caótico, o Santo André foi a campo para enfrentar o Palmeiras. Seria a última vez que o Ramalhão jogaria em casa, já que o Bruno José Daniel não tinha capacidade necessária para receber os jogos da semifinal e da final, e o time fez valer essa vantagem.
O jogo de ida foi 3 a 3, e o Santo André se aproveitou do campo irregular de seu estádio e da iluminação baixa que os jogadores já conheciam.
Dirceu - Santo André - 20 anos Copa do Brasil
Sandro Gaúcho, um dos destaques do confronto, descreveu da seguinte forma a vantagem de ainda poder mandar o jogo em Santo André.
– Foi muito positivo em todos os aspectos, como o Romerito falava, caiu no "concretão" nós temos que ir dentro dos caras. Então o campo a gente já conhecia e eu gostava de jogar lá, a torcida próxima, um estádio gostoso. Os adversários que iam lá encontravam muitas dificuldades, as vezes pelo estado do gramado, as vezes um pouco ruim, mas a gente conhecia até a trave que era um pouquinho mais alta de um lado que de outro, os atalhos do campo, então isso ai só nos favoreceu, então enquanto pudemos usar o Bruno Daniel a nosso favor foi bom.
– O Marcos até sofreu um gol de fora da área, reclamou da iluminação, aquela coisa, mas nós conhecíamos o estádio, conhecíamos cada buraco dali, afinal trainávamos lá e sabíamos a dificuldade que os adversários teriam e usávamos isso a nosso favor – completou Sandro.
Os jogadores do Santo André sabiam da dificuldade que seria vencer no Palestra Itália, mas acreditavam na possibilidade, afinal, um empate só garantiria a classificação do Santo André a partir de um 4 a 4. E foi exatamente o que aconteceu.
Em 2004, Palmeiras e Santo André empatam em 4 a 4 pela Copa do Brasil
O Palmeiras chegou a abrir 4 a 2 no placar, mas o time do ABC Paulista foi buscar o resultado. Sandro Gaúcho, autor de dois gols, chegou a dizer que durante a partida já havia se esquecido de qual resultado precisavam para se classificar e, ao invés de procurar ajuda com um companheiro, foi alertado por um rival de que ainda tinham chance.
Arnaldinho, ídolo histórico do Santo André conta como se sente parte do título da Copa do Brasil
– Quando eu fiz o gol do 4 a 3, eu perguntei para o Corrêa, volante do Palmeiras, se a gente fizer mais um dá o quê? E ele disse “Dá vocês e nós estamos fora”. Nisso eu saí comemorando e gritando “mais um, mais um, vamos por mais um”. Pegamos a bola, saímos correndo para o meio e no meio desse entrevero todo, eu tinha perdido as contas, mas quando soube que só bastava mais um acreditamos – contou Sandro.
O gol de Sandro Gaúcho mencionado foi aos 35 do segundo tempo. Pouco mais de 10 minutos depois, Tássio empatou o jogo e garantiu a classificação do Ramalhão para a semifinal do torneio.
Dos 594 torcedores à final
A partir da semifinal, o Santo André teria que mandar seus jogos fora do Bruno José Daniel, em razão de requisitos da CBF, principalmente em relação a capacidade do estádio para receber o público. A ideia inicial era mandar os jogos no Estádio Anacleto Campanella, em São Caetano, cidade vizinha.
A relação entre as diretorias de Santo André e do A.D São Caetano era ótima, apesar da rivalidade entre as equipes. Porém, o Anacleto Campanella não pertencia ao A.D São Caetano, mas sim à prefeitura da cidade de São Caetano.
O prefeito do município vizinho à época era Luiz Olinto Tortorello, que não gostou nada da ideia do rival mandar o jogo no estádio e mandou arruinar o gramado às vésperas da semifinal da Copa do Brasil.
– Nós tivemos um problema já para a semifinal e tivemos que jogar no Pacaembu. Na verdade, eu queria jogar em São Caetano, o estádio do São Caetano tinha condições de receber a partida, porém o prefeito da época, que era o Tortorello, mandou colocar enxadas no campo, cavar buracos e não teve como jogar lá não, ele não cedeu o campo, já que era da Prefeitura – explicou Celso de Almeida.
Diante deste cenário, não restou muitas alternativas ao Ramalhão a não ser mandar a partida no Pacaembu, com auxílio e articulações de Marco Polo Del Nero, que era presidente da Federação Paulista na ocasião.
Sérgio Soares e Makanaki - Santo André - 20 anos Copa do Brasil
Porém, essa não foi das melhores soluções. Sem o apelo de um clube gigante na semifinal, e a torcida andreense não se deslocando para a capital, o jogo entre Santo André e XV de Novembro, de Campo Bom no Rio Grande do Sul, teve o ínfimo público de 594 pagantes, o que gerou um grande prejuízo aos cofres do Santo André, já que o custo operacional de locação do Pacaembu era muito alto.
Esportivamente, o evento também foi um desastre para o Ramalhão, que acabou derrotado por 4 a 3, pelo time do XV, então dirigido pelo técnico Mano Menezes.
O jogo de volta aconteceu no Estádio Olímpico do Grêmio, em Porto Alegre, já que pelo mesmo motivo que o Santo André, o XV de Novembro não pôde mandar o jogo em seu estádio em Campo Bom. O resultado foi uma virada do Santo André, que venceu por 3 a 1 e garantiu vaga na final.
Sandro Gaúcho, jogando em seu estado natal, foi novamente o nome da partida, anotando dois gol, um deles um golaço, deixando diversos adversários para trás e tirando o goleiro do lance com uma cavadinha.
– O gol contra o XV foi o mais bonito da minha carreira, foi uma pintura de Pelé. Aquele gol contra o XV, jogando no Olímpico, foi o mais bonito, foi uma pintura, e olha que eu tive oportunidade de fazer gol de bicicleta, gol de peito, gol de tudo que é jeito – garantiu Sandro ao relembrar o gol.
O outro gol da partida foi anotado por Makanaki, jovem recém provido da base após o título da Copinha de 2003, relembrado por todos os entrevistados como o mais divertido do elenco e que adorava fazer brincadeiras, tanto que comemorou o gol da classificação de forma inusitada no hotel.
– Ele fez o gol que nos levou para o jogo do Maracanã, o gol contra o XV, e depois isso, no hotel lá em Porto Alegre, ele pegou o extintor e usou no andar inteiro, parecia que havia tido um incêndio, você passava no corredor e não via ninguém, só fumaça branca, e era ele lá, mas era esse tipo de brincadeira saudável, eles eram bagunceiros, meninos né. [...] Fomos para o hotel, jantamos, liberamos a cerveja, aquilo tudo, dali um pouco fumaça para todo lado, quem era? Makanaki, foi passando pelos corredores e arrancando os extintores e foi usando no corredor todinho, você abria a porta do quarto e não via nada – contou Sérgio do Prado.
Makanaki - Santo André - 20 anos Copa do Brasil
Mano Menezes, que posteriormente chegaria à Seleção, era apenas um jovem treinador na época e chegou a sondar o Santo André no ano seguinte visando oportunidades no mercado de trabalho paulista.
– O Mano ligou para mim, tivemos uma conversa, que tinha alguns terceiros, mas passaram o telefone para ele, que estava no começo de carreira, e ele me disse que gostaria muito de trabalhar em São Paulo e de ter oportunidade no Santo André, mas não andamos pois tínhamos a opção do Ferreira. Alguns anos depois ele foi para o Corinthians, ai foi jogar no Bruno Daniel e eu falei “tá vendo agora, nunca mais eu vou poder trazer você” – revelou em tom bem humorado Sérgio do Prado.
Ao chegar a grande final, o Santo André contava com dois grandes baques, primeiro a suspensão de Péricles Chamusca, que já havia o tirado da semifinal e o tiraria dos dois jogos da final e a perda dos 12 pontos na Série B foi confirmada após o trâmite de diversos recursos, que terminou justamente às vésperas da grande final da Copa do Brasil.
Péricles Chamusca não pode entrar no vestiário do Santo André e fizeram de tudo para o tirar do Maracanã. Porém Sérgio Soares se mostrou pronto para encarar o desafio, além de ter a estratégia para o jogo definida durante a semana com o treinador principal, ele contava com um grande amuleto.
Apesar do forte calor que fazia no Rio de Janeiro naquela noite, Sérgio Soares foi a campo vestindo um agasalho completo. O motivo: pura superstição.
– No jogo do XV de Campo Bom, que eu fui o primeiro, eu fui de agasalho, lá é frio e deu certo. Falei, pô, não vou tirar mais e em todos os jogos, eu fui de agasalho. Eu puxava a manga até aqui, assim, mas não tirava o agasalho. Eu falei, pô, deu certo isso aqui, não vou tirar mais. E no jogo do Maracanã, eu estava de agasalho também, muita gente nem percebeu, mas era superstição mesmo – confessou Sérgio Soares.
Diante de tantos momentos curiosos, engraçados, de superação e, principalmente de união, o Santo André entrou para a história com o título conquistado há 20 anos.
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