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Por Caíque Andrade — Rio de Janeiro


Pep Guardiola vive um momento sem precedentes em sua carreira de treinador. Acostumado a vencer campeonatos e ser dominante quando comandou Barcelona, Bayern de Munique e Manchester City, o técnico catalão tem sua primeira grande sequência negativa. O atual tetracampeão da Premier League perdeu nove dos últimos 12 jogos, com 27 gols sofridos (média de 2,45 por partida).

O torcedor mais jovem do City também estranha o momento. A última sequência de derrotas semelhante havia sido em 2005/06, dois anos antes de o clube ser adquirido pelo Sheik Mansour, membro da família real de Abu Dhabi. Na ocasião, foram nove derrotas dos últimos 10 jogos da temporada.

Mas o que justifica uma crise deste tamanho na equipe que venceu seis das últimas sete edições da Premier League? O ge separou fatores que podem explicar o momento.

Pep Guardiola com semblante preocupado em derrota do Manchester City para o Aston Villa — Foto: Getty Images

Importantes e numerosas lesões

(Devolvam) meus jogadores. É isso que tem sido diferente. (Devolvam) meus jogadores. A solução é trazer os jogadores de volta. Temos apenas um zagueiro central que eu diria que está em forma, e isso é mais difícil.
— Pep Guardiola, após a derrota para o Aston Villa, no último sábado.

Este tipo de desabafo de Guardiola tem sido corriqueiro. O treinador credita o mau momento, principalmente, à série de lesões no elenco do Manchester City. Na atual edição da Premier League, pelo menos 10 jogadores já passaram dois jogos ou mais sem atuar por razões físicas.

E quando não são desfalques, muitas vezes jogam no sacrifício. No jogo contra o Tottenham, na Copa da Liga, no dia 30 de outubro (o primeiro da série de derrotas), quatro jogadores de defesa tiveram problemas físicos: Kyle Walker, John Stones, Akanji e Rúben Dias. No setor ofensivo, Doku, Grealish, Foden e Oscar Bobb também estiveram lesionados em momentos semelhantes. O último, inclusive, teve fratura na perna e só voltará a jogar em 2025.

A lesão mais grave foi justamente a mais relevante de todas. O meio-campista Rodri, vencedor da Bola de Ouro de 2024, lesionou o ligamento cruzado anterior (LCA) do joelho e está fora da temporada 2024/25. Sua importância é traduzida pelos números. Desde o início da temporada 2020/21 até o momento da lesão de Rodri, o Manchester City teve aproveitamento de 79,1% com o volante. Sem ele, o número caía para 66,6%. Isso sem contar o atual momento desastroso.

O substituto natural de Rodri foi Kovacic, que entrou bem e ajudou a equipe a se manter forte. Acontece que o volante croata foi, em seis partidas recentes, mais um dos intermináveis desfalques do Manchester City, que desmoronou.

Guardiola conversa com Rodri, que saiu lesionado em Manchester City x Arsenal — Foto: Getty Images

Craques em má fase e fim de ciclo

É claro que as lesões influenciam muito na má fase do Manchester City. Mas não seria correto afirmar que é o único problema. De acordo com informações do portal The Athletic, internamente no clube existe a noção de que alguns jogadores vivem fim de ciclo e já não têm a mesma performance de outros momentos.

Nomes que foram fundamentais para as glórias recentes do City já teriam sido avaliados como transferíveis, mas foram mantidos. Fontes do portal que pertence ao New York Times afirmam que Ederson, Kyle Walker, De Bruyne e Jack Grealish seriam alguns destes jogadores.

A diretoria do Manchester City teria definido junho de 2025 como o momento para fazer a reformulação do elenco. Seria o fim do contrato de Pep Guardiola, até ser renovado por mais dois anos. Em seu possível ano de despedida, o treinador não queria grandes investimentos em contratações.

Mas a cúpula do clube já reconhece que a alternativa pode ter sido um erro, já que alguns atletas estão claramente em má fase técnica. Além dos citados, jogadores como Bernardo Silva, Gundogan e Phil Foden passam longe de seus melhores níveis de atuação.

Melhor jogador da Premier League 2023/24, Phil Foden é um dos atletas que vivem má fase técnica no Manchester City — Foto: Getty Images

Desequilíbrio tático e mental

As lesões e a má fase técnica ainda não bastam para explicar como uma equipe tão dominante no cenário inglês passou a ser derrotada com frequência. No momento em que perde Rodri, Guardiola sabia que seriam necessários ajustes táticos. Isso porque nenhum outro atleta do elenco seria capaz de fazer o papel do volante espanhol.

Após a lesão de Kovacic, nomes como Gundogan e até Jack Grealish passaram a atuar mais recuados no meio de campo, mas nenhum deles tem a capacidade de recuperação, nem de criação de Rodri. Sendo assim, o característico estilo de jogo de Guardiola, com marcação avançada e manutenção da posse de bola de forma criativa, foi extremamente prejudicado.

Fragilidade defensiva do Manchester City chama a atenção; veja análise no Gringolândia

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Com isso, o time passa a ser previsível na criação, dependente de jogadas individuais pelos lados e cruzamentos para Haaland. O norueguês deixou de ser a cereja do bolo para ser uma tentativa de salvação ofensiva, já que a falta de variação faz com que os demais jogadores não consigam marcar.

Artilheiros do Manchester City em 2024/25

  1. Haaland - 18 gols
  2. Phil Foden e Gvardiol - 4 gols
  3. Stones, Doku, Matheus Nunes e Kovacic - 3 gols

Defensivamente o momento é ainda pior. De acordo com dados do SofaScore, o Manchester City tem na Premier League 2024/25 uma média de 42,8 bolas recuperadas por jogo. Este número é consideravelmente pior do que as 51 recuperações por partida da temporada passada. Guardiola sempre afirmou que ter a bola era a melhor forma de se defender, e a equipe não tem conseguido mais reter a posse de bola com a mesma eficácia.

Seus adversários têm tido grande facilidade de penetrar a defesa do City. Seja com lançamentos longos ou trocas de passes rápidas, as equipes que enfrentam o time de Pep Guardiola encontram espaços. E o treinador se vê numa posição de vulnerabilidade defensiva nunca antes vista em sua carreira. E não tem conseguido encontrar alternativas.

Pep Guardiola discute com torcedor na rua após derrota para o Liverpool

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A influência da parte mental também é notável. Algumas falhas individuais, como passes errados no campo de defesa ou erros fatais do goleiro Ederson, indicam o momento de instabilidade psicológica da equipe. A virada relâmpago sofrida para o Manchester United, nos últimos minutos, e o empate em 3 a 3 com o Feyenoord após abrir três gols de vantagem, também são indícios de desequilíbrio mental.

No tropeço contra o time holandês, Pep Guardiola saiu de campo com o nariz cortado e o rosto marcado por conta do descontrole. Quando o comandante chega ao ponto de praticar uma espécie de automutilação, já se pode imaginar o estado psicológico do restante da equipe.

Pep Guardiola com um corte no nariz e arranhões na cabeça — Foto: Reprodução

Janela de transferências é esperança

Dinheiro não é e nunca foi o problema para o Manchester City, ao menos desde a aquisição pelo governo dos Emirados Árabes, em 2008. Portanto, é de se esperar importante movimentação do clube a partir do dia 1 de janeiro, quando reabre a janela de transferências no futebol europeu.

Pep Guardiola terá um mês para reforçar pontualmente e possibilitar a reorganização de sua equipe, além de alcançar maior profundidade ao elenco, castigado com problemas físicos.

Por enquanto, a certeza de demissão do treinador fica apenas para o coro dos torcedores do Liverpool. Guardiola faz questão de lembrar o crédito que tem após os oito anos vitoriosos à frente do clube. Uma saída ainda é improvável, principalmente até se observar os frutos que a janela de janeiro pode trazer. Mas vale repetir que é uma situação sem precedentes, então só nos cabe observar o desdobramento.

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