Doan, Kubo, Ueda, Minamino e Mitoma. Hajime Moriyasu escalou um "quinteto ofensivo" e o Japão arrasou a China em Saitama, na estreia pela fase final das Eliminatórias Asiáticas para a Copa do Mundo de 2026. SETE a ZERO. Foi não só o maior placar dos 107 anos de história do confronto, como foi também a primeira vez que o Japão derrotou a China por mais de dois gols de diferença.
O primeiro jogo internacional da história do Japão foi contra a então República da China, em 1917: derrota por 5x0 pelos Jogos do Extremo Oriente em Tóquio. Um primeiro rival que a seleção japonesa levou 67 anos para derrotar. Por causa de um "isolamento" da China, houve um hiato de confrontos entre 1934 e 1975 (algumas fontes só consideram os resultados a partir de 1975, depois que o país virou República Popular da China, com o histórico da primeira metade do século passado herdado por Taiwan), mas demorou até 1984 para vir a primeira vitória japonesa, 1x0 pela Copa Kirin. A partir daí o panorama começou a mudar. De freguês absoluto o Japão passou a equilibrar os duelos e começou a ganhar mais do que perder. Desde 1998, 0x2 pela antiga Copa Dinastia, o Japão nunca mais perdeu para a China.
A partir do ano 2000, são 15 jogos, com nove triunfos nipônicos e seis empates. Ainda assim, todos jogos equilibrados, nunca com mais de dois gols de diferença. A goleada de hoje serviu para evidenciar uma tendência que aos poucos se fazia notar nos últimos confrontos. O futebol chinês, apesar de todo o investimento que teve na década passada, está regredindo, enquanto o futebol japonês vai na direção contrária.
Havia motivos para esperar um jogo duro hoje. Nas duas últimas edições das Eliminatórias, o Japão foi derrotado em casa no primeiro jogo da fase final. 1x2 Emirados Árabes Unidos em 2016 e 0x1 Omã em 2021. Inclusive, o técnico de Omã três anos atrás era Branko Ivankovic, justamente o atual treinador da China. Mas o croata vem tendo dificuldades em reviver o Team Dragon, que tem apenas uma vitória em 2024 (contra Singapura) e vem da pior participação de sua história na Copa da Ásia, onde foi eliminado na fase de grupos sem ter marcado um gol sequer. Ivankovic assumiu depois disso, em fevereiro, e conseguiu a classificação para a fase final das Eliminatórias na bacia das almas, empatando em casa com a Tailândia com um gol nos minutos finais e passando apenas no critério do confronto direto.
Enquanto a China de Ivankovic entrou em campo com um 4-4-2 focado em se defender, Moriyasu surpreendeu ao escalar o mesmo 3-4-3 (ou 3-4-2-1 dependendo do ponto de vista) do último jogo contra a Síria, contrariando as prévias da imprensa local que imaginavam um retorno ao convencional 4-2-3-1. O sistema, que foi usado com sucesso na Copa de 2022 contra Alemanha e Espanha, naquela ocasião em modo defensivo, mostrou agora que pode ser uma boa alternativa em modo ofensivo contra seleções asiáticas que ficam na retranca contra o Japão.
A maior diferença não é a presença de três zagueiros, e sim de meias ofensivos no lugar dos laterais. Na ala/ponta direita, Ritsu Doan ou Junya Ito ao invés de Sugawara. Na esquerda, Mitoma ou Daizen Maeda ao invés de Nakayama ou Nagatomo. Contra um adversário retraído, os zagueiros extremos (Itakura na direita e Machida na esquerda) têm liberdade para subir como laterais que apoiam por dentro e o avanço dos alas deixa o time com uma linha de cinco no ataque. Hoje foram Doan, Kubo, Ueda, Minamino e Mitoma no primeiro tempo e Ito, Kubo, Ogawa, Minamino e Maeda no momento do apito final. E assim o Moriyasu Japan evolui e ganha uma nova e interessante opção tática.
Nos Japão x China mais recentes, apesar dos placares baixos, a seleção chinesa havia ameaçado pouco no ataque. Desta vez, ameaçaram menos ainda, com apenas uma finalização, uma tentativa de voleio do camisa 9 Zhang Yuning que passou vários metros acima da meta de Zion Suzuki. Wu Lei, o principal jogador e atual capitão chinês, não fez nenhuma jogada digna de nota. Os atacantes Fei Nanduo e A Lan, brasileiros naturalizados que entraram no segundo tempo, também foram anulados.
O Japão, por outro lado, finalizou 19 vezes, 10 no alvo. E nem precisou forçar muito, pois os gols foram saindo naturalmente e todos do quinteto ofensivo inicial tiveram pelo menos um gol ou assistência. O time não baixou a intensidade nem após as substituições, tanto que cinco dos sete gols saíram no segundo tempo e os substitutos Ito e Maeda também foram às redes.
Superada a "zica" dessa primeira rodada, que nas duas Eliminatórias passadas assombraram o Japão até o final da campanha, a sequência de jogos agora promete trazer mais dificuldade. Na próxima terça (10/09), os Samurais Azuis jogam fora de casa contra o Bahrein, que está invicto desde a derrota para o próprio Japão na Copa da Ásia e surpreendeu ao ganhar hoje da Austrália por 1x0 em Gold Coast. E no mês que vem a seleção japonesa enfrenta os maiores rivais do grupo em sequência: Arábia Saudita (fora) dia 10/10 e Austrália (casa) dia 15/10.
Eliminatórias - Japão 7x0 China
Saitama Stadium 2002 - Público: 52.398
Gols: Wataru Endo (12'), Kaoru Mitoma (45+2'), Takumi Minamino (52'), Takumi Minamino (58'), Junya Ito (77'), Daizen Maeda (87'), Takefusa Kubo (90+5')
Notas:
Zion Suzuki - 6,0 - Não fez nenhuma defesa a partida inteira e só trabalhou com os pés, em bolas recuadas.
Ko Itakura - 6,0 - Atuação tranquila, foi pouco acionado e não teve dificuldades na marcação.
Shogo Taniguchi - 6,0 - Peça central da linha de três zagueiros, também não precisou aparecer muito, mas foi preciso nos duelos e antecipações.
Koki Machida - 6,5 - Foi o zagueiro que mais participou do jogo e contribuiu bem com o ataque. Mostrou precisão nos passes e foi dos pés dele que começou a jogada do quarto gol.
Ritsu Doan - 6,5 - Já vinha muito bem nos últimos jogos com a seleção e fez mais uma bola partida como ala pela direita. Levou perigo nas jogadas trabalhadas com Kubo e deu uma assistência para Mitoma.
Wataru Endo - 7,0 - Ele não sabe o que é ter atuações ruins. Além de ter sido fundamental em anular o meio-campo chinês, marcou de cabeça o gol que abriu caminho para a goleada do Japão.
Hidemasa Morita - 6,0 - O único do meio-campo para a frente que não esteve envolvido diretamente em um lance de gol, mas nem precisou. Atuou com segurança e foi até capitão nos minutos finais após a saída de Endo.
Kaoru Mitoma - 7,5 - Jogar como ala teoricamente o deixa mais longe do gol, mas hoje Mitoma quase não precisou se preocupar em defender. Deu tanto trabalho ao lateral Yang Zexiang que logo o meia Xie Wenneng também ia cercá-lo, mas nem a marcação dupla parou o craque japonês, que saiu como um dos destaques da partida com gol e assistência.
Takefusa Kubo - 8,0 (Melhor em campo) - No primeiro tempo, ele já era o que mais aparecia no ataque japonês, ditando o ritmo do time como um camisa 10. No início do segundo tempo, encontrou menos espaços, mas logo voltou a desequilibrar. Teve duas assistências e nos acréscimos finalmente deixou o dele. Destaque para o lance em que deu uma caneta no momento em que um adversário fazia um carrinho.
Takumi Minamino - 7,5 - Foi discreto no primeiro tempo, mas no início do segundo, quando a marcação apertou em cima de Kubo, ele finalmente encontrou espaços e marcou dois bonitos gols.
Ayase Ueda - 6,5 - Provavelmente saiu frustrado por não ter feito gol (até porque ele disputa a artilharia das Eliminatórias) e não ter tido nem a chance de fazer, pois não recebeu nenhuma bola em condições de finalizar. Tentou forçar alguns chutes que não deram certo, mas sua movimentação ajudou a abrir espaços aos companheiros e pelo menos ele saiu com uma assistência, fazendo o pivô para o quarto gol.
Junya Ito - 8,0 - Em meia hora conseguiu produzir um gol e duas assistências, mostrando que o Japão continua bem demais de opções para a ala/ponta direita. Um retorno triunfal para Ito, que não era convocado desde a Copa da Ásia.
Daizen Maeda - 6,5 - Entrou na mesma função de Mitoma na ala esquerda e marcou um gol bem parecido com o do colega, de cabeça aparecendo na segunda trave atrás da zaga após cruzamento do outro ala.
Ao Tanaka - 6,0 - Jogou os 20 minutos finais no lugar de Endo e manteve o Japão com o controle do meio-campo.
Kota Takai - 6,0 - Virou adulto com estilo. Um dia depois do seu aniversário de 20 anos (no Japão a maioridade é aos 20), estreou pela seleção principal. E apareceu bem nas poucas jogadas em que foi acionado.
Koki Ogawa - 6,0 - Teve poucos minutos em campo e quase deixou o dele em um cabeceio que carimbou o travessão.
Hajime Moriyasu - 8,0 - Hoje não há nenhuma ressalva a fazer sobre o trabalho de Moriyasu. Mandou a campo a melhor escalação possível, fez substituições que tiveram impacto e o time fez uma partida praticamente perfeita, sem deixar cair o ritmo até o último minuto e sem sofrer em nenhum momento.
(Peso das notas: 5,0 = Muito ruim; 5,5 = Ruim; 6,0 = Razoável; 6,5 = Bom; 7,0 = Muito bom)
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