'Delulu': O termo do k-pop que está sendo aplicado no TikTok e no LinkedIn para conseguir emprego

Com mais adeptos na gringa, alguns usuários brasileiros já aplicam o estilo no cotidiano e divulgam a hashtag no TikTok e LinkedIn para conseguir algo que desejam, como um emprego dos sonhos ou alcançar um novo cargo.

"Delulu" vem da abreviação de “delusional”, que, em português, significa "delirante"✌🏾, segundo definição no Urban Dictionary (dicionário online de gírias e frases em inglês).

A comunidade k-pop começou a utilizar o termo para descrever ou zombar de um fã quando o amor passa dos limites e que ele pensa que irá namorar, casar ou terá amizade com seu ídolo favorito, ou seja, a pessoa não consegue separar fantasia e realidade.

No entanto, a nova expressão saiu da bolha e passou a ser usada no TikTok e no LinkedIn, principalmente pela geração Z, para falar de outras situações, incluindo relacionamentos, escola e carreira.

Segundo os relatos nas redes sociais, a mentalidade "delulu" envolve o uso de afirmações, otimismo e pensamento positivo 👍.

Especialistas ouvidos pelo g1 explicam que a iniciativa pode até ser utilizada de forma estratégica, mas é preciso cuidado para não se tornar um problema relacionado à saúde mental (veja mais detalhes abaixo).

No trabalho, o uso do termo no TikTok e no LinkedIn é direcionado para descrever momentos que, de alguma forma, despertam esperança ou ilusão. Também é associado como uma forma de se proteger de uma mentalidade excessivamente crítica.

Alguns internautas dizem que esse mundo que pode ser criado alheio à realidade pode estar associado a desejos profissionais, como por exemplo, fixar o pensamento que está trabalhando em um determinado cargo, mesmo sem ter ao menos participado da seleção para a vaga.

Embora pareça contraproducente e irrealista em alguns pontos, os usuários do TikTok estão seguindo o conselho (veja relatos abaixo) – a hashtag #delulu tem 2,4 bilhões de visualizações, enquanto #delulugirl tem quase 300 milhões de visualizações até terça-feira (22).

Uma das criadoras de conteúdo sobre o tema aqui no Brasil, a jornalista de moda Laryssa Alarcon, de 25 anos, de São Paulo (SP) publicou uma lista no TikTok, com mais de 800 mil visualizações, de como ser "delulu"; veja abaixo:

• Finja até que atinja ✨
• Seja obcecada por você mesma 💁‍♀️
• Proibido se autossabotar 🚫🧠
• Xô negatividade 🙅‍♀️🌈
• Tudo é um sinal 🚦🔮
• Acredite que o que você deseja, já aconteceu 🌟🙏
• Não se preocupe 🌼😌

A britânica Elle Wilmot, de 23 anos, compartilhou no LinkedIn que entrou de "cabeça na temporada de 'delulu'" nos próprios objetivos.

"Na maioria das vezes, temos objetivos dos quais somos absolutamente capazes, mas nossas mentes, pensamentos e sistema de crenças nos dizem que não somos capazes ou que isso não é possível."

A executiva de redação e mídia social Amy Stephenson-Yankuba citou como um dos principais pontos para ter sucesso na área o pensamento "delulu".

“Porque você tem que estar um pouco delirante para conseguir qualquer coisa. A meu ver, ou você pensa que é péssimo e tem oportunidades de descobrir se é. Ou você não se acha bom, é óbvio - e por causa disso, você não tem oportunidades de provar o contrário", disse ela no LinkedIn, acrescentando que era um “Catch 22” (termo que significa um caso em que uma solução desejada é impossível de alcançar devido a um conjunto de condições inerentemente ilógicas).

A criadora multimídia de conteúdo dos Estados Unidos Danielle Creger disse em um vídeo no TikTok que ser "delulu" a ajudou a conseguir uma promoção e um novo namorado.

Outra usuária americana postou um vídeo dizendo que largou seu emprego de tempo integral sem nenhum plano traçado depois, mas que está "na terra dos 'delulu' pensando que tudo vai dar certo".

Ela acrescentou entre parênteses: "De alguma forma, não sei como, mas estamos manifestando isso porque não há realidade em que você não seja rico e bem-sucedido", afirmou a criadora de estilo de vida e moda Anju Bhandari.

Depois de esbarrar em um vídeo no TikTok sobre o assunto, a modelo Liz Melo, de 24 anos, de Brasília (DF), resolveu fazer um experimento e adotar a "vibe delulu", inclusive com iniciativas na sua carreira.

"Adotando essa vida 'delulu', ainda mais nesse meio que tem sempre essa questão da aparência, sempre tem uma menina mais bonita, mais magra, mais alta, que sabe fazer poses melhores, e você sempre está se comparando. Isso me ajudou a lidar com a minha autoestima", disse.

Ela compartilhou os resultados na rede social e contou que, em menos de um mês, conseguiu retorno de parcerias e novas propostas de projetos, mas não revelou os valores. Após os resultados, ela conta que aprendeu a "parar de ficar se distraindo com coisas que estavam dando errado".

"No trabalho, como é um ambiente muito frustrante, onde você está com a cabeça cheia o tempo todo e você tem que resolver problemas, ao pensar dessa forma 'delulu' e imaginar que tudo já deu certo, e romantizar sua vida, acaba deixando as coisas mais leves e acaba fluindo melhor", explica.

A mentora energética e taróloga Michaella Berwanger, de 26 anos, de Amambai (MS), afirma que consegue utilizar esse “estado mental” nas atividades profissionais e na área pessoal.

“Os pontos cruciais para conseguir manifestar aquilo que se deseja, ser na matéria a pessoa da sua mente, dos seus delírios, é se aproximar de uma rotina que te mantenha em contanto com informações e gatilhos que correspondam o que deseja. Usando o que você tem no agora para facilitar o caminho e quando menos esperar, se perceber vivendo o que projetou”.

Em relação aos resultados, Michaella conseguiu expandir a criação de conteúdo e aumentou o número de seguidores que acabaram colaborando para aumentar a monetização em seus canais nas redes sociais.

A nutricionista esportiva e empresária Mariana Garcia, de 26 anos, de Belo Horizonte (MG), disse que chegou a aplicar a ideia nos negócios.

"Um exemplo com minha loja: se eu tenho uma meta de vender tanto, eu não vou ficar no desespero e preocupada porque isso contamina e não vou ser a minha melhor versão, que eu seria se eu estivesse tranquila, feliz, alegre e isso vai interferir no meu desempenho."

Ela relaciona o "delulu" com "Fake it Till You Make it" ou "Finja até conseguir", que existe há muito tempo, para dar andamento em casos pontuais e com objetivos específicos, que não envolvem toda a estratégia da empresa.

"Se você tem o objetivo de chegar em algum lugar ou de realizar alguma tarefa no seu emprego, ter um senso de que aquilo já aconteceu, sentir a alegria daquilo antes que aconteça já te ajuda a enfrentar o processo de uma forma mais positiva. Se a pessoa se deixa contaminar com estresse e pressão, ela entra nesta energia mais caótica e isso pode atrapalhar."

Para Vanessa Cepellos, professora de Gestão de Pessoas da Fundação Getúlio Vargas (FGV) na Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP), não devemos viver em uma fantasia, mas essa forma de pensamento pode ser uma nova maneira de lidar com as incertezas ao fingir ter mais confiança.

"Talvez uma mentalidade 'delulu' possa ser o novo copo meio cheio e pode indicar mais do que apenas uma tendência divertida nas redes sociais. Em vez disso, reflete o desejo dos jovens de encontrar um senso de controle em um ambiente incerto, onde objetivos como garantir uma vaga de emprego parece fora de alcance", afirma.

Mas, a desconexão com a realidade pode representar um cenário "perigoso e frustrante", segundo Vanessa.

"Desejar e sonhar com um emprego são interessantes para projetar um plano de carreira. Mas, para além de conseguir entrar no trabalho, será necessário ter conhecimento dos seus pontos positivos e suas fraquezas para manter a vaga e desempenhar as tarefas. Com o tempo, se as habilidades não estiverem compatíveis com a realidade, isso pode impactar de forma negativa nas relações e na autoestima".

A psicóloga Tallita Kemmer, especialista em desenvolvimento organizacional da Merkis, explica que "ser delulu" de forma extrema não é sustentável e pode causar prejuízos à saúde mental a longo prazo.

"Uma coisa é usar o 'delulu' como 'inspiração' para ser ousado e transpor barreiras e limites que as vezes são autocriadas, que pode ser usada de forma estratégica. O risco é usar 'delulu' como regra do jogo e não prestar atenção nas lições e aprendizados que as situações trazem", afirma.

Além disso, ela explica que para construir a carreira, um profissional precisa apresentar entregas, ter uma rede sólida (conhecer pessoas) e criar a própria sorte.

"'Delulu' pode ser uma maneira de 'criar a própria sorte' e olhar mais para as oportunidades do que para as barreiras. Mas o importante é manter uma perspectiva de aprendizado para ambas as situações: as que dão certo usando 'delulu' e as que não dão certo", completa.