Por Darlan Helder, g1


  • O projeto World, cocriado por Sam Altman, CEO da OpenAI, já escaneou a íris de 115 mil brasileiros desde o início de suas operações no país, em 13 de novembro de 2024.

  • As coletas estão sendo realizadas em 20 locais distribuídos pela cidade de São Paulo. Não há custo para os interessados, segundo a empresa.

  • O projeto é considerado polêmico por especialistas, especialmente por não detalhar quais informações são coletadas.

  • A World afirma que, hoje, uma inteligência artificial já é capaz de enganar a checagem de segurança de sites e redes sociais, que é feita por meio de um código.

Dispositivo usado para criar 'passaporte digital' da Worldcoin — Foto: Darlan Helder/g1

A World, projeto cocriado por Sam Altman, CEO da OpenAI, já escaneou a íris de 115 mil brasileiros desde o início de suas operações no país, em 13 de novembro de 2024. Os dados foram confirmados pela própria World ao g1, nesta quarta-feira (11).

Ainda segundo a companhia, 519 mil brasileiros possuem conta no World App, um aplicativo que permite realizar transações com a criptomoeda da World. Essa moeda digital é oferecida aos usuários que realizam o escaneamento da íris (entenda o que é o projeto).

As coletas estão sendo realizadas em 20 locais distribuídos pela cidade de São Paulo. Não há custo para os interessados, segundo a empresa.

Na última segunda-feira (9), o g1 registrou uma dessas lojas no Shopping Boulevard Tatuapé, localizado na Zona Leste da capital paulista (veja na imagem abaixo).

Loja da World no Shopping Boulevard Tatuapé, em São Paulo — Foto: Darlan Helder/g1

O projeto é considerado polêmico por especialistas, especialmente por não detalhar quais informações são coletadas.

Em entrevista ao g1, Rafael Zanatta, diretor do Data Privacy Brasil, defende que a Tools for Humanity, empresa colaboradora do protocolo World no Brasil, crie um Conselho Consultivo Civil, formado por pessoas com formação em direitos humanos, para prestação de contas sobre garantia dos direitos de privacidade e proteção de dados pessoais.

"É importante que a empresa também tenha condições de prestar contas à humanidade, de forma democrática, e não só ofereça serviços e tecnologias para diferenciar robôs de humanos", completou Zanatta.

No segundo semestre do ano passado, a Word chegou a disponibilizar três locais de atendimento em São Paulo. Naquele período, a empresa disse que a operação era apenas um teste e que os "serviços não tinham a previsão de serem permanentes no momento".

Um dia antes do início da operação oficial, em novembro de 2024, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) iniciou um processo de fiscalização contra a empresa.

Em nota enviada ao g1, a ANPD, que é vinculada ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, informou que a Tools for Humanity entregou, no fim de novembro, informações referentes a suas práticas de tratamento de dados pessoais.

"No momento, a fiscalização [da ANPD] está avaliando a documentação apresentada pela empresa", acrescenta a nota.

Além do Brasil, a Word também atua nos Estados Unidos, no México e na Alemanha. A empresa informou que o escaneamento está temporariamente pausado na Espanha e em Portugal "por iniciativa própria do projeto".

Por que a World quer coletar íris de brasileiros

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O projeto tem como objetivo auxiliar na distinção entre humanos e robôs criados por inteligência artificial. Entre os potenciais usos da inovação está a prevenção de perfis falsos em sites e redes sociais, por exemplo.

Ele também pode substituir o Captcha (veja na imagem abaixo), uma ferramenta de segurança usada por vários sites para certificar que quem está acessando é um humano e não um robô.

A World afirma que, hoje, uma inteligência artificial já é capaz de enganar essa checagem.

Por enquanto, não há custo para quem optar pelo registro, e a pessoa pode receber 25 tokens da Worldcoin, uma moeda digital semelhante ao Bitcoin. Na conversão para o real, esse valor equivale a aproximadamente R$ 470.

Teste do reCAPTCHA pode ser validado automaticamente em certas circunstâncias — Foto: Reprodução

A estrutura da World tem três frentes:

  • 👁️ World ID, como é chamado o passaporte digital que transforma o registro da íris em uma sequência numérica;
  • 🪙 Token Worldcoin (WLD), a criptomoeda que será distribuída como recompensa para todos os inscritos;
  • 📱World App, o aplicativo que permite fazer transações com a criptomoeda.

Como funciona a coleta

Câmera Orb, da Word, que escaneia a íris — Foto: Darlan Helder/g1

A "foto" da irís da pessoa é tirada com a câmera Orb (veja na imagem acima) e é usada para criar um código numérico para identificar cada usuário e, de acordo com a World, é apagada logo em seguida.

Segundo a organização, os usuários não precisam compartilhar nome, número de telefone, e-mail e endereço. O sistema é mais seguro que o reconhecimento facial, diz Rodrigo Tozzi, gerente de operações da Tools for Humanity, parceira da World. Veja como é feita a coleta:

  1. primeiro, os interessados devem baixar um aplicativo, chamado World App;
  2. em seguida, é preciso agendar um horário em um dos locais de verificação;
  3. depois, a pessoa deve ir presencialmente até este local para que a câmera Orb capture uma imagem de alta resolução da íris;
  4. após o registro, a "foto" é criptografada de ponta-a-ponta, enviada ao celular da pessoa e deletada da Orb, segundo a organização.

As ambições da empresa vão além e ela afirma que governos ao redor do mundo podem utilizar sua tecnologia em "processos democráticos globais". A iniciativa também defende que sua ferramenta pode abrir caminho para a criação de uma renda básica universal.

Projeto gera polêmica

Ponto de escaneamento de íris criado pela Worldcoin na Índia, em foto de 25 de julho de 2023 — Foto: Reuters/Medha Singh

Apesar de não precisar manter imagens da íris de usuários, a World vem sendo criticada pela falta de detalhes sobre como vai tratar outras informações que coleta. Isso porque a sequência numérica gerada a partir da foto funciona como um dado biométrico, que é considerado sensível.

"Mesmo que a imagem do teu olho tenha ido embora, o identificador único permanece. Existe uma intenção de reutilizar esse sistema e ganhar dinheiro em cima dele fazendo autenticações", afirmou Rafael Zanatta, diretor do Data Privacy Brasil, em entrevista ao g1 em agosto de 2023.

A World levanta questões sobre até que ponto uma organização independente pode coletar qualquer tipo de código genético de pessoas, analisou Nina da Hora, do Instituto da Hora, também no ano passado.

"É extremamente delicada a afirmação de que precisam invadir a privacidade das pessoas para protegê-las", disse.

De acordo com Rodrigo Tozzi, gerente de operações da Tools for Humanity, parceira da World, a empresa conversa e trabalha com órgãos regulares em cada país em que atua. No Brasil, ele afirma que vem tratando do assunto com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Um dia antes do lançamento no Brasil, a equipe de fiscalização da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) se reuniu com representantes da World para esclarecer dúvidas sobre o projeto e entregar o documento que formaliza o pedido de explicações adicionais.

Procurada pelo g1 no mesmo dia, a World afirmou estar à disposição das autoridades reguladoras dos países em que atua para esclarecer seu projeto. A empresa também afirmou que busca cumprir todas as leis e regulamentações relacionadas ao processamento de dados pessoais nos mercados em que opera.

Em um posicionamento enviado nesta quarta (11), a Word defendeu a segurança do projeto e disse que "os códigos de íris são fracionados por meio de criptografia avançada, conhecida como Computação Multi-partidária Anonimizada (AMPC). Esses fragmentos são armazenados em nós computacionais operados por universidades e terceiros confiáveis".

"Os fragmentos criptografados não revelam nada sobre o indivíduo nem podem ser efetivamente vinculados de volta a ele. A World assegura a efetiva anonimização dos dados", completou.

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