O PlayStation 4 vendido no Brasil por R$ 4 mil faz do novo videogame da Sony o mais caro do mundo. A empresa tenta justificar dizendo que, mesmo com o alto valor, a empresa "perde dinheiro" com a venda do videogame no Brasil e culpa a cascata de impostos que produtos importados têm no país.
O cálculo é questionado pelo advogado tributarista Miguel Silva, sócio do escritório Miguel Silva & Yamachita advogados. Em entrevista ao G1, ele sugere que além da carga tributária de quase 70% sobre os videogames, as multinacionais estão colocando o custo de embaraço, logística e distribuição, ou 'custo Brasil', no preço final do produto.
Já João Eloi Olenike, presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisas Tributárias (IBPT), afirma que a Sony não só exibiu corretamente os tributos como deixou de incluir alguns.
O G1 conversou com Mark Stanley, vice-presidente e gerente-geral de PlayStation para a América Latina, e Anderson Gracias, gerente da divisão PlayStation da Sony Brasil. O objetivo dos dois executivos é mostrar ao público a conta feita pela companhia para trazer o PlayStation 4 a R$ 4 mil.
De acordo com a empresa, R$ 858, 21,5% do preço do PlayStation 4, é o valor de transferência do console, ou seja, o valor que a Sony Brasil paga para cada unidade do videogame que será importado. A empresa afirma que R$ 2.524, 63% do valor final do produto, são impostos cobrados para trazer o console para o país como IPI, imposto de importação, Pis e Cofins. Estes valores são somados à margem do varejista que irá vender o PS4 e à margem do distribuidor, que é a Sony Brasil, em um total de 22%.
O total da conta chega a R$ 4.257. A Sony ainda diz "devolve para o negócio" R$ 258, 6,5% do valor do produto, para conseguir fechar o preço do varejo de R$ 3.999, que os executivos consideram "o mais baixo o possível". "Eu poderia dizer que a Sony não está ganhando nenhum centavo. Na verdade, estamos perdendo. Tudo isso é imposto em cascata, imposto sobre imposto. Esse é o maior problema do nosso país", diz Gracias.
"O IPI para videogames é de 50%, enquanto computadores pagam apenas 15%. Usaremos toda a repercussão negativa do nosso preço de lançamento e a levaremos para o governo brasileiro para tentarmos mudar alguma coisa na política tributária", disse Stanley.
Consultado pelo G1, o IBPT não só chancelou como informou que a carga tributária incidente no PS4 informada pela Sony é menor que a estimada pela entidade. "Nosso cálculo é maior ainda que aquilo, de 72%, pois incluímos outros tributos, como o sobre a folha de salário e os incidentes sobre o lucro", afirmou João Eloi Olenike, presidente do IBPT. Ele explica que as alíquotas são maiores pelo videogame ser considerado um produto supérfluo. "Quanto mais necessário um produto é para o país, menor a alíquota, e quanto menos útli ou mais maléfico à saúde, maior a alíquota, até para inibir o consumo."
"Não esperamos vender muitos PS4 a este preço alto no Brasil. Não ajuda a marca PlayStation e não ajuda os gamers. Nossa prioridade é olhar para a frente, na fabricação local para que mais gamers possam ter o console em suas casas".
O executivo diz que o objetivo, agora, é concentrar esforços para a fabricação local do PlayStation 4 em território brasileiro, o que reduziria em cerca de 50%, para R$ 2 mil, o preço do aparelho.
O PlayStation 3, que é o foco da empresa no Brasil, começou a ser fabricado em maio deste ano. "Neste momento as primeiras unidades do PS4 estão sendo fabricadas no exterior. Com elas, aprendemos como tornar o processo de fabricação mais fácil. Temos que ver quais componentes podem ser feitos aqui no Brasil ou terão que ser importados, o que influencia no preço final", diz Stanley. "Há impostos complicados quando se fabrica localmente e cada peça importada é taxada com um imposto diferente".
Entretanto, não há previsão de quando o PlayStation 4 começaria a ser fabricado no Brasil. "Não será em 2014", adianta Stanley. Entretanto, ele diz que todos os esforços da empresa estão concentrados na fabricação local. "O fato de já termos o PlayStation 3 sendo fabricado no Brasil já agiliza o processo [de fabricação do PlayStation 4]".
Sobre o concorrente Xbox One, da Microsoft, ser quase 50% mais barato do que o PS4 no Brasil (ele custa R$ 2,2 mil), o executivo diz que o mérito é deles, que há duas maneiras de conseguir lançar um videogame por esse valor: "um subsídio massivo ou com fabricação local". "Você terá que perguntar para eles como eles chegaram a este preço".
"Infelizmente, nos EUA temos um cenário de impostos mais estável e um mercado mais competitivo. Isso não acontece aqui no Brasil", afirma o executivo. "Me frustra muito [o concorrente ser quase 50% mais barato]. Não consigo colocar um PS4 nas mãos de cada brasileiro no lançamento e isso por conta das taxas cobradas pelo país".
Procurada pelo G1, a Microsoft disse que não irá comentar as afirmações da Sony.
Adiar lançamentopara 2014
A Sony afirma ter feito grandes esforços para incluir o Brasil na lista de países que receberão o PlayStation 4 no lançamento mundial em novembro, mesmo com o preço elevado.
"Tínhamos a opção de não lançar agora e esperar a fabricação local ou mostrar que o Brasil é importante para a divisão PlayStation e inclui-lo na lista de 26 países que o receberão no lançamento mundial. Infelizmente ele chega a um preço alto, mas para nós foi mais importante mostrar que o país é prioridade. Nosso objetivo é fazer o PS4 ser mais acessível", explica Stanley.
Por R$ 4 mil, muitos brasileiros conseguem viajar para países onde o PlayStation 4 é mais barato, compram o aparelho e ainda economizam dinheiro. "Muitos consumidores brasileiros são forçados a viajar para comprar produtos no exterior por um melhor preço. Sabemos que muitos farão isso. Parte da nossa missão é dar a todos acesso a estes produtos nas suas lojas e não descansaremos enquanto não fizermos isso. Já vendemos o console por menos do que ele custa para ser fabricado e ainda devolvemos parte do lucro para fechar a conta. Tentamos manter o preço mais baixo apesar das taxas", afirma o executivo.
"Embora estamos oferecendo o PlayStation 4 a um preço alto, estamos trabalhando dia e noite para conseguir trazer o videogame a um preço mais baixo. Graças às vozes de todos os fãs, poderemos levar essa conversa para o governo brasileiro para tentar mudar as políticas de impostos, que são os maiores do mundo". Stanley diz que há muitos anos a Sony trabalha próxima ao governo brasileiro para mudar as políticas tributárias de importação.
'Risco Brasil'
O G1 consultou um especialista em direito tributário sobre a relação de tributos repassada pela Sony. Apesar de afirmar que destrinchar a lista seria um "trabalho hercúleo", Miguel Silva, sócio do escritório Miguel Silva & Yamachita advogados, afirma que, à primeira vista, surge um ponto de interrogação.
Foco no PlayStation 3 | |
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De acordo com Stanley, o PlayStation 3, lançado em 2006, está no foco da empresa para o mercado brasileiro nos próximos anos. Para o executivo, ele é um videogame de alta qualidade com um preço acessível. "Ainda estamos investindo muito tempo de desenvolvimento de games para o aparelho". Novidades do console serão apresentadas em um evento da Sony que antecede a feira Brasil Game Show em São Paulo na quinta-feira (24). A empresa pode anunciar uma redução no preço do PS3 e o lançamento do serviço PlayStation Plus |
"Soa estranho. Militando na área do direito tributário há 25 anos e sei que nos EUA [o PlayStation 4] custa US$ 399. Quer dizer, como de um limão de US$ 399 fazem uma limonada de R$ 4 mil?"
Segundo ele, "além de colocar uma carga tributária de quase 70%, não podemos esquecer que as multinacionais estão colocando no preço o custo Brasil". Isso quer dizer: "custo de embaraço e logístico até chegar no centro de distribuição da Sony e dali chegar ao Carrefour, ao Extra".
Para se ter ideia dos percalços no caminho, segundo ele, demora até dez dias para desembaraçar (resolver os trâmites burocráticos) um produto no Porto de Santos, enquanto a média mundial é de um dia.
"Já sabendo que há um custo burocrático que em outros países não existe, a Sony inclui isso na formação de preço. Além disso, tem também a taxa de insegurança jurídica. O governo atual tem um política intervencionista e as multinacionais estão preocupadas com isso, colocando uma taxa de insegurança jurídica, um nome bonito para Risco Brasil"
"A insegurança jurídica está na raiz da situação que tem dificultado a entrada de alguns jogos no país devido a uma mudança na classificação de games pela Receita Federal", diz o especialista.
O fato de o mercado de games ser concentrado entre três empresas (Sony, Microsoft e Nintendo), cria um cenário de oligopólio. "Não há fuzilamento se não comprar da Sony. Mas como estamos num mercado de poucos fornecedores, há um sobrepreço por se tratar de um mercado oligopolizado", diz.
Apesar de o preço elevado, ainda assim, isso não deve afastar os consumidores: "Há fiéis da Sony como há fiéis da Apple".
(*colaborou Helton Simões Gomes)