Criança cujo túmulo é visitado por aqueles que buscam intercessão para problemas infantis — Foto: Reprodução/TV Globo
Antoninho da Rocha Marmo, Noeminha, Menina Débora, Padre Monteiro: esses são os nomes de algumas das pessoas que morreram, estão enterradas em cemitérios de São Paulo, e são consideradas "milagreiras".
O estudo de um integrante da Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais (ABEC), o professor Lourival Andrade Júnior, já chegou a catalogar cerca de 2 mil milagreiros de cemitérios pelo país.
Já na capital paulista, o pesquisador independente associado à ABEC Thiago de Souza catalogou 25 milagreiros em cemitérios da cidade, como um menino que teria previsto a própria morte e uma noiva que morreu antes do casamento. A prefeitura chegou a catalogar 12 pessoas.
Os objetivos da pesquisa são dois: apresentar à cidade suas “divindades” eleitas pelo povo e exigir proteção a esse patrimônio.
Os pedidos para os "santos milagreiros", que embora não canonizados oficialmente pela Igreja Católica, são venerados pela população, são diversos: passar no vestibular, proteção contra doenças, fazer o filho parar de beber e até conseguir a cura de um pet que teve a patinha fraturada.
O fenômeno é descrito no livro "Milagreiros de Cemitério - Cidade de São Paulo", que será lançado neste sábado (2), na Capela dos Aflitos, no bairro da Liberdade.
"O maior objetivo desse livro é apresentar para São Paulo suas divindades locais. Porque embora não tenha encontrado milagreiros em todos os cemitérios públicos de São Paulo, a gente encontrou milagreiros em todas as regiões de São Paulo. O segundo objetivo é passar a proteger esse patrimônio que a gente acredita que é imaterial, já que ele dialoga de forma muito simples e muito genuína com a espiritualidade dessas pessoas e dessas regiões, dessas comunidades", diz o autor do livro, o advogado, compositor e roteirista Thiago de Souza.
Ele observa que o fenômeno pode nascer da comoção de uma morte sentida, que costuma ser traumática, como um assassinato ou um grande acidente, mas também por uma morte que acontece no curso natural dela, mas que é muito sentida, como a do padre Monteiro.
"Existe uma incidência muito grande de conversões de pessoas em milagreiros a partir de seu martírio. Existe um fenômeno muito bonito, que é o de você perceber que as pessoas antigamente tinham um tipo de empatia comunitária, dividiam o fardo da dor, da perda com familiares, com amigos, com pessoas próximas, especialmente com esse ímpeto, diligente de ir orar diante dos túmulos", diz.
"Então, tudo nasce meio que disso e depois alguém faz um pedido de ajuda para essas almas, considera essas almas purificadas pela dor, até às vezes pela gravidade da circunstância da morte. E ao ser agraciado, ao receber essa graça alcançada, passa a propagar não apenas a sua gratidão a partir de ex-votos, que são aquelas plaquinhas, mas também o poder divino daquela pessoa sepultada no túmulo. Então, a plaquinha serve para exibir a gratidão, mas também em alguma medida para publicizar essa capacidade do milagreiro", completa.
Veja alguns dos milagreiros dos cemitérios de São Paulo
Cemitério da Consolação (Centro)
Antoninho da Rocha Marmo morreu em 1930, aos 12 anos. É conhecido por atender pedidos de cura e intercessão. — Foto: Reprodução
- Antoninho da Rocha Marmo morreu em 1930, aos 12 anos. É conhecido por atender pedidos de cura e intercessão.
- Maria Judith de Barros, morta em 1938 após sofrer violência doméstica, é procurada por estudantes que buscam sucesso em vestibulares.
- Domitila de Castro (Marquesa de Santos): o túmulo da figura histórica, amante de Dom Pedro I, tornou-se ponto de visitação, especialmente por mulheres em situações vulneráveis, que a veem como protetora e símbolo de força. É lembrada por suas obras de caridade, por seu envolvimento em campanhas políticas e na defesa de ideias liberais.
Cemitério de Vila Formosa (Zona Leste)
Criança vítima de um crime brutal nos anos 1980. O túmulo é visitado por pessoas que buscam conforto e milagres e cura de crianças — Foto: Thiago de Souza/ Arquivo pessoal
- Menina Débora: Criança vítima de um crime brutal nos anos 1980. O túmulo é visitado por pessoas que buscam conforto, milagres e cura de crianças.
Cemitério da Penha (Zona Leste)
- Cesinha, Coca e Mari Aninha: os túmulos das crianças e da jovem são locais de devoção popular.
Cemitério São Pedro na Vila Alpina (Zona Leste)
- 13 Almas do Edifício Joelma: há um memorial dedicado às vítimas do incêndio no Cemitério São Pedro.
Thiago de Souza e a homenagem às 13 Almas — Foto: Thiago de Souza/ Arquivo pessoal
Cemitério do Araçá (Zona Oeste)
- Menino Guga: sepultura da criança é ponto de peregrinação para pedidos relacionados a crianças e cura de doenças.
Cemitério da Lapa (Zona Oeste)
- As Três Marias: túmulo de três meninas que atraem devotos em busca de graças.
Cemitério da Freguesia do Ó (Zona Norte)
- Padre Monteiro: sacerdote lembrado por sua dedicação à comunidade, é procurado por fiéis que buscam intercessão.
Cemitério Santana/Chora Menino (Zona Norte)
- Garotinho (Franco) e Neusinha Vidal: crianças cujos túmulos são locais de devoção popular.
Cemitério de Santo Amaro (Zona Sul):
- Bento do Portão: conhecido por atender pedidos diversos, especialmente relacionados a causas perdidas. Um grande intercessor de saúde.
- Alzira Branco Jacinto: mulher lembrada por sua bondade, é procurada por devotos em busca de graças.
- Noeminha: criança cujo túmulo é visitado por aqueles que buscam intercessão para problemas infantis.
Cemitério de Vila Mariana (Zona Sul)
- Luiginho e Marquinho: crianças cujos túmulos são pontos de peregrinação para pedidos relacionados a saúde e proteção infantil.
Cemitério da Quarta Parada (Zona Leste)
- Felisbina Müller: também conhecida como "Santa Felisbina", teria sido vítima de agressões por parte do marido. Após a morte de Felisbina, relatos indicam que seu corpo passou por exumações e permaneceu incorrupto, o que contribuiu para a sua fama de santidade. Devotos atribuem a ela diversos milagres, especialmente relacionados à aprovação em vestibulares, razão pela qual é considerada a "santa protetora dos vestibulandos". Também é conhecida por pedidos de proteção a pets. Seu túmulo é frequentemente visitado por pessoas que buscam intercessão em questões acadêmicas e outras causas pessoais.
Felisbina Müller: também conhecida como "Santa Felisbina" teria sido vítima de agressões por parte do marido dela — Foto: Reprodução
Agradecimento a Santa Filisbina por cura de patinha fraturada — Foto: Thiago de Souza/ Arquivo pessoal
Capa do livro "Milagreiros de cemitério - cidade de São Paulo" — Foto: Reprodução