Prefeitura quer administrar escolas estaduais
Outras 25 escolas, com mais quase 12,7 mil matrículas, já foram selecionadas para o mesmo processo, mas ele deve ocorrer apenas em 2025.
Zona Leste concentra mais escolas
O SP2 teve acesso a ofícios trocados entre as secretarias municipal e estadual entre novembro e dezembro, em que as pastas discutem criar um convênio dentro do Programa de Ação de Parceria Educacional Estado-Município. Ele está limitado ao âmbito dos anos iniciais do ensino fundamental, ou seja, aos estudantes do primeiro ao quinto ano do fundamental.
Mapa mostra onde ficam as 50 escolas selecionadas pela Prefeitura de SP em dezembro para terem a gestão transferida da rede estadual para a rede municipal de ensino — Foto: Letícia Prado/TV Globo
Um dos documentos, um ofício encaminhado pela Secretaria Municipal de Educação (SME-SP) à pasta estadual em 8 de dezembro, contém a lista de 50 escolas escolhidas pela prefeitura.
A Zona Leste concentra mais escolas (21), seguida da Zona Sul (11), da Norte (7), do Centro (6) e da Zona Oeste (5).
Nenhuma das secretarias confirmou se a lista é definitiva. A SME-SP afirmou, em nota, que, "considerando o mês de janeiro com recesso escolar, estado e prefeitura estão organizando as redes, que já trabalham integradas", e que "os próximos passos serão noticiados previamente ao ano letivo".
"Nesses processos, o município assume a gestão das escolas, podendo contar com o apoio do Estado na cessão de professores, recursos financeiros e patrimoniais", disse a prefeitura.
Governo estadual reduz matrículas em 7,6%
A TV Globo cruzou os dados da lista de escolas disponível em um ofício encaminhado pela Secretaria Municipal da Educação (SME-SP) à pasta estadual em 8 de dezembro com as informações disponíveis na edição mais recente do Censo Escolar, de 2022.
No total, as 50 escolas somavam 24.895 matrículas, 100% delas dos anos finais do fundamental.
Considerando o total de matrículas dessa etapa de ensino em 2022, a transferência de gestão significa uma redução de 7,6% nas 327.545 matrículas que a rede estadual tinha nos anos iniciais do fundamental na capital, e uma expansão de 11,2% nas 222.993 matrículas da rede municipal. A rede privada concentra outras 201.861 matrículas do 1º ao 5º ano do fundamental.
No total, considerando todas as etapas de ensino, a Prefeitura de São Paulo é responsável por 720 mil matrículas da educação básica.
Medida é inédita na capital
De acordo com o governo estadual, esta não é a primeira vez que uma prefeitura paulista assume a gestão de uma escola estadual.
“A municipalização teve início em 1996, com o lançamento do programa de Ação de Parceria Educacional Estado-Município. Desde então, 3.830 escolas de 588 cidades foram municipalizadas”, disse em nota a Secretaria Estadual de Educação (Seduc-SP).
Porém, a medida é inédita na capital. Segundo a especialista Márcia Jacomini, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e pesquisadora da Rede Escola Pública Universidade (Repu), em 1996, quando a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) foi aprovada, houve um intenso processo de municipalização de escolas estaduais em vários estados e no interior de São Paulo.
O movimento foi fomentado pelo novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, o chamado Fundef, que foi criado no mesmo ano e era focado especificamente no ensino fundamental.
O Fundef foi substituído em 2007 pelo Fundeb, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, em vigor até hoje.
Mas, na época, a Prefeitura de São Paulo se recusou a assumir a responsabilidade das escolas estaduais na capital. Segundo a professora Márcia, o motivo é o fato de São Paulo já ter uma rede municipal grande.
Ela explica que a municipalização, na capital, é negativa porque a prefeitura atualmente só consegue atender a demanda por creches (uma etapa de ensino exclusiva da gestão municipal) porque contrata entidades conveniadas. "Se a prefeitura considera que pode ampliar a rede de ensino, ela deveria expandir a rede de ensino infantil", afirmou ela.
Além disso, a professora explicou que a municipalização sem diálogo prévio, e feita após o cálculo de recursos por aluno do Fundeb para 2024 já ter sido feito e divulgado em dezembro, pode acarretar em diversos problemas.
Segundo ela, o professor da rede estadual "vai passar a conviver com outro currículo, com outra orientação pedagógica e educativa, mas ele vai passar também a conviver com professores da rede municipal, que têm uma carreira diferente daquele da rede estadual, e também têm uma remuneração, um salário diferente da rede estadual".
Outro problema, segundo ela, é a incerteza sobre como ficam os professores temporários (os contratados pela rede estadual na Categoria O e que representam mais da metade do total de docentes), e que podem ficar sem aulas. De acordo com a professora, o buraco deixado por eles terá que ser preenchido por professores da rede municipal, mas os recursos do Fundeb para essas escolas não contemplam o salário deles.
Nenhuma das secretarias informou se os professores poderão continuar dando aulas nas escolas municipalizadas. Os detalhes só foram divulgados a respeito dos professores concursados ou estáveis, que poderão permanecer nas mesmas escolas, como emprestados do governo estadual, ou pedir transferência para outras escolas da rede estadual.
Leia a íntegra das notas enviadas pelas secretarias:
O que diz a Secretaria Municipal da Educação (SME-SP):
"As secretarias Municipal e Estadual de Educação de São Paulo estão em tratativas com vistas a parceria inédita que prevê a municipalização de 25 unidades escolares dos anos iniciais (1º ao 5º ano) da capital paulista, neste ano. A ação deve alcançar outras 25 unidades em 2025.
A medida fará parte da chamada descentralização das políticas públicas, movimento determinado pela Constituição de 1988, que reorganizou a prestação de serviços públicos entre os diversos níveis de governo. A Constituição combinada com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) determina que a atuação neste ciclo de ensino deve ser oferecida prioritariamente pelos municípios.
O plano de trabalho está sendo construído em conjunto. As tratativas iniciaram em agosto e os critérios para escolha das unidades escolares levam em conta as regiões que não possuem escolas municipais, ou o atendimento é majoritário da rede estadual, possibilitando a melhor organização das redes de educação e o atendimento na cidade.
Com a municipalização as escolas passam a contar com todos os serviços de apoio ao estudante, como créditos para material e uniforme, Transporte Escolar Gratuito (TEG), merenda, limpeza e manutenção predial.
Todos os professores concursados e estáveis da rede estadual que desejarem, permanecerão nas unidades, sendo formados para o desenvolvimento do currículo da cidade.
A administração municipal possui o Currículo da Cidade, documento que norteia as aprendizagens essenciais para os estudantes da rede. O Currículo, alinhado às diretrizes nacionais, com orientações para o trabalho das Unidades Escolares quanto às atividades no dia-a-dia, leva em conta as especificidades de cada fase do desenvolvimento dos estudantes.
A medida traz avanços na prestação do serviços educacionais na cidade, pois diversifica as formas de atendimento do poder público nos territórios e avança na especialização das etapas de cada ente federado, como previsto pelo ordenamento constitucional.
Nesses processos, o município assume a gestão das escolas, podendo contar com o apoio do Estado na cessão de professores, recursos financeiros e patrimoniais.
Considerando o mês de janeiro com recesso escolar, Estado e Prefeitura estão organizando as redes, que já trabalham integradas. Os próximos passos serão noticiados previamente ao ano letivo."
O que diz a Secretaria Estadual da Educação (Seduc-SP):
"Um convênio da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo com a prefeitura da capital irá municipalizar 25 escolas no início do ano letivo de 2024 e outras 25 em 2025. As tratativas entre Estado e capital começaram em agosto e a conclusão do processo termina no início de fevereiro deste ano, início das aulas.
O interesse pela municipalização partiu da prefeitura que fez a seleção das escolas a partir de dois critérios: unidades de Anos Iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano) e aquelas que ficam em regiões em que a prefeitura da capital tem necessidade de ampliar o atendimento municipal.
A proposta visa transferir para a gestão municipal as unidades que atendem os Anos Iniciais (1⁰ ao 5⁰ ano) do Ensino Fundamental, cuja responsabilidade, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases, é prioritária dos municípios.
Cerca de 25 mil estudantes serão impactados nos dois anos. Neste período, os profissionais da rede estadual poderão permanecer atuando nas unidades - na situação 'afastados para o município' - ou atribuir em outras unidades estaduais, caso prefiram. O salário dos profissionais das escolas municipalizadas será pago pelo Estado, sem qualquer prejuízo aos profissionais.
Atualmente, a Seduc-SP possui 1.082 escolas regulares na capital, sendo os Anos Iniciais atendidos em 586 unidades, os Anos Finais (6⁰ ao 9⁰ ano) em 608 e o Ensino Médio em 586. No estado de São Paulo, 588 cidades já tiveram escolas estaduais municipalizadas. Na capital, esta ação será inédita.
Vale ressaltar que a municipalização teve início em 1996, com o lançamento do programa de Ação de Parceria Educacional Estado-Município. Desde então, 3830 escolas de 588 cidades foram municipalizadas. A iniciativa atende a Lei de Diretrizes e Bases que preconiza que a responsabilidade da gestão das unidades escolares dos Anos Iniciais (1⁰ ao 5⁰ ano) do Ensino Fundamental é dos municípios."