Há quase três décadas, o mês de dezembro tem um significado especial na vida do advogado José Franklin Winston, de 69 anos. De olhos azuis, barba e cabelos brancos, ele veste a roupa vermelha de Papai Noel e leva esperança e alegria a milhares de crianças em Ribeirão Preto (SP). Quem vê Winston na casinha montada na Praça XV de Novembro, no entanto, não imagina que o que motiva o 'bom velhinho' a encarar a função há 27 anos é o fato de nunca ter comemorado o Natal na infância. “Enquanto eu puder, vou continuar levando a alegria e a esperança a todos os que acreditam no Natal", recorda.
Ao recordar a infância humilde no Centro de Ribeirão, bairro onde foi criado, Winston narra um pouco do que o Natal representava nos fins de ano da família. "Comecei a trabalhar cedo, aos 8 anos. Eu fazia caminhãozinho de madeira na marcenaria. Eu mesmo cortava, colocava as rodas. [No Natal] O que a gente conseguia ganhar era uma cesta básica com leite condensado e bolacha champagne. Eu via a dificuldade. Minhas irmãs se esforçavam para tentar comprar presente para a gente. Mas presente nosso era uma alpargata. Se esfarelasse as cordas, a gente ia para a escola descalço. Quando a gente ganhava um aviãozinho, alguma coisa do tipo, era uma alegria", diz.
O início da 'carreira' de Papai Noel, no entanto, aconteceu por acaso. Em dezembro de 1988, Winston, na época com 42 anos, foi abordado por uma mulher enquanto caminhava por uma das ruas da Vila Virgínia, na zona oeste de Ribeirão. "Estava perto de uma escola. A senhora perguntou, bem nervosa, se eu estava com muita pressa. A pessoa que ia vestir a roupa de Papai Noel tinha ficado doente e as crianças estavam esperando. Ela pediu para eu passar duas horas vestido de Papai Noel. Passei pasta de dente na sobrancelha, coloquei barba postiça, um cinto simples e tentei ser o Papai Noel da forma como eu via por aí. No dia seguinte, comprei uma roupa para mim", conta.
Dali para frente, o advogado assumiu a identidade do Papai Noel. Com o passar do tempo e a chegada dos fios brancos, resolveu deixar crescer barba, cabelo e bigode para ficar com a aparência mais próxima à do 'original'. "O dever de um Papai Noel é realmente ser Papai Noel. Mantenho esse visual com a barba e o bigode para pelo menos uma vez ao ano fazer com que esse sonho em volta do Natal continue", afirma.
Ao longo de quase 30 anos como Papai Noel, Winston já passou por todo tipo de situação: já travou a coluna por ficar muito tempo sentado, teve três óculos quebrados na hora do abraço caloroso de algumas crianças e pegou piolho seis vezes. "Umas duas vezes por semana, nessa época do ano, eu lavo o cabelo com álcool e vinagre. Acontece de pegar piolho, porque a criança vem, abraça, aí não tem como escapar. Se chega janeiro e meu cabelo começa a coçar, é porque o bichinho resolveu pular para a minha cabeça", diverte-se.
Emoção à flor da pele
Se por um lado a vida como bom velhinho garante risadas e diversão com as crianças, por outro há situações em que não há como conter a emoção. Dentre as inúmeras histórias contadas pelos pequenos, Winston não se esquece de um menino que foi até ele e perguntou se Papai Noel era amigo de Jesus Cristo. "Ele perguntou: É o senhor que vive perto de Jesus? Respondi que sim. Aí ele disse: Então reza para o meu pai sair da cadeia para poder vir passar o Natal com minha mãe e meus irmãos. Essas coisas cortam o coração, porque ficamos de mãos atadas diante de situações assim", diz.
Houve uma ocasião, no entanto, em que Winston conseguiu cumprir à risca o papel de Papai Noel. O advogado conta que em 2008, ao ler uma das cartas deixadas na casinha onde trabalha no Centro de Ribeirão, o pedido de uma menina chamou a atenção. "Dizia: meu nome é Érica. Queria ganhar uma televisão e nós não temos nada para colocar na panela no dia do Natal”, recorda-se.
O problema, segundo Winston, é que a carta havia sido escrita em uma folha de papel simples, sem envelope. Não havia sequer um endereço para localizar a menina. "Foi aí que olhei no verso do papel e tinha um telefone: tia Alice. Liguei, a mulher atendeu. Eu disse: Aqui é o Papai Noel. Imediatamente a mulher começou a gritar para a sobrinha que eu estava no telefone. A menina pegou o telefone e perguntou se eu tinha lido a carta. Eu disse que sim, e disse que iria ver o que poderia fazer por ela."
Winston, que tinha uma televisão sobrando em casa na época, reservou o aparelho para presentear a família de Érica. Conseguiu a doação de duas cestas básicas, e no dia 25 de dezembro foi até a casa da menina. "A família estava toda sentada no portão. Realmente, eles não tinham nada para comer. O pai estava com o braço quebrado, a mãe tinha cortado a mão numa serra. No varal da casa estavam as roupas de todos penduradas, porque eles não tinham guarda-roupas. Todos ficaram emocionados quando chegamos lá. Apesar de tudo, eles sorriram naquele Natal", afirma.
'Até o fim'
Reconhecido nas ruas como o bom velhinho até fora da época natalina, Winston diz que guarda na memória as feições de muitas das pessoas com quem cruza. Tanto que até já 'atravessou' gerações em Ribeirão. "Tirei uma foto com um menino de 12 dias em frente a uma loja. No ano passado ele apareceu casado e com dois filhos, para eu tirar foto com as crianças dele. São pessoas que vêm todo ano, e essa convivência é muito gratificante", afirma.
Hoje, aos 69 anos e pai de 13 filhos (um deles já falecido), Winston não cogita a possibilidade de aposentadoria como Papai Noel. O sonho, segundo ele, é de no mínimo completar os 30 natais com a roupa vermelha, as botas pretas e a vontade de arrancar sorrisos das crianças. "Vou ver até quando eu aguento. Faltam mais três anos para completar 30 anos de Papai Noel. Começamos num grupo de seis homens, e o único que está vivo sou eu. Enquanto eu puder, vou continuar levando a alegria e a esperança a todos os que acreditam no Natal", conclui.