Por Yasmin Castro, g1 Campinas e Região


Pastor trans que teve câncer relata renascimento após retirada da segunda mama

Pastor trans que teve câncer relata renascimento após retirada da segunda mama

Normalmente associado ao sexo feminino que, de fato, é mais acometido, o câncer de mama também pode se manifestar em pessoas do sexo masculino. Mais do que isso, a doença exige atenção especial entre pessoas transexuais.

Luiz Gustavo Oliveira Brito, doutor em ginecologia pela Unicamp, explica que a terapia de hormonização feita durante a transição de gênero pode colocar essa população em um patamar específico na chance de desenvolver esse tipo de câncer.

Além disso, fatores como uso inadequado de testosterona e estrogênio, aliado à vulnerabilidade social, que muitas vezes afasta a população dos serviços de saúde e dificulta o autocuidado, também podem elevar a probabilidade de surgimento da doença.

No Dia Mundial de Combate ao Câncer de Mama, data celebrada neste sábado (19) e que dá origem à campanha Outubro Rosa, o g1 explica quais são os riscos para essa população e quais cuidados devem ser adotados para prevenir a doença.

Nesta reportagem você vai ver:

A transexualidade e os hormônios

Antes de analisar o assunto, é válido relembrar:

  • Homens transgênero: pessoas que ao nascer foram atribuídas ao sexo biológico feminino, mas que se identificam como homens;
  • Mulheres transgênero: pessoas que ao nascer foram atribuídas ao sexo biológico masculino, mas que se identificam como mulheres;
  • Homens e mulheres cisgênero: pessoas que se identificam com o sexo biológico atribuído no nascimento.

Nem toda pessoa transexual deseja modificar características físicas para se adequar ao gênero com o qual se identifica – e isso não a torna menos trans. No entanto, aquelas que desejam transformar o corpo como forma de afirmação de gênero podem optar por terapias hormonais e cirurgias.

  • Homens trans: podem recorrer à mastectomia masculinizadora (retirada das mamas) e uso de testosterona (hormônio masculino), entre outros procedimentos, para ter uma aparência mais masculina, com aumento da massa muscular e crescimento de pelos.
  • Mulheres trans: podem recorrer a implantes mamários (silicone) e uso de estrogênio (hormônio feminino) – que também altera a mama, muda a distribuição de gordura no corpo –, entre outros procedimentos, para ter uma aparência mais feminina.

Pessoas transexuais podem ter câncer de mama?

A resposta é sim. Embora a doença seja predominante entre as mulheres cisgênero – segundo tipo mais comum no público feminino, atrás apenas do tumor maligno da pele – o câncer de mama pode se manifestar em qualquer pessoa.

  • Veja só: dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), mostram que o tumor maligno da mama representa cerca de 28% dos casos novos em mulheres. Entre homens, representa ao menos de 1% do total de casos da doença. O levantamento não especifica se fala de pessoas trans ou cis.

A questão, segundo Luiz Gustavo, é que entre pessoas transexuais essas estatísticas tendem a ser diferentes e o motivo está, justamente, nos hormônios e nas modificações que eles causam no corpo.

"É comum o paciente pensar: 'se eu estou me transformando para ser um homem [no caso da transição de feminino para masculino], o meu risco risco cai'. Tudo bem que a chance de um homem ter câncer de mama é 135 vezes menor do que uma mulher, então alguns acham que não precisam fazer mamografia, mas não é verdade".

Afinal, o que os hormônios têm a ver com o câncer de mama?

O médico explica que o câncer de mama pode ser influenciado por hormônios, mas eles não são o único fator. No entanto, pontua dois fatores que os relacionam ao risco da doença em pessoas transexuais:

  • PRIMEIRO PONTO: o uso de testosterona e estrogênio de forma errada e sem acompanhamento médico pode influenciar o desenvolvimento de diferentes tipos de tumores.

“Quando a gente prescreve hormônio para a pessoa, a gente prescreve dosagens em níveis fisiológicos para aquele gênero que ela deseja. Se a pessoa feminina faz a transição para homem, a gente aumenta a testosterona para que seja igual a de um homem cisgênero. O mesmo acontece com o estrogênio, que vão diminuir para ficar como o de alguém que nasceu masculino”.

“Às vezes, o que acontece é que eles usam doses que não são as recomendadas”, comenta o médico. Isso ocorre, por exemplo, quando algumas mulheres transexuais fazem um uso inadequado de estrogênio, acreditando que terão mais características femininas, e homens trans tomam mais testosterona que o recomendado.

  • SEGUNDO PONTO: as mudanças que esses hormônio causam no corpo, aliadas às características do sexo biológico e do gênero para o qual a pessoa está transicionando.

Um estudo publicado em 2023 no European Journal of Cancer Prevention analisou a incidência da doença nesta população e constatou:

  • Homens trans tem menor probabilidade de desenvolver câncer de mama do que uma mulher cis;
  • Homens trans tem maior probabilidade de desenvolver câncer de mama do que um homem cis;
  • Mulheres trans tem menor probabilidade de desenvolver câncer de mama do que uma mulher cis;
  • Mulheres trans tem maior probabilidade de desenvolver câncer de mama do que um homem cis.

E por que isso acontece? O uso do estrogênio faz com que as mulheres transexuais tenham alterações nas mamas, que passam a ser semelhantes as de uma mulher cis. Por isso, o risco de ter câncer passa a ser mais parecido com o de uma mulher cisgênero.

"Às vezes as mulheres trans pensam assim: 'como eu sou biologicamente um homem inicialmente, eu não tenho esse risco aumentado'. Porém, os estudos mostram que o risco pode ser diminuído a igual, mas é maior que o do homem cis.

No caso do homem trans que toma testosterona, é o oposto. Ele vai ter alterações na quantidade de gordura, no volume e na composição por causa do hormônio, vai ficar mais próximo de um homem cis, mas as glândulas mamárias continuam e precisam de acompanhamento.

Se o homem trans optar pela retirada das mamas, essa probabilidade diminui, mas ainda dependerá da extensão do procedimento cirúrgico. Se os mamilos forem mantidos e se ainda houver tecido mamário no interior do corpo, a chance de desenvolver a doença ainda vai existir.

Como prevenir a doença

O professor da Unicamp reconhece que as pessoas trans podem enfrentar barreiras na saúde por conta da discriminação ou até da situação de moradia.

Além de dificultar o acesso a uma terapia de transição de gênero correta, esse cenário também atrapalha a busca por atendimento médico preventivo e atrapalha o cuidado com o próprio corpo.

Porém, lembra que a principal forma de prevenir o câncer de mama é manter um estilo de vida saudável, com boa alimentação e atividades físicas, e fazer acompanhamentos de rotina.

Quais são os sintomas do câncer de mama?

Segundo o Ministério da Saúde, o aparecimento de nódulo é o sintoma mais comum de câncer de mama. Ele geralmente é indolor, duro e irregular, mas há tumores que são de consistência branda, globosos e bem definidos. Outros sinais de alerta são:

  • aparecimento de nódulos na região dos braços (axilas) ou pescoço;
  • mudanças na pele, que pode ficar avermelhada, retraída ou parecida com casca de laranja
  • alterações no mamilo
  • dor;
  • saída de secreção líquida de um dos mamilos.

Como é o diagnóstico do câncer de mama?

Independentemente do sintoma, o diagnóstico só pode ser feito após investigação. Para isso, pode ser necessária a realização de:

  • exame clínico das mamas;
  • exames de imagem (mamografia, ultrassonografia ou ressonância, por exemplo);
  • biópsia.

Tratamento

O câncer de mama tem cura e o tratamento varia de acordo com cada caso. Apenas um médico pode definir a opção mais adequada para o paciente.

Entre as terapias mais utilizadas estão a mastectomia (retirada da mama), radioterapia, quimioterapia, hormonioterapia e o uso de anticorpos.

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