UFFS está presente em Santa Catarina, Paraná e no Rio Grande do Sul — Foto: Divulgação/Diretoria de Comunicação UFFS
O presidente Jair Bolsonaro nomeou o terceiro colocado na lista tríplice para reitor da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), com campis em Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná. A nomeação do professor Marcelo Recktenvald, de 44 anos, foi publicada no Diário Oficial da União na quinta-feira (29).
Recktenvald vai assumir o lugar de Jaime Giolo, que ocupava o cargo de reitor eleito da UFFS desde 2015, quando ocorreu o primeiro processo de consulta previa à comunidade universitária e a votação do Conselho Universitário (Consuni). Antes disso, desde 2009, o próprio Giolo estava à frente do cargo como reitor pro tempore, ou seja, que foi designado temporariamente pelo Ministério da Educação (MEC).
O processo de escolha de composição da lista tríplice para reitoria da universidade - o segundo em sua história - teve o primeiro turno realizado em 29 de abril deste ano. O processo de consulta prévia contou com quatro chapas inscritas e participação de mais de 6 mil pessoas. Recktenvald teve 21,40% do total de votantes, ficando em terceiro lugar.
O reitor nomeado por Bolsonaro nesta sexta não chegou a participar do segundo turno do processo, realizado em 28 de maio. Participaram as duas chapas mais votadas. O resultado foi Anderson André Genro Alves Ribeiro em primeiro lugar, com 54,1%; e Antônio Inácio Andrioli, com 45,9%.
Já no processo de consulta ao Consuni, composto por 54 conselheiros, Recktenvald recebeu apenas quatro votos, de 49 votantes. O conselho seguiu a votação realizada pela comunidade universitária: o primeiro colocado foi o professor Ribeiro com 26, e Andrioli com 19 votos dos conselheiros. Os dados foram informados pelo atual reitor, Giolo, que também é presidente do órgão.
O presidente do país, no entanto, tem permissão para indicar qualquer um dos nomes da lista para a reitoria.
A posse de Recktenvald vai ocorrer na quarta-feira (4), em Brasília, no Ministério da Educação. Junto com o vice, Gismael Francisco Perin, ele tem como um dos principais objetivos ampliar a relação da instituição com a comunidade externa envolvendo os segmentos produtivos e empresarial.
Marcelo Recktenvald e Gismael Francisco Perin, candidatos a reitor e vice-reitor da UFFS, durante apresentação de suas propostas na eleição de 24 de junho — Foto: Lia Pagoto/UFFS
Reitor nomeado
Em entrevista ao G1, Recktenvald destacou as mudanças no país. "O que percebemos é um posicionamento da comunidade que está com muitas demandas que tem sido apresentadas na sociedade e o reposicionamento inclusive da universidade pública. Creio que minha nomeação seja muito coerente com todos os movimentos que foram percebidos nas urnas nas últimas eleições para presidência".
Ele disse que não conhece o presidente Bolsonaro pessoalmente. "Ninguém pode questionar que a nomeação de um terceiro colocado de uma lista tríplice deixe de ser democrática. Atendemos todos os requisitos de legalidade, temos uma legitimidade da comunidade externa muito maior do que as outras candidaturas. É um processo que precisa ser aperfeiçoado com o tempo, e nós faremos isso", defendeu.
O professor também criticou o processo para a escolha do cargo. "O pleito eleitoral e de disputa da reitoria é muito disputado e embolado. No segundo turno [quando não entrou a chapa de Recktenvald] acredito que foi muito incoerente, uma vez que pelo que demanda lista tríplice, não faz sentido ter segundo turno, mas foi uma opção que a universidade fez e acabou sendo um resultado diferente do que foi no primeiro turno", explica.
Ele também questionou sobre a composição do Conselho Universitário, a participação da comunidade externa e da empatia pelo Projeto Future-se.
"O Conselho Universitário foi composto em um período que havia uma gestão, em que as posições ocupadas faziam parte de algum movimento de legitimação estruturante com a universidade, inclusive com algumas disfunções no processo de escolha dos conselheiros, que não tem uma escolha representativa, em que todos tem igualdade e oportunidades", disse.
"O Conselho Universitário tem uma estrutura que foi construída dentro de um escopo ideológico muito claro das universidades federais, diferente do que acredito, e do que os nossos apoiadores demandavam e que a nossa candidatura representou. Defendemos o envolvimento da comunidade externa de maneira ampla e não direcionada a alguns segmentos. As entidades externas que historicamente tinham participação na universidade eram ligadas à partidos políticos de esquerda e movimentos sociais do tipo MST, Mulheres Campesinas, órgãos muito ideológicos do partido dos trabalhadores e com a universidade não pode ter esse tipo de aparelhamento, ela precisa de verdade de uma representatividade ampla da sociedade, como a aproximação com o segmento produtivo e empresarial", disse.
Também afirmou que os princípios de gestão foram os diferenciais em relação aos outros candidatos. Segundo o professor, entre os objetivos estão: a valorização das pessoas do trabalho, excelência acadêmica, integração com a comunidade, defesa da universidade pública com ensino gratuito, laica, apartidária e de qualidade, zelo com os princípios da administração pública. Além disso, o professor afirma que a religião não interfere na gestão profissionalizada.
Repercussão
O reitor atual Giolo, disse que as universidades geralmente esperam que ocorra a nomeação do primeiro da lista tríplice.
“Há todo um processo eleitoral que é feito e é um processo eleitoral sério. A expectativa é sempre a mesma, mas também não é o primeiro que o presidente Bolsonaro escolhe entre outros classificados da lista e ele até anunciou inclusive que iria escolher quem ele queria, e não o que a comunidade acadêmica quisesse”, disse.
Após o anúncio, o reitor disse que não ocorreram manifestações na instituição. “Não sei como a comunidade acadêmica vai reagir, é muito cedo, pois todos ficaram sabendo agora de manhã sobre isso. De maneira geral, as universidades entendem que isso é uma espécie de afronta ao princípio da autonomia universitária, mas não é ilegal, a lei faculta o presidente escolher entre os três da lista, mas tem sempre uma expectativa pelos princípios democráticos, então certamente gera frustração e não sei como isso vai se traduzir”, explicou.
O primeiro colocado da lista tríplice, Anderson André Genro Alves Ribeiro, se disse surpreso com a decisão, mesmo sabendo que a indicação de qualquer um dos nomes é possível, conforme prevê legislação. Nesta semana, na quarta-feira (28), ele chegou a ser contatado pelo MEC, pelo gabinete da Secretaria de Educação Superior, para falar da solenidade de posse.
“Mas a surpresa maior não foi por causa deste contato, mas sim porque tivemos um processo de escolha, de composição da lista tríplice da universidade, que foi pautado pela legalidade. Ou seja, não existe nenhum desabono dentro do nosso processo que poderia motivar a indicação de outro que não o primeiro indicado da lista”, observou.
“Posteriormente o que me vem à cabeça é o desdobramento disso, a consequência para a universidade. Porque a instituição ao invés de concentrar suas energias nas discussões importantes do ensino, na formação de profissionais, na pesquisa científica, na extensão e na cultura, vai estar agora discutindo novamente a democracia, a legitimidade, a legalidade, moralidade, ou seja, desfocando a universidade daquilo que ela deveria estar focada”, complementou.
O segundo colocado, Antônio Inácio Andrioli, preferiu não se manifestar sobre a decisão.
Quem é o novo reitor
O professor Marcelo Recktenvald foi nomeado como reitor da UFFS pelo presidente Jair Bolsonaro. — Foto: Facebook/ Arquivo Pessoal
Marcelo Recktenvald é doutor em Administração pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) , mestre em Administração pela Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB); possui especialização em Gestão Estratégica Empresarial pela Universidade de Passo Fundo (UPF) e especialização em Avaliação Institucional pela Universidade de Brasília (UnB) . Bacharel em Administração pela Universidade de Passo Fundo (UPF) e em Teologia pela Faculdade Kurios. Tem experiência nas áreas de Administração e Educação, com ênfase nos seguintes temas: gestão universitária, avaliação institucional e regulação, educação superior, políticas públicas, administração geral.
O professor leciona desde 2000. Na UFFS em Chapecó, no Oeste catarinense, desde julho de 2010. Ele é cristão, conservador, pastor por vocação e é membro da Igreja Batista de Balneário Camboriú, no Litoral Norte catarinense. Até março deste ano ocupou o cargo de Pró-Reitor de Gestão de Pessoas da universidade.
Sobre a universidade
A UFFS atualmente tem campus em seis cidades, entre os três estados do Sul. Em Santa Catarina está o maior deles, em Chapecó. No Rio Grande do Sul são três campi, em Passo Fundo, Erechim e Cerro Largo, e há dois também no Paraná, em Laranjeiras do Sul e Realeza.
No total, 8.602 alunos estudam nos seis campi, em 44 cursos de graduação. A universidade ainda conta com 712 professores. Na pós-graduação, são 1,161 estudantes.
A universidade foi criada em 2009 e teve como reitor pro tempore com designação temporária feita pelo MEC, Dilvo Ristoff. Ele ficou no cargo por seis meses e assumiu em seguida o vice Jaime Giolo. Em 2015, no primeiro processo envolvendo a consulta prévia à comunidade universitária e o Consuni, Giolo foi o primeiro da lista tríplice, com maior votação. O resultado foi acatado pelo presidente da época. O atual reitor se manteve no cargo então por nove anos.
Nomeações nas universidades
A nomeação feita diretamente pelo presidente Jair Bolsonaro, sem acatar a decisão da comunidade universitária, não foi a primeira. Também ocorreu na Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), para as federais do Triângulo Mineiro (UFTM) e do Recôncavo da Bahia (UFRB).
Apesar de a escolha do reitor ser prerrogativa do presidente, a nomeação de candidato menos votado rompe com uma tradição que se mantinha, com a gestão do governo do PT.
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