Entenda o que é suicídio assistido
O escritor e compositor Antonio Cicero, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), morreu, na manhã desta quarta-feira (23), por suicídio assistido na Suíça, onde o procedimento é legal desde a década de 1940.
Considerada controversa por envolver questões religiosas e éticas, a técnica do suicídio assistido ocorre quando uma equipe médica fornece medicamentos para o procedimento, mas é o próprio paciente que administra a dose fatal.
Embora o crítico literário e filósofo tenha mencionado a eutanásia em uma carta para explicar sua decisão, a técnica apresenta algumas diferenças, visto que a eutanásia acontece quando a própria equipe médica administra uma dose. No Brasil, os dois métodos são proibidos. Na América Latina, somente a Colômbia permite tanto o suicídio assistido como a eutanásia.
Abaixo, entenda como são feitos os procedimentos.
1) O que é suicídio assistido?
O suicídio assistido é o ato de deliberadamente ajudar uma outra pessoa a se matar, assim define o serviço de saúde britânico, o NHS.
"Se um familiar de uma pessoa com doença terminal obteve sedativos fortes, sabendo que a pessoa pretendia usá-los para se matar, o parente pode ser considerado como auxiliar do suicídio", diz o NHS.
No Reino Unido, assim como no Brasil, tanto o suicídio assistido como a eutanásia são considerados ilegais. Por aqui, o Código Penal define como crime, com pena de 6 meses a 2 anos de prisão, "induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou prestar-lhe auxílio material para que o faça".
Antonio Cicero. — Foto: Daryan Dornelles / Divulgação
Em outros países, como na Colômbia, Suíça, Holanda, Luxemburgo, Canadá, Austrália, Espanha, Alemanha e alguns estados norte-americanos (como Oregon, Vermont, Washington, Califórnia e Montana), a diferença é que o suicídio assistido, quando feito sob supervisão de uma equipe médica e acompanhado de uma avaliação caso a caso, é considerado legal, em certas circunstâncias (entenda mais no item 4).
Ou seja, nesses casos, o médico ou uma entidade médica fornece os medicamentos para o procedimento, mas o paciente o administra.
A legislação suíça, por exemplo, permite o suicídio assistido desde que não seja por "motivos egoístas".
"Um exemplo seria incitar deliberadamente uma pessoa a cometer suicídio para se livrar de ter que pagar apoio financeiro para essa pessoa", cita a associação suíça Dignitas, que oferece suicídio assistido no país.
No país, segundo a "Swissinfo", suicídios assistidos representam cerca de 1,5% das 67.000 mortes registradas em média a cada ano.
Em maio de 2022, a Corte Constitucional da Colômbia descriminalizou o suicídio assistido, tornando o 1° país da América Latina a aceitar a prática para quem esteja sofrendo com doenças sérias ou incuráveis.
2) Qual a diferença entre suicídio assistido e eutanásia?
Na Holanda, diferentemente da Suíça, tanto a eutanásia como o suicídio assistido por médicos são práticas consideradas legais.
A diferença entre as duas técnicas é que na eutanásia é a própria equipe médica que administra uma dose fatal de um medicamento no paciente.
"Os pedidos de eutanásia muitas vezes vêm de pacientes que passam por um sofrimento insuportável sem perspectiva de melhora. Seu pedido deve ser feito com seriedade e plena convicção", afirma o governo da Holanda.
No caso do suicídio assistido, o paciente recebe um comprimido com uma substância que, naquela dose, vai provocar a morte.
"Aí ele tem o controle de tomar aquele comprimido quando ele achar que é o momento. Mas a diferença principal é que o ato de tomar a medicação no suicídio assistido é do paciente, é da pessoa, não é do profissional de saúde", explica Ana Cristina Pugliese Castro, médica de Cuidados Paliativos do Hospital Sírio-Libanês.
Em ambos os casos, porém, os médicos devem cumprir alguns requisitos legais e cada procedimento de eutanásia e suicídio assistido deve ser relatado a comitês regionais que devem julgar se a equipe médica tomou os devidos cuidados ao analisar o histórico do paciente.
Além disso, no país, os menores de 12 anos podem solicitar a eutanásia, mas o procedimento deve ser feito somente se os pais autorizarem (até eles completarem 16 anos).
3) Quais países autorizam os procedimentos?
Ao menos Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Canada e Colômbia permitem tanto a eutanásia como o suicídio assistido.
Na Suíça somente o suicídio assistido é permitido, mas não é necessário que um médico preste assistência para o procedimento. Apesar disso, como mencionado antes, a conduta da pessoa que presta assistência não deve ser motivada por egoísmo.
Já na Bélgica, o suicídio assistido por médico é tratado como uma forma de eutanásia.
4) Em que casos é possível fazer os procedimentos?
Alguns países estipulam uma série de condições para a autorização dos procedimentos.
A lei belga sobre a eutanásia, por exemplo, define que um paciente deve estar legalmente consciente no momento da decisão, seu pedido deve ser feito de forma voluntária, bem ponderado e repetido. Além disso, não deve ser resultado de uma "pressão externa".
Fora isso, o médico que realizar o procedimento não estará cometendo um crime somente se a doença do paciente causar um sofrimento físico ou mental constante e insuportável, resultante de "uma doença grave e incurável causada por doença ou acidente".
As regras do Canadá também são semelhantes. No país, que chama legalmente o procedimento de "assistência médica na morte", além de ter mais que 18 anos, o paciente precisa ter uma condição "médica grave e irremediável".
Já na Colômbia, tanto o suicídio assistido como a eutanásia são autorizados com supervisão médica para quem esteja sofrendo com doenças sérias ou incuráveis. Em janeiro de 2022, porém, depois de uma decisão judicial, um homem de 60 anos se tornou a primeira pessoa sem doença terminal a morrer por eutanásia na Colômbia.
A Suíça é o país que tem as regras mais permissivas: a legislação local não estipula um limite de idade nem condições médicas para a realização do suicídio assistido (apesar de não permitir que um médico administre a dose letal). Além disso, a Suíça é um dos poucos países onde os estrangeiros podem realizar o procedimento.
Apesar disso, a Dignitas, a associação suíça que oferece o procedimento para estrangeiros, exige evidências médicas, como relatórios médicos, e ressalta que o processo até a realização do suicídio assistido pode levar três meses ou mais.
"Acho que o que leva as pessoas a buscarem em todos esses exemplos a morte medicamente assistida é a busca de uma vida de acordo com seus preceitos de dignidade. Quando isso não é mais viável, tecnicamente falando, pela condição de saúde da pessoa, então elas buscam abreviar a vida", afirma Ana Cristina.
A médica relembra que uma porcentagem muito grande das pessoas não é elegível para os programas de suicídio assistido. Quem pleiteia esse procedimento passa por inúmeras avaliações com médicos paliativistas, psiquiatras e psicólogos e, se confirmado, enfim recebem o comprimido com a dose letal da medicação.
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