O Ministério Público do Estado de São Paulo abriu um inquérito civil para apurar denúncias sobre trotes violentos que teriam sido aplicados por estudantes veteranos em calouros da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), em Sorocaba (SP). A investigação foi aberta com base no relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) que investigou ilegalidades nos trotes em universidades do estado. Ao G1, a PUC informou não ter sido notificada sobre a abertura do inquérito civil.
Alberto Marum (Foto: Reprodução/TV TEM)
No documento, instaurado na última terça-feira (8), o promotor de Sorocaba Jorge Alberto de Oliveira Marum chega a comparar os trotes com "torturas". De acordo com a portaria, o campus em Sorocaba "tem sido palco de trotes violentos e outras práticas humilhantes, vexatórias e intimidatórias, inclusive assemelhadas à tortura, contra os alunos matriculados no primeiro ano da instituição, (...) sem que a diretoria (...) tenha adotado medidas eficientes para coibir tais práticas".
Os trotes são praticados por estudantes veteranos aos novos universitários a cada começo de ano, o que se tornou tradição entre os alunos. Defendidos como suposta "brincadeira" pelos mais velhos, as atividades podem até virar caso de polícia, quando praticadas contra a vontade dos calouros.
Com a abertura do inquérito, tanto a PUC quanto outros envolvidos – estudantes e instituições – serão notificados para prestarem esclarecimentos oficiais e por escrito. A universidade ainda terá que explicar eventuais providências tomadas para tentar coibir as práticas realizadas pelos estudantes durante os trotes.
A PUC em Sorocaba informou ao G1 que até a tarde desta quarta-feira (9) ainda não havia sido notificada oficialmente sobre a abertura do inquérito civil e que só iria se manifestar após tomar conhecimento do conteúdo do documento.
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Denúncias
A Alesp abriu uma CPI em 2014 para apurar denúncias de alunos e se as universidades paulistas estariam sendo omissas ou negligentes com casos de violação de direitos humanos contra estudantes. Entre os depoimentos de universitários de Sorocaba, um dos estudantes chegou a afirmar que os calouros eram obrigados até a comer fezes.
Na época, o estudante Rodolfo Furlan, integrante do Grupo de Apoio ao Primeiranista (GAP) que denunciou a violência à CPI em depoimento via videoconferência, separou em dois tipos os trotes aplicados aos alunos: o mínimo, que é o corte do cabelo do calouro, a pintura do corpo e a obrigatoriedade do uso da camiseta dos calouros; e o mais complexo: os alunos novatos chegam a ingerir fezes e vômito alheio, além de receberem urina na cabeça. Segundo o estudante, os trotes mais complexos ainda contariam com a participação de alunos e de médicos formados, que são conhecidos apenas por apelidos.
Pelo menos oito estudantes da PUC em Sorocaba chegaram a ser ouvidos na CPI em São Paulo. "Os alunos bebiam muito além do que podiam, inclusive antes de ir para as aulas. Eu mesmo presenciei isso. Correr nu, isso também acontece. Eu tenho um relato pessoal de que eu não corri, mas eu vi isso acontecendo no final de um amistoso", afirmou uma aluna que preferiu não ter o nome divulgado. Os demais estudantes relataram abusos como proibição de usar elevadores do prédio, de comer no refeitório e transitar livremente pelas dependências da universidade.
A CPI, concluída um ano depois com a aprovação do relatório final e a proposta de dois projetos de lei, também registrou denúncias de outras universidades paulistas: Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Universidade Estadual Paulista (Unesp), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), e da Faculdades Adamantinenses Integradas (FAI).