Por g1 RS


Sarah Silva Domingues fazia TCC na região da Ilha das Flores — Foto: Arquivo Pessoal

O Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul denunciou, nesta sexta-feira (22), quatro pessoas pelo assassinato da estudante Sarah Domingues, morta por engano em janeiro enquanto realizava uma pesquisa do trabalho de conclusão de curso em Porto Alegre. Além da jovem, o dono de um mercado, Valdir dos Santos Pereira, de 53 anos, também foi morto no ataque – ele seria o alvo dos criminosos (relembre o caso abaixo).

Também nesta sexta, o juiz Francisco Luís Morsch, da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, aceitou a denúncia e tornou os quatro acusados réus.

Os nomes dos denunciados não foram divulgados. São eles: o mandante (um presidiário), a irmã dele (que teria intermediado a comunicação para a realização do crime) e mais dois apenados (que cuidavam a movimentação do alvo).

"São graves crimes que ceifaram a vida de duas pessoas, uma delas, uma jovem que estava fazendo um trabalho para tratar das enchentes na região das ilhas, que era o trabalho de conclusão da Sarah", disse a promotora Lúcia Helena Callegari.

O MP acusa os investigados de duplo homicídio qualificado (motivo torpe e recurso que dificultou a defesa das vítimas, através da utilização de arma de fogo de uso restrito). Os executores do crime ainda não foram identificados.

"Infelizmente, até o momento, foi possível apurar de forma bastante clara, através de provas de extrações de dados de celulares, quem ordenou e organizou o crime, mas ainda são necessárias algumas diligências complementares e informações para descobrir os executores", disse a promotora.

Segundo o MP, o dono do mercado era o alvo do grupo por não aceitar que o tráfico de drogas dominasse a comunidade onde residia. A estudante estava entrevistando o comerciante no momento do crime, quanto foram atingidos por 15 tiros.

Relembre o caso

Sarah foi morta no dia 23 de janeiro de 2024, em frente a um mercado na região da Ilha das Flores, enquanto fazia uma pesquisa acadêmica.

Moradores relataram à polícia que dois homens em uma motocicleta chegaram ao local, desceram do veículo e atiraram contra a estudante e o dono do estabelecimento. Segundo a polícia, o alvo dos criminosos seria o comerciante, que estaria incomodado com o tráfico de drogas na região.

No dia 6 de fevereiro, a Polícia Civil prendeu temporariamente cinco pessoas suspeitas de envolvimento no assassinato da jovem de 28 anos. Os presos seriam o mandante do assassinato, dois executores e outras duas pessoas que teriam envolvimento com o crime. Eles foram alvo de mandados judiciais cumpridos em diferentes endereços de Porto Alegre e Região Metropolitana.

Já na noite de 21 de fevereiro, a Polícia Civil prendeu preventivamente o traficante Maicon Donizete Pires dos Santos, conhecido como "Red Nose", que teria cedido os homens que participaram do ataque. Ele estava foragido e foi capturado em Garopaba, Santa Catarina. Na época, a Polícia Civil afirmou que o ataque teria sido executado por um grupo criminoso, da Zona Norte da capital, com o qual Maicon teria envolvimento.

"É uma pessoa inocente que morreu devido a essa violência. Esse grupo criminoso faz parte do criminoso que foi preso em Garopaba. Então, a morte da estudante da UFRGS, existem indícios fortes, de que está ligada a esse grupo criminoso da Zona Norte, que resultou em várias outras mortes durante o ano de 2023", disse, na época, o delegado Mário Souza.

A Polícia Civil cedeu, à reportagem da RBS TV, imagens que mostram a conduta dos criminosos. No vídeo, é possível ver que os criminosos descem de um carro branco no meio da rua, à luz do dia, e se revezam atirando. Um homem é atingido várias vezes e morre. Um dos envolvidos nos atos de violência, segundo a polícia, foi preso dentro de um shopping de Porto Alegre.

O conflito entre os criminosos de diferentes grupos foi registrado pela polícia. Nas imagens, um homem efetua diversos disparos, sendo possível ver cartuchos de balas caindo.A Brigada Militar e a Polícia Civil, em operação realizada no ano passado, prenderam 28 pessoas e 25 armas.

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Homenagem em formatura

Marta da Silva Domingues, mãe de Sarah, definiu como "uma homenagem bonita, mas dolorosa" a entrega do diploma da filha, realizada de forma póstuma em junho. A servidora pública de 53 anos recebeu o canudo em nome da jovem.

"É difícil. É um misto de sentimentos, pois foi uma homenagem bonita, mas dolorosa. Todos estavam felizes e fiquei o tempo todo imaginando como seria, mas ela não estava lá. Arrancaram um direito da minha filha. Ela esperou muito por esse dia, queria muito essa formatura", relata a mãe.

Durante a cerimônia, o nome de Sarah foi recebido sob aplausos da plateia e dos formandos, que se levantaram para a homenagem.

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Além da mãe, a irmã de Sarah, a estudante Eloá da Silva Farias, de 17 anos, também viajou para participar da homenagem de formatura. Percorreram mais de 1,1 mil km de carro em 16 horas de viagem.

Durante o trajeto e na chegada, a lembrança de Sarah era constante. A jovem deixou Campo Limpo Paulista, a 60 km da capital, São Paulo, em busca de conhecimento, de cursar uma faculdade e concluir o ensino superior.

"A cada vinda, fazíamos passeios juntas, passeávamos pelo Centro Histórico, conhecíamos vários locais. Ela veio para Porto Alegre para uma vida melhor, para realizar um sonho. Passou por dificuldades financeiras, estava longe de casa. Era uma aluna cotista e lutou pela permanência na universidade. É muito difícil voltar. Porto Alegre era ela", lembra a mãe da estudante.

Sarah Domingues, assassinada em Porto Alegre, estudava o curso de Arquitetura e Urbanismo, na UFRGS — Foto: Everaldo Oliveira/Jornal A Verdade

Projeto sobre enchentes nas ilhas

Além da formatura, a mãe de Sarah também foi até a Ilha das Flores, região onde a jovem foi morta. No local, as marcas da enchente de maio também lembraram a dedicação da estudante na luta pela moradia digna.

O trabalho de conclusão de curso desenvolvido pela estudante foi sobre um tema que se revelou urgente meses após a morte: a necessidade de um projeto urbanístico para combater as frequentes enchentes que atingem a região das ilhas. Após os temporais, o bairro Arquipélago teve 6,4 mil moradores afetados.

"Ela queria fazer uma denúncia com o trabalho que ela estava concluindo. Fui até lá e entendi. É uma região com infraestrutura precária, onde as pessoas seguem morando no meio da água. Conheci a família do seu Valdir, que também foi morto por querer proteger os moradores. Por tudo isso, espero que a luta e dedicação da Sarah não sejam esquecidas e sirvam de inspiração porque a história dela merece ser contada", diz Marta.

Sarah foi coordenadora do Diretório Central dos Estudantes (DCE), diretora da União Nacional dos Estudantes (UNE) e integrou o Conselho Universitário da UFRGS. Após a morte da estudante, o Diretório Acadêmico da Faculdade de Arquitetura (DAFA) da universidade foi renomeado para "DAFA Sarah Domingues - UFRGS".

Área inundada na Região das Ilhas, em Porto Alegre — Foto: Reprodução/RBS TV

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