Xamã Davi Kopenawa e reitor Geraldo Ticianeli (da esquerda para a direita), no outorga do título. — Foto: Samantha Rufino/g1 RR
O xamã Davi Kopenawa, principal liderança indígena do povo Yanomami recebeu o título de doutor honoris causa, a máxima distinção acadêmica concedida pela Universidade Federal de Roraima (UFRR). A solenidade histórica aconteceu no Centro Amazônico de Fronteiras (CAF), no campus Paricarana, zona Leste de Boa Vista, na última sexta-feira (23).
Conhecido internacionalmente e uma das mais respeitadas lideranças no país, Davi foi o primeiro indígena a receber o título da UFRR - e foi concedido por sua "liderança e contribuição na luta pelos direitos indígenas, reconhecidas tanto nacional como internacionalmente".
"Sou o doutor honoris da floresta que eu nasci e cresci. Fiquei muito contente, muito alegre, junto com a floresta que esta viva e em pé. Ser doutor honoris é o resultado da minha luta", disse.
Para ele, receber a honraria também foi uma forma para reconhecer o povo Yanomami. "É muito importante para mim, para o meu povo, família, jovens, mulheres e homens".
Indígenas realizaram um ritual yanomami durante a cerimônia, em Boa Vista — Foto: Samantha Rufino/g1 RR
Conduzida pelo reitor José Geraldo Ticianeli, a cerimônia de entrega do título ao xamã começou com um ritual Yanomami. Durante a solenidade de concessão do título, a filha de Davi, Tuíra Kopenawa, foi quem lhe entregou a beca.
"É o primeiro encaminhamento ao Conselho Universitário de uma personalidade indígena que trás, dentro das características da universidade, todos os conceitos para receber um doutor honoris causa."
"Foi um momento histórico para todos nós, um momento muito significativo para toda a nossa terra e todo o nosso povo", disse o reitor da UFRR.
Cerimônia de concessão do título foi realizada no Centro Amazônico de Fronteiras, em Boa Vista. — Foto: Samantha Rufino/g1 RR
A concessão do título foi aprovada por unanimidade pelo Conselho Universitário (Cuni) da UFRR no dia 5 de agosto deste ano. A iniciativa foi do Programa de Pós-graduação em Sociedade e Fronteiras.
O título é o mais importante concedido, e pode ser atribuído a uma personalidade que tenha destaque por contribuição com a sociedade. Ao todo, a UFRR já concedeu o título para 19 pessoas, incluindo políticos, professores e ex-reitores.
Sobre Kopenawa
Nascido por volta de 1955 (a data é incerta), Kopenawa é xamã e porta-voz dos Yanomami, povo ameaçado, principalmente, pela exploração ilegal do garimpo de ouro - atividade que se intensificou nos últimos ano e ameaça o povo que vive isolado geograficamente em Roraima e Amazonas.
Há mais de 30 anos, ele viaja pelo mundo em defesa do seu povo. Recebeu o apelido de "Dalai Lama da Floresta Tropical" e foi chave para o reconhecimento oficial do território Yanomami na Amazônia em 1992, depois de quase dez anos de luta.
Com quase 10 milhões de hectares, a Terra Indígena Yanomami é a maior do país. O território é duas vezes maior que a Suíça — sendo a maior área indígena coberta por floresta do mundo, de acordo com a organização Survival International.
Nos anos 1950 e 1960, o contato intensificado com homens brancos levou ao surgimento de doenças que praticamente eliminaram os yanomami. Foi assim que Kopenawa viu os pais morrerem.
E, na década de 1980, milhares de garimpeiros invadiram seu território em busca de ouro, resultando em violência e novas doenças, o que reduziu a população nativa em 20%, segundo a Survival International.
Kopenawa diz que não morreu por ser "protegido pelo pajé". Em 1989, ele recebeu um prêmio da ONU pela defesa do seu povo.
É diante deste contexto que o líder indígena — cofundador e presidente da Hutukara Associação Yanomami, criada em 2004 — tem dedicado sua vida a proteger os direitos indígenas e o território do seu povo na floresta tropical.
Kopenawa, que aprendeu português já adulto, é autor do primeiro livro escrito por um Yanomami: "A queda do céu". A obra, publicada em 2010, narra a trajetória dele e do seu povo, além de suas visões sobre o "homem branco".
Estrelou o filme "A Última Floresta", lançado em 2021. A obra mistura documentário e ficção, denunciando garimpos ilegais e o desmatamento da floresta. O roteiro foi coassinado pelo xamã e ativista. Os atores foram os próprios indígenas.
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