Por Bette Lucchese, Lucas Soares, Lucas Von Seehausen, Sérgio Telles, RJ1


MP investiga se a EMUSA, Empresa Pública de Niterói, está sendo usada para acomodar parentes de políticos

MP investiga se a EMUSA, Empresa Pública de Niterói, está sendo usada para acomodar parentes de políticos

O Ministério Público do Estado (MPRJ) instaurou na última quinta-feira (23) um inquérito de improbidade administrativa, má gestão, excesso de quadro de pessoal e omissão contra o prefeito de Niterói Axel Grael (PDT) e o presidente da Empresa Pública de Niterói (Emusa), Paulo Cesár Carrera.

É que a autarquia de Moradia, Urbanismo e Saneamento do município da Região Metropolitana do Rio está sendo usada para acomodar parentes de políticos da cidade. O número de comissionados dobrou nos últimos dois anos. Mas falta transparência nas contratações e nos gastos da empresa.

Criada há 45 anos, a empresa nunca fez concurso público. A Emusa é responsável por fazer obras de infraestrutura e manutenção na cidade e também contratar prestadores para os serviços. Os funcionários da empresa são servidores cedidos ou comissionados, ou seja, aquele que ocupam cargos de forma provisória. Por conta disso, o MPRJ passou a investigar a empresa por falta de transparência.

A promotora Renata Scarpa Fernandes Borges, afirma que os responsáveis pela empresa usam uma desculpa de "carência de pessoal, numa estratagema ilegal e danosa ao erário e à moralidade pública". No fim de janeiro, os promotores encontraram menos 10% das pessoas que deveriam trabalhar na autarquia. Há suspeita da contratação de funcionários fantasmas.

Segundo o MP, a falta de transparência de dados impede que se faça uma fiscalização adequada e se consiga esclarecer se há situações de nepotismo ou mesmo de funcionários fantasmas.

Crescimento de servidores e parentes de políticos nos cargos

Axel Grael é investigado pelo MPRJ — Foto: Divulgação

O RJ1 apurou, junto ao Portal do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que o número de funcionários dobrou nos últimos dois anos. Em dezembro de 2020 eram 518 pessoas, 446 delas comissionadas. Já em 2022, o número saltou para 1.053, com 993 comissionadas, o que gerou um gasto de mais de R$ 11 milhões com a folha de pagamento, o dobro de 2020.

O aumento mais expressivo de contratações ocorreu a partir de 2021, quando o prefeito Axel Grael assumiu o cargo. Ele recebeu a Emusa com 518 funcionários. Três meses depois já existiam 805.

Outro fato chamou a atenção dos promotores que cuidam do caso: parentes de secretários e vereadores de Niterói fazem parte da lista de funcionários comissionados da empresa.

Os parentes e os altos salários

Entre os funcionários estão:

Flávia Chagas Marques, esposa do presidente da Câmara dos Vereadores, Milton Cal. Ela foi nomeada em 1º de janeiro de 2021, com salário de R$ 9.500. À TV Globo, ela disse que é cedida e está trabalhando no Pacto Niterói Contra a Violência desde 2021, onde a sede fica ao lado do Parque das Águas. Disse ainda que não foi encontrada porque estava participando do Prefeitura Móvel no Horto do Fonseca.

Mariza Neves Gama, prima do ex-prefeito de Niterói e atual secretário Executivo do município, Rodrigo Neves. Contratada em 1º de fevereiro de 2021, recebe quase R$ 10 mil por mês.

Sheila Motta Pereira Bahia e Silva, esposa de Oto Bahia e Silva, secretário do Núcleo Executivo Regional do Caramujo, Baldiador, Maria Paula e Santa Bárbara, foi nomeada em 1º de março de 2021, com salário de R$ 10 mil.

Ana Clara Latge Alves, filha do coordenador da Coordenadoria de Eventos, André Felipe Gagliano Alves. Contratada em 1º de fevereiro de 2021, ela recebe quase R$ 7 mil. Em mensagem à TV Globo, Gagliano Alves afirmou que a filha é engenheira ambiental formada pela UFF e responsável pelos licenciamentos ambientais das obras da prefeitura. Diz ainda que ela "cumpre a carga estabelecida para o cargo para o qual é habilitada".

Michel Machado Jorge, cunhado do vice-prefeito de Niterói Paulo Bagueira. No cargo desde 1º de fevereiro de 2021, ganha quase R$ 10 mil.

O MPRJ diz que se pode cogitar que essas pessoas foram nomeadas na Emusa para se beneficiarem de remunerações mais altas, numa afronta ao princípio da impessoalidade, já que os valores pagos na empresa pública são muito superiores aos dos cargos da administração direta.

O RJ1 esteve nesta segunda-feira (27) na sede da Emusa, em Niterói, e não encontrou nenhum dos funcionários/parentes dos políticos.

O MPRJ compara a situação na Emusa como o caso do Ceperj. O escândalo que descobriu contratações, sem transparência, de milhares de pessoas, para trabalhar em projetos feitos em parceria com o Governo do Estado.

Os chamados cargos secretos consumiram valores 12 vezes maiores do que o previsto no orçamento. Mais de R$ 460 milhões foram gastos até novembro de 2022.

Exonerações às pressas

Na última quinta, o MPRJ instaurou um inquérito para apurar se o prefeito de Niterói e o presidente da Emusa cometem improbidade administrativa. Fontes da prefeitura ouvidas pelo RJ1 dizem que desde que as fiscalizações se intensificaram, mais de 40 pessoas já foram exoneradas.

Na última terça-feira (21), a esposa do secretário de Participação Social, Fabiane Cordeiro da Costa Ribeiro, foi exonerada. Na última quinta, foi a vez do primo do ex-pefeito Rodrigo Neves, Gerson Luiz Maia Neves.

Há dez anos o Ministério Público cobra mais transparência da Prefeitura de Niterói. Mas, até hoje, informações básicas continuam indisponíveis nos sites oficiais. Os dados sobre contratações e gastos gerais não são atualizados desde junho de 2019. E não há no site a lista dos funcionários da Emusa.

O que dizem os citados

Em nota, a Prefeitura de Niterói informou que "a Emusa vai passar por uma reforma administrativa para modernizar e dar ainda mais eficiência à empresa. Uma comissão está sendo criada para fazer um diagnóstico do atual cenário e definir critérios para a realização de um concurso público com o objetivo de ampliar os serviços prestados pela empresa".

Ainda de acordo com a prefeitura, "a previsão é que o parecer da comissão seja liberado em 30 dias". Ainda de acordo com o comunicado, a prefeitura disse que a Emusa conta hoje com uma equipe total de 958 funcionários nas mais diversas funções. Por fim, a gestão municipal de Niterói disse que "todas as informações solicitadas pelo Ministério Público serão esclarecidas e que a Procuradoria Geral do Município avalia a viabilidade de outras ações imediatas necessárias".

A TV Globo tenta contato com os citados na reportagem.

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