Casa do suposto 'homem da mala' de Witzel era frequentada por muitos políticos
José Carlos de Melo, apontado como o "homem do dinheiro" no suposto esquema criminoso do governador afastado Wilson Witzel (PSC), recebeu em sua casa secretários, deputados, chefe do Poder Legislativo, nomes ligados à Prefeitura e até opositores do atual governo.
A investigação aponta o empresário como chefe de um dos três grupos que disputavam poder e obtinham vantagem ilícita no governo Witzel.
De acordo com a delação de Edmar Santos, José Carlos de Melo agenciava as empresas que prestariam serviço para a pasta, recebendo valores em função dessa intermediação.
O Ministério Público Federal (MPF) afirma que ele utiliza entidades sem fins lucrativos para praticar operações financeiras suspeitas, com movimentações que beiram o patamar de R$ 1 bilhão em quatro anos. Uma das empresas não tem sequer funcionário.
Visita de secretários
A casa de José Carlos de Melo, num condomínio na Barra da Tijuca, era frequentada pelo então secretário de Saúde, Edmar Santos, que delatou o esquema. Outros três secretários foram ao local.
Edmar Santos diz que, em uma das ocasiões, foi ao imóvel para receber propina. Santos afirma ainda que José Carlos pagava uma mesada ao secretário de Ciência e Tecnologia, Leonardo Rodrigues. Este esteve ao menos cinco vezes na casa do lobista.
Lucas Tristão, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, visitou José Carlos em 31 de janeiro. Em julho e em agosto, quando já tinha sido exonerado, voltou ao local.
Um dos carros cadastrados na portaria do lobista como o de Tristão pertence a Thyrone Paulo Alves. Ele está cadastrado como funcionário da casa de José Carlos de Melo, apesar de fazer parte do quadro de funcionários da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Thyrone passou 152 vezes na portaria para entrar no condomínio.
Outras visitas
- Armando Correa Fonseca Júnior, ex-superintendente de compras e licitações da Secretaria de Saúde, atual subsecretário executivo
- Cassio Barcelos, assessor especial da Casa Civil; esteve 23 vezes no imóvel, sempre em carros blindados
- Frederico Loretti, o Kiko, ex-prefeito de Magé visitou o local 13 vezes; é apontado como operador financeiro de José Carlos de Melo
- Flavio Chadoud é investigado na operação que apura irregularidades na Fundação Leão XIII. Ele esteve no local no dia 24 de julho, em um utilitário avaliado em mais de R$ 500 mil.
- Pedro Osorio, ex-presidente do Detran é empresário e ligado ao grupo do Pastor Everaldo. Em março, passou duas horas no local.
- Fabio Picanço Loureiro, diretor jurídico do Procon, foi o maior doador da campanha de Wilson Witzel, com R$ 120 mil e esteve na casa de José Carlos de Melo duas vezes
- Altinêu Côrtes, responsável pelo meio ambiente, fez 16 visitas
Visita de opositores
Em uma das visitas feitas por Altinêu Cortes, ele estava acompanhado de Eduardo Paes, ex-prefeito do Rio e atual pré-candidato à Prefeitura. Os dois chegaram por volta das 17h e saíram perto das 19h.
Paes não é investigado nesta ação, mas é citado no relatório do Ministério Público para demonstrar a força política de José Carlos de Melo.
Nilton Caldeira, candidato a vice na chapa de Eduardo Paes, também visitou o empresário. Ele era assessor do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e esteve no local três dias antes de Paes.
Ligação na Prefeitura
José Carlos recebeu também pessoas ligadas a atual gestão da Prefeitura do Rio, como Rafael Alves, suspeito de ser um dos responsáveis pelo esquema de corrupção dentro do município. Alves esteve no imóvel em março e julho.
Licínio Soares Bastos, que também é suspeito de corrupção na Prefeitura do Rio, visitou José Carlos. Em 2016, ele teria feito doações ocultas a campanha do prefeito Marcelo Crivella (Republicanos). Crivella também não faz parte da investigação.
O empresário Leandro Braga, preso na Operação Favorito, frequentou o imóvel quatro vezes em dezembro do ano passado -- incluindo a noite de Natal. Ele foi ao local em um BMW conversível avaliado em mais de R$ 300 mil. Ele foi sócio de Maressa Crivella, nora do prefeito.
Parlamentares
As câmeras da portaria mostram que José Carlos recebia visitas de parlamentares de todas as esferas, como Sargento Gurgel (PSL), líder da bancada do rio na Câmara Federal.
O deputado estadual Delegado Carlos Augusto (PSD) e Max Lemos (PSDB) estiveram em dias diferentes. Ambos têm reduto eleitoral em Nova Iguaçu, região do lobista.
O presidente da Câmara Municipal, Jorge Felippe (DEM), também visitou o local no dia 23 de março.
O que dizem os citados
A defesa de José Carlos de Melo, que está preso, afirmou que sempre foi um hábito dele receber amigos e realizar encontros sociais. Por isso, ele teria alugado recentemente uma casa maior no Rio. Segundo ele, não se pode agora atribuir a qualquer encontro um ato ilegal.
Edmar Santos não quis comentar. Altineu Côrtes, Nilton Caldeira, Lucas Tristão e Licínio Soares Bastos não responderam ao RJ2 até a última atualização desta reportagem.
O secretário Leonardo Rodrigues disse que é amigo de José Carlos antes de entrar para a política.
Cássio Barreiros disse que já foi advogado de José Carlos e que as reuniões não trataram de assuntos relacionados à função dele no governo.
Fábio Picanço Loureiro afirmou que a referência ao nome dele é gratuita e desrespeita a advocacia.
Armando Correa Fonseca Junior afirmou que foi à casa de José Carlos tomar vinho a convite de um amigo em comum e que não tratou de assuntos da Secretaria.
Eduardo Paes disse que esteve apenas uma vez com José Carlos a convite de um conhecido, já que José Carlos era reitor da Universidade de Nova Iguaçu (Unig). Paes disse ainda que afirmou que reitores, em geral, são pessoas respeitadas e que não poderia imaginar de quem se tratava. Em anos eleitorais, segundo Paes, é comum que haja encontros políticos com desconhecidos.
Jorge Felippe disse que esteve no condomínio apenas uma vez para reunião com o presidente estadual do PL, Altinêu Cortes, e o presidente municipal do partido, Nilton Caldeira. Jorge Felippe diz que estava estudando migrar para o PL, o que não ocorreu, e que não sabia de quem era a casa.
Flavio Chadud afirma que responde às autoridades desde julho do ano passado e que não é citado na investigação.
Sargento Gurgel diz que só foi uma vez ao imóvel por ser presidente do PSL no Rio e que não tem nenhuma relação com o empresário.
O deputado Carlos Augusto diz que esteve duas ou três vezes na casa de José Carlos em eventos sociais e que ambos são de Nova Iguaçu. Até aquele momento, diz o parlamentar, não havia nada que desabonasse a conduta do empresário.
O deputado Max Lemos diz que conhece José Carlos há mais de 20 anos e que fez visitas ao empresário sem conhecer qualquer tema de investigação.
O advogado de Rafael Alves informou que tudo será esclarecido no processo.
O RJ2 não conseguiu contato com Leandro Braga e Carlos Frederico Loretti.